loremkmorais Lorem K Morais

"Por que quando tiram uma foto sua parece que colocaram uma arma na sua cabeça e te mandaram sorrir?"


Поезия Всех возростов.

#poesia #pensamentos
Короткий рассказ
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Diga x

“Ei, se juntem todos, vamos tirar uma foto!”

Aos sete anos eu queimei minha mão.

Eu lembro do ocorrido com claridade surpreendente, apesar dos 20 anos que passaram desde então. De agarrar o tronco em brasa e da sensação excruciante quando tentei o soltar em vão.

De certa forma, eu estava acostumada a certas dores, sempre fui uma criança envolvida em acidentes, mas aquela era uma novidade.

Eu lembro quando finalmente consegui olhar o ferimento, a mão avermelhada e em carne-viva onde a pele ficou presa no tronco. Era a mão direita e eu pensei “logo agora que comecei na escola.”

E ainda assim eu não chorei.

Corri para trás da construção e consegui um balde de água gelada para aliviar a dor. E fiquei lá, quieta, com receio de ver minha mãe decepcionada comigo por ter desobedecido e me aproximado do fogo.

Eu não chorei até me encontrarem e ver minha mãe tão apavorada.

Eu não chorei pela dor que eu estava sentindo, mas a que estava causando a ela.

Hoje eu tenho uma cicatriz na palma da mão. De vez em quando eu olho e penso na ‘eu’ daquela época.

Eu era daquele tipo de criança que não chorava quando levava tombo. Sorrir também não vinha fácil. Em boa parte do tempo eu parecia viver em um mundo à parte da maioria e pouca coisa do lado de cá podia me afetar.

De vez em quando eu ainda me sinto assim. Como se houvesse uma barreira entre meu mundo e o dos demais e eu apenas caminhasse ao longo do vidro, ouvindo os sons abafados do outro lado. Ao longo dos anos ela se tornou mais fina, mais frágil, mas nunca se quebrou de fato.

E então, tudo o que as pessoas conseguem ver de mim é um mero reflexo distorcido, um rosto imutável que esconde o que realmente está se passando do lado de cá. É como viver em um mundo do contrário e quando tento uma ação daqui, nunca funciona certo de lá.

Chorar, sorrir, gritar, tudo parece abafado, complicado. Como se fossem ações que só funcionam por dentro.

De vez em quando eu quero passar para o outro lado, mas é cansativo demais. Que motivação eu tenho para fazer isso?

“Sorria para foto!”

Como posso quebrar essa barreira sem causar uma inundação com tudo isso que está do lado de cá?

“Por Deus! Eu disse para sorrir!”

“Mas eu sorri.”

“Parece que colocaram uma arma na sua cabeça e mandaram sorrir! Por que você é assim, hein?”

“Oh, desculpe.”

Que direito eu tenho de inundar o mundo de alguém com tudo isso que existe no meu?

“Vamos tentar de novo.”

“Diga X!”

No fim das contas, o mundo do lado de cá me parece bem mais simples.

26 ноября 2019 г. 17:13 2 Отчет Добавить Подписаться
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Об авторе

Lorem K Morais Cosmopolita, cafezeira e ranzinza. Estou sempre de um lado para o outro, sem pouso certo. Uma hora aqui, outra acolá. Cirurgiã-Dentista e escritora por ocasião, porque preciso colocar em palavras tudo o que vi. Entre aqui e acolá. Em comum a vontade de fazer as pessoas sorrirem. Vocês podem me encontrar também no meu blog Anjo Sonhador [loremkrsna.blogspot.com]. Não se acanhe não, se achegue aqui. Deixe te contar uma história.

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Alice Alamo Alice Alamo
Mano, eu fui comprada pela capa, confesso. E achei uma graça a forma como você conduziu a história partindo de uma reflexão antiga e então puxando para a atualidade. Simples e extremamente tocante. Eu to apaixonada por esses textos seus <3

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