*Considerando que a história se passa no interior, os diálogos "errados" são propositais para marcar a pronúncia, por favor não se assustem. Boa leitura!
A chuva fininha que caía parava aos poucos. O garoto observava sua jovem mãe tentar alcançar um armário mais alto na velha cozinha que cheirava a café recém passado. A mulher esticou-se toda, até ficar na ponta dos pés, e alcançou o vasilhame de plástico fazendo uma leve careta ao fitar o conteúdo. O menino riu baixinho ao ver a expressão materna, pois ela era um tipo de mulher séria e atitudes assim eram raras de sua parte, afinal para ela comida era algo sagrado.
— Tcs... mofou. Maldito tempo chuvoso...
— Faiz mais mãe.
— Pra desperdiçar mais?
— Desperdiça não, eu vou dar pros cachorros.
— Cachorros não comem pão de queijo duro, Arthur! Jogue para as galinhas ciscarem.
— Tá bom!
Arthur, que tinha cara de menino de seis anos, de pés descalços pegou os pães mofados carregando-os na camiseta em uma sacola improvisada com a parte da frente.
— E limpa esses pé antes de entrar pra dentro quando volta, escutou!
A advertência foi vã, o garoto corria para o quintal com cheiro de chuva e poças de água no barro vermelho, atravessou rapidamente o terreno, deixando um portão de madeira baixo aberto para trás, e ignorando os cacarejos assustados das galinhas, jogou duas unidades da quitanda mofada, se divertindo vendo as aves brigando entre si pelos pedaços agora bicados.
— Galinhas burras, tudo mofado hahaha!
— Mas ainda é nutritivo, tem queijo além do mofo.
Arthur se assustou com a voz vinda do nada, olhou ao redor procurando a fonte do som e apenas viu folhas da mangueira molhada caírem no chão.
— Então come um pra ver o tanto que é nu...nutri-tri-tivo. - segurou um dos pães de queijo na mão de forma suspeita.
— Vem fazê então!
Arthur fitou a copa da frondosa mangueira procurando sinal de alguém no meio da folhagem, os pingos da chuva, que havia cessado, brilhavam com o sol que aparecia preguiçoso atrás das nuvens atrapalhando sua visão. Segurou com mais firmeza sua camiseta e atirou o pão de queijo, pássaros voaram e uma sonora risada infantil ecoou.
— Manézão hahaha! Nem com estilingue acerta alguma coisa, imagina sem.
— Inferrrno!
Arhtur correu para debaixo da copa da árvore tentado localizar seu alvo, desviou de algumas mangas que vieram em sua direção e apenas escutou o estalo de galhos se quebrando. Instintivamente soltou a camiseta com medos dos galhos acertá-lo e se estabanou todo quando as galinhas vieram pra cima de seus pés por causa da comida. As bicadas em seus pés o distraía de seu alvo que essa altura já havia descido do pé de manga. Uma das frutas passou perigosamente perto de sua cabeça e caiu em meio as galinhas dispersando-as. Arthur tremeu de fúria ao ver o sorriso moleque de sua inimiga.
O macacão sujo de terra denunciava que a menina, com cara de sete anos, estava ali por um tempo brincando, o cabelo curto bagunçado balançou com o vento frio e algumas mangas verdes sujavam seus pequenos dedos de nódoa.
— Qual você acha que dói mais? - a menina desafiou.
— Depois não vem chorar pedido pra parar, Aninha!
O desafio estava feito, o menino espantou as galinhas e pegou os pães de queijo duro feito pedras, enfiou-os de qualquer maneira em seus bolsos, olhou rapidamente para sua adversária que verificava os próprios bolsos do macacão para se certificar da sua munição verde. Arthur endireitou-se e apontou o dedo destemido.
— Te dou até três pra corrê! - uma pequena manga verde acertou sua testa - Assim não vale! Eu vou conta pra mamãe que você tá 'panhando sem esperar crescer!
— Um! - Aninha contou gargalhando travessa, dando a entender que não sairia do lugar.
Arhur correu para trás da mangueira.
— Dois! - um pão de queijo passou zunindo perto da garota.
— Três!
A guerra começara. Manga versus pão de queijo duro. Aninha e Arthur corriam entre gargalhadas e poças de lamas. A menina supôs que seu irmão jamais a dedaria à mãe, pois se ela descobrisse que ele também estava brincando com comida apanharia igual. As galinhas corriam atarantadas sobre bolotas marrons, atrapalhando a brincadeira que terminara quando Arthur levou um tombo digno de galo na cabeça no barro. O berreiro chamou a atenção da mãe que saiu no terreiro com uma vara na mão.
— Meninooooo! - viu a cor vermelha de seus filhos, que de limpo só sobrara as bochechas vermelhas da correria - Passem já pra dentro!
— A Ana tava me tacando manga! - fungou enquanto passava a mão sobre a testa machucada.
— E ele me tacou pão de queijo!
— Mentira é pedra!
Arrependeu-se ao ver a cara zangada de sua mãe azedar para uma mais zangada ainda.
— Galinha não come pedra, Arthur! - ralhou.
Os pequenos irmãos fecharam os olhos quando viram a vara de goiaba nas mãos de sua mãe ser apontada em direção a cozinha.
— Passem já pra dentro...
Tentaram correr para a casa, mas pararam com o berro zangado da mãe.
— Lava esses pé no tanque primeiro!
Obedeceram calados e esconderam um sorriso quando a mãe apenas deu um puxão de orelha como castigo, enquanto lhes ajudavam a subir no tanque e tirar o barro dos pés.
— Mãe...
— Quê menino? - respondeu ainda zangada a mãe ao seu pequeno filho, que agora limpava a testa com caretas de dor.
— Pedra era pão de queijo antes de ser pedra?
A jovem mãe apenas deu uma gargalhada gostosa e beijou seu filho no machucado, arrancando mais uma careta do menino.
— Sabe Arthur - olhou para os lados como se estivesse para contar um segredo - Na verdade aqueles que tão beeeemmm duros que se acha no outro dia, foi o saci que colocou de noite.
FIM.
Merci pour la lecture!
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