Hoje eu parei, observando a tonalidade roxa do céu das seis. De repente, veio na minha cabeça a que tantas você andava. Se sua boca coral estava com um canudo em seu centro, que tipo de coisas você andava vendo e que fazia seu coração parar por segundos antes de seu sorriso com dentes demais iluminasse seu rosto. Acho que sinto sua falta, mais do que eu quero. Mais do que imagina e mais do que eu posso me permitir. Talvez se eu ficar aqui mais um tempo, o congelador faça as lágrimas pararem.

Olhar pros dois lados mesmo que a rua fosse de via única era uma mania sua. Vai que tem um doido, vai que é uma perseguição, vai que o carro da Prosegur está fugindo de homens maus? Sei lá. Quando chegou a parada, a preguiça desceu sobre si como um vestido novo. Resolveu esperar outro ônibus e viu uma nova via que ia pra sua casa. Nova linha de ônibus? Era de se espantar, havia tantas poucas opções, subiu sem hesitar e logo viu todo novinho, sem cobrador, identificação eletrônica... Que chique.

Às vezes penso que deveria deixá-lo. De verdade. Sem medo nem olhar pra trás. Minha vontade é pegar todas as nossas memórias, lembranças, sonhos e risos e colocar numa redoma. Jogá-la no fundo do oceano e nunca mais encontrá-la. Mas logo desisto, é mais que impossível fazer isto. Dou-me conta que por mais que faça isso, de nada adiantará. Do que me adianta livrar-me de tais coisas se o mais importante tu tens? Dizem que o ser humano não vive sem coração, pois bem, eu não vivo sem você.

O cheiro de peixe frito e frutas frescas invadiam suas narinas, tal qual as folhas de mangueiras invadiam as ruas. O calor insuportável abafado pelas vidraças a fazia ver os antigos casarões se mexendo. Mal podia aguardar o inverno amazônico, quem sabe o cosmos não a brindava com uns bons 15°? As mangas já estavam nascendo, só de ver sua boca salivava. O sono e o cansaço não a deixavam apreciar o quanto de bom e de privilégio havia naquilo tudo, mas quando chegasse em casa, haveria de saber.

Arrumou o cabelo loiro mais uma vez no espelho da escada. Estava nervoso, muito. Finalmente estavam assumindo que aquilo ali era mais do que amizade e resolveram sair pra tirar a prova disso, mas não esperava estar tão nervoso. Chegou a praça de alimentação e de longe viu os cabelos arrepiados e negros, ele estava de frente ao painel de filmes, com algumas pessoas o observando de longe, como ele conseguia ser extremamente belo e simples não saberia dizer. Mas sabia estar extremamente apaixonado

O meu nariz e olhos coçavam horrivelmente, os nós dos meus dedos podiam ficar brancos de tanto que eu os apertava mentalmente, a energia no meu corpo era equivalente a 1,21 gigawatts. Minha cabeça girava, perdida, fugindo de todos os ícones de triângulo com exclamação vermelhos, numa tentativa desesperada de me estabilizar. Eu estava a um passo, a um mínimo passo, de romper com o tecido da realidade e do espaço-tempo. A quase 88 milhas de velocidade. Nesse caso, a realidade era a minha vida.

Eu ficava pálida ao ter que ignorar aquele caos. Os gritos incessantes, logo eu, uma pessoa silenciosa, apegada a calmaria... Até o ar estava pesado, o suor em meu pescoço me desesperava. A sensação de sufocamento, de que faltava pouco pra eu querer morrer outra vez. Tomei banho e fui. O abraço acolhedor, o cheiro, a rigidez da tez ao se comprimir ao meu redor de forma carinhosa, o riso ao me beijar de forma terna, os olhos castanhos... Eu morreria por aqueles olhos... Eles me recarregavam.

Deitou na cama, com os cabelos ainda molhados do banho, um erro rotineiro horrível, mas enfim... Abriu os status do WhatsApp. Um bom dia, uma amiga colocando tranças, um meme que fê-la rir momentaneamente... Estava terminando e aquilo afagando sua mania de limpar notificações quando chegou no último. Era o status de Matheus, um amigo de escola... Dizia no status: "Se ela não quis tem quem queira, a fila anda e o pai tá online, ONLINE". Seus olhos rolaram tanto que sentiu ter ficado cega.

O dia estava nublado, como não esperava pra uma época como aquela. Tudo havia passado rápido demais, até demais. Logo os preparativos para o Círio chegariam... Não era uma data que se importava, a bem da verdade, mas gostava por ser basicamente um feriado mais que prolongado. Ahh, as alegrias do Estado Laico com feriados religiosos... Ajeitou os óculos que haviam escorregado para a ponte do nariz, e sentiu o cheiro da brisa carregada de monóxido de carbono. O BD-87108 já ia longe. Sortudos.

As lágrimas desciam quentes, roliças e enormes. Ela não era assim. Tinha orgulho, quando criança, de cair e jamais chorar. De levantar e continuar em frente. "But I'm a sunflower, a little funny" Aquela música, tímida e singela, quebrava-lhe o coração todas às vezes. Não sabia o porquê de chorar tanto, mas era com certeza o estado que se encontrava. Não era perfeita, pra ninguém, nem pra si mesmo. Se sentia um girassol, nada como uma rosa, e isso magoava. Como espinhos encravados na pele.

Minha parede era vazia antes. Um marasmo de azul apagado e riscado, mas então me veio que nenhum mar é mar sem um veleiro, e era minha missão velejar naquele mar. Corri até a impressora agitada, a ideia borbulhando na minha mente e os barulhos sistemáticos. Quando saiu, eu logo colei fita dupla face em todas as extremidades e colei na parede. Agora era um mundo, um universo, algo a que me agarrar e seguir em frente. Era só olhar e a motivação vinha, assim haveria de lembrar de sua ambição.

Meu corpo estava quente, e eu estava ofegante. A mente anuviada não me deixava pensar direito, e eu só conseguia pensar o quanto o gosto na minha boca era bom... Aquela sensação adormecia minha garganta mas ainda assim eu não podia evitar. Fazia tanto tempo que não sentia aquela sensação... Limpei a lágrima dos olhos e tirei o termômetro da boca. 38,5°. A febre estava realmente forte. Espera, caro leitor, você pensou em outra coisa? Meu Deus, vai orar. Procure uma capela, um pastor. Eu, hein.

— Você tem certeza? Aquela pergunta fê-la tremer. Sua vontade era sair dali, mas conseguiu se conter, se controlar, era sua hora, treinou tanto pra aquele dia. Assentiu pra ele em concordância. As cortinas se abriram, estava mais ou menos cheio, e ela se dirigiu para perto do violoncelo. A orquestra só esperava o seu sinal, e ele veio, junto a uma lágrima solitária de felicidade ao ver que seu pai estava na primeira fila, olhando-a e incentivando-a. O dia era dos pais, mas o presente era dela.

Segurou o copo de dose, um tanto tímida e receosa, esperando a coragem bater pra virar enquanto seus amigos faziam o clássico coro de "Vira! Vira! Vira!". Respirou fundo, e virou tudo de uma só vez. o líquido queimou sua garganta de tal forma que quando chegou ao estômago vazio, ela sentiu, e sentiu forte. O grito dos amigos era ensurdecedor, e todas aquelas pessoas que moravam na vila deviam estar muito putas com todos eles. Mas foda-se, era seu primeiro shot de tequila, e não seria o último.

Pegou a pedra mais chata que encontrou, respirou fundo, tomando postura e, por fim, arremessou. A pedra deu dois saltos, no segundo fraquejou e afundou. Procurou outra, achou uma de aspecto escuro e liso, com leves pontos de seixo, parecia perfeita. Tomou postura novamente e atirou, a pedra deu dois saltos novamente, e no segundo, afundou. Bem, talvez nunca chegasse a três, talvez não fosse pra ser. Sentou-se na beira, onde a água molhava levemente sua roupa. Talvez ela lavasse sua tristeza.

Checou mais uma vez o cabelo, ele teimava em ficar embaraçado e cair pro lado. A roupa era extremamente "não-ele", preferia algo mais jogado, talvez um moletom escrito "impeachment for vegetables, pizza for president" e tudo mais. Mas gostava dela... E esperava que tudo desse certo. Dobrou o corredor e entrou na 1-A, deparando-se com ela... Beijando uma loura alta. Quando sua ficha caiu, aproximou-se e disse: — Bia? — Oi, Caio. Como tá? Quero que conheça minha namorada, Alexa. Riu a contragosto.

Passou a mão pelas mechas do cabelo a tão conhecido, e sentiu os nós formados. Por quê? Isso deixava seu corpo amolecido. A preguiça abatia seu corpo outra vez, e mais e mais nós surgiam... A umidade em sua cama por deitar de cabelo molhado já era sentida por sua bochecha ao repousar o corpo outra vez sobre o móvel. — Amanhã eu penteio, juro que penteio...—disse já fechando os olhos. Isso com certeza lhe custaria muito pela manhã, o que queria dizer alguns chumaços de cabelo, mas ela já dormia.

Passou a mão pela testa, estava quente e úmida. Trouxe os dedos a vista e o sangue rubro pintava as pontas dos dedos, como um pincel recém manchado. Não deveria ter feito isto, seu amigo esguio já tinha lhe dito isso, mas mesmo assim teimava. Engraçado é que fazia o mesmo com as feridas internas, não as deixava sarar, cutucava sempre que podia e quando estavam prestes a fechar, rasgava-as de novo e elas voltavam a sangrar dentro de si. Talvez seu amigo brigasse sobre isso se soubesse... Talvez.

Eu poderia passar horas no seu colo sem perder a maciez do seu toque ou entediar-me. Teus cabelos ondulados lembram-me as ondas do mar a beijar-me o corpo. Seu rosto tem a maciez de uma cama a qual a colcha foi trocada recentemente. Teu hálito quente por sobre o meu resfresca-me a vida, e me faz sentí-la arder. Seus olhos são a porta de um abismo doce que atraem-me ao infinito indegustado, o qual me deleitaria até o inadiável fim. Você é a prova de que o universo ainda sabe fazer maravilhas.

Minhas mãos passearam em seu corpo, o cheiro de seu cabelo era o mesmo, os sentimentos que ele tinha eram uma bagunça. A nuca dele era quente, os fios macios se enroscavam pela minha mão... Era confuso, tão confuso quanto o "o que está fazendo?" dele, minha única reação foi dizer "não é com você", mas era também. Afinal, quem me abraçara no fundo do lago fora ele, e também quem me agraciou por estar viva também fora ele. Aragorn era um rio dourado de incertezas, seus olhos eram apenas o portão.

Eu estava literalmente me matando em Tic Tac. Nós já tínhamos levado o outro laranja, e agora comíamos o branquinho. Eu estava nervosa, se Gabriel estava levando dano... O que seria de nós? Eu não tinha mais unhas pra roer, nem cerveja pra tomar, as conversas sobre classes e modificadores ribombava a minha volta, e Raffa de pé descrevendo tudo que ocorria. Meus cabelos ainda úmidos transmitiam o que eu queria fazer, será que conseguiria? — Kallel, o que é que tu me olha? — Ahhh tá. Entendi. Riu.

Mordi a torrada, sentindo o suave gosto da geleia de morango e o pão torrado quebrando na minha boca. Eu não gostava de torradas, na verdade. Achava elas secas... E por isso sorvi um pouco do capuccino já morno por eu ter demorado a bebê-lo, mas estava bom mesmo assim... Até porque eu não gostava de capuccino. Eu odiava café, ele deixava as pessoas viciadas, mas mesmo assim-... — Não era tu que não gostava de café, lindinha? E nem de torrada, pelo que eu lembro... — É diferente com você...

— Tá, isso foi uma merda. — Eu concordo com a Ynarthian — disse Hygor, ainda refletindo. — Ah, gente, qual é! Não foi tão ruim assim — disse Raffa, otimista demais. — Eu acho que teve partes legais, e algumas partes meio meh, mas ainda assim foi legal — disse Luke, mexendo em seu Porcophone. Nunca teria nome tão legal de telefone quanto esse. — A questão é a seguinte — disse Gabriel, se levantando — vocês colocaram hype demais na morte dela, foi isso. Fiz um bico, odiava quando ele tava certo.

Respirar. Parecia um ato simples, a princípio. Mas não agora, não naquele momento... As grades estavam fechando, e ela estava dentro. O quadrado com a fechadura na parede parecia sempre o segredo de suas angústias, mas a chave ao seu lado não o abria, nunca cabia. Sempre quando dormia, ela mudava de forma, ora pequena demais, ora grande demais. Não importava agora, de certa forma... As grades se aproximavam pra despedaçá-la, a essa hora já estava dormente. E tão automático como o começo, o fim.

Se tinha uma coisa que odiava era permanecer com um gosto na boca que não fosse o de seu creme dental. Ainda que fosse de alguma comida gostosa, ir imediatamente pro banheiro escovar os dentes era fato, saboreando a sensação de ter o gosto de menta e a boca limpinha outra vez. Andava com pastilhas e balas pra todo canto, nem sabia quando aquele vício tinha começado ao certo. Mas as coisas mudavam quando o beijava. Era o gosto dele, não tinha gosto de menta, mas era tão viciante quanto...

Os entalhes na madeira do arco eram difíceis de fazer, mas não pra ela. Sempre fora cuidadosa... Sentiu a movimentação mas não levantou os olhos, concentrada. Ninguém tinha aquela suavidade, ainda mais usando um manto pesado como aquele, um cajado e um grimório! Ele vivia com aquele grimório, pra cima e pra baixo como um estudioso nato. Seria mais forte do que Gringor um dia, disso ela sabia. — Há mais de leitor em ti do que magias para aprender, Gungnir... Ele lhe deu um sorriso.

Era sempre daquele jeito. E eu amava. As minhas mãos suavam com aqueles míseros, surrados e exatos três papéis. Olhei de novo as informações que continham ali... +3 de modificador de destreza. Ouço a voz que sempre tira o doce da minha boca no final de todo sábado e domingo... — E então, o que vai fazer? — Eu quero subir na árvore, dar um mortal e atirar três flechas nos gnulls. — Tá, tu não pode fazer isso. — MAS QUE PORRA! POR QUE NÃO? — Porque tu precisa de mais level. — Eu te odeio, Raffa.

Um passo de cada vez. • Stuff, Stuff, Stuff • Eles tinham um barulho engraçado quando chapinhavam na água. • Stuff, Stuff, Stuff • Todo mundo já havia avisado para não fazer isso. • Stuff, Stuff, Stuff • Se pulasse da borda, o que aconteceria? Seria igual aquele Agosto tenebroso? • Stuff, Stuff, Stuff • "Porque o medo de altura não é o medo da queda, e sim o medo de finalmente se jogar de lá" • Stuff, Stuff, Stuff • Sentou-se no final da cachoeira. Não tinha um porquê. Mas gostava.

Os cabelos estavam desgrenhados. Emaranhados. Ele nunca penteara seus cabelos. Mas ajudou-a a passar hidratante uma vez... E leu uma fanfic a qual ele próprio não tinha interesse. Juntos assistiram Bandersnatch, e viram a garoa descer sobre eles com uma garrafa de champanhe na mão, enquanto DinDin da Ludmilla tocava em alto e bom som para aquela multidão vestida de branco. E esperaram uma pizza... que parecia mais gostosa que todos os combos de biscoito que haviam comido. Ele faria falta.

É incrível como pra alcançar sonhos, a gente tem que abdicar de algumas coisas. Eu sinto falta de escrever, do cheiro da tarde às 18h, de dobrar a esquina da minha casa enquanto está claro... De ouvir os risos dos meus amigos sábado a noite. De simplesmente não dormir de madrugada. Coisas tão pequenas, mas custosas. Tão custosas. Valiosíssimas.

— Mas e se eu não gostar? — Você nunca vai saber se não ler. — Mas a gente nunca ouviu falar. E se a gente comprar um que a gente já leu? — Qual o sentido de comprar um livro que já se leu? — Ficaria bonito na minha estante. — Mas ele só ficaria lá pegando poeira. — Mas eu poderia emprestar pra alguém ler e assim fomentar a leitura. — A gente não conhece ninguém que lê. E quem a gente conhece não gosta de ler. — ... — ... — E se a gente comprar um livro que a gente já conhece? — Simplesmente não

Sentimento confuso, desespero. Erroneamente difundido como quebrador de taças, atirador de jarros, lágrimas com soluços e intermináveis gritos. Porém, ele não é assim. Você pode estar com a face mais serena do mundo e incandescente por dentro. E é perigoso. Uma hora, você pensa em fugir, outra, em caminhar sozinho até seus pés sangrarem. A morte é apenas uma das possibilidades. Então sugiro que preste atenção, muita atenção. Só é preciso um segundo de coragem, de ímpeto, e tudo acabou.

Injusto nosso mundo e sina, pintados a nanquim. Todo bramidos e endrôminas, datado a morte com seu triste fim. Porém, contrariamos qualquer ruideza. Todo amargor e destempero. Eu, por ti, me apaixonei. Como soube? Ó, que aspereza. Mas ainda assim, lhe digo. Notei todas as coisas acima. Por mais recorrentes que possam parecer, não tiraram o brilho que ao final do dia, teu sorriso traz pra mim.

Talvez ficar sozinha não seja o problema. Talvez, na verdade, seja a coragem. Irônico coragem ser justamente o motivo que cause medo. Medo de ficar sozinha, medo do acesso as coisas que tenho, as múltiplas possibilidades que tenho que só precisam de um pico de coragem. É só disso que eu preciso. Coragem Não quero, mas preciso. E é minha culpa. Está ali, o tempo todo, me dizendo que é o certo a fazer, que seria mais fácil, que seria mais conveniente. O problema sempre foi o medo. E eu. Sempre

Eu odeio manhãs. Sempre odiei, só as via se virasse a noite, e quando chegavam, eu já estava passando mal e com os sentidos totalmente aflorados e doentes sem oxigenação que só a falta de sono pode proporcionar. Porém, é diferente com as conversas de parede. Eu acordo feliz, ouvindo a voz que foi por tantos anos privada de mim. Sinto pelos dias que vão ser arrancados de mim, mais brevemente do que eu gostaria. Todas as suas histórias são incríveis. Como não pode ter nenhuma comigo? Dói. Muito

Gostaria de dizer que lembro de você. E não é tipo lembrar seu nome, seu aniversário, seu lanche preferido. Não, não é isso. É tipo, ter sentimento. Não há mais nenhum. Doido, né? Logo eu, que amava você mais do que tudo. A gente vê por aí sempre "Aí, fulano ama beltrana até hoje! Nunca esqueceu dela, acredita?" Eu esperava isso. Esperava sofrer, por muito tempo mesmo. Mas não rolou, não. Acho que às vezes a vida serve uns refrescos, né? Não amar você é muito aliviante. Mais do que beber.

Sabonete de menta. Eu adoro sabonete de menta. Até agora eu não sei se costuma olhar quando eu passo, sabe que é uma coisa que nunca notei? A mania de jogar água e espuma em mim é algo que me faz rir todas as vezes. Penso que não quer que eu o abandone, penso que quer que eu fique. Eu pretendo ficar, juro pra você. Pretendo sim. Até o dia que queira que eu vá, até o dia que me fizer ir. Aí então partirei. Mas enquanto eu anseio que esse dia nunca chegue, eu sinto seu cheiro de banho tomado.

Foi num dia calorento de Outubro. As pessoas começavam a se aprontar pro Círio, maior procissão religiosa da Amazônia, os transeuntes apressados, os ônibus e carros com suas buzinas incessantes , qualquer um com uma garrafa de água era um privilegiado. Quando as redes sociais caíram, achei que poderia ser apenas um atraso no trabalho. Tudo mudou quando, no meio da Baía do Guajará, emergiu uma árvore. Era enorme, frondosa e no topo, carregava as águas cinzentas com uma vitória-régia, tudo mudou.

Atroz aqueles que ousam viver livremente. Os que arrotam aspereza, veneno e dissabores. Loucos, embriagados de vaidade e luxúria. Submersos em um vazio tremente, autoflagelante e afogador de lágrimas salgadas e insólitas. Mal sabem que a paz advém do interior.

Estou a treze horas rindo. No começo, eu estava rindo do que me levou até essa situação. Talvez os abetos, árvores assustadoras, aquelas. Grandes, enormes. O sangue nela, meu sangue, me assustou também. O homem correndo com a faca e as calças folgadas também me assustou. Será que eu sou muito medrosa? Ou talvez fraca. Fraca pode ser também. Pelo menos a força faltou quando eu peguei a pedra e arremessei no rosto dele, e faltou quando apunhalei-o diversas vezes. No sanatório, tudo falta. É amargo

Faz tempo. Muito tempo. Meu coração, que eu imaginava destroçado depois que você se foi... Um coração enlatado, eu diria. Disperso em todos os cantos, intenso em todos os enlaces... É. Eu supunha que ele enferrujara as próprias engrenagens, sabe? Falta de óleo faz isso. Falta de amor faz isso. Mas o que é amor? Eu sabia o que sentia. Mas não recebia mais de você, e mesmo assim, meu coração está vivo. Ou seja, meu coração não bate por você, nunca bateu. Eu apenas te dei importância demais.

A velha dor nas costelas por carregar coisas demais. A dúvida se descia e pegava um ônibus com ar condicionado mais seguro ou não. Decidiu que não. Queria vê-lo o mais rápido possível, mas também estava em dúvida se ia vê-lo ou não. O auge, como havia pegado o hábito de dizer. O caminho longuíssimo, os três garotos estranhos na porta do meio. Enfim, retornar a faculdade, ainda mais em um turno novo, era cansativo. Mas era apenas o começo. E esperava ser um começo bom. Seria um ledo engano?

Há coisas que me deixam em tela time's up. Digamos que eu goste muito de algo, mas o tempo daquele algo acabou. E então eu continuo lá, o sabor já está levemente alterado, e eu permaneço. Passa um tempo a mais, e continua rançoso, até que depois, eu percebo que não é o mesmo gosto, está mudando. Tá me fazendo mal já. E então olho pra coisa outra vez, o que me dava água na boca, e vejo que não foi ela que mudou. Continua o mesmo. A mesma cobertura, o mesmo recheio, tudo. Quem mudou foi eu.