best_frund Felipe Belarmino

Arthur está a caminho do seu primeiro encontro. Nervosismo e esperança fundem-se em seu peito até o momento em que deverá encontrar o rapaz com quem trocou mensagens e chamadas de vídeo - por vezes excitantes - durante os últimos meses. Ele sabe o que é preciso para manter-se no ritmo do outro, assim como sabe como deseja o fim desse encontro. Uma conto sobre amor e violência com inspiração Freudiana para uma cadeira do meu curso.


Conto Para maiores de 18 apenas.

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Conto
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Capítulo Único

Dia 16 de fevereiro, terça-feira de carnaval. Hoje é o dia.

Estou suando por debaixo da camisa e da máscara. Faz um mês que não corto o cabelo e, consequentemente, o que deveria ser minha franja está grudando no meu rosto graças a minha habilidade de liberar líquido mesmo com o ar do carro ligado.

Fernando é o nome do meu motorista neste momento, foi fácil chamar o Uber e não me atrasar; na verdade, ainda tenho 15 minutos até meu encontro. Pergunto-me se Fernando está tentando adivinhar para onde vou, ele claramente não é o tipo que gosta de puxar conversa, e até o momento só me deu um seco boa noite; prefiro assim. A falsa sensação de intimidade me incomoda, tal como o falso interesse em detalhes da sua vida, que algumas pessoas acham ser algo compreensível – talvez seja, mas não para mim.

Estou no banco de trás, observo o mundo através do vidro transparente do carro. Eu sinto que preciso conhecê-lo [o mundo], mas ainda estou preso na minha cabeça e hoje deve ser o primeiro dia em que realmente irei me conectar com alguém além do meu gato.

Escrevo poesias desde 2017, tenho um blog com todas elas e alguns diários sobre minha vida. Queria que minha mãe pudesse vê-lo, mas ela se foi no ano em que comecei a escrever. Cresci com Dona Lourdes, e hoje a única coisa que cresce em mim é a saudade das suas torradas temperadas. Meu pai nunca existiu, não para mim; mamãe tinha o costume de dizer que eu desejaria conhece-lo um dia, mas a única coisa que desejo sobre ele é que esteja afogado em alguma privada.

– Precisa de algum lenço, senhor? – Fernando questiona, com uma voz terna.

“Senhor”, como as pessoas decidem que este é um termo educado para se referir a qualquer pessoa maior de idade? Não me sinto um idoso ao ouvir, mas eu preciso repassar a palavra uma segunda vez em minha cabeça, para então decidir que se refere a mim.

– Ah... – respondo. – seria uma boa.

Volto a olhar pelo vidro, o restaurante onde eu devo estar em 13 minutos está logo ao lado. O carro estaciona e, quando dou por mim, Fernando está estendendo alguns lenços em minha direção; os pego, agradeço, passo-os em meu rosto, e então estou sentado à mesa do jantar com uma taça com água, o cardápio em cima da mesinha redonda e guardanapo em um compartimento de madeira.

– Arthur?

Eu reconheço aquela voz, ainda que tenha a ouvido apenas por telefone, reconheço como sendo a dele. Meu coração palpita, percebo que minha perna direita esteve pulsando tremendo em nervos desde que cheguei, derrubo o compartimento com os guardanapos no momento em que me ergo para receber o garoto de cabelos loiros, o qual estive ansioso para conhecer pessoalmente desde novembro do ano passado.

O som da madeira atingindo o piso deixa meu cérebro em total alerta. Sinto como se Fernando ainda estivesse do lado de fora do restaurante esperando o momento certo para invadir o lugar com seu Ford prata, em primeiro momento atingir a mim e Rafael, e então, com o impacto e a velocidade, sermos empurrados e finalmente empalados no balcão mais a frente. Olho pelo o vidro do restaurante e não há qualquer Ford prata no estacionamento.

Suspiro aliviado.

– Arthur... – Rafa chama novamente. – Boa noite!

Jogo meu olhar por sobre Rafael, que já se posicionou do lado oposto da mesa. Está prestes a sentar quando respondo:

– Boa noite... meu deus, me distraí por um segundo.

Acomodamo-nos em nossas cadeiras quase ao mesmo tempo.

– Acho que estou um pouco nervoso. – Ele diz.

Ele é tão mais bonito pessoalmente. O cabelo loiro está levemente desgrenhado – como costumava ser nas chamadas de vídeo; seu olhar azul e profundo me coloca na defensiva; está com uma barba rala que deve ter crescido desde nossa última chamada e que, agora, lhe da um ar mais maduro. Temos a mesma idade – 21 – e mesmo assim me sinto um adolescente agora que estamos frente a frente.

– E-eu... – gaguejo, limpo a garganta, e tento novamente: – Eu estive molhado de suor até uns minutos atrás, então não é o único nervoso aqui.

Ele sorri; os dentes brancos me excitam – eu o disse isso previamente, “Tudo em você me excita” ele retrucou.

– Nem me fale, tirei a máscara assim que te vi aqui sentado. – Ele ergue o pedaço de tecido azul pelo elástico, mostrando-o quase como um troféu. – Decidiu o que vamos comer?

Hesito em responder. Mal olhei o cardápio desde que cheguei, mas eu tinha pretensão de apenas tomar um suco e comer frango com fritas, meu lanche preferido ainda que nenhum frango de restaurante fosse como o de Dona Lourdes.

– Gosta de fritas?

Conversamos sobre o caminho até o restaurante enquanto esperamos a comida. Logo depois, entre garfadas e goles de nossos sucos, repassamos alguns assuntos que já tínhamos comentado virtualmente. Estou em Recife há um dia em nome deste encontro; passei o dia de hoje inteiro ouvindo a playlist que Rafa criara especialmente para mim – um pouco diversificado, mas a maioria canções de amor que incluíam nomes como Videoclub, Celine Dion e U2; ele repete a história de quando ficou bêbado a primeira vez em seu primeiro carnaval com mais riqueza de detalhes, e eu comento, como já fiz diversas outras vezes desde que nos conhecemos, que nunca bebi e nem pretendo.

Até que estou me saindo bem para um primeiro encontro, penso comigo.

Estou terminando meu suco de maracujá com leite quando um garçom vem até nós e pergunta se gostaríamos de mais alguma coisa. Penso um pouco, encaro Rafael que dá de ombros para mim e sorri.

– Eu de boa, – diz Rafael. – estômago pequeno. – Ele dá um gole no vinho.

Encaro o garçom, o rosto inexpressivo. Repasso mentalmente as chances de eu me encher com qualquer outra porção de alimento e, quando estou prestes a pedir apenas a conta, percebo que estou apertando meus “países baixos” entre as coxas.

– Estamos cheios. – digo. – Tu pode me orientar como chegar ao banheiro? Na volta vamos apenas pagar a conta.

O garçom explica rapidamente o que peço, agradeço e então digo a Rafael que estou de volta logo. Estou pensando em quais as possibilidades de ele me seguir até o banheiro, encontrar o box em que estou mijando e, com movimentos desavergonhados, entrar ali, pois sabe que deixei a tranca propositalmente aberta.

Devolvo minha máscara para o rosto e movo em passos largos.

Ele sabe. Ele sabe. Ele sabe.

O banheiro me surpreende. Tem um cheiro de lavanda, não forte o bastante para irritar meu nariz, mas não fraco o bastante para parecer natural. Ouço uma descarga em algum dos boxes e um barulho de jato em outro; entro no último e torço para que nenhum estranho entrar ali. É um jogo de sorte: muitas de minhas chamadas com Rafa envolviam nos tocarmos enquanto falávamos coisas excitantes um para o outro. Combinamos que transaríamos em qualquer lugar no nosso primeiro encontro, e isso não faz mais que duas semanas.

Eu o quero agora, ainda que esteja fazendo xixi, mas meu pau foi feito especialmente para isso. Posso prender o xixi – o gozo é até mais prazeroso – mas não precisarei fazê-lo enquanto Rafa não invade o box e sussurra qualquer coisa no meu ouvido. Tenho imaginação fértil, e é na voz dele sussurrando as mesmas coisas que dizia nas chamadas de vídeo que penso enquanto faço xixi, com os olhos fechados direcionados para o teto.

Alguém bate uma porta; não é a minha. Minha imaginação é interrompida pela imagem do Ford, e então pelo rosto da minha mãe na cama do hospital, respirando por aparelhos, pedindo em uma voz rouca para que eu a perdoasse. Não havia nada o que perdoar; eu estava com ela assim como ela sempre esteve comigo. É doloroso lembrar que ela sentia tanta dor nos pulmões naquela época e eu não podia fazer nada.

Balanço a cabeça na tentativa de afastar a lembrança. Ouço o chiado de uma torneira ligada, alguém pigarreando e, finalmente, o som da torneira cessa junto ao meu fluxo. Rasgo um pedaço do papel higiênico que está no boxe, dobrando-o em várias camas, e seco minha glande.

A imagem dos equipamentos do hospital ainda está na minha mente quando a porta atrás de mim range. Meu coração dispara, Rafael está atrás de mim, sinto seu calor enquanto se aproxima. Minha mente se esvazia com o toque dos lábios dele em minha nuca, o calor de sua respiração, seu peito junto à parte superior das minhas costas, o “clique” da tranca.

– Eu disse que faríamos, não disse?

Sim, é ele.

Abro um sorriso por debaixo da máscara, e viro-me ao mesmo tempo em que retiro o tecido do meu rosto. O azul dos olhos de Rafael queima, e meu peito queima junto. Sinto meu corpo se desviando da rigidez e entregando-se ao toque. É quase automático: logo estou encostando meus lábios aos dele, apertando sua cintura, sua bochecha. Sinto o gosto do vinho misturado à sua saliva, mas mais que isso: sinto sua ereção.

É uma ótima sensação, como se estivéssemos de volta as vídeo chamadas e há toda a tensão para que um de nós mostrasse primeiro nosso membro rígido. É meu primeiro encontro, mas não meu primeiro beijo, então eu sei oque faço quando invado a boca de Rafa com minha língua e ele consegue “manobra-la” com a própria língua.

Pressiono minha ereção contra a dele. Nosso ritmo é bom, por mais que eu não saiba se ele está concordando. É excitante, e eu realmente estou o amando mais agora do que quando pensava no quão estranho era imaginá-lo ouvindo My Heart Will Go On, que estava na playlist que me mandou. Era engraçado, mas era terno, e isso aquecia meu peito. Talvez aquilo fosse amor mesmo, e agora eu estava bem perto de uma certeza.

Minha mão viaja de sua bochecha até sua nuca, os cabelos loiros moldando-se entre meus dedos. Meu coração palpita, também sinto o dele bater em um ritmo frenético. Em um minuto Rafael está em minhas mãos, no minuto seguinte estou empurrando sua cabeça violentamente até a parede do box.

Meu pau está duro. Vejo um fio de sangue escorrer da lateral de sua cabeça, ele está de pé, mas parece perdido. Seu olhar viaja de um canto para outro do box, passa por meu rosto, e então está direcionado para o teto.

– Arthu-

Não o ouço terminar de pronunciar meu nome. Suas mãos se desvencilham do meu corpo e tocam, cada uma, uma parede lateral do box. Consigo trazê-lo para perto de mim rapidamente e, também em um movimento frenético, segurar sua nuca enquanto troco de posição com ele dentro do cubículo.

Ele finalmente reage, sua cabeça se torna mais firme e é necessário colocar mais força em minha mão, pulso, antebraço, e todo resto do meu corpo, para coloca-lo de joelhos diante da privada – eu o amo tanto por isso. Gemo baixinho, como fazia nas chamadas de vídeo, e eu espero que ele saiba que não estou fingindo.

A força com que ele consegue lutar contra a pressão da minha mão em sua nuca me faz deseja-lo ainda mais, e espero que ele esteja gostando, me amando como eu o estou fazendo. É irônico como nunca teremos filhos de uma transa entre nós, e ele deve imaginar a mesma coisa em certos momentos. Mordo meu lábio inferior, e logo estou com as duas mãos sobre sua cabeça, lançando-a para dentro da privada, enquanto o mantenho seguro entre meu corpo e o vaso sanitário de cerâmica.

Ouço o som das bolhas que se criam no liquido ali dentro enquanto Rafa tenta gritar ou respirar ou... Sua mão esquerda alcança um dos meus braços e tenta puxá-lo. Seguro sua cabeça com mais força. Vejo pouco do líquido que há dentro do vaso, mas, neste momento, o sangramento na cabeça de Rafa está se misturando com meu xixi e a agua que já estava ali previamente.

Ele se debate, me arranha, eu consigo sentir todo o amor acumulado. Suas pernas se movimentam e até sinto que ele está tentando com vontade, mas ele está sobre mim, o máximo que consegue é lutar, mas não vencer. Eu tive dias e dias até me convencer que conseguiria fazê-lo se sentir como está se sentindo agora, e ele deve estar me agradecendo enquanto seu corpo gasta toda sua reserva de energia.

Quando ele finalmente fica imóvel, descanso os meus braços e analiso as marcas profundas que as unhas de rafa deixaram em minha pele. Seus braços recaem sobre suas costas. Suas pernas estão em uma posição estranha, quase como se tivessem nascido tortas e... eu sinto repulsa pelo que ele se tornou agora.

Eu não imaginara que estaria decepcionado no fim deste encontro. Ergo-me, respirando fundo.

Destranco a porta e, antes de dar as costas definitivamente para o corpo imóvel de Rafa, sua perna parece se mover um mísero segundo, quase como xingando minha decepção. Sorrio para mim mesmo, e então passo um último olhar pelo cenário.

Saio deixando a porta do box entreaberta. Lavo as mãos em um dos lavabos lentamente, uso o sabão líquido em meus braços e mãos, lavo novamente com agua e utilizo o secador automático para me secar.

Quando volto para a mesa, observo o garçom que me atendera, atendendo outra mesa do fim do salão. A pasta comanda com o valor da dívida está em cima da mesa em que Rafael e eu comemos; deixo o dinheiro e me distancio da mesa, caminhando em direção à saída do restaurante. Devolvo a máscara para o meu rosto, tiro o celular do bolso e me aproximo da porta de saída que se abre automaticamente. Abro o aplicativo do Uber e, antes de chamar algum carro, decido que este seria o momento certo para ouvir a playlist de Rafael.

5 de Março de 2021 às 04:44 0 Denunciar Insira Seguir história
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Fim

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