Escancarou a porta de casa e, após mostrar as compras que fez para sua mãe, decidiu que era o momento de contar sobre seus momentos de glória no jogo daquele dia. Dona Maria sorriu largo, fez todas as perguntas que ele gostaria que ela fizesse e realizou o procedimento rotineiro: o fez realizar tarefas da escola antes de continuar suas aventuras em domicílio. A rigidez de sua mãe o assustava de tempos em tempos, mas ele sentia que a criação de Dona Maria o faria alguém melhor no futuro.

Conforme a noite chegava ao Morro do Rato e os trabalhadores voltavam para suas casas, o clima agitado do dia se transformava vagarosamente em alegria e pagode. Os bares se preenchiam, as televisões se ligavam na partida de futebol e Pedro cruzava a favela para finalmente retornar para casa com as compras. Ria e saltitava de ansiedade quando se imaginava contando sobre a partida para a mulher. Toda aquela aventura havia aumentado ainda mais sua vontade de sentar e conversar com a Dona Maria.

— Vocês estão com medo de uma lenda idiota? Faremos uma fortuna com o pelo do bicho e estão se cagando por pensar em protetores da floresta? Isso é absurdo. Peguem as malditas armas e me sigam, não recuaremos. Essas matas nos tornarão homens ricos. Comigo!

Quando estava próximo de casa, trombou o corpo contra um sujeito por insistir em caminhar com a cabeça baixa. Pedro ergueu os olhos e foi contagiado pelo sorriso breve de Léo; entretanto, a alegria do rapaz em vê-lo se esvaiu quando ele provavelmente percebeu a tristeza abrigada em seu sorriso. Ouviu o relato de Pedro e, tão revoltado quanto determinado, puxou o garoto na direção da casa de Carlos. Mesmo temendo a ira de Léo, não negaria sua ajuda. Era o momento de resolver aquela injustiça.

Ainda abalado pela humilhação imposta pelos garotos, adentrou a quadra da escola de samba sem esforço; todos abririam passagem para alguém completamente sujo de lama. O frio causado pela chuva pesada ainda o afligia. Chorando baixo e abraçando o próprio corpo, alcançou o centro da quadra e vários membros da escola de samba se aproximaram com toalhas e um sonhado copo d’água. Eles o limparam, o cuidaram e o consolaram; o único pedido feito por eles foi: Mãe Elisa quer falar com você.

Sujo é o melhor amigo imaginário do mundo. Diferente do papai e da mamãe, ele sempre me ouve e fala comigo por muito tempo. Dei o nome engraçado porque ele sempre aparece sujo de vermelho, mesmo assim, sempre está feliz. Ele conhece tudo que eu gosto e até começou a falar igual a mim. Mas hoje uma coisa estranha aconteceu: papai e mamãe falaram com o Sujo pela primeira vez e estão o confundindo comigo. Estou chamando há horas e ninguém me escuta. Por que estou tão sujo de vermelho?

Andou irritado pela rua movimentada do Morro do Rato; chutou pedras e se permitiu alguns xingamentos. Até que, para sua surpresa, viu Carlos parado na esquina do barraco. Era sortudo ou azarado? Há pouco implorava para encontrá-lo, mas quando finalmente o encontrou, se viu desesperado. O que faria? Conversaria com o garoto antes de qualquer coisa? Antes de pensar em um plano, notou surpresas tensas: dois amigos de Carlos o acompanhavam e os três lançaram olhares desconfiados em sua direção.

Contas atrasadas e um roubo terrível com certeza causariam o fim de seu sonho. Dívidas e mais dívidas, credores furiosos, um casamento arruinado. Suspirou e decidiu. Nos curtos passos até o guichê de atendimento, arrancou a aliança valiosa do dedo da mão esquerda. Vendida. Seu negócio estava salvo: o Café das Flores continuaria recebendo clientes, histórias, emoções e um pedacinho da vida de cada visitante do café mais bonito da Glória. Sua felicidade era pura e tão intensa.

Adentrou o Café das Flores em desespero, os olhos encharcados buscavam sua amada; estava atrás do balcão, pele bronzeada e cachos dourados tão lindos quanto os olhos esverdeados. Puxou o buquê das costas e, ao atravessar para a área de funcionários, se pôs de joelhos. Estremeceu com sua face impassível; não fazia diferença, precisava tentar. Perdão, perdão, perdão. Rejeição. Nunca mais teria a mulher que mais amou na vida. Que Rosa morra sozinha, próxima parada: a casa de Camila.

Perseguia Carlos pelos becos apertados do Morro do Rato; corria como se iniciasse o melhor contra-ataque de sua vida. Viu o rapaz cruzar um barraco exposto, contornou a casinha pela lateral, os olhos vasculhavam as janelas sem vidro. Cadê? Dois cachorros latiram; avançou dez metros e viu seu adversário sumir na feirinha do pé do morro. Cadê? Nunca seria capaz de alcançá-lo. Tentou mesmo assim: atravessou a feira entre opa e dá licença, mas não encontrou nada. Virou-se quando pegaram seu ombro.

Ouviu a história da proprietária do Café das Flores com desdém. Anotava pontos relevantes em um bloco de folhas escassas, odiava o maldito procedimento. Criminosos mascarados, ausência de qualquer câmera de vigilância, poucas testemunhas, caso péssimo. Se impressionou com a revelação do valor exato do prejuízo, duvidava da existência do café por muito mais tempo. Pediu uma fatia de bolo para a viagem enquanto apostava consigo mesmo que o caso iria para algum fundo de gaveta. Não ligava.

Puxaram as máscaras de fantasma assim que viraram a esquina do bairro da Glória. Dez horas; uma surpresinha bem na hora de fechar. Seu parceiro planejara o roubo nas semanas anteriores, visitara o Café das Flores diversas vezes para monitorar o cotidiano de seus funcionários. Moleza. Enfiou uma das mãos enluvadas no bolso frontal do moletom e agarrou sua pistola. O sorriso sob a máscara denunciou o começo do assalto. Chute na porta; todo mundo com as mãos no alto. Ferro e carteira pesados.

Seu olhar vacilante alternou entre Carlos se afastando e a expressão fechada do Zé do Mercadinho, o dono do mercado do morro. A única testemunha de seu contratempo o encarava sério: corre! O que faria com Carlos se o alcançasse? Ele era muito maior, muito mais forte, muito mais perigoso. Zé curvou as sobrancelhas grisalhas e gesticulou forte na direção do ladrão: corre! Mesmo pequeno, driblava os zagueiros mais velhos, maiores, mais fortes e perigosos; goleava com gosto. Correu.

Suas partes favoritas das visitas diárias ao Café das Flores eram as conversas descontraídas com Rosa, a proprietária. Em seus oitenta e cinco anos, não desejava nada além de contato, de um ouvido amigo; amava testemunhar a juventude em seu primor. Naquele dia, chocou-se ao perceber o choro da amiga, lamentava o fim do casamento e praguejava seu marido. Suas décadas de experiência ofereceram um único conselho valioso: deveria lucrar muito com a venda da elegante aliança.

Continuar naquela situação absurda seria loucura. Odiava a biscate? Não. Porém, se ele não ficaria ao seu lado, também não teria o amor de sua mulher. Nunca reuniria a coragem necessária se permanecesse ali, acuada na cadeira do Café das Flores, duvidando se caíriam no tapa ou se precisaria consolá-la. Agora ou nunca. Avançou até Rosa e contou cada detalhe das noites de ternura na companhia de Samuel, o marido da dona do Café. Nem tapas e muito menos lágrimas: foi expulsa, mas estava satisfeita.

Não podia evitar de se lembrar dos tantos relacionamentos tóxicos, fracassados e corrompidos de seu passado. Passado. Sentava-se ao lado do amor de sua vida em um dos sofás aconchegantes do Café das Flores. Enquanto ria de outra piada, levou a mão esquerda à bolsa discretamente; puxaria a caixinha escura do modesto anel de noivado comprado no dia anterior. Chamou seu nome antes da próxima piada, inspirou, expirou e indagou: você aceita? Ainda tomariam muitos cafés juntos.

Seu cappucino matinal no Café das Flores era o momento mais gratificante dos dias atribulados. Frequentava o local três vezes por semana; era bem ao lado do prédio de sua aula de boxe. Largou o calor da bebida na mesa de madeira ao notar os comentários estúpidos de outro cliente. Sofia, a simpática garçonete do café, era atormentada por insinuações terríveis de seu assediador em completo silêncio. Determinada, levantou da cadeira e decidiu que sua aula de boxe aconteceria ali mesmo.

Ignorou o ruído irritante da porta do Café das Flores e caminhou vagarosamente até o fundo do local. Vasculhou o teto e as paredes; nenhuma câmera de segurança. Entre xícaras de café e manchetes de jornal, assistiu aos movimentos de Rosa durante um fim de tarde inteiro. Decorava sua rotina, cronometrava as visitas de seu marido e monitorava o comportamento de Sofia — a garçonete — como parte fundamental de um roubo: o plano. Precisava de uma parte dos lucros do melhor café da região.

Entrelaçava os dedos enquanto mordiscava o lábio inferior; nunca estivera tão apreensiva em toda sua vida. Sofia sentava-se em um dos bancos altos do Café das Flores, aguardava Rosa acertar os últimos detalhes de sua contratação como garçonete. Começaria no mesmo dia: os olhos quase marejavam ao admirar o avental florido em cima do balcão. Com o novo salário, financiaria o tratamento de sua mãe e manteria sua família unida. Seus pais nunca precisariam trabalhar novamente. Sentia paz.

Atravessou o portão de casa e quase tropeçou numa galinha raquítica. Se assustou com o berro da vizinha desesperada, perseguia o bicho em desajeitamento. Riu sozinho da cena, avançando por vielas íngremes; sentiu o cheiro familiar de cerveja, carne e fumaça. Ouvia crianças rirem, bebês chorarem e o som alto de noticiários. Boa tarde, Dona Neide. Boa tarde, Seu Araújo. Desviou de uma bicicleta veloz; pulou uma poça d’água. Aliviado, viu que o chinelo não arrebentou. O mercadinho era logo ali.

Não se preocupavam se sujariam suas becas entre as risadas, recentes memórias já distantes, flertes e papos furados. Sentiu dor nas bochechas; sorria por tempo demais. Um dos amigos pediu mais pães de queijo e outra rodada de refrigerantes. Sempre comiam e bebiam no Café das Flores, mas não é todo dia que se conclui o ensino médio. Tão rápido quanto foram os anos na companhia dos amigos, suas mãos gelaram ao se imaginar universitária. A vida adulta não começa todo dia.

Batia os dedos no teclado em ritmo acelerado; suas ideias fluíam como um rio enraivecido da mente par as mãos e, enfim, para a tela de seu laptop. Escrevia o romance que nunca o enriqueceria; porém, preencheria seu âmago com todo amor que desconhecia. O Café das Flores era cenário perfeito: um lugar pacato de sabores impecáveis. Sorriu ao ver Rosa e seus cachos loiros. Desejava conhecer melhor sua inspiração, viu seu marido e um beijo, os olhos voltaram ao romance. Amor platônico e ficcional.

Sua mãe julgou necessário explicar cinco vezes tudo que precisava comprar no mercadinho do morro: cinco quilos de arroz, três quilos de feijão e um quilo de macarrão. Era uma mulher de poucas palavras e muitas ações: não queria chateá-la. Segurou o dinheiro firme em uma das mãos, respirou fundo e sapateou entre os poucos móveis; ainda se orgulhava dos três gols da última partida. Tentou contar seus feitos à mulher atarefada; sua resposta? Só depois das compras. Amarrou as chuteiras e partiu.

Odiava o começo de qualquer fim. Sentou-se em oposição à namorada; desviou seu olhar do dela, encarava vitrines e doces. A Glória não seria a mesma sem o Café das Flores. Sentir o cheiro potente do café fez o embrulhar de seu estômago piorar; por que precisava ser tão difícil? Como falar o impronunciável entre tanto nervosismo? Não importava. Adiara o momento por tempo demais, chega. Ergueu o dedo, pediu um café puro, inspirou, expirou e decretou: acabamos. Estava sozinho quando seu café chegou.

Quase não foi capaz de conter uma gargalhada impressionada ao entrar no Café das Flores. Puxava o paletó do papai e gritava por ele; agarrava a mão da mamãe e saltitava de animação. O dedo rechonchudo mostrou um bolo de baunilha com chocolate que estava na maior vitrine dali. Ignorando a reprovação dos pais, saltou mais alto, os berrou mais empolgada. Três minutos depois, devorou o bolo em garfadas rápidas. Tão doce, até que sentiu uma dor esquisita na barriga. Hora do banheiro, mamãe.

Pedro fintou para um lado e carregou a bola ao outro; aos doze anos, era um prodígio da escolinha de futebol do Morro do Rato. Jogava as canelas finas para cá e para lá, abria sorrisos frenéticos, chutava e goleava. Era um artista e a bola era sua arte. Ignorava o sol cruel, o suor pegajoso e a exaltação dos amigos driblados; só enxergava o gol. — Pedro, vem cá agora! — Ouviu o grito distante da mãe e se arrancou do transe. Após se despedir, correu para casa, já sentia saudade da bola.

Com um aceno rápido do queixo, Rosa deu as boas-vindas a mais um par de clientes. O dia da inauguração não poderia ser melhor. O Café das Flores era um sonho realizado: décadas de economia permitiram que abrisse seu próprio negócio. Estava certa de que seu estabelecimento de aroma rústico e decoração florida seria um destaque do bairro da Glória. O sorriso orgulhoso se desenhou nos lábios cansados; ajeitou o avental, mais clientes. O Café das Flores não se manteria de pé por conta própria.

Para a surpresa de Pedro e de qualquer um que conhecesse o histórico da dupla, quem estava de pé na porta de sua casa era Carlos. Parecendo genuinamente chateado com o desenrolar de sua briga com o garoto, Carlos se desculpou pelo ato covarde que cometeu e explicou como tem sido difícil sobreviver com o dinheiro de sua casa. Eles se entenderam e finalmente se despediram com uma promessa de que jogariam a próxima partida no mesmo time. Pedro foi dormir mais feliz do que era capaz de imaginar.

O fim de noite de Pedro aconteceu como de costume: jantou, ajudou com a louça, assistiu à novela das nove com a Dona Maria na sala e treinou alguns chutes no quintalzinho de trás. Já sentia o sono bater nas portas de sua mente hiperativa e estava se preparando para escovar os dentes quando ouviu a campainha de sua casa tocar. Ninguém esperaria uma visita naquelas horas. Cobranças ou boas notícias? Havia apenas uma maneira de descobrir.

Finalmente retornando ao mercadinho do Zé, Pedro percorreu os corredores estreitos do comércio e recolheu todos os itens requisitados por sua mãe: cinco quilos de arroz, três quilos de feijão e um quilo de macarrão. Pedro se permitiu gastar parte do troco com balas e chicletes por sua valentia em reconquistar o dinheiro roubado. Aparentemente orgulhoso de sua corrida, Zé do Mercadinho colocou três balas extras no saquinho antes de se despedir com uma piscadela do olho e uma ajeitada no bigode.

Estava pronto para perguntar a Léo qual seria a estratégia, mas seu companheiro avançou contra Carlos e seus amigos entre gritos e investidas de punhos. Os capangas covardes abandonaram o beco em corridas desajeitadas, mas Carlos tentou lutar pelo que não era dele: enfrentou Léo e terminou imobilizado pela chave de braço do rapaz mais velho. Ouvindo as ordens de seu amigo, Pedro arrancou o dinheiro do bolso de Carlos e fugiu do beco. Seu problema estava resolvido e o troco estava dado.

Não conseguia acreditar que estava voltando para casa. Atravessava o Morro do Rato com o queixo baixo e os olhos fixos no asfalto defeituoso; seu pensamento estava focado em sua mãe. Tentava imaginar como a mulher agiria ao descobrir que suas compras não foram feitas e que seu dinheiro fora roubado, mas falhava em prever sua reação. Se por um lado conseguia ser compreensiva, por outro não conseguiria evitar de ponderar as dificuldades que passavam e a falta que o dinheiro faria. Droga.

Pedro cruzou o corredor extenso da Unidos do Rato e soube que era o lugar que procurava ao notar as fotografias antigas na parede. Aos 93 anos, Mãe Elisa era uma anciã da escola e da comunidade: nove décadas de sabedoria resumidas em gentileza e amor à vida. Ela o sentou na outra poltrona do quarto e explicou sobre perdão, disse que o segredo para uma longa vida era uma vida sem rancores. Com o corpo limpo e a mente um pouco mais esperançosa, saiu da quadra quase sorrindo.

Pedro rumou para a quadra da escola de samba assim que uma chuva pesada iniciou sua queda no morro. Os ensaios causavam uma aglomeração exagerada na porta de entrada e, apesar de sua pequena estatura e agilidade natural, ele não conseguia vencer a barreira de humanos. Os passos apressados atrás dele se aproximaram, até que ele fechou os olhos de medo; Carlos agarrou sua roupa e o arrastou para a chuva, jogando-o na lama recém-formada. Os rapazes riam e Pedro sentia que estava prestes a chorar.

Pedro corria como se sua vida dependesse disso. Na verdade, talvez dependesse. Desviou de um vendedor ambulante ao alcançar a rua principal do Morro do Rato; se espremia entre a multidão de pessoas para conseguir despistar Carlos e seus capangas. Era capaz de ouvir os gritos e as risadas dos garotos se distanciando, mas não se sentiria seguro até saber que estava fora de alcance. Como um infeliz perdido no deserto, viu seu oásis logo ali: a quadra da Unidos do Rato, a escola de samba do morro.

Pedro viu que os três garotos se aproximavam e aceitou que seria seu fim. Pensou em correr antes que estivessem perto demais, mas realmente valia a pena perder a dignidade outra vez em um intervalo tão curto de tempo? Não. Aceitaria a morte com coragem. Carlos chegou perto, disse que não daria o dinheiro e que Pedro seria esperto se corresse dali. Abriu a boca três vezes, mas não conseguiu rebatê-lo. Os meninos riram e investiram em sua direção; Pedro ignorou a maldita dignidade e correu.

Alcançou o barraco da família de Carlos e empurrou a porta quebrada. Surpreendeu-se ao descobrir que o choro de bebê que já ouvia há minutos vinha dali. A menininha estava de pé em um berço encardido; a mãe dela surgiu na sala, consequência do ranger irritante da porta. Perguntou onde ele estava, ela gritou que não sabia. Por que ela parecia tonta? A mulher cambaleante o enxotou de lá. Saiu do barraco e a ouviu gritar ainda mais com a bebê chorona. Ele bufou e também quis gritar: cadê ele?!

Léo levou Pedro para fora da feira com um sorriso amarelado e uma ajeitada no boné, falou da perseguição que viu. Tinha dezenove, fedia a cigarro e a alguma outra coisa que não foi capaz de identificar; vestia bermuda de marca e tênis da moda. Léo discursou sobre olho por olho e dente por dente, sobre a lei do mais forte e sobre as regras do morro. Estava revoltado com a situação do amigo. O sorriso malandro permaneceu intacto enquanto cochichou o endereço de Carlos no ouvido de Pedro: vai.

Pedro sentiu um solavanco nas costas antes que chegasse ao mercadinho, quase caiu no barro da rua. Carlos — o menino que chutava suas canelas no futebol e roubava seu almoço na escola — zombou do efeito de seu empurrão e, como se avistasse ouro, arrancou os reais dos dedos surpresos de Pedro. Droga. Avançou e tentou recuperar seu dinheiro, mas era muito pequeno, muito hesitante; o garoto dois anos mais velho ergueu o punho, Pedro recuou. Carlos riu e se foi. Droga.