mschneider21 Margot Schneider

Estraído do livro Estórias que a Escola se Esquece de Contar - O Brasil - Conto 6: A divertida história conta o porquê e como a família real portuguesa fugiu para o Brasil em 1807. A viagem foi um horror! No final do texto um teste é apresentado para que você teste seus conhecimentos.


Não-ficção Todo o público.

#fuga #Majestade #Família-real #Napoleão #brasil #Nau #louca #louco #chantagem #portugal
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A nada majestosa fuga de Sua Majestade

“Covarde: alguém que, numa situação perigosa, pensa com as pernas.”

Ambrose Bierce


Talvez você já tenha vivido a experiência de ter que mudar de casa e deixar para trás seu antigo quarto e os amigos da vizinhança. Ou quem sabe mudar de escola, se afastar dos colegas da antiga escola e fazer novos amigos? Mas imagine se você tivesse que mudar de país e para um país do qual você não conhecesse nada a respeito!!!

Agora faz de conta que você não vive no ano corrente (o ano de agora), mas vive no ano de 1807. Seu nome é João, você tem 40 anos, e você é um príncipe regente de um reino próspero (rico).

O verbo “reger” significa “governar”. Portanto um “príncipe regente” é um “príncipe que governa”. Se você fosse apenas “príncipe” você não seria chefe de nada, teria que esperar, talvez um dia virar rei para governar.

Mas se você é quem governa seu reino, por que é que você não tem o título de “rei”? Porque a senhora sua mãe, a Dona Maria, está viva e é ela por direito quem deveria governar. Ela, a sua mãe é a rainha.

Mas se ela é a rainha e está viva, então por que é que ela não governa e sim você é que deve assumir as responsabilidades de um governante ainda que só seja príncipe? Porque a rainha Dona Maria, sua mãe, está louca! Exatamente. Sua mãe tem mais de 70 anos e desde que perdeu seu filho primogênito (o mais velho), chamado José, ela ficou tão triste que não “regula mais bem da bola”. Então, além de passarem a chamar a rainha de “Dna.Maria, a louca”, acharam por bem, que o segundo filho dela, “você”, se tornasse o chefe do reino e portanto você passa a ter o título de “príncipe regente”.

Nesse “faz de conta” você se casou muito cedo, com mais ou menos 18 anos e com uma menininha espanhola de nome Carlota Joaquina, com apenas 10 anos. Levou alguns anos, mas os filhos apareceram. E agora, em 1807, você está com 40 anos, sua esposa Carlota está com 32 e vocês têm oito filhos que também são princepezinhos. São eles: Maria Teresa com 14 anos, Maria Isabel com 10 anos, Pedro com 9 anos, Maria Francisca com 7 anos, Isabel Maria com 6 anos, Miguel com 5 anos, Maria da Assunção com 2 anos e Ana de Jesus com 1 ano.

Seu reino há muitos anos faz grandes negócios com um outro reino que se chama Inglaterra, cujo rei se chama Jorge III e é também conhecido por “Jorge, o louco”. Naquela época o que mais havia eram reinos com reis e rainhas loucos.

Neste mesmo cenário, há uma terceira figura p’ra você agora imaginar. Um imperador muito, muito poderoso e ambicioso (alguém que quer quer conseguir alguma ou várias coisas). Falamos de um corajoso general que tomou conta (se apropriou) do reino chamado França e se coroou por decisão própria, imperador daquele reino. Não satisfeito com o pedaço de terra que ele domina, ele passou a invadir todos os reinos vizinhos. O reino dele se chama França e seu maior inimigo é o reino chamado Inglaterra, onde manda o Jorge III, o louco. O nome desse imperador da França é Napoleão Bonaparte e como ele anda invadindo todos os reinos vizinhos ao seu, você começa a ficar muito preocupado.

Um rei manda em um reino. Um imperador é “o senhor”, manda em um império, que é formado por vários reinos. Como esse rei da França invadiu um monte de outros reinos, ele achou por bem se nomear imperador.

Napoleão tem um exército enorme, com muitos mais soldados do que você e cada um de seus soldados muito mais bem treinado que os seus soldados. Se ele resolver invadir também o seu reino, tudo pode acontecer. Ele certamente o destituiria do seu posto (tiraria você do seu posto de rei), e poderia até colocar você e sua família em uma prisão ou quem sabe até fazer coisa muito pior.

Um dia esse imperador diz pra você que ele não quer mais que você faça qualquer negócio com o reino do Jorge III, o louco. Oras, seus negócios com a Inglaterra são coisa antiga e você está contente com o resultado. Além disso, você não tem nada contra o Jorge. Ele pode ser meio biruta, mas é seu antigo parceiro comercial (de negócios).

Você não quer ceder à vontade do Napoleão, mesmo porque, a Inglaterra, do Jorge, também é um reino muito forte, com muitos navios e soldados e eles poderiam facilmente ficar com raiva de você e partir para briga também se você disser que não vai mais vender qualquer coisa pra eles ou comprar qualquer produto deles.

Você tem um outro reino, bem longe de onde você mora. Esse segundo reino é muito grande, mas você sabe muito pouca coisa sobre ele. Você nunca esteve lá, só sabe que ele realmente existe, que não há praticamente nada nele, porque ele é uma terra há pouco tempo descoberta portanto há pouco tempo é colonizada e você sabe que seu ameaçador vizinho jamais iria até lá pra importunar você ou sua família. O que você faz?

1 - Obedece direitinho o que o imperador Napoleäo mandou você fazer?

2 – Corta relações com o tal imperador Napoleão, mantém a amizade e os negócios com o Jorge III da Inglaterra e corre o risco de ver seu reino ser invadido pelo general francês Napoleão?

3 – Finge que cortou a amizade com o reino da Inglaterra só pra ter paz até quando der?

4 – Pega correndo suas coisas importantes, junta sua família e dá no pé para aquele seu outro reino longe?


Agora pense rápido e decida qual das quatro opções é a melhor alternativa pra você. Escolha!


Bom, você, o João dessa estória, é o famoso Dom João VI, príncipe regente de Portugal. E o reino distante que pertencia também a Portugal naquele ano, 1807 é o Brasil.

Da mesma maneira que a palavra Dona é a forma de tratamento para senhoras Dom é para senhores. Por isso nos referimos a ele como Dom João. E esse “VI” (sexto) que segue o nome dele, serve para indicar que ele é o sexto sujeito chamado “João” que governou Portugal.

Dom João VI era um príncipe nada bonito. E sua mulher, Dona Carlota Joaquina menos ainda. É sabido também que Dom João VI era glutão (muito guloso), desajeitado e, parece, com péssimos hábitos de higiene; mas naquela época, além de loucos era comum também se achar um rei ou rainha porquinhos. Além disso, Dom João não foi criado para ser rei. O irmão mais velho dele, o José, que morreu de varíola (uma doença) é que havia sido criado com melhores modos e boa educação para ocupar a posição de rei. Dom João virou rei por acaso.

Vamos ver agora se você pensou do mesmo jeito que Dom João VI pensou naquela época, em 1807. Se você respondeu 3 e 4 você acertou, porque primeiro Dom João VI fingiu estar em guerra com a Inglaterra, só para ver se Napoleão parava de amolar. Não funcionou. Napoleão não era nada bobo. Então Dom João resolveu juntar tudo e “mudar de país”, se mandar para o Brasil. Como naquela época não havia automóvel ou avião J, ou seja, Napoleão teria um longo percurso à cavalo com várias paradas até chegar em Lisboa, capital de Portugal, Dom João, toda sua família e seus empregados tiveram algum tempo pra recolher seus pertences mais caros e preparar suas bagagens para a grande viagem.

A família real não viajou para o Brasil apenas com os empregados, mas também com pessoas que ocupavam cargos importantes na côrte, funcionários, nobres e muitos comerciantes ricos que não queriam ficar em Portugal pra “receber” Napoleão. Foram ao todo, 15.000 pessoas que resolveram sair juntas de Portugal; elas, e claro, com suas bagagens espalhadas em um dos diversos navios.

Por temer (ter medo) que durante sua ausência alguém se aproveitasse para assaltar suas casas e roupar suas coisas, resolveram encaixotar tudo aquilo que iria ficar. Encaixotaram toda a prataria que tinham, móveis mais caros, quadros, castiçais, tudo aquilo que lhes era precioso e não tinham como levar.

Por outro lado, como essa gente não sabia quanto tempo levaria para voltar à Portugal, ou mesmo se um dia voltaria, resolveram cada um deles, praticamente carregar a casa nas costas. Então também encaixotaram tudo aquilo que levariam consigo. Com muita pressa, encaixotaram suas roupas, brinquedos das crianças, animais de estimação, cachorro, gato, passarinho, lembranças que acumularam ao longo da vida e foram amontoando os caixotes cheios, uns sobre os outros, no cais do porto que fica entre as cidades de Lisboa (capital de Portugal) e Belém. Foi uma bagunça e uma verdadeira trabalheira acomodar toda aquela tralha nos porões dos navios. Ficou com certeza difícil, mais tarde saber em que navio, em que caixote estava isso ou aquilo.

Em suma (resumindo), os portugueses passaram dias apenas encaixotando toda a parte rica de Portugal. Sim, porque a parte pobre não viajaria, então não precisava ser encaixotada.

Para levar tantos estes caixotes de pertences como os viajantes para os navios, era preciso antes tomar um bote (barco pequeno à remo) até o meio do rio Tejo, aonde se encontravam ancorados os navios. Todo rio desemboca no mar e o rio Tejo é o nome do famoso rio de Portugal aonde fica o porto.

Finalmente no dia 27 de novembro de 1807 os passageiros começaram a chegar no porto para o embarque. A pobre rainha, “Dona Maria I, a louca”, fazia um escândalo gritando que não queria embarcar. Queria ficar em Portugal. Mas ela foi, mesmo sem querer. Era inverno em Portugal e verão na terra distante, o Brasil. O chão da cidade estava cheio de poças d´água por conta das chuvas fortes dos últimos dias, mas mesmo assim, a cidade toda se postou nos arredores do cais para ver toda aquela gente importante partir. As pessoas que ficavam, olhavam tudo com tristeza, alguns choravam e ninguém sabia bem que opinião ter sobre aquela cena inusitada (diferente). O que pensar de um príncipe regente que toma todas as suas maiores riquezas e abandona a população de seu reino, que ele deveria, ao contrário, proteger? E o que aconteceria com os portugueses que ficavam quando Napoleäo chegasse lá? Mas quanto a isso, certamente a família real não estava preocupada.

Os dias passavam rápido e todo mundo começou a ficar preocupado porque o exército francês de Napoleão poderia chegar lá à qualquer momento. Mas só depois que todo mundo embarcasse é que poderiam partir. Para desespero dos viajantes, o tempo em Portugal piorou e a armada (uma porção de navios) portuguesa não tinha como deixar o rio Tejo para alcançar o mar com ventos contrários tão fortes. A família real começou a rezar desesperada! Toda a gente já dentro dos navios estava nervosa, só pensando em Napoleão.

Finalmente o sol brilhou no dia 29 de novembro de 1807, dois dias depois do embarque da família real e de todo o resto que viajaria. O dia estava lindo e os navios puderam içar suas velas, levantar âncoras e dar Adeus a Portugal. A viagem levaria quase dois meses.

Os portugueses tiveram por fim muita sorte. Exatamente na manhã do dia seguinte à sua partida os franceses chegaram em Lisboa!!!


Notas:

Ambrose Gwinnett Bierce (nasceu em 1842— data de falecimento desconhecida) foi um crítico satírico, famoso escritor e jornalista norte americano particularmente conhecido pela sua obra O Dicionário do Diabo. Contista excelente, suas obras são constantes em qualquer antologia de contos americanos. Aos 71 anos, Bierce seguiu em viagem para o México e desapareceu sem deixar rastros. A teoria mais popular diz que ele foi fuzilado pelos revolucionários do exército de Pancho Villa. O local e a data de sua morte são incertos, sendo que teria falecido provavelmente dezembro de 1913 ou 1914, presumidamente no México.


Outros fatos importantes ou curiosos deste mesmo ano de 1807 foram:

- Nascimento de Giuseppe Garibaldi, revolucionário italiano.

- Nascimento de Joaquim Marques Lisboa, o Almirante Tamandaré, patrono da marinha do Brasil.

- Descoberto o potássio.

- A Inglaterra acaba com o comércio de escravos.


Teste seu conhecimento:


1 – Como se chamava a mãe e a mulher de D.João VI, respectivamente?

1. Dona Carlota e Dona Josefina;

2. Dona Maria e Dona Isabel de Castela;

3. Dona Maria e Dona Carlota Joaquina;


2 – Quem era o rei da Inglaterra em 1807?

1. Jorge III;

2. Henrique VI;

3. Ricardo I;


3 – Quem era o rei da França em 1807?

1. Napoleão Bonaparte;

2. Luis XIV;

3. Luis III;


4 – Com que país, Portugal tinha estreitas relações comerciais em 1807?

1. Com a França;

2. Com a Espanha;

3. Com a Inglaterra;


5 – Por que a família real portuguesa se mudou para o Brasil em 1808?

1. Para conhecer a nova grande terra recém-descoberta, e aproveitar o verão no Brasil, já que em novembro de 1807 era inverno na Europa e fazia um frio terrível em Portugal;

2. Por medo de Jorge III, que por ser um doido, resolveu invadir Portugal com seus exércitos;

3. Por medo de Napoleão Bonaparte, que estava por invadir Portugal com seus exércitos;

9 de Março de 2021 às 22:13 0 Denunciar Insira Seguir história
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Fim

Conheça o autor

Margot Schneider Margot Schneider é o pseudônimo adotado pela escritora brasileira, nascida em Santos. Mudou-se para São Paulo, estudou Ciências da Computação o que lhe permitiu mais tarde trabalhar como desenvolvedora de sistemas de informação na Suíça, onde mora desde o ano 2000. A escritora adora tocar piano, violão, ler, viajar, conhecer gente, conversar, aprender outras culturas, novas línguas e atualmente só usa os computadores para trocar e-mails e escrever, mais uma paixão descoberta.

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