boaswain uanine oliveira

Jimin não tinha grandes planos na vida, mas ele tinha um caminho a seguir: a fotografia. Era apaixonado por paisagens, pela vida e pela inspiração que ganhava quando saía da sua zona de conforto, talvez por isso tenha se apaixonado por Adam tão rápido, porque ele era tudo isso e ainda o nubífugo perfeito para as nuvens na cabeça do Park.


Hayran Kurgu Gruplar/Şarkıcılar Sadece 18 yaş üstü için.

#lgbt #bts #interracial #preconceito #drama #romance #bangtan-boys
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Entre poesias e fotografias nas ruas de NY

A melhor coisa de Nova York são as paisagens do inverno — parece que com neve por cima a cidade fica ainda mais linda, mais inspiradora, mais apaixonante, como um cenário que chamava para ser fotografado. Eu não sou bem o cara que sai fotografando paisagens, gosto mais daquele estilo minimalista de fotografia, da rotina apressada ou monótona das pessoas, eu gosto de ver vida e registrar através da câmera, mas Nova York é uma grande exceção ao meu estilo artístico: a cidade é uma musa.

Mesmo com as mãos coçando para tirar a câmera de seu suporte de couro, me seguro quieto na cadeira da lanchonete, aproveitando meu café quente no clima frio do continente, observando os exteriores do estabelecimento. De onde eu vim, as pessoas não sorriem tanto nas ruas, ou se abraçam, não tem tantos casais apaixonados para serem fotografados. Saí da Coréia do Sul a fim de poder conhecer lugares novos e produzir um conteúdo mais diversificado, mas até agora não fui encorajado a deixar NY. Gosto de como a cidade se encaixa na lente e qualquer zoom a deixa muito cheia de detalhes; é isto: é cheia de detalhes e cada vez que fotografo encontro um novo. Os prédios antigos, as pessoas rápidas e os artistas de rua, tudo é tão cativante, roubando suspiros de estrangeiros como eu.

Toda vez que penso que encontrei o lugar certo para mim, no entanto, minha mãe me liga, reclamando do prazo que ela me deu de dois meses nessa viagem louca até voltar para casa. Eu, na maioria das vezes, rio da Sra. Park, explico para ela que já sou grandinho e posso pagar minha estadia por ainda mais alguns meses. A velha, que só entende de astros e do cosmos, sendo uma astróloga respeitada no Oriente, e nadinha sabe sobre relações e pessoas, reclama da minha imprudência, que sou igual meu pai, que Deus o tenha, e da solidão que se encontra em nossa casa. Mamãe nunca gostou de companhia, diferente de mim que sempre fui carinhoso demais, apaixonado por tudo que via, me afeiçoando a cada um que encontrava, inclusive Jeongguk, meu primeiro namorado. O amor adolescente que me fez passar alguns meses em um internato para ver se “minha fase” passava. Com dezoito, voltei ao lar apenas para dizer, não pedir permissão, que faria Fotografia e que estava me assumindo gay de uma vez por todas.

Gay, fotógrafo e com alma de nova iorquino.

Termino o café, pegando minha bolsa e levantando-me em direção à saída do estabelecimento, colocando a touca sobre a cabeça para aplacar o frio intenso da cidade. As ruas são cheias de pessoas como eu: estrangeiros, turistas; o que me faz pensar quantos olhares estranhos essas mesmas pessoas ganhariam se pisasse em solo coreano. Sempre acabo rindo desses desencontros culturais, é realmente irônico os avanços e retrocessos de cada sociedade.

Me alojei em uma pousada simples que fica no Brooklyn, perto de centros artísticos/culturais que sempre me dão uma boa inspiração para fotografar. Nunca foi o melhor aluno da aula de inglês, mas é verdade que conviver a língua é melhor do que estudá-la, já consigo me comunicar melhor com os locais, mesmo com o sotaque forte.

Pegar táxi também se tornou menos complicado depois de um tempo, eu não costumo desbravar as ruas, apenas vou nas que já conheço e dou volta em quarteirões seguros, sempre tem algo de novo para ser registrado, mesmo. Antes de estender a mão para o carro amarelo típico do solo americano, confiro os bolsos para sentir a falta da minha carteira. Tateio o corpo inteiro, tendo certeza de que ela deveria estar comigo, mas logo lembro-me da lanchonete e deduzo que devo ter deixado a dita cuja no estabelecimento, xingando mentalmente antes de dar meia-volta e andar rápido o caminho de volta.

Meu fôlego quase não existe mais quando chego na lanchonete, indo até o balcão apressadamente.

— Eu esqueci minha carteira na mesa 8 — disse.

— Um rapaz negro saiu daqui com ela nas mãos — a ruiva dos cabelos cacheados respondeu, pouco interessada enquanto limpava os copos do balcão.

— E você deixou?

Ainda despreocupada, a mulher apontou para a placa acima de si, onde estava escrito “Não nos responsabilizamos pelos pertences de nossos clientes”. Bufo, indignado, mas agradecendo de guardar os documentos sempre dentro da bolsa e não da carteira. Um discurso que assisti ainda moleque, de Neil Gaiman, chamado “Faça Boa Arte” sempre me inspira em momentos como este. Me roubaram e não poderei ir de táxi para casa, mas posso ir andando e fotografar mais coisas.

Decidido a não me irritar por isso, afinal, não tinha tanto dinheiro assim lá dentro uma vez que havia acabado de gastar a maioria me alimentando no final da manhã, voltando para o mesmo caminho que fiz minutos atrás, caminhando mais vagarosamente e olhando meus pés bem acomodados nos coturnos. A brisa bagunça a franja loira na minha testa e minha respiração acaba por sair entre sopros congelantes, mas o frio pouco me incomoda devido meus agasalhos reforçados, luvas e cachecol.

— Ei — ouço atrás de mim, mas não paro minha caminhada. — Você com a touca!

Analiso as outras pessoas na calçadas e por constar que nenhuma delas olha para o dono da voz atrás, me viro, analisando bem o homem que segura uma carteira muito parecida com a minha em mãos. Além da carteira, noto seu tom de pele: é negro; um rosto de traços fortes, lábios carnudos e olhos claros. Paro na calçada, observando o estranho e seu traje todo empacotado acompanhando de uma mochila volumosa em suas costas. É visualmente atraente.

Parece arte.

— Estava procurando por você — ofegou ao se aproximar o suficiente, estendendo a carteira na minha direção. — Esqueceu a carteira na lanchonete.

Aposto que meus olhos brilharam ao presenciar a atitude singular, honesta e rara. Passei ainda mais tempo estudando o rosto do desconhecido, fascinado com a beleza a qual eu não era habituado. Sua cor se destacava naquele mundaréu branco que era Nova York no inverno, e seu sorriso, os dentes tão perfeitamente alinhados o davam um toque juvenil. Talvez eu até parecesse mais novo, mas nós dois éramos da mesma altura, sendo, de resto, completamente diferentes. Sobrancelhas grossas e uma mandíbula bem delineada que marcava perfeitamente o contorno de sua face. Ainda havia um charme extra, sinais abaixo de seu olhar que deixavam-no ainda mais adorável.

Aceitei de volta meu pertence, sorrindo para o homem na minha frente.

— Eu... — murmurei, limpando a garganta. Ele era muito bonito. — Obrigado, voltei na lanchonete mas a atendente me disse que... Esquece o que ela disse, muito obrigado.

Atrapalhei-me ao pôr o objeto no bolso novamente. Tinha tudo sido um engano e mesmo assim, eu ouvia Neil Gaiman na minha mente, repetindo e repetindo para eu fazer boa arte deste acontecimento.

— Disse que um “do gueto” tinha roubado seu dinheiro? — presumiu, sem deixar o sorriso morrer. — Talvez não com essas palavras, mas com o mesmo tom de preconceito? Não tem problema, também não gosto de ruivas.

Quase não acreditei e ri justamente de minha bobagem estampada na cara ao encarar o estranho. Resisti a vontade de apontar-lhe minha câmera e fotografar seu rosto inesquecível.

— Park Jimin — apresentei-me. — Ou Jimin Park, muda conforme o país onde é pronunciado.

— Adam Eastwood, prazer.

Apertei-lhe a mão firmemente, o sorriso teimando em petrificar-se nos meus lábios. Tão logo nos separamos, um silêncio gostoso e minimamente desconfortável pairou sobre nós — dois estranhos em uma calçada, me fazendo rir e olhar ao nosso redor, vendo Adam ficar tímido e olhar para o chão.

— Você é bonito — confessei, metendo a mão nos bolsos. — Desculpa se ser elogiado por homem, te faz ficar desconfortável.

— Não, eu... — ergueu os olhos, imitando meu gesto em seu casaco. — Sou gay.

— Eu também — ri, cobrindo o rosto com a mão ao me sentir envergonhado. Parecia obra do destino, por mais que eu nem acreditasse nessas coisas de coincidência. — E fotógrafo.

— Eu, poeta. — Adam passou a mão no pouco cabelo que tinha sobre a cabeça, crespo, meio enrolado, que combinava tão bem com ele. — Não é daqui?

— Coréia. Do sul, mas ultimamente não faz tanta diferença.

— Bronx.

O próximo passo seria convidá-lo para um café, mas ambos já tínhamos tomado a bebida quente naquela manhã fria. Talvez uma festa, mas eu não tinha ideia de onde os clubes ficavam; uma caminhada ao parque, uma visita à um museu. Passei a língua nos lábios — eu não queria ir a nenhum desses lugares —, pensando no que dizer em seguida ao moço bonito que me entregara a carteira.

Adam foi mais rápido, no entanto, ele se se aproximou um passo assustador de mim, pegando a nós dois de surpresa quando um pedestre quis caminhar atrás de si na calçada, obrigando-o a se afastar do meio-fio e se aproximar de mim.

— Tenho que ir pra lá — Apontou para o lado oposto que eu seguiria. — Foi um prazer conhecê-lo, Ji... Min?

— Isso — assenti, encantado. — A gente se vê.

O negro crispou os lábios, concordando comigo e abaixando o rosto em um sorriso aberto lindo de se presenciar antes de ir embora em passos contidos. Observei-o, suspirando, planejando tentar a sorte e talvez esquecer minha carteira amanhã também. Ele precisava ser registrado pela minha câmera.



— Quanto deu?

O taxista trocou um olhar rápido comigo pelo retrovisor enquanto eu buscava a carteira no bolso do casaco e o valor apresentado no taxímetro.

— Onze dólares.

Assenti, buscando as notas e encontrando, estranhamente, um papel solto ali dentro, tirei ambos, entregando o dinheiro ao motorista do táxi e aproveitando para conferir o conteúdo rabiscado naquela pedacinho de papel. Me surpreendi ao encontrar alguns número ali riscados e logo presumi serem um número de telefone, o associando à pessoa certa ao ler “Adam” escrito meio sem jeito no canto. Sorri, abobalhado, agradecendo o taxista e correndo para fora do táxi, ao mesmo tempo que tirava o celular do bolso.

Subi as escadas da pousada já com a chamada em andamento e o aparelho contra a orelha, me desfazendo de cachecol, touca e luvas. Eram três toques já quando enfiei a chave na fechadura, finalmente em casa, minha bagunça de material e fotografias, um cantinho bem americano que minha mãe surtaria ao ver.

— Que DDD estranho — O Eastwood riu ao atender.

— Sou eu, Jimin.

A linha ficou muda por um tempo. Mal conhecia o homem mas gostaria que estivesse acertando ao apostar que naquele momento ele estava abaixando a cabeça para exibir um sorriso tímido que precisava — gritava para — ser fotografado.

— Oi — suspirou, por fim.

— Eu estava pensando — comecei. — se poderia fotografar você.

— Me fotografar?

Mordi o nó do dedo indicador, a fim de fazer aquele sorriso estúpido largar do meu rosto, mas a beleza de Adam (tudo que o fazia ser tão lindo: desde sua cor até as pintinhas extremamente charmosas em seu rosto que eu tinha amado) e sua graça continuavam bombeando meus neurônios, me dando um hormônio a mais que me deixava muito mais contente, mais satisfeito.

— Você conhece o discurso “Faça Boa Arte” de Neil-

— Gaiman, sim. Então, queres tirar proveito artístico de uma coincidência banal entre rotinas?

— Quero — murmurei, achando fofas todas as palavras saindo da boca dele. — Seria muito ousado para um primeiro encontro?

Sabia que seria; outra vez, não fotografo pessoas, não sou o cara dos autorretratos, mas havia vida até demais transbordando de Adam, cores em si que não estavam disponíveis em nenhum efeito, nenhum realce. Eu o encontrei como um nubífugo: espalhando as nuvens para poder ver mais claramente a cor do céu, a cor do céu dele. E estava de noite, sempre e para sempre meu período favorito do dia, onde, como minha mãe ensinou-me, as estrelas mais brilhantes podem ser vistas.

Mas o poeta da história é ele, não eu.

— Não sou modelo.

— E nem quer arriscar?

— Jimin...

Divaguei. Na minha mente, mil ângulos poderiam se tornar perfeitos para fotografar aquele momento, mas eu não sou tão profissional assim, tinham simples coisas que não precisavam ser registradas, eram melhores vividas, presenciadas, a arte inventada às vezes só atrapalha. E eu tive aquele sentimento que se fotografasse Adam, de alguma forma, iria capturar toda a beleza dele para dentro da lente e deixaria apenas um oco para o Eastwood e sentia que o negro precisava ser preenchido, no sentido puro, de cores, coisas, lembranças e belezas diversificadas.

Gostar de um poeta te torna um?

— Alô?

— Ah, sim — despertei, sorrindo para o vidro embaçado da minha janela suja. — Te passo o endereço por mensagem, pode ser?

A risada gostosa foi ouvida pela linha telefônica, produzindo o antigo friozinho na barriga de amor adolescente que começa de repente e acaba rápido. Subi na cama com os pés frios, sorrindo de volta mesmo que o negro não pudesse ver.

— Pode, pode sim — suspirou. — Tchau.

— Tchau, Adam.

Não sei bem o quê — podia ter sido a gravidade, mas não afirmo com certeza já que de física não sei muito, podia ter sido a tontura da bela coincidência, proveniente daqueles olhos claros em contraste com a pele escura, podia ser até mesmo o leve aroma das praias de Busan, minha cidade natal, que proviam do perfume suave do Eastwood —, mas algo me fez cair na cama, aturdido e meio com aquele sentimento de não saber o que fazer.

Quando eu era mais novo, filho único, órfão de pai, pseudo-órfão de mãe, tive que aprender logo a sempre saber o que fazer. Se não fossem certas decisões tomadas com minha calma e, mesmo assim, firmeza, não estaria onde estou e nem teria o que tenho hoje. No entanto, o impacto de um encontro como esse abalaria até mesmo o mais forte dos gigantes — afinal, eu me perguntava, quem não derreteria com a beleza daquele americano, todo trabalhado na poesia urbana, camisa de botões, cabelo crespo e sotaque do Bronx?



Como um romance adolescente clichê, os dias sem Adam não precisam ao menos ser contados, mas saliento a verdade dos fatos ao dizer que a rotina de um fotógrafo não é tão interessante assim, entre um ângulo bom e um horrível são apenas centavos gastos com balinhas e salgados nada saudáveis. O final de semana, para compensar, foi de empurrão em móveis e espirros entre espanadas na poeira sobre os objetos, panos sujos de tanto esfregar as janelas, troca de cortinas e perfume em todos os cômodos.

Eu estava empolgado; cortei tecidos velhos para formar um fundo de fotografia roseado depois de uma lavagem com um short jeans rosa meu. Pendurei dois armadores na parede onde ficava a televisão, colocando o tecido por cima, arrumei um banquinho para meu modelo especial. A projeção da TV se sobrepunha ao tecido, dando assim um efeito muito bonito pelo que eu podia ver já da câmera posicionada naquele ângulo. Arrumei-me sem muito capricho, como se já fosse habitual vestir-me tão desleixadamente para encontros que me deixavam nervoso.

Um vinho suave sobre a mesa da cozinha, e uns salgadinhos porque eu não tinha coisa melhor para oferecer. Sem me dar brechas para acumular minha ansiedade, Adam chegou logo, tocando a campainha e me dando leves ataques cardíacos ao andar na direção da porta; direcionei meu último olhar da manhã ao meu material sobre o braço do sofá, um espelho comum, uma margarida e a blusa branca bem passada — porque o restante seria todo direcionado ao Eastwood.

— Oi, Jimin — sorriu o menino, se metendo nos meus pensamentos instantaneamente. — Eu tentei melhorar minha pronúncia do seu nome, melhorou?

— Fica melhor com o seu sotaque, de qualquer forma — Escondi meu galanteio com sintomas de timidez. — Entra.

Adam entrou. Timidamente deu passos para dentro de minha simples moradia, observando tudo em silêncio, aquele silêncio poético e confortável que esses moços de Letras têm o costume de ficar, mas, diferente de um silêncio estranho, o negro combinava com aquela quietude, o deixava mais pleno, com a mandíbula travada e os dedos esbarrando uns nos outros. Mapeei aqueles gestos, esperando alguns segundos para fechar a porta.

Ele estava ainda mais bonito vestido daquela forma — suéter azul, calça jeans e All Star, o tipo de rapaz que não precisa muito para ficar terrivelmente atraente.

— O cenário ficou legal — comentou.

— Valeu, achei que fosse combinar com você — murmurei, ajeitando a câmera pouco interessado no meu instrumento de trabalho e sim no homem que estudava minha sala de estar. — Tem vinho, se quiser...

— Não bebo pela manhã.

— Não? Bem, também tem água.

— Aceito.

Sorri, encantando com a doçura e educação do Eastwood, então me direcionei até a cozinha, servindo rapidamente um copo d’água.

— Pode vestir essa camiseta branca, por favor?

— Para as fotos? — perguntou; não podia o ver de onde estava, então imaginei que analisasse o tecido da tal.

— Sim.

Quando voltei, Adam já estava vestido como o pedido. Radiante, se me permitem, com a margarida atrás da orelha, combinando mais do que perfeitamente com os olhos claros e o sorriso aberto. Mais do que isso, a camiseta marcava muito bem seus músculos, coisa que me chamou atenção, não tanto a ponto de esquecer aquele detalhe novo para mim e que eu já amava: os pezinhos de Adam.

Realmente graciosos.

— Para de olhar para os meus pés — brincou, aceitando a água.

— Eles são adoráveis — argumentei, achando-me o dono da certeza. De fato, era verdade. — Está pronto?

O negro deu de ombros, se tornando ainda mais adorável do que seus pés fofos. Ele deixou o copo de lado — eu sabia que estava confortável sobre meu olhar um pouco profissional e um pouco nada profissional, porque eu também estava com o estranho na minha casa. Fazia uns cinco dias desde que tínhamos nos conhecido, e conversamos apenas umas duas vezes, mas parece que já nos encontramos diversas vezes em pensamento pela forma como Adam sorri para mim quando estou atrás da câmera, posicionando-a para capturar aquela beleza toda que eu enxergava nele.

Alguns dos amores sentidos criam medos nos corações de seus amantes; já li um conto parecido, que me apavorou um pouco, mas nunca fui fã de aventuras ouvidas, e sim das vividas. Nunca tive receio de entregar-me ou receber o coração de alguém de bom grado, mas não saía procurando e esperando o feito. Mesmo assim, eu tinha um temor pequeno, me sentia um covarde por admitir, ainda que em pensamento, a impossibilidade de um relacionamento com Adam. Sabia, pela minha experiência com paixões, olhares, sorrisos e poetas, que poderia me segurar no negro e seria bem recebido, mas, para dar um final nada feliz ao conto de fadas, e saliento: sem preconceito algum — de todas as características que eu mais amo nele, a principal é sua cor.

E é exatamente isso que nos separa.

Vejam: eu sou tão branco que quase não uso camisas brancas para não ficar simplesmente invisível ao sair na rua. Adam seria o contraste gritante ao meu lado, sempre com o sorriso vivo e os olhos românticos, e eu adoraria, adoraria porque temos a oportunidade de, diferente da Coréia, andar de mãos dadas, viver a vida de casal. Mas eu não sou norte-americano, e uma hora tenho que voltar para o lar.

Sei como as coisas funcionam: estrangeiro, preto e gay, Adam iria ser apedrejado no meu país. Aprecio aventuras, a coragem e as motivações humanas para se arriscarem com causas, sentimentos e pessoas, mas não tenho o prazer de colocar tudo em jogo, mesmo que pensando nas boas consequências, se no caminho eu posso ferir ele.

Matar esse sorriso.

— Posso recitar um poema?

— Claro — Acordei dos devaneios, voltando a fotografá-lo. — De quem é?

— John Keats, inglês, viveu pouco, amou demais e morreu jovem. Ele escreveu esse soneto pouco antes da morte, homenageando sua amante, Fanny Browne. Se chama “Astro Fulgente”

Poderia perceber que aquela era uma estratégia muito inteligente para me fazer ficar apaixonado por ele. Sem beijos, e sim com versos e aqueles olhos verdes na minha direção, aquela margarida nas mãos. Eu estava tentando não me apaixonar, mas minha missão estava falhando miseravelmente enquanto Adam recitava Keats.

Fosse eu imóvel como tu, astro fulgente!

Não suspenso da noite com uma luz deserta,

A contemplar, com a pálpebra imortal aberta,

– Monge da natureza, insone e paciente –

As águas móveis na missão sacerdotal

De abluir, rodeando a terra, o humano litoral,

Ou vendo a nova máscara – caída leve

Sobre as montanhas, sobre os pântanos – da neve,

Não! mas firme e imutável sempre, a descansar

No seio que amadura de meu belo amor,

Para sentir, e sempre, o seu tranquilo arfar,

Desperto, e sempre, numa inquietação-dulçor,

Para seu meigo respirar ouvir em sorte,

E sempre assim viver, ou desmaiar na morte.

Morte. Parecia ser esse o propósito humano, e como o tal do Keats tinha deixado registrado, dos astros fulgentes também. Alguns se sentem atraídos por ela, outros só esperam, há quem diga que não a teme. Nunca fui chegado na ideia de viver pensando no final, penso no máximo, no amanhã, e ultimamente penso muito em Adam, na maneira como poderia deixá-lo dormir aqui nos sábados e acordá-lo cedo nos domingos, que poderia superar minha alergia se ele quisesse criar um gatinho, ou um passarinho, um camundongo, poderíamos fazer dessa casa um zoológico.

Cocei a garganta, me aproximando com a câmera em mãos.

— Algum comentário? — questionei.

— Acha justo agonizar por uma paixão?

— Agonia nenhuma é justa — argumentei, aproximando-me ainda mais, queria registrar aquelas pintinhas o melhor que conseguisse. — Talvez por isso Keats tenha ido tão cedo, por se agonizar sobre algo. Nem tudo na vida é tragédia.

— Tuberculose e... Você é um otimista.

— Eu e Gaiman.

Adam sorriu, abaixando o olhar, gerando a foto perfeita. Todos os ângulos dele eram bonitos, cada gesto e olhar, cada zoom dado, a cada clique a beleza rara do americano parava direto na memória da câmera que faria questão de lembrar desta minha sessão tão incomum dali em diante. No entanto, o negro continuou com a cabeça baixa, impossibilitando-me de fazer novos cliques. Parei, observando-o.

Era a manhã de um domingo, na segunda faltaria apenas um mês para que eu voltasse para a Coréia, também era o dia em que, ele tinha me confessado, iria mostrar seus escritos a uma editora, estava esperançoso, mas não deixaria de fazer seus bicos como iluminista cênico, vivia a arte; eu vivia a vida. Talvez por isso éramos divergentes, uma característica tão mais forte entre nós que me intrigava e me fazia esquecer o tom de nossas peles (se o mundo fosse preto e branco, iríamos ser apenas mais um tom de cinza), Adam vê o mundo girando com letras, eu com momentos. Arquitetei meus dedos em sua mandíbula, trazendo o olhar perdido para mim.

— Pode permanecer assim?

— Pode me beijar?

De certo o fiz.

Não seria capaz de resistir àqueles olhos verdes — nem por receio do preconceito, nem por medo da mágoa, nem mesmo se tentasse. Os lábios carnudos logo se apossaram dos meus, dando-me aquela sensação nervosa de primeiro romance adolescente, logo minhas mãos estavam em cada canto do seu corpo; rosto, nuca, braços, cintura, tomando-o para mim como um realce de cor para mim vida. Nos atrapalhamos, Adam avançando, eu, bobo, preocupado com a câmera entre nós, e, antes de cairmos no sofá velho, consegui tirá-la de questão, desafiando-me a tirar também a camisa do Eastwood, e tirar sua timidez que a meu ver era simplesmente encantadora.

Acabamos nus, nos comunicando com nossos corpos no meio da minha sala. Se antes meus pensamentos temerosos nublavam minha mente quanto ao relacionamento com o negro, Adam foi nubífugo e agora eu enxergava claramente: estava apaixonado.



Não vamos apressar as coisas; algumas linhas de romance nunca mataram ninguém. Eu me apaixonei por Adam, e dou o mérito aqueles sinais adoráveis embaixo de seus olhos. Perdi completamente a noção do eu, meu, para dignificar-me com “ele, dele”, e assim os dias pareciam menos frios, quando ele sorria e chegava com uns dois ou três post-its para colar pela casa, versos que o impregnavam em mim. Adam não conseguia convencer as editoras de seu talento, o que era incompreensível para mim que amava o amor dele em escrever, mas saímos para comer em restaurantes coreanos depois das derrotas, ele tentava pronunciar “annyeonghaseyo” ou um “kamsamnida”, tudo soando como arte pelos lábios do garoto do Bronx.

Nós ficávamos bêbados antes das oito e só íamos dormir depois das onze, sempre embalados por beijos e promessas. Adam gostava de dizer que me amava pela manhã, depois que eu tinha escovado os dentes, já; eu apenas confessava pela noite, acariciando seu rosto enquanto o trazia para perto. O fotografava secretamente, com meus lençóis enrolando seu corpo bonito, a luz do abajur sobre sua pele, a feição calma, mas tinha a impressão que o negro sabia. Na maioria das vezes, a insônia o pegava e Adam gastava a madrugada com seu bloquinho, se desculpando ao me acordar; eu suspeitava que fosse seu modo romântico de se vingar pelas minhas fotos noturnas.

Sua vizinha, Nicole, passou a ser minha amiga pela minha presença constante no prédio onde o Eastwood morava,; eu estava adorando aquela rotina de casal que tínhamos, algo novo para mim. Calçava coturnos pretos e caminhava até o seu apartamento, comprando os pães que gostava pelo caminho, recebido por sorrisos, beijos e citações poéticas. Quando o americano estava ocupado demais, eu só ficava o analisando, brincando com seu cachorro, Levine II. O Levine I tinha ficado no Bronx, com sua família. Assim, meio devagar e meio rápido demais, descobrimos todas essas informações nada úteis, mas únicas, de cada um. Adam adorava encher meu saco me chamando de Jimin hyung, e eu vivia o irritando quando o chamava de Palhacinho, apelido que sua mãe, Sra. Rosa, tinha o dado quando era um garotinho.

Normalmente, Adam era sempre muito quieto na frente do computador, logo estranhei sua falância toda aquele dia. Começou com um assunto distante, sobre história dos escravos e osmose, depois ele leu a previsão do tempo, mesmo que estivesse chovendo. Haviam se passado semanas, não meses, mas eu conhecia o mais novo (aliás, eu com uma primavera a menos que eu) o suficiente para dizer que algo estava fora do lugar.

— Um sinônimo para parceiro, Jimin — pediu, levantando o olhar da tela para mim por dois segundos.

Estreitei os olhos, desconfiado e pensando na palavra equivalente. Fiz um bico. Até aquele momento a gente se beijava, fodia, jurávamos amor um ao outro e tínhamos até mesmo passado uma tarde planejando uma mudança para um apartamento maior, mas nada intitulado. Não tinha possibilidades de nomear uma relação entre fotógrafo e poeta.

— Namorado?

— Quer ser o meu?

Ri suavemente, apreciando o tom natural com que Adam pediu. Ele não tirou os olhos claros, cobertos por um óculos de leitura, do computador — estava nervoso. Pisquei meus olhos, imaginando se a sentença era verídica e ainda valia para eu respondê-la. Mesmo assim, mordi os lábios, assentindo para o negro que nem sequer me olhava. Dar-me um título não mudaria muita coisa de onde estávamos, mas tinha um significado importante em nossas mentes livres e selvagens. Eu queria ser chamado de namorado por ele.

Levantei-me, abraçando Adam por trás e beijando sua bochecha. Percebi que ele segurava a respiração assim que relaxou os ombros, segurando meus fios com carinho. Ele, que sempre estava rindo dos meus olhos puxados, minha voz fina, meus dedos pequenos, meu rosto arredondado, minha altura, a pessoa que conseguia me desarmar, me acalmar, me alegrar, apenas em um segundo, com um sorriso, meu namorado.

— Vou cozinhar algo para o almoço, tá, namorado? — eu disse, confirmando meu desejo.

Adam não escondeu suas emoções, agarrou-me e encheu meu rosto de beijos, rindo de nossa bobagem. Nós, dois jovens cheios de arte e amor, sempre acabávamos rindo de tudo. Naquela altura, qualquer coisa tinha graça, nossos cabelos após o banho, meu desastre na cozinha, a cama quebrando. Ele sorria e lá estava eu, feito um idiota, rindo também.

Um dia a diversão acabou.

Antes de Adam, eu era apaixonado pelo café americano, o aroma, sabor, modo de preparo, dizia convictamente a quem perguntasse que se tornara meu vício e o levaria para Coréia por mais esquisito que fosse comer bibimbap com café. Por isso mesmo havia me tornado um expert (pelo menos nisso!) no café da manhã tradicional americano, e Adam eram o maior apreciador da comidinha pela manhã; era regra: eu acordava mais cedo, preparava tudo e voltava para a cama, descansando um pouquinho mais do que devia com o corpo dele próximo do meu. Quando não dormíamos juntos, era ele quem corria para o meu apartamento, faminto pela comida e por mim, mas aquele dia não era um desses casos.

O ar estava frio, então tratei de me vestir pelo menos com uma camiseta e bermuda antes de fazer o café da manhã. Adorava a sensação de pertencer ali, o ambiente escuro pelas janelas e cortinas sempre fechadas, o que contradizia a personalidade brilhante do Eastwood; adorava poder sair só de cueca pelos cômodos, como se a casa fosse minha, e invadir a cozinha, buscando os ingredientes e materiais pelos armários e amava quando o negro aparecia sonolento, me abraçando por trás, mas esse não é um desses dias.

Quando voltei para o quarto, Adam estava bem acordado. Na verdade, parecia ter passado a noite em claro pela expressão em seu rosto, mas eu sabia que não, porque a minha câmera estava na cabeceira do meu lado da cama, sinal que eu tinha tentado registrar sua pacificidade noturna. Aproximei-me do mesmo, deitando-me em suas pernas e tomando de si o telefone que parecia ser o motivo daquela seriedade que não combinava nada com ele — mas, porra, mesmo assim ele permanecia lindo.

— Aconteceu alguma coisa?

— Amanhã faz um mês que a gente se conheceu — explicou, apontando para o calendário na tela do celular.

— E então você finalmente se arrependeu porque descobriu que ser fotógrafo não dá dinheiro e vai desistir de dar o golpe do baú em mim — brinquei, arrancando um mínimo riso do rosto de Adam que foi o suficiente para iluminar o meu, sentando-me ao seu lado. — É isso aí! Consegui! — comemorei, segurando seu queixo com o sorriso discreto preso ali.

— Lembra que você me contou que ainda tinha um mês antes de voltar para a Coréia? Agora só temos sete dias.

Uma característica especial de Adam é que ele marca qualquer coisa no calendário, dessa forma eu quase nunca posso argumentar. Dei uma olhada para a tela do celular dele, abrindo a data marcada onde estava escrito “Dia da viagem do Ji para a Coréia”. Eu não queria viajar, Nova York não era o meu lugar, mas eu tinha Adam e ele havia se tornado o meu mundo. Questionem, sim, essa paixão pode ser coisa de inverno, pode passar daqui uns meses, talvez a mãe dele seja uma vadia e eu não consiga mais o satisfazer sexualmente, mas estamos saindo por aí de mãos dadas, e dividindo toalhas, comendo no mesmo prato e até mesmo separando dias para que cada um cuide do Levine II, isso significa alguma coisa: que eu o amo.

Engoli em seco, quase lembrando da voz da minha mãe.

— Ainda não tinha pensado nisso? — ele perguntou.

Não.

— Eu não quero voltar pra Coréia — falei, sério. Talvez a seriedade também não combinasse comigo. — Eu quero ficar com você, amor.

— Eu sei, amor, eu sei — Adam disse, remexendo-se todo, mania que tinha quando ficava ansioso para dizer algo. — Eu também iria adorar se você ficasse aqui, mas você não pode. E aí, a gente faz como, Ji? Não tenho dinheiro o suficiente para ligações internacionais.

Massageei as têmporas, desviando do olhar de Adam, que pedia uma alternativa. Bem, naquele momento, eu não tinha pensando em nada. Já previa o celular tocando e a Sra. Park me alvejando com seus prazos, cobranças, suas expectativas. Naquela altura, eu estava cansado de seguir fazendo o que ela queria, mas não me restavam opções a não ser aceitar, até Adam aparecer e querer me prender em Nova York com aquele sorriso bonito.

— A peça acabou semana passada, você sabe — ele disse. — E eu também não fui aceito por nenhuma editora então não tem muito pra mim aqui, a não ser você.

— Como assim?

— Nós poderíamos viajar juntos, se você quiser.

Encarei Adam assustado e simplesmente atônito — meu namorado era realmente brilhante. Nova York me rendeu belas fotografias, eu já estava pronto para voltar para Coréia e mostrar ao meu professor meu trabalho para exposição, mas na maioria do tempo, ao invés de estar trabalhando, eu só passava meu tempo com o Eastwood, assim como ele, infelizmente sendo rejeitado nas editoras e tendo pouquíssimo trabalho como iluminista. Mesmo a cidade sendo o nosso berço, palco romântico e inspiração diária, eu estaria disposto a deixá-la se o negro me acompanhasse. Pelo visto, ele se arriscaria a isso também.

— É claro que eu quero, Adam — exclamei. — Você viria? Quem cuidaria do Levine II? Eu nem contei sobre você pra minha mãe, ela vai surtar.

— Jimin, calma — riu, sendo abraçado por mim. — Posso passar duas semanas lá e se eu não gostar, eu volto, e aí a gente transa por vídeo chamada.

— Credo — Mostrei minha melhor careta, o beijando logo em seguida. — Você vem mesmo comigo?

— Pra qualquer lugar do mundo todinho — O crespo acariciou meu rosto docemente, me aconchegando no seu toque. — Annyeonghaseyo, sogrinha!

De todas as preocupações, uma se destacava no fundo da minha mente, não que eu desvie do meu namorado contrapondo meus pensamentos receosos aos seus sorrisos brilhantes, enquanto eu tentava fingir para Adam que estava tudo bem: a Sra. Park, defensora da família tradicional coreana, que quase me bateu ao saber que eu gostava de garotos, também não aprecia essas relações inter-raciais. Por telefone, talvez, ela adore saber que o genro (se um dia ela se acostumar com minha sexualidade) gosta de poesia, dos clássicos do jazz, de esculturas e chá gelado, talvez ela ame o senso de humor de Adam assim como o seu jeito informal de ser formal, mas ela não vai conseguir não estranhar o contraste bonito, singelo, puro e artístico de nossos tons.

Para não suavizar em nada a situação: ela não gosta de gente negra.



Ele parecia tão lindo com os fones de ouvido, a touca cobrindo seu cabelo crespo e o dicionário Coreano/Inglês aberto. Adam realmente queria impressionar, e eu estava listando a quem e o porquê do homem estar fazendo isso. Número um, a minha mãe, porque ele tinha esse sentimento de poeta de querer cativar os outros através de suas palavras e concordava que annyeonghaseyo não era tão cativante assim. Número dois, a mim, ainda não tinha certeza mas achava que ele me devia essa por nossa comunicação ser ótima já que eu havia aprendido o inglês, mas na minha terra, minha língua, e de coreano, Adam era péssimo. Número três, a ele mesmo, porque se desafiava a coisas novas todos os dias e se eu o desse minha câmera, temia que ele ficasse até mesmo melhor do que eu em fotografia.

Telefonei para minha mãe dois dias antes da viagem, porque já tínhamos comprado nossas passagens e decidido nossos prazos. Para falar a verdade, eu não me separaria de Adam, deixaria a Coréia, o que é fácil, e viveria no topo de uma serra no Brasil, ou nos castelos da Escócia, talvez construir um iglu no Polo Norte, mas de forma alguma iríamos deixar de sentir o que sentíamos. De qualquer forma, ela, inicialmente, não gostou da minha paixão e tentou me barrar com seus argumentos tradicionalistas, mas logo que aceitou quis saber mais sobre Adam. Eu a contei tudo o que me fez ficar apaixonado — sua honestidade, suas pintinhas, sua arte e seu sorriso. Tudo, exceto sua cor.

Tinha acabado de acordar de um cochilo no avião, deparando-me com minha visão preferida: Adam Eastwood. Não resisti, me inclinando para roubá-lo um beijo inocente.

— Jeoneun hangugeoreul hal jul moreumnida (Eu não falo coreano) — ele sorriu, travando um pouco na pronúncia.

— Aniyo? (Não?) — perguntei, o provocando.

— Aniyo — Adam repetiu, mesmo sem ter certeza do que significa, me encantando mais um pouquinho ao checar no dicionário. — Nalssiga johda (O clima está bom).

Ri.

— Vai falar sobre o clima com ela?

Era até uma boa opção comigo prevendo que o clima entre nós não estaria muito bom quando a Sra. Park visse seu genro pela primeira vez. Meu corpo tremeu, mas logo suavizei ao receber um cafuné de Adam. Preferia que fosse assim; que ele estivesse perto para me acalmar antes das minhas preocupações me consumirem.

— Eu não vou conseguir falar sobre nada com ela — o negro sorriu, colocando um fone no meu ouvido. Tocava Die Trying do Michl. É, meu namorado tem bom gosto musical. — Você tá pensativo demais esses dias.

— Tô? — Adam assentiu, confirmando minha distância aparente. Procrastinei o momento em que falaria disso para ele o máximo que pude porque não queria magoá-lo, mas a hora havia chegado e não cabia a mim fugir agora. Passei a língua nos lábios, passando a brincar com os anéis envolta dos meus dedos. — É, eu tô. Só... pensando na minha mãe, estive tentando pensar em palavras para amaciar a situação toda e não te deixar desconfortável, mas você é quem mexe com as palavras aqui e eu só consegui adiar e adiar para dizer que talvez minha mãe não seja tão gentil com você de primeira.

— Porque ela é racista — ele presumiu.

Exatamente isso, confirmei, calando-me e desviando o meu olhar do dele ao deitar a cabeça em seu ombro. Com isso, a única coisa que ouvíamos era a música no fone, e eu meus pensamentos tomando forma enquanto imaginava o que o Eastwood pensava agora. Havia o mandado para um país centralizado com preconceito em cada esquina que ele virasse e ao menos tinha o avisado, começava a me sentir mal por isso. Adam fechou o dicionário, agarrando minha mão em seguida.

— Poderia perguntar o motivo de estarmos fazendo isso, então, mas tenho a sensação de que já entendi. Não tenho a obrigação de transformar a mente da Sra. Park, só posso mostrar-me da forma que eu sou porque não há outro eu. Ji, você não tem que se preocupar com isso. Quando estivermos lá, eu não vou chamá-la de noona, ou beber o chá corretamente como quando se está na frente dos mais velhos, eu não sou coreano, ela vai ter várias coisas para não gostar em mim, mas não vou odiá-la por isso. Já encontrei vários racistas na minha vida toda e se tornou fácil lidar com isso. A culpa não é sua e isso não tem que recair nos seus ombros, só vou ter que falar para ela uma coisinha: naneun ne adeul-eul salanghae. (Eu amo o seu filho)

Cobri meu sorriso, envergonhado e deixei um beijo casto no ombro de Adam, entrelaçando ainda mais nossas mãos. Momentos assim, sussurrando entre assentos de um avião, aventurando o nosso amor a experiências agitadas como esta que estamos prestes a vivenciar, eu apenas confirmava mais uma vez para meu espírito o quanto o amava. Seria capaz de amá-lo de todas as formas, em todas as realidades possíveis. Quando eu olhava para Adam, não via seu tom de pele, ou sua beleza, eu via a pessoa que eu queria para sempre fotografar, porque era aquela personalidade que me cativava e inspirava diariamente.

— Também amo você.

O único capaz de espalhar as nuvens que impedem minha total liberdade. O nubífugo.



Quando mais novo, morávamos afastados da cidade, a profissão da minha mãe pedia isso dela: um céu mais limpo, um clima mais ameno, uma visão melhor dos astros. Nunca me importei, comecei com aquela câmera velha que meu pai havia me dado de presentei e saia fotografando os animais, os lagartos, os pássaros, as borboletas. Provavelmente eu e ela nos cansamos de ficarmos isolados ao mesmo tempo, eu queria ver vida, pessoas, o tempo passar e queria poder ser a pessoa com o rosto atrás da lente registrando isso tudo. Ela só queria terminar logo sua pesquisa ao se juntar com mais alguns de sua área.

Nunca morei muito na nossa segunda casa, fui para o internato e então tudo foi acontecendo em uma velocidade que eu quase não consegui acompanhar, me afastando do lugar, mas respirar encarando a fachada do domicílio me fazia pensar que, na verdade, aquele nunca foi meu lar. Assim como Adam, aquela seria minha primeira vez ali. Eu reconhecia as paredes de tijolos, as plantas no jardim frontal, as janelas brancas, mas nada associado àquela sensação de pertencer a algum lugar me preenchia.

Adam apertou minha mão, descansando a cabeça no meu ombro. Estávamos cansados da viagem e por mais que nenhum dos dois admitisse, a melhor opção seria fingir que minha mãe não existe e só dormir até o dia seguinte começar. A luz do quarto de cima se acende, logo depois a da sala de estar, posso dizer que meu coração para uns segundos ao ver a maçaneta virando-se, mas me acalmo ao olhar a face terna do negro ao meu lado.

A expressão da minha mãe vai de dócil e simpática para antipática e rabugenta em questão de segundos, impressionando não só a mim, mas também Adam que treme ao meu lado. Deixo sua mão, dando-o um olhar singelo que falava por mim ao me direcionar a baixinha na soleira da porta. Me dói deixar ele ali, com as malas ao seu redor, em um país que não o acolhe tão bem quantos meus braços. Todavia, capturo a atenção da minha mãe que simplesmente dá as costas, voltando ao interior da casa. Eu a sigo.

— Omma — chamo. — Omma, não reaja assim, por favor.

— Não espera que ele fique aqui, não é? Você quer que todos me vejam como a mãe sem controle que deixa seu filho gostar de homens e trazer esses de cor para casa? Park Jimin, como espera que eu aceite?

— Você pode gostar dele, omma, não é nenhum desafio. Adam-ssi é uma pessoa como nós dois, ele está tão empolgado em te conhecer, e eu contei para ele sobre seu preconceito. Ele gosta de você apesar de não te conhecer e saber apenas das partes ruins, por favor, faça isso por mim, o receba, eu amo ele.

A mais velha abaixou o rosto, se apoiando no corrimão da escada. Observei seu silencia com tensão em meus punhos fechados; por um lado, eu esperava um ‘não’, a primeira oportunidade de segurar as malas outra vez e partir com ele para qualquer lugar onde pudéssemos só fazer compras de Natal e comemorar aniversários de namoros em público; por outra lado, no entanto, minhas mãos tremiam por um “sim” por vê-los sorrindo na mesa de jantar ou tentando se comunicar para descobrirem que gostam das mesma coisas.

— Descansem — ela disse. — Se estiverem famintos, o jantar está feito, eu vou pro meu quarto. Jimin, se eu realmente te criei como meu filho, não deixe esse homem em nossa casa, não desonre sua família.

Puxei meu namorado e nossas malas para dentro o mais rápido possível, sem me preocupar com avisar ao negro que ele tinha que retirar os chinelos nem nada do tipo, assim que a mais velha subiu as escadas, trancando-se no seu cômodo. Imaginava que ele queria ficar afastada mesmo, pelo menos até assimilar a verdade. Ao meu ver, no entanto, o problema da sociedade é esse: não encarar a verdade, trancafiar-se em uma realidade absoluta não sujeita a mudanças. Por ser um fotógrafo essa é exatamente a visão contrária da que tenho; nada permanece igual, o tempo modifica as paisagens e também as pessoas, mil vezes mais sensíveis.

Tentei despreocupar Adam, minha mãe tinha uma segunda chance e nós tínhamos o jantar. Fingir que estava tudo bem realmente não combinava comigo, mas eu não conseguia pensar em outra coisa que não fosse minha extrema felicidade por tê-lo comigo quando ele sorria experimento comida tradicional. Naquele dia, dormimos tarde da noite, o Eastwood não queria largar seu caderno e eu não queria adormecer sem ele ao meu lado.

— Acha que ela vai falar comigo amanhã?

— Acho que sim — fui sincero. Curvei-me sobre seu corpo sentado, tirando o caderno de si e deixando um beijo em seu rosto. — Chega de poesias por hoje.

— Tô cheio de inspiração — argumentou.

— Amanhã eu vou falar com o meu professor e vamos fazer a minha exposição o mais rápido possível, pode me ajudar? — Adam assentiu, desistindo dos versos e se entregando ao sono. — Quer saber o que eu acho? Acho que não há pessoa no mundo mais bonita que você, e minha mãe precisa consultar um médico se não consegue enxergar isso.

Na manhã seguinte, a Sra. Park saiu do quarto e foi direto para o trabalho. Me senti mal por Adam, ele não conseguia disfarçar a decepção que sentia por não se achar o suficiente, mas não o culpava, muitas vezes eu estive no seu lugar, tentando o meu melhor. Todavia, não podia fazer mais do que já tinha feito: o convidado para conhecer meu professor de faculdade, Han Jinyoung.

Se me desse o privilégio, talvez passasse o dia inteiro deitado e choramingando pelo amor proibido, mas a vida não é assim, e este é o ponto bonito dela. Ser julgado por minha mãe podia ser devastador para Adam, mas ao andarmos juntos nas ruas de Busan, ele parecia não se importar em ser a pessoa diferente. Encontramos o Sr. Han no Busan Citizens Park, ele estava apreciando suas amadas rosquinhas com um óculos de sol fora de moda e adorou Adam assim que o conheceu. Acho que aquilo renovou a confiança do negro, já que o sorriso não deixou mais seu rosto pelo resto do dia, enquanto selecionávamos as fotos para a exposição.

Normalmente este processo demora algum tempo, mas eu estava com pressa. Pressa para me mostrar ao público, para provar meu trabalho a minha mãe, para sair dali com Adam. Sabia muito bem a mãe que tinha; ela passou vinte e cinco anos convivendo com um homossexual e ainda não conseguia aceitar a homossexualidade, ela não iria aceitar Adam. A exposição se chamaria “Nubífugo” e, para ser o mais independente possível, o próprio Eastwood faria a decoração do museu, nos livrando de uma despesa. Passamos o dia viajando entre as lojas de Busan — de mãos dadas, aos beijos.

Quando voltamos já era noite, mamãe estava sentava no sofá, olhando fixamente para a televisão ligada. Adam trocou um olhar comigo e eu apenas assenti.

— Annyeonghaseyo — ele disse, tímido.

A mais velha o reprimiu com um olhar torto que mais dizia do que qualquer sentença, mas, não obstante, decidiu falar. Naquele momento, agradeci pelo negro não entender outra palavra além desta por ele dita.

Diga a ele não se dirigir a mim outra vez, eu nunca tive que aturar esse tipo de gente falando comigo e não vai ser agora que me rebaixarei a este nível. Dentre tantas opções, Park Jimin, você me trouxe logo um desse! Não há coisa pior para uma mãe.

— Adam-ssi é meu namorado e você deve respeitá-lo. Como uma profissional tão renomada consegue ser tão ignorante e preconceituosa? Você deveria se envergonhar.

— Me trate com respeito, seu inútil!

— Ji — Adam chamou-me a atenção quando já estava prestes a respondê-la com mais discussão, segurando-me pelo pulso e me encarando na sua calma. Sem dizer mais nada, os dois subimos para o meu antigo quarto. Ele meteu-se nas sacolas, eu apenas me sentei na cama. — A gente vai embora agora?

— Não.

— Eu quero ir embora, amor — disse, sério, olhando-me sem nem tremer em hesitação. — Não entendi uma palavra do que ela disse, mas sei que não foram coisas boas e eu entendo que ela seja sua mãe, mas eu também tenho minha casa e eu não vim para ser desrespeitado e discriminado e machuca tanto, porque eu só queria te deixar feliz.

Sorri, incrédulo. Neste momento, pensamentos demoram a aparecer mais constantemente, dando lugar a atos que demonstram muito mais dos nossos sentimentos.

— Você me faz feliz, Addy, muito, muito, tanto, tanto, eu só conseguir pensar em palavrões quando estou perto de você, do tipo “porra, eu sou muito sortudo” e “caralho, ele é muito lindo”, “puta que pariu, eu o amo tanto”. Não precisa provar nada pra mim, nunca. Eu conheço minha mãe, ela não vai melhorar com o tempo.

— Então eu volto.

— E me leva junto — sorri, selando nossos lábios rapidamente. — Vamos fazer nossas malas, então, a gente dorme no museu, diz que somos os decoradores e estamos fazendo hora extra, ficamos amigos do segurança e ele dá comida pra nós dois, quando não tiver ninguém olhando a gente foge pro banheiro e dá uns amassos.

Um sorriso brotou nos lábios do negro na minha frente e ele segurou meu rosto para beijar-me suavemente. Foi aí que entendi: minha casa não estava em Nova York ou em Busan, a minha casa era Adam e, com ele, eu sempre teria um teto e um cobertos para me aquecer.



Terminamos a exposição na quarta, seis dias depois de chegarmos. Bati na porta do quarto dela e a avisei, mas mamãe não compareceu, no final, talvez ela não tivesse gostado — eu enchi as paredes com as fotografias de Adam, não só dele mas de Nova York inteira, de todos os ângulos bonitos, inesquecíveis e marcantes que eu tinha achado desde que botara os pés para fora da Coréia. Mesmo tímido, o Eastwood concordara em me emprestar alguns versos seus para compor a paisagem artística da exposição, o que, sem sombra de dúvidas, havia a deixado muito mais bonita.

Todos os amigos do Sr. Han apareceram, alguns compraram algumas das fotografias, outros só elogiaram, mas meu peito se regozijava mais ainda ao ver as pessoas parando para observar o sorriso de Adam e espantando-se ao verem ele ao vivo e em cores ao meu lado. Em parte, servia para mostrar que nem todos eram a minha mãe. Inclusive uma senhora que estava acompanhada de um moleque pequenino comprou duas das fotos onde Adam era a estrela e não foi embora sem antes me agradecer e dizer que eu tenho talento.

O homem concordava com o que diziam sobre mim, mas qualquer elogio direcionado a si o fazia ficar sem jeito — reforçando meu amor por ele.

No final, o dinheiro arrecadado não dava para viver bem, mas podíamos viajar um pouco com ele e esse era o objetivo; de mãos dadas, desvendar as fronteiras do mundo porque as nossas nós já conhecíamos. Voltamos pelas calçadas com sorrisos nos rostos e garrafas de soju nas mãos, por mais que Adam odiasse a cerveja coreana, ele a bebia dizendo se sentir um mocinho ao fazer aquilo. Eu o via banhado de um luar quase divino. A luz da lua sobre a minha pele dava um contraste intenso que me fazia parecer cinza até, o que era ridículo se no sol a visão não melhorava muito, mas sobre Adam, ah, sim, o majestoso satélite natural apenas acentuava o brilho vivo em sua tez, adornando-o como se fosse um desses príncipes de conto de fadas.

Praguejei por não estar levando minha câmera comigo.

— Eu escrevi um poema pra ela — assumiu, chutando uma pedra para fora da calçada. Percebi logo. — Não é sobre ela, é mais como uma coisa que gostaria de ter dito.

— Vamos embora no fim de semana — alertei, apoiando-me no poste e observando o negro brincar com as gramas no meio-fio. Ri da piada que ele contara uns minutos antes. — Me diga: pra onde?

Adam sorriu, eu não sabia se era a brisa o fazendo cócegas, a grama o entretendo ou se ele tinha lembrado da própria piada também, mas imaginei, para minhas satisfação, que fosse pelo meu convite indireto.

— Agora? Pra sua cama.

Fizemos as malas depois de fazer amor, foi colocando minhas camisas junto com as camisas de Adam que deixei cair seu caderno de anotações. Ele tomava um banho, cantarolando uma melodia de alguma música de Kpop que ele talvez tenha gostado do karaokê que o levei, então não achei que faria mal ler alguns de seus versos. Sentei-me sobre a cama, devorando palavra por palavra do talento poético que o Eastwood tanto tinha — se ainda estava sóbrio, lembrava que o mesmo havia mencionado um poema feito para minha mãe, pois se a embriaguez não me enganavam, aquelas singles palavras, que podiam ser interpretadas de tantas formas diferentes (ainda mais para um bêbado — de amor), retratavam exatamente o recado que Adam queria dar a ela.

Quis ter forças para passar os versos para uma folha com a minha letra, mas adormeci, sentindo apenas o caderno sendo tirado das minhas mãos e sabendo que na manhã seguinte, com certeza, não só eu leria aquilo.



Eu era só uma criança quando fui para o interior da cidade estudar em um internato, mas eu já sabia de algumas coisas, que, certamente, não eram as certas. Eu chorei porque gostava de Jeongguk e chorei porque ia ficar sem videogame. Hoje a memória parece distante, mas nem tanto tempo passou desde que eu comecei a crescer. O internato me ajudou muito, confesso, e talvez a disciplina que aprendi a ter na instituição tenha me tornado a pessoa que sou hoje. Todavia, uma grande parte da minha personalidade ainda é adquirida pela minha mãe, digo, de criação, um pouco da genética também, mas a maioria vem do meu escudo contra sua frieza.

Aprendi a cativar as pessoas para que elas não precisassem querer se afastar de mim, como mamãe fez, mas não conseguia me bloquear de ter afeto pelas pessoas. Me apaixonei por Adam assim: eu não tinha nenhuma espécie de radar que me avisasse quando ou quem seria perigoso, eu também não sentia aversão por sentimentos, mas o fato é que o Eastwood foi uma surpresa e tanto.

Por isto e o que veio depois, sou grato. Quando acordei, omma estava na cozinha, sentada nos bancos altos da mesa de jantar, com o olhar perdido pela janela. Eu sorri, era assim que lembrava dela quando menino — com o olhar perdido, pensativa.

— Como foi a exposição?

— Os amigos do Sr. Han gostaram — dei de ombros. — Você não apareceu.

— Vi na internet — A mais velha levantou o tablet com a fotografia de Adam sorrindo com a margarida presa atrás da orelha. — Por quê?

Por que eu gostava de homens? Não é uma coisa sexual; pra mim, é natural, como o sabor preferido de sorvete. Por que eu fugi de casa? Não foi bem uma fuga, acho que segui o caminho que era certo pra mim e chamo isso de destino, não covardia. Por que um cara negro? Porque é Adam, e eu o amo, simples assim.

— Mãe, não é o seu primeiro “por quê”, não é verdade? Eu sempre te imaginei quando criança — falei, tomando um assento a sua frente. — os cabelos soltos, querendo andar de bicicleta de noite e o vovô correndo atrás de você para te impedir de alcançar o quintal. Aí você voltou emburrada pro quarto, olhou pro céu pela janela, viu uma estrela cadente e perguntou: por que as estrelas não caem todas em cima de nós e só algumas? Eu sei, eu sei, você já contou essa história antes, mas levou um tempo, não foi? Quer dizer, pra você descobrir o porquê, foram anos, na verdade, e muito estudo. O que eu quero dizer é que, se tiver paciência e se dedicar, vai entender os meus porquês também, mãe. Não sou tão complicado quanto as estrelas, nem Adam é, na verdade, somos comuns demais.

Sra. Park suspirou e eu a acompanhei, sendo arteiro o suficiente para capturar sua mãozinha pequena entre a minha em um momento frágil e delicado da mesma. Ainda era dia, mas ela olhou para o céu, como se pudesse enxergar as estrelas ali, mesmo no claro. Houve um tempo em que a mais velha podia ter retirado sua palma dali, recuando, como sempre, meu carinho, mas agora, talvez por precisar de algo físico para relembrar que éramos família, ela apertou minha mão.

— Sabe, mãe, só dá pra ver as estrelas no céu escuro A lua só aparece à noite. Talvez a senhora nem entendam, mas eu gosto de colocar a luz contra a paisagem para produzir um contraste do claro com o escuro. E fica lindo, você só precisa perder o medo do escuro.

— Jimin?

Adam apareceu na porta, com a manbag já no corpo assim como sua roupa linda e totalmente americana, ele mostrou seu espanto e desconforto ao me encontrar com minha mãe na sua expressão, mas eu sorri, porque o aperto da mais velha se intensificou em minha mão. No entanto, tive que deixá-la para me postar ao lado do negro, tirando gentilmente, a bolsa de si para encontrar o caderno de anotações dele ali dentro.

— O que você está fazendo? — sussurrou.

Consegui o papel que tanto queria solto dentro do caderno, já com uma arrumação diferente da que estava ontem. Adam ainda se curvou para tentar alcançar a poesia, mas eu dei um passo à frente, me esquivando do mais novo. Minha mãe revirou-se na cadeira, prestando mais atenção em mim. Então eu recitei:

seulpeum-eulo jieun geos-eun eobsda

salm jache

hollo

haengboghago maelyeogjeog-ida.

naneun godoghan dongbanjayeossda

jaegeonchug

oneul yeoljeong

naneun but-eoissdalopeue

usgoissneun

naneun gam-og-eul bwa

geugeos-eul joh-ahanda

insaeng, nae insaeng

baeugi wihae sal pil-yogaissda

eotteon salamdeul-eun salgoissda

daleun salamdeul, insaeng



No voo de volta, aconteceu o contrário: Adam deitou a cabeça no meu ombro, ainda sonolento, tentando acompanhar o filme que eu assistia no celular, deixando minha mão ocupada ao entrelaçar seus dedos nos meus. Saímos da Coréia sem sorrisos ou despedidas, apenas com muita, muita saudade do Levine II — e um dinheirinho extra. E expectativa, porque agora o otimista não era eu, Adam testemunhou o sorriso orgulhoso e discreto da minha mãe ao ouvir sua poesia, ele tinha esperança de uma ligação, ao menos, nem que depois de meses, aceitando nosso relacionamento.

E eu também.

— Adorei quando você traduziu meu poema — ele bocejou, esticando os braços e me imobilizando em seu abraço. — Você é tão fofo, Ji. Essa viagem pode não ter sido mil maravilhas, mas você fez a experiência ser... Mais leve.

— Como você escreveu “nada é feito com tristeza”.

Selei os lábios de Adam; assim seríamos para sempre: unidos, belos, artísticos e alegres. Corajosos ao ponto de dispersar qualquer nuvem que quisesse se meter entre nós, nubífugos.

nada é feito com tristeza

a vida por si

alegra e encanta

eu fui parceiro da solidão

da reconstrução

hoje, a paixão

nos arames, prende-me

e sorrio

olho pro meu cárcere

amo

a vida, minha vida

e só vivendo se aprende

tem gente viva e tem gente

vida

28 Haziran 2018 14:49 1 Rapor Yerleştirmek Hikayeyi takip edin
6
Son

Yazarla tanışın

uanine oliveira i was a little bit lost, but i'm not anymore

Yorum yap

İleti!
Letíxia  Letíxia
Tão lindo, não tenho nem palavras, ao terminar de ler eu pude entender que o verdadeiro poeta da história é você <3
June 30, 2018, 00:45
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