guilhermerubido Guilherme Rubido

Os dias de Miguel estavam contados, consumidos rapidamente pelo câncer que se praparava para o golpe final. Aceitando seu destino, Miguel recebe a visita de uma estranha criatura em sua casa; uma ave grande com rosto de uma velha mulher. Com um tétrico assobio, ela anuncia sua visita e, rapidamente, o cura de sua doença. No entanto, o preço cobrado se torna uma maldição, onde Miguel é tragado para um pesadelo persistente.


Korku Gotik korku 13 yaşın altındaki çocuklar için değil.

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Tudo tem um preço

Tudo tem um preço


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Um assobio despertou-o do sono.

No teto, o ventilador rodopiava com um zumbido monótono. Fazia calor e, quando ele se levantou, percebeu que estava suando e seus olhos lacrimejavam.

Descalço e vestido apenas com uma samba-canção, Miguel tateou pelo quarto escuro em busca da porta que, por pura superstição irracional, ele sempre matinha fechada quando ia dormir. Apesar do calor, ventava lá fora. Um sopro abafado e quente, que fazia as folhas das árvores balançaram, despencarem e deslizarem sobre as calçadas, asfalto e telhados das casas em um farfalhar que se repetia de hora em hora.

O vento se espremia pelas frestas das janelas, produzindo um sussurrar agudo. No entanto, deslizando por trás do ulular que o vento fazia, havia algo mais... algo com propósito. Com intenção.

Havia um assobio.

E, quando Miguel acordou, ele sentiu quase que imediatamente que o assobio o chamava. O assobio atravessava a noite, tateando pela casa a sua procura. Ele ficou um tempo sentado na cama; atordoado e parado, olhando para as paredes enquanto o ventilador girava, preguiçosamente, no teto do quarto. Por alguns segundos, ele esperou no escuro, tentando discernir o que ouvia. Tentando compreender o que ouvia através do vento.

Já de pé, Miguel andou pela casa; ainda trôpego de sono, foi até a janela da sala, por onde olhou para o portão da garagem lá fora. Deve ser um bêbado, ele pensou, puxando um pouco da cortina para ver a frente da casa. Porém, por trás das grades escuras, o portão estava vazio. Por trás das barras de ferro, a rua brilhava sob os postes de luz branca e as folhas se arrastavam em uma dança frenética, mas nada havia ali, senão a areia que as lufadas de ar traziam consigo. Por ali, naquela região – e principalmente naquela quadra, parecia a Miguel –, havia muitas casas que ficavam em um processo de construção eterno, interrompendo e voltando com o processo a todo momento, seja por falta de verba ou o que fosse. Assim, terrenos baldios, aterros, depósitos, casas e sobrados pela metade descansavam como esqueletos descarnados, ladeando a rua com seus materiais de construção em desuso sendo balançados ao sabor do vento. Então, quando começava uma tempestade, a poeira e a areia desses lugares era logo arremessada para todos os lados. No dia seguinte, pela manhã, seria preciso pegar uma vassoura para limpar dentro – se tudo não estivesse muito bem fechado – e fora de casa. O asfalto, antes preto, estaria branco, coberto por pó e salpicado de pedrinhas beges de areia.

— Não tem ninguém — ele falou, fechando a cortina novamente e se sentando aliviado no sofá. Talvez ficasse ali mesmo. Sentado no sofá assistindo TV durante toda a madrugada até que finalmente amanhecesse. Ele pegaria alguma coisa para come...

O assobio recomeçou.

Surgiu outra vez por trás dos uivos do vento, elevando-se e tremulando até ele lá da frente da casa. Um som agudo e fantasmagórico que oscilava em tons diferentes, projetando sobre a noite uma melodia horrível e, de alguma forma, assustadora. Era o som de uma flauta diabólica que fazia suas notas se projetarem, dançando e rastejando pelo ar, até que, sem saber o motivo, você estivesse apreensivo e os calafrios começassem a corroer sua pele. Ao menos era a sensação que Miguel experimentava naquele momento, paralisado sob o peso aterrador daquelas garras que se assomavam sobre a casa na noite quente.

Agachado, Miguel voou até o quarto e abriu o armário ao lado da cama. Apoiou-se nas pontas dos pés e agarrou uma caixa de tênis que estava sobre uma prateleira acima dos cabides. Colocou a caixa na cama, abriu-a e tirou uma arma lá de dentro. Era uma Taurus 82, um revólver que conseguira com um amigo do trabalho que tinha conhecidos na Polícia Militar. A região onde Miguel morava era perigosa e, mesmo sem se falarem, todos sabiam o que tinha escondido no armário de cada vizinho. Ele não sabia se precisaria da arma. Não tinha visto nada. Nada mesmo. Não houve indício algum de presença, exceto pelo assobio que, de alguma forma, penetrou em seu coração com uma força tão desoladora, que o fez correr em busca de proteção. Então, por via das dúvidas, ele estava armado.

Armado e amedrontado.

Com a arma na mão, arrastou-se até a porta de entrada da casa, que ficava ao lado da cozinha. Andando meio curvado, sentia a borracha da empunhadura ficar quente sob as palmas das mãos e, prendendo a respiração por um tempo, estancou. O assobio parara. Com cuidado, Miguel tirou uma das mãos da empunhadura e segurou a maçaneta. Percebeu que estava tremendo. Com cuidado, girou a maçaneta e puxou a porta, que se abriu com três estaladas nas dobradiças. Preciso passar um óleo, o pensamento cotidiano lhe passou pela cabeça de repente. Esticando o pescoço, olhou pela porta, lá para o quintal. Era um largo corredor onde se poderia – e essa era a intenção da construção – colocar um carro que Miguel não tinha e nem pretendia ter; não por agora, ao menos. Desalinhados, caquinhos de cerâmica vermelha, preta e amarela formavam o chão e seguiam até o portão de ferro lá na frente, que dava para a rua vazia. Levantou a arma e começou a andar até a entrada. Os pés descalços se arrastavam sobre o mosaico avermelhado e sujo que era o chão. O coração palpitava e o calor abraçava seu torso nu como tentáculos grudentos e escorregadios. Quando chegou nas grades, não encontrou nada.

Até que, com o canto do olho, viu algo balançando na bordinha de cima do portão. Paralisado, ele acompanhou aquilo com o olhar, ultrapassando as grades por onde aquilo – penas? – balançava por trás e ultrapassando a moldura de cimento que contornava o grande portão e que formava o muro da casa, onde, empoleirado em uma cena grotesca, um gigantesco pássaro o observava do alto.

Miguel se sentiu zonzo no mesmo instante. Com um gritinho que saiu em um suspiro, ele cambaleou para trás, recuando para longe daquilo que o olhava e acompanhava com a cabeça. Era, de fato, um pássaro. No entanto, de uma forma bizarra, era também uma pessoa. Como quando uma criança desenha todos seus heróis favoritos juntos em um só personagem, ali, de hora em hora, as penas dos braços davam lugar a uma pele enrugada e seca e, de repente, as penas voltavam. Em várias regiões da ave era possível ver os sulcos e marcas da pele de uma velha, mas eles logo eram cobertos por uma floreste de penas. As asas eram uma fusão horrorosa de braços finos e esqueléticos com as vigorosas asas de um abutre negro.

E o rosto...

A velha o olhava lá do alto, de seu poleiro. Os olhos estavam fechados, como se ela fosse cega e, ainda assim, olhava diretamente para Miguel. As pálpebras enrugadas vibravam e a boca fina e seca contorcia-se sem parar, os lábios movendo-se e vibrando como vermes finos e viscosos, para, enfim, produzir o assobio que tanto assustara Miguel e que agora ele ouvia de perto, cara a cara. A cauda da ave balançava de um lado para o outro, pendendo para fora do muro e se arrastando contra as grades do portão em movimentos pesados e pendulares que fazia o som de cartas sendo embaralhadas rapidamente.

Fliiiiip-fliiiiip.

Em algum lugar, numa casa vizinha, um cachorro latia.

Sem compreender o que estava vendo, Miguel gritou:

— S-Sai d-daqui! — Disse apontando a arma para o peito da gigantesca ave. — Seu b-bicho noj-jento, sai daqui!

Agora, maior do que o medo, sentia-se assaltado e tomado por um sentimento de repugnância desgovernada por aquela figura à sua frente. Com um nojo desesperado, abanou a mão para tentar espantar a ave, como fazemos quando vemos algum inseto se aproximar. Mas ela não saiu. Continuou ali, parada como uma estátua de pedra sombria e imperturbável, olhando-o do alto com olhos selados.

Ele não tinha coragem de atirar – não ainda. Contudo, a vontade de espantar aquilo, afastar-se de qualquer jeito daquela maldita ave era tão grande que, por um momento, viu-se arremessando a arma na direção dela para ver se ela sairia voando. Mas não fez isso. O que fez – e o que conseguiu fazer – foi ficar ali, paralisado e só de samba-canção, enquanto a estranha sentinela alada o vigiava, encimada pelo céu escuro.

Então, de forma mecânica, o rosto de velha que o pássaro ostentava começou a se mexer. As rugas se dobrando e esticando em uma máscara contorcida. O assobio cessou e a cidade adormeceu silenciosa. Ao longe, o vento murmurava e um cão ladrava. Então, ainda com os olhos fechados, a boca se abriu e começou a falar algo. As mandíbulas se moviam de modo mecânico e débil, como quando um idoso que já está dormindo começa a balbuciar algo de sua cadeira.

— O que você quer? — A voz ressoou na noite e deslizou pela espinha de Miguel, fazendo seus pelos se arrepiarem no mesmo instante. Uma voz que soava como vidro estilhaçado sob a sola dos sapatos. Uma voz antiga e sepulcral, ecoando descarnada nas paredes do tempo.

Miguel sentia o suor, que agora estava frio, deslizar pelo pescoço e pelas costelas feito dedos mortiços. Sua garganta estava seca. Sentia-a entalada. Ainda assim, sem saber por quê, ele respondeu instintivamente:

— Quero ser curado do meu câncer.

Do alto, os olhos fechados o encararam por um tempo. Miguel teve a impressão de conseguir ver o contorno dos glóbulos oculares girando por trás das pálpebras cerradas, como se algum processo maluco ocorresse por trás da pele.

— Pois muito bem — a velha respondeu.

Soltando-se do beiral do muro, a ave deixou-se cair no chão da garagem com um movimento pesado. O som das garras – que Miguel ainda não tinha visto – tilintando contra a cerâmica era perturbador, e a ave parecia ainda maior, ainda mais assombrosa naquele – agora pequeno – espaço que separava o portão da casa. As patas eram horríveis. E Miguel viu-as levantando para caminhar em sua direção. Uma mistura tortuosa e escamosa de pés humanos e patas de aves, com garras tão afiadas que seriam capazes de rasgar uma porta com um só movimento.

Miguel já não ouvia mais nada. Todo seu sangue parecia fervilhar em sua cabeça e pressionar contra os ouvidos. Seus sentidos não tinham espaço para outra coisa senão aquilo que se aproximava a passos lentos, avolumando-se como uma gigantesca sombra. Quando ela chegou perto o suficiente, ele tremia sem parar, atônito demais para fazer qualquer cosa diante daquele ídolo horrendo. A arma, que antes ele empunhara com tanta força, estava agora caída inutilmente no chão, e o mundo à sua volta girava em redemoinhos. O ar, tomado pelo cheiro da criatura, parecia podre; tóxico demais para respirar. A vontade que tinha era de sentar e chorar.

Então ele apagou.

Acima dele, o vento voltou a assobiar.

06 Aralık 2020 16:33 0 Rapor Yerleştirmek Hikayeyi takip edin
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