Os gritos de alegria retumbavam nos meus ouvidos. Eu mal entendia o que estava acontecendo com aqueles lábios invasivos sobre os meus. Sair de casa e ir para o trabalho. Minha intenção era somente essa, mas de repente um homem havia me agarrado e me beijado, e eu tinha ficado completamente sem ação. Um homem. Céus, eu nem gostava deles.
É claro que minha primeira reação, em especial depois de ser solta, não seria cuspir na cara dele — o que seria merecido, mas mesmo assim... — nem revelar minha orientação sexual, mas vontade não me faltou. Com a Segunda Guerra Mundial ainda tão fresca na memória de todos e a alegria por conta do final dele nos olhos, rostos e vozes dos presentes, meu relato, meu protesto, se perderia ao vento. Na pior das hipóteses, poderia até ser vista como traição. Um herói de guerra me beijara à força, e eu agradecia como? A única resposta correta era um com um sorriso. Foi isso que eu fiz.
O resto do dia correu como normalmente. Fui para o hospital, para meu trabalho como enfermeira. Recebi cumprimentos de pessoas que nem sabiam que estavam lá, que eu não vira lá. Perguntaram se nós nos veríamos de novo, eu e o marinheiro. Por Deus, eu nem sabia o nome dele. Não queria saber. Assim talvez o asco fosse menor. Um abusador sem nome, quase sem rosto, para que nos meus pesadelos aparecesse com uma silhueta menos assustadora.
Ninguém perguntou se eu estava bem, ninguém sequer cogitou a possibilidade de eu não estar. No fim do dia, quando cheguei em casa, foi sozinha que me debulhei em lágrimas. Chorei por mim mesma, chorei pela guerra também, pela minha situação, chorei nem sei por quê. Mas fiquei feliz que ao menos estava terminado.
No dia seguinte, todos os jornais estampavam a foto daquela agressão na primeira página. Sem que eu soubesse, ela se tornara um símbolo da nossa nova liberdade, da alegria que era poder ir e vir com segurança, de poder sair para trabalhar, dançar, namorar, de poder ser um americano feliz de novo. Mas só se fosse servisse ao ideal do que se tinha de ser americano. Eu não me encaixava nisso. Céus, nem se eu não preferisse mulheres poderia me encaixar nisso. Aquele beijo não fora consentido, e tenho para mim que mulher alguma se sentiria confortável de ver uma invasão daquelas de súbito virar algo tão importante para a nova fase do país. Mas, de novo, ninguém me perguntou nada, ninguém quis saber. Todos seguiram em frente. Estávamos seguros de novos. Estávamos felizes. Pouco importava se, em meio a esse “nós”, alguém ficara para trás.
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