Notas: Olá pessoas! Estou postando essa destiel para o desafio do sítio do pica-pau amarelo. Meu conto é uma adaptação da lenda da Iara a sereia do rio. Espero que vocês gostem <3
Deveria ser seu décimo suspiro em menos de dez minutos. A bebida já meio quente descia por sua garganta com dificuldade. Seu corpo suava com a adrenalina correndo por suas veias e em seu rosto havia um sorriso forçado para não preocupar quem estava ao seu redor.
Já fazia cerca de dois dias que estava na floresta amazônica, sofrendo com mosquitos e a chuva insistente, mas hey… Tradições de família!
Todo ano, desde seus dez anos, seu pai levava ele e seu irmão para caçar no meio do matagal. O velho insistia em dizer que caçar ligava eles com sua masculinidade e um monte de outras besteiras que ele sempre colocava no discurso quando Dean resolvia reclamar sobre a viagem, outro evento anual.
Não era como se não gostasse realmente de passar aquele tempo com seu pai, afinal o homem não era a pessoa mais comunicativa do mundo, Dean havia puxado isso dele, e ir caçar acabava ajudando no relacionamento entre eles, mas o loiro não aguentava mais os mosquitos, a chuva e os rituais de sempre… Sim, rituais.
Eles sempre chegavam no local dois dias antes da caçada. Encontravam com o Bobby, amigo de seu pai e caçador local. Iam até o bar, uma construção que era sustentada por madeiras sólidas acima do nível da água, e passavam o dia tomando bebidas e azarando as mulheres dali. Dean sempre riu do modo como Sam dizia como aquilo era ridículo, todo ano as moças ouviam as mesmas cantadas baratas.
-Sam, meu filho - dizia seu pai toda vez, virando mais uma lata de cerveja - Enquanto houver sereia que caiam na minha rede, eu vou continuar a jogá-la.
Dean sempre ria da maneira como Sam enfezava o rosto para estas palavras. Sam agora era um homem, já ia completar seus vinte anos, e sempre foi uma pessoa muito diferente de seu pai. Isso acabava causando bastante conflitos familiares.
Os pais de ambos se separaram quando Sam tinha dez e Dean quatorze. Já empurravam o casamento com a barriga há muito e decidiram finalmente dar fim aquela relação fracassada e continuar amigos, porém Sam, como a maioria das crianças, não aceitou bem aquela situação e acabara culpando o pai pelo ocorrido. Hoje, já mais entendido, ele não destrata o homem como antes, muito embora também não seja um grande fã de passar tanto tempo ao lado deste, mas aceitava ir na caçada, sabia que o pai insistiria mesmo que ele dissesse não.
Ainda assim, Dean sabia que Sam era tão fã daquilo quanto ele próprio.
Então, como acontecia anualmente, os bêbados se sentavam e contavam as nativas histórias. As lendas urbanas que o pessoal que não pertence a este tipo de região taxa como folclore, mas que para eles era uma crença. Todo ano eram novas aparições como curupira, o menino demônio, ou o saci e seu tornado. A melhor de todas para Dean era cuca, essa sim era coisa de louco. Uma feiticeira com cara de jacaré, vê se pode!
Dean não acreditava em nenhuma daquelas besteiras, mas tentava respeitar. Ele nunca entendeu os porquês dos moradores serem tão ligados aquele tipo de lenda, era besteira para amedrontar as crianças. Chegou até confrontar Bobby quando era mais novo e só conseguiu uma resposta do homem:
-Isso aqui é deles, garoto - dizia o homem observando a floresta - Se estamos aqui é porque eles permitiram, não pense que é mais esperto porque chegou agora, eles estão aqui há muito mais tempo que nós.
Dean não mais respondeu depois daquilo, nem mesmo voltou a argumentar seus motivos para não acreditar. Apenas preferiu aceitar que a maneira como eles pensavam era diferente da sua, que a cultura deles era diferente e por isso que para si era difícil de acreditar.
No fim, ele via todos os homens e mulheres do bar beberem até cair. Via seu pai dormir no chão do bar e acordar sem saber nem mesmo o próprio nome, para segundos depois rir e lhe dá um empurrão dizendo que já havia acordado. Eles venciam a ressaca e começavam a se preparar para caçada.
Arrumavam as mochilas com o que mais iam precisar, facas, cordas… Com o tempo acabaram aprendendo como usar recursos naturais para fazer a própria barraca ou flechas para os arcos. Levavam alguns potes de comida para facilitar a estadia no acampamento.
A parte que Dean mais odiava na aventura era a trilha na chuva. Naquele dia, no entanto, havia chovido muito no dia anterior, por tanto, a previsão é que estive parcialmente nublado o dia todo.
Chegaram ao ínicio da trilha mais cedo do que imaginava, geralmente eles demoravam bem mais arrumando as coisas, não por falta de prática, mas sim porque a ressaca acaba letargiando o processo. Dean acreditava que quanto mais anos bebendo mais resistente a pinga o pinguço ficava.
Como manda a tradição eles levaram fumo e pinga para floresta, deixavam no encosto de uma árvore e pediam permissão para os protetores da floresta para poder caçar no local sem problemas. Todos deveriam pedir, e todos sabiam as regras, se assim os espíritos permitissem não poderia haver caça as fêmeas prenhas. Naquele ano, porém, Dean revirou os olhos para o ato, ele já se sentia cansado de ter que pedir algo para alguém que nem existia, que era só fruto de crianças que cresceram perturbadas por aquelas histórias.
Ele deixou sua contribuição, já que já estava com ela, mas não rezou, nem mesmo em pensamento, para que os tais espíritos liberassem a permissão. Se era para castigá-lo já deveriam ter feito anos atrás, já tinha muito tempo que vinha até a floresta e matava os animais que ali viviam. Se existisse de verdade quem os protegesse, alguém os avisaria das armadilhas e os salvaria da morte, mas isso nunca aconteceu.
-Vamos andando, precisamos chegar à margem do rio antes do anoitecer - seu pai olhava para o caminho de lama enquanto começava a trilha - Cuidado onde pisa.
O caminho foi complicado, havia muita lama, tantas partes derrapantes que Sam e Dean chegaram a cair algumas vezes em meio a superfície molhada e suja. Havia muitos galhos grandes caídos ao chão e a todo momento eles deveriam olhar para não pisar em formigueiro ou acabar se deparando com uma cobra pronta para o bote, tinha muitas por ali.
Chegaram à margem do rio no entardecer do sol. Sam gritou um “aleluia” e retirou as roupas para poder se lavar no rio. O rapaz nunca foi de gostar de um pouco de sujeira na pele, nem mesmo quando criança, então era de se esperar que ele estivesse louco para se livrar daquela lama em sua bunda.
Enquanto isso Dean, John e Bobby arrumavam madeiras e grandes folhas para montar as barracas naturais e a fogueira para a noite. Como os três já estavam acostumados a fazer esta tarefa não demorou muito, quando escureceu já estavam com tudo pronto, só restou se sentarem ao redor da fogueira e comer o que haviam trazido nas mochilas.
O fogo iluminava o local irradiando uma luz alaranjada. Bobby abria mais uma lata de cerveja despejando o inicio da bebida no chão, o caçador é um homem muito ligado a cultura indígena e suas crenças, ele servia aos espíritos e se conectava com eles e com as forças da natureza as recepcionando em qualquer ambiente. Dean nunca conheceu um homem que tivesse mais histórias para contar do que Bobby.
-Então eles ouviram um grito de uma criança ao longe - a fogueira iluminado apenas metade do rosto de Bobby, deixando seu aspecto mais sombrio - Seguiram as pegadas deixadas no chão mais acabaram se perdendo, quando isso aconteceu só o que conseguiram ouvir foi a risada escrachada do curupira - bebeu um gole da bebida - Vou dizer a vocês: Que criaturinha encapetada! Por isso que se deve sempre agradá-los antes de entrar em suas terras...
-Mas você mesmo não já foi pego em uma dessas “brincadeiras” - perguntou Sam - E você sempre pede licença.
Bobby sorriu afirmando com a cabeça.
-Quando você bate na porta de alguém ela tem o direito de não atender - explicou de forma simplista - Eles sempre fazem o que acham melhor para floresta, algumas vezes para eles mesmos, mas o importante é se ter respeito para conseguir ser respeitado de volta.
-Mas você já conseguiu ver algum deles? - foi a vez de Dean perguntar - Quer dizer, as pessoas têm teorias de como eles sejam, mas ninguém nunca disse que conseguiu ver de fato.
-Eu apenas ouvi suas vozes, vi o vulto avermelhado que a caipora deixa, mas ver de fato e me comunicar diretamente… - balançou a cabeça em negação - … Nunca.
Dean não se sentiu muito feliz com a resposta, não tem nada que comprove a existência dessas criaturas a não ser as histórias de um velho bêbado e louco.
Quando finalmente estavam se preparando para dormir, Dean se manteve um pouco mais afastado. Gostava de observar as estrelas, o céu da floresta era bem mais limpo que o da cidade, era de tirar o fôlego. Quando viu todos já estavam dormindo, deu de ombros, sempre foi o último a dormir graças a seus problemas de insônia.
Se passou bastante tempo desde que ele refletia sobre sua vida olhando as estrelas, mas foi com um bocejo que ele resolveu que era hora de entrar no abrigo natural e dormir.No entanto, quando se levantou para ir se deitar escutou uma voz. Uma bela voz.
Dean parou seus pés no exato momento em que ouviu. A melodia bonita de uma canção que ele não sabia reconhecer, só sabia que gostava da música, gostava muito. Por vontade própria seus pés fizeram o retorno, se dirigiam agora para o rio.
O canto ia se afastando conforme os pés de Dean se guiavam por ele. O loiro adentrou um pouco a floresta, não conseguia mais raciocinar para onde, ele simplesmente não raciocinava, só existia aquele canto em sua cabeça.
Atravessou o mato sendo arranhado por alguns galhos e espinhos, se sujando por completo de lama, mas isso não importava. Só parou quando se deparou com uma cachoeira, estranhou por um instante não ter ouvido o alto som da água, mas o pensamento durou um segundo já que o canto voltará a tomar conta de seus sentidos.
“Dean...” - dizia a voz - “Você veio, Dean!”
Seus olhos se guiaram em direção a voz hipnotizado se deparando com o homem recostado em uma grande pedra no rio, com apenas metade do corpo para fora d’água, seu corpo parecia irradiar luz, seus olhos eram intensamente azuis com o cabelo preto, molhado, caindo sobre eles de forma sensual.
Seu corpo ficou quente de repente, houve uma vontade incontrolável de se aproximar daquele homem. Uma vontade insana de querer tomá-lo para si e… E beijá-lo e mais, muito...Muito mais!
Assim que deu seu primeiro passo em direção a água sentiu seu corpo estremecer, as pernas bambearem sem muito controle andando cada vez mais rápido para alcançar o homem dentro da água, mas quando seus pé finalmente tocaram a superfície aquática extremamente gelada pareceu haver um choque em si que conseguiu fazê-lo recobrar um pouco da consciência. tão rápido quanto chegou a beira do rio ele se afastou.
-Quem… - iria perguntar, mas sua cabeça processou as informações e num instante tinha a resposta para a própria pergunta - Iara…
Se lembrava bem da lenda. Iara era uma guerreira indígena que provocava inveja em seus irmãos que tentaram assassiná-la, mas acabaram sendo mortos pela mesma em combate. O pai furioso a jogou no rio para morrer. Iara foi salva por uma magia aquática que a transformou em metade peixe. Buscando vingança seduz os homens e os afoga no fundo do rio.
Nunca pensou que ela fosse de fato real, mas ali estava ele, sendo preso pela armadilha do canto da sereia, ou neste caso tritão.
“Eu tenho muitos nomes, Dean” -a voz na verdade soava em sua cabeça - “Mas neste momento, eu sou o que você mais deseja”
-Fique longe de mim! - ordenou ouvindo a risada soar em sua cabeça, enquanto o homem na água olhava penetrante em sua direção, sorrindo.
“Você reconhece este corpo? É curioso, geralmente eu assumo a forma de uma mulher, com seios bem fartos, mas não há seios dessa vez”
Dean se lembrava bem daquele corpo, daquele cabelo e, principalmente, daqueles olhos azuis. Era Castiel, seu amor bobo do colégio na adolescência.
Enquanto seus amigos viviam atrás de garotas, não que ele não se interessasse por elas também, ele vivia com a mente presa naqueles malditos olhos azuis. Nunca teve coragem de dizer ao rapaz como se sentia, e agora ali diante dele estava seu amor reprimido do colegial.
“Castiel” - disse a voz - “Você tem boas memórias dele, mas não posso dizer o mesmo dos desejos… Seus desejos são bastante sujos, Dean…”
-Pare… - interrompeu - Pare! - gritou
“Não quer saber como seria? Como seria beijá-lo, toca-lo, senti-lo… Ahn Dean, seria tão bom…”
Os pés de Dean deram passos para frente, enquanto suas mãos se agarraram aos fios de seu cabelo os puxando com força na tentativa de fazer seu corpo acordar.
“Não adianta resistir a mim, meu amor, você me quer, tanto quanto eu quero você!”
-Não - berrou na tentativa de encobrir a voz em sua cabeça - Você não é ele...Você não é o Castiel… - disse a si mesmo.
O canto do, até então, tritão começou a soar em sua mente, de repente ele estava no pátio de sua escola, anos atrás, com seus amigos e… Castiel, bem do outro lado do mesmo pátio, sorrindo para ele da maneira doce que fazia seu coração parar um batida.
Seus pés foram até ele, atraídos por aquele sorriso e por aqueles lindos olhos azuis. Como queria dizer para ele o que sentia, como queria poder estar com ele como gostaria, saber o gosto daqueles belos lábios carnudos que eram seu maior alvo de desejo.
Quando finalmente chegou em Castiel, não mais sentia-se respirar, de primeira pensou ser de nervoso, então ele não conseguia falar. Desesperado agarrou nos braços de Castiel, mas este apenas sorria de forma doce para si, envolvendo suas mãos ao redor de seu rosto e se aproximando lentamente.
-Dean - ouviu nitidamente a voz do rapaz - Eu te amo tanto...
Não!
Aquele não era Castiel. Seu Castiel se preocupava. Seu Castiel nunca teria coragem para beijá-lo assim, muito menos no meio do pátio. Seu Castiel não era assim!
Quando recobrou a consciência já estava no fundo do rio, sendo preso por aquele rabo de peixe, enquanto que a verdadeira Iara lhe encarava. A índia debaixo d'água agora era uma caveira presa à uma maldição, não havia mais beleza, nem mesmo mais carne. Não havia escapatória, já não tinha mais ar em seus pulmões, suas forças já tinham deixado seu corpo.
Antes da morte, por um momento, voltou a ver Castiel ali consigo. Deixou-se ser enlaçado e beijado pelo homem que amava, realizando seu mais profundo desejo antes de se entregar de vez à inevitável morte.
Notas finais: É isso! Deixem seu lindo comentário e façam dessa autora muito feliz <3
Obrigado pela leitura!
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