Esperança
Se liberdade depois, terei por viver,
E no mundo de morte gemendo ficar,
Esperarei a vida de gemidos morrer
Pelo riso de vida que o futuro dará.
Falsas amizades
Não me tenhas por frio e mau.
A vida faz-nos ambos iguais.
Se hoje de teu amor não há sinal,
Do meu amanhã tereis jamais.
A justiça é balança imparcial.
Tanto quanto aí, cá também.
Se de ti tenho amizade parcial,
Parte da minha terás além.
Ter-te como amigo pode parecer,
Se aparência é o que tu franqueia.
Minha mão que tu julgas ter,
Do que hoje dás-me terás cheia.
Essências
Luzidia é a obra da mera larva
Ofuscada pela laboriosa teia.
É inverso à nossa alma parva,
Que fora é seda sobre a larva feia.
Os bichos acrescem ao construir,
Curvados sobre o que produzem.
Só homens produzem ao destruir
Exaltando obras que não luzem.
As autênticas luzes são excluídas.
Pois são Deus, flores e estrelas
Ignorados por mentes reduzidas.
Por isso não podem abrangê-las.
Erguem olhos aos azuis imperiais,
Sem baixá-los às verdes raízes.
Discursam em cima de pedestais
Qual máscara sobre as diretrizes.
Como acima de tantos feitos abjetos
Podem florir os artísticos labores?
É que como flor em cima de dejetos
Brota a beleza, subjugando odores.
Imodéstia
Superar os próprios limites
Muitos tem como motriz.
Só não superam um deles:
Ver um palmo além do nariz.
Elegia
Meu ideal exala um canto triste e terno.
Orbitando a primavera desse sonho,
Desabrocha como flor sobre o inverno
Meu luto do mundo, cujo fim exponho.
Porém não sai de mim, mas donde ponho.
Friamente, o vasto som no qual hiberno
Chora pelo riso alheio, que suponho
Maquiar por fora o pouco brio interno.
Tão profundo som abala o orbe inteiro.
Agourando o fim do mundo em melodia.
Vai ter o que não chorou, quem riu primeiro
Vai rir, quem do luto extrai sabedoria.
Ouvirão o próprio funeral no derradeiro
Toque profético da última elegia.
Nuances
Quisera percepções várias
Tão complexas quanto as cores.
Mas vejo noções ordinárias
Superficiais e sem valores.
É sempre alegria ou tristeza;
Certo e errado; oito e oitenta,
É um olho pra cada certeza
A certeza pobre e enfarenta.
Há tantos tons entre mal e bem;
Há mil cores entre dois tons.
É de Deus ver assim também
Mas do homem banalizar os dons.
Baixa-estima
A solidão é um quarto espelhado. Mas não é o quarto em si que alguns temem e evitam.
Paixão
O amor é exercido com a mente;
Paixonite sente-se com o coração.
A eternidade de um lapso é paixão;
Amor são tais lapsos eternamente.
A arte serve para chorar as lágrimas que não cabem no coração, e para rir os sorrisos que não cabem no corpo.
Vesper
Será que é nessas horas desoladas que nosso eu imaterial parece que poderia, e deveria, desgarrar-se dessa matéria claustrofóbica do nosso corpo, matéria que resume a miséria do mundo? São nessas horas silenciosas que a mente quer ir-se embora junta com o sol; com esse astro que, ao partir, explode em cores violáceas cravadas de ouro, deixando a terra muda e ensombrada, num silêncio de criança desamparada pelo pai; nesse alívio de emoções e cismas que saem e esvaziam o coração para se transformarem em pranto, tornando-se cristalizados e dispersos no espaço. Assim quisera eu, evaporar na noite meus pesados sentimentos, para que os mesmos surgissem renovados e livres sobre meu corpo flébil e adormecido.
Pueril
Explode, refulge em mil erupções
Meu dourado coração de criança,
Quando a multicolorida esperança
Tinge a Arte de eternas emoções.
Grandes asas
Ó Sonho Azul, inspiração amada!
Cujo dom de muitas asas me deste.
Perdoa se o vôo dessa arte alada,
Não ergue-se tanto quanto quiseste!
Despeito
Críticas não sobem sequer ao meu joelho.
Se quer tirar o cisco do olho, faça assim:
Ao invés de vir e falar olhando pra mim,
Tape a boca e abra o olho ao espelho.
Hipocrisia
Por que amigo, te enamoras da verdade,
E queres dela um beijo apaixonado?
Quando o gosto amargo da falsidade
Em teu lábio ainda está impregnado?!
Olhar
Já vi o chão tapetado de flores,
E sonhei um micro-céu de estrelas;
Vi aves com muito mais cores,
São tão poucos a reconhecê-las!
Vejo a próspera humanidade
Produzindo suas mil invenções,
Mas nelas não há luz de verdade
Como aquelas sensações.
Sinto sensações nas flores,
Sinto sensações nas aves,
Sinto carícias suaves
Em sua música de amores.
Mas não sinto do homem o coração.
Míope aos detalhes, indiferente;
Não sinto o brilho de sua mente,
Nem colorido na compreensão.
Já vi árvores jovens e antigas,
Hostis, imponentes ou singelas;
Umas eram tristes, outras amigas,
Mas nada pulsa mais que elas.
Já espiei o solo e suas miudezas;
O simples fungo que renova a vida;
Os seres da sinfonia desassistida…
Um rico mundo de infinitas belezas!
Já vi o exemplo dado por Deus,
Que no homem há muito murchou,
Ser ostentado em crentes e ateus,
Cuja voz ao sair da boca calou.
Ouvi a Santa Lei ser proferida
De peitos jovens e dos idosos,
Do palco, do covil e da ermida.
Ecoavam discretos ou vigorosos…
De bocas fartas e de mendigos;
De lábios medíocres e de vultosos.
Vi causas grandes em frágeis mãos,
E muitas palmas a propósitos vãos.
Mas as flores ofuscam-lhes do chão,
E as estrelas do mundinho só meu…
Tão ofuscantes são ao meu coração,
E tantas, que tonto logo se encheu.
Tão sublimes são as cores das aves,
Tão eloquentes as vozes do chão,
Que o som dos murmúrios suaves
Calam a filosofia do homem vão.
Pois ele é um eco preto e branco
Clamando uma vida modorrenta.
Cimentam o coração no flanco,
E na mente a cobiça pavimenta.
Têm originalidade morta e muda.
Meu seio à morte é impassível.
Sua afronta artificial e desnuda
É mera usurpação invisível.
Mas as estrelas, flores e aves,
Suas meras fantasias acrescem,
Sugerem e sussurram suaves
O que os humanos nem parecem.
Dois corações
Entre o senso e a emoção
Vivo em lágrimas desfeito.
Por ter na cabeça um coração
E outro coração no peito.
À natureza
Grita ao meu espírito
Aquela que é muda.
Aos ouvidos eu grito
Daquela que é surda.
Calada, me diz tudo…
E ouvindo-a falar
Devolvo e ainda escuto
O que já deu e vai me dar
À tua doce voz me calei
Quando teu pranto sorvi,
E só pranteando, eu sei,
Pagar-te-hei o que pedi.
Do contra
Pra você eu serei exatamente o que você pensa que eu sou.
Para os 'preto no branco', sou uma pintura impressionista; para os coloridos serei transparente; para as rosas serei sonhadoramente azul; para os que 'se dizem' azul, serei lilás, a fim de mostrar que a natureza de todo homem é equilibrada; para os que se acham branquinhos, serei negro como o riso da ironia; serei branco para os que acham que estão no vermelho; serei 'verde raíz' para os que acham que a riqueza está no alto; serei criança para as crianças, mas não serei adulto para os que se julgam adultos_ o primeiro que quis ser dono do próprio nariz hoje governa o mundo, e eu detesto política; serei culto para os que reconhecem, mas serei ignorante às mentes cujo espaço é limitado, preconceituoso ou estereotipado; serei palhaço aos que são sérios demais; aos burros, serei o cocheiro. Finalmente, para Deus, serei o que muitos também tentam ser_ virtuoso. E para o Diabo serei o que todos são_ imperfeito.
Estereótipos
O falso opõe-se às leis naturais,
Qual opõe-se a vida à morte fria.
Mas nem ela nem o frio são reais,
Qual as aparências da fantasia.
O valor do caráter foi trocado.
O homem tornou-se artificial.
Estereotipou aos gays o veado
E o arco-íris distinto e natural.
Faz o nome mais que a essência,
Desvirtuando gente e animal,
Ao compararem eles na aparência.
Faz o feio ser belo, o bom ser mal.
Melhor equilibrar a firmeza de leão
Com a realeza do cervo a coroar,
Do que viver latindo como cão,
Cujo valor e brio tem que provar.
Triste, ver tudo desequilibrado:
Do metido a santo já me cansei;
De quem tenta ser macho forçado;
E quem por via da moda é gay.
"Hábitos não fazem um monge".
Nem "lobo em pele de ovelha".
Quem sob peles se esconde
Não vira dentro o que assemelha.
Se não existe conteúdo legítimo
E de qualidade para ostentar,
De nada adianta, se no íntimo
A intenção é somente maquiar.
É só disfarce para o teor escasso.
Estereótipo é ilusão, não é lei.
Quem usa disfarce é palhaço.
Mas só a natureza atesta um rei.
Inteireza
Sou aquilo que falo;
Sou aquilo que pinto;
Sou aquilo que penso;
Sou aquilo que sinto.
Amar só um pedaço,
É amar parte de mim.
Sou todo, não sou bagaço,
Pra mendigar-me assim.
Ouça minhas palavras,
E junte às minhas cores;
Atente às minhas ideias
E sinta meus amores…
E plante-os, se tens espaço.
Não posso dar partes de mim.
De nenhuma flor me desfaço,
Pois não sou flor, sou jardim.
Amizade
Ah! Quem me dera
Que os amigos fossem flores.
Ah! Quem me dera
Cultivar esses castos amores.
Ah! Quem me dera
Que todas florissem pra mim
Então as pusesse
Todas em um imenso jardim.
Se esse jardim quisesse,
Todo ele seria sorrisos.
Pois eu talvez pudesse
Ser árvore pra esses amigos.
Alvorecer
Novos tempos hão de vir
Que vão por fim a essa história.
Os dias dourados voltarão,
A aurora há de nova luzir,
Trazendo as eras de glória.
A primavera se unirá ao verão,
O estéril inverno há-de partir.
O 'sempre' reinará na memória.
O eterno será a única estação.
Canção lunar
Quando a brisa sussurra no ar
Em espirais de brumas dispersas
Perceba a forma e o brilho lunar
Flutuando em estrelas imersas.
Pois a lua suave põe-se a cantar
E as estrelas repicam brilhando.
E o som vem descendo devagar,
Com o silêncio descem voando.
As asas tocam as ondas do mar
E as ondas harpejam de luz,
Fazem o ruído das águas cantar,
Cantar as vozes dos mares azuis.
As vozes distantes de além-mar
Que a lua de fantasias embala
Fazem o véu de folhas farfalhar
E no sopé dos montes resvala.
A melodia faz o silêncio agitar
As aves e animais dos campos.
Faz a quietude do lago acordar
E agitam também os pirilampos.
Tais murmúrios que os acariciam
Convidam alguns sonhos a voar.
Sonhos que cansados dormiam
Antes da lua começar a cantar.
A música atiça cantos escuros
Em árvores de segredo milenar.
Os segredos sussurram barulhos
Que fazem o passado lembrar.
No doce som que em todos ecoa
Há luz que nos faz transbordar.
Então a sombra do peito escoa
Pra ficar cheio da canção lunar.
No peito semeia uma Noz
E uma pinha para nos guiar
Guiar à divina e eterna voz
Que docemente nos faz sonhar
A rotina
Nesse fado premente de repetir
O badalo da enfadonha rotina,
O sonho ensurdece com o retinir
Vão e repetitivo da ladainha.
Acumulando pedras até esvair
Do corpo a vida que termina.
E o tempo ainda a prosseguir
Na imortal e ressonante sina.
Renova-te! O novo experimenta!
Livra-te da definhante tormenta!
Para de querer nas mãos o vento!
Teu corpo gasta-se. O tempo não.
Assim, escravos teus anos serão
Mas livre e imortal será o tempo.
Biosfera
Esse globo viajante
Ainda vai sustentar
O azul verdejante
Dessas matas e mar.
Quando em mãos inocentes
As reservas podem durar.
Resistirão persistentes
Até novo tempo chegar.
Se vencesse a ganância
Que faz flor moeda virar,
A flora seria lembrança
Que a arte iria ilustrar.
Mas antes do dinheiro
A vida sempre fez brotar
O rico verde desse viveiro
Que rico e verde há-de ficar.
Liberdade autêntica
Lateja o verso que o tempo disfarça.
Poema composto por palavras vagas
Por idéias cansadas de tanto falar.
Mas pode ser a falta das livres asas
Que impede a poesia de gritar.
É curto o tempo; a liberdade é falsa…
Qual as idéias mudas e cansadas
O sonho preso não quer voar.
Mas além do tempo, verei alçadas
As asas da liberdade em pleno ar.
Rejuvenescimento
Aguarde a velhice tirana
Que fere a imagem no espelho
Verter de si mesma o vermelho
Que da juventude derrama.
Limitações
A borboleta sem asa
Crisálida permanece.
Em cujo casulo inerte
Geme enclausurada.
Infecto
Há gentes que zumbem como moscas
Em torno de mente ainda mais pobre.
Dessas artificiais mentalidades foscas
Que mui longe estão de parecer nobre.
Despretensão
A espada, a lança, a flecha ardente
Do mundo, antes e sempre lacera.
Usam tais armas impiedosamente
Para vencer fome, medo e guerra.
Mas um mal reside secretamente
Que pior ainda sendo, será e era
Uma arma de forma transparente,
Que males como as outras gera.
Negam o valor alheio por ambição?
Ferem com a língua a quem invejais?
Por criticar a outros, obtereis em vão
Apenas aplausos e momentos banais.
Invejando o que vos falta ao coração
Secam o vosso e põem no deles mais.
Herança
Morei em um sítio com meus pais.
Na frente um arvoredo, um rio no final.
Cultivei um jardim no meu quintal,
Com flores cercadas por matagais.
Meu pai decidiu criar galinhas
Que se deliciavam com meus rosais
Minhas plantações não existem mais.
Percebi então que não eram minhas.
A vida, tal qual o meu jardim
Não é feita apenas de flores.
Pois há bichos que roem os labores
Dando a eles um triste fim.
Tentei de novo uma plantação
Que cerquei com mais amores.
Veio um bando de saqueadores
E estragou também a habitação.
Finalmente então compreendi
O que devem ser nossos tesouros,
Que não precise trancas ou ferrolhos
Ou ponha fim na alegria que senti.
Aprendi que algo só é todo nosso
Quando realizado por todo eu,
Construído no que de fato é meu,
Sem depender do que não posso.
Coração e mente não têm termos.
É a luz de Deus em nós plantados.
Quando do jeito certo cultivados
Na certeza de eternamente sermos
Nunca fui feliz com o que é finito,
Passageiro, vão e artificial.
Eu fui concebido para o imortal,
Sempre meu, sempre invicto.
Não quero bem hereditário.
Se passa de mão, não é posse real
Só desejo o que já tenho afinal:
Os bens do meu dom, meu relicário.
Nele cabe meu enorme sentimento,
Sem entradas, meios ou finais.
Pois nasci com sonhos atemporais,
Que não cabem em um só momento.
Cultivo sonhos e pinto histórias,
Onde é meu mundo e também céu.
Neles posso ficar sempre ao léu
E eternizar minhas memórias.
Resumi, pois, minha felicidade
À tinta e um pedaço de papel.
Sou feliz construindo com o pincel
Um lar e um jardim que nada invade.
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