Saudade é quando o coração corrói por dentro. Corrói dolorosamente, até que reste a dormência. A indiferença em alguns casos. Ou na dor e no poder de um adeus. É quando, em cada batimento, ouve-se um eco profundo. Um eco daquilo que falta. Daquilo que em algum momento não será assim tão fácil de definir. É pulsação que jamais sangra. Mesmo diante de tanta dor. É a parte que falta. A parte que já fez parte e hoje se parte. Em pedacinhos, todos silenciados diante da queda. É esquecimento. É forjar a se esquecer, ao mesmo tempo que se lembra. É o silêncio de uma noite de luto. Uma noite longa, fria, demorada, corroída pela boca que cala. Daquilo que não se suporta, não se admira, não se preza e somente se humilha. Saudade é telefone fora do gancho, é chamada perdida, é a mensagem nunca recebida. Saudade é quando se sente muito sem ter nada. Um nada de tudo. Um nada ausente, descontente. É o desprazer da jornada. É quando não se tem palavras suficientes para explicar, é quando momentos esvoaçam e vão embora. O pó de todas as coisas. Partículas que o tempo se encarrega em carregar e levar para longe. É quando se perde o valor do que um dia foi, do que um dia pôde-se se contar. É quando as coisas já não são mais as mesmas. Porque um dia se foi, mas não há mais importância. É adeus sem despedidas. É mágoa guardada. É sentir falta daquilo que não se viveu, ou de quem nunca se conheceu. É tipo um abraço que não é mais caloroso, o aperto de mão folgado. É quando o inimigo é o seu melhor amigo, mesmo inventando-se um. É chamar pela mãe e ela não estar lá. É sentir saudade de um pai ausente. É noite fria de verão e noite quente de inverno. É escuro. Pálido. Vazio. É grito de silêncio. Porque lá, lá não tem ninguém. Só você a murmurar, a ficar quietinho. Na sua. Em voz alta. Aos gritos. E quando grita, teimam em não ouvir. Porque só faz parte ali, naquele corpo a envelhecer. É onde há medo. Um corpo com medo de ocupar espaços que nunca deverão ser seu por puro medo. Medo de sentir saudade. Medo de olhar na cara. Medo de procurar. De mandar uma mensagem. De pedir perdão. De ligar de volta. De iniciar a conversa. De responder. De questionar. De recomeçar. E tentar de novo, até se realizar. É torcer contra. É gol não marcado. É azar. E vai abrindo um vazio imenso, a engolir corpos e formas, fluidos e cicatrizes. A sempre restar nada. Nada que um dia foi tudo. Tudo que se é nada. Pois nada existe no que se é vazio. Só o eco de tudo. E o eco é só um eco que ecoa na solidão, no aperto da falta de escolhas. Escolhas jamais escolhidas por não saber o que realmente é escolher. No conflito das coisas que faltam. E vão faltando até a gente ser completamente consumido. Até virarmos pó debaixo dessa terra cheia de saudades. Cheia de sonhos que se foram ou que nunca vieram. É onde a esperança finda. É onde se é cheio de quem se foi, de lágrimas que secaram, apodreceram em terra, de quem se consumiu pela saudade ou até mesmo solidão. Ambas vêm juntas, a carregar o fardo que é viver. Viver de. De algo que talvez nunca virá. Daquilo que se faz silêncio. Daquilo que se faz inteiramente saudade.
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