agmars A. G. Mars

Juntos no 221B, John está escrevendo no blog sobre o último caso que resolveram juntos. Porém percebe não ter todas as informações possíveis. Quando questiona Sherlock, entra num território muito mais sensível do que o esperado, deixando ambos vulneráveis aos próprios sentimentos. A química do amor é absurdamente simples e até Sherlock Holmes, conhecido por tentar se divorciar dos sentimentos, consegue explicar como funciona.


Fanfiction Série/ Doramas/Opéras de savon Interdit aux moins de 18 ans.

#johnlock #Sherlock-Holmes #John-Watson #romance #gay
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Capítulo 1

Notas da História:

Baseado em Sherlock da BBC.

Personagens não meus, mas história sim, baseado no conto O Caso da caixa de Papelão de ACD.

Fiz a fic antes da estréia da S4, em meados de Agosto/Setembro, então ainda não tinha o nome da baby. Agora troquei para Rosie para ficar mais verossimílimo.

Pós-s4, mas diverge do que está acontecendo na série.

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Clandestino

Relendo as anotações no pequeno bloco, sentiu falta de algo. Tinha as descrições exatas, feitas por seu amigo, das orelhas recebidas por encomenda e as palavras da mulher reescritas, mas a explicação de como ele desvendara o pequeno mistério não estava ali. Fechou o bloco e o deixou sobre o notebook.

Finalmente deu atenção a presença do outro na sala, assistindo à televisão em uma altura baixíssima. Preocupou-se que o mínimo conforto era pela filha adormecida em seu quarto, no andar de cima.

— Não vai acordar a Rosie, não se preocupe. – Manifestou-se.

— Hum. – Mas ele não deu uma resposta interessante, mantendo-se focado no que parecia algum programa sobre a vida de alguém.

Deu de ombros. Não era o assunto do qual queria tratar de qualquer forma.

— Como você sabia que elas eram um casal? – Virou-se completamente para o amigo ainda de costas.

— Quem?

Ah! Agora ele respondia.

— Da senhorita Cushing. Como sabia que ela teve um relacionamento com Sarah?

— Ah, sim! Pelos olhares.

— Que olhares? – Suspirou, era sempre irritante as respostas dadas como se fossem óbvias, quando não eram.

— Na fotografia.

— Sherlock, merda, dá para responder mais detalhadamente? Eu não sou você, lembra? – Bufou.

Por segundos achou que Holmes iria ignorá-lo e continuar a assistir sobre mulheres ricas fazendo alguma coisa entediante. Por sorte, porém, ele ajeitou-se no sofá, saindo da posição meiga abraçado às pernas para uma mais concentrada, esticando as costas e cruzando as pernas. Sorriu, sabia que teria total atenção dele agora. Tanto que se levantou e caminhou até a própria poltrona, de frente ao amigo.

— Deve lembrar que havia, na sala, uma prateleira sob a televisão cheia de retratos. – John apenas concordou com a cabeça — Dentre os retratos, um em específico me chamou a atenção. Ele estava escondido atrás dos outros, porém era o único sem poeira. Algum significado teria e poderia ajudar ou não no caso. Optei por me aproximar e buscar alguma pista discretamente. Era uma foto da senhorita Cushing com uma moça de, aproximadamente, mesma idade, uma de frente para a outra, com as testas quase se tocando e um olhar intenso trocado. Irmãs não se olham desta forma. Amigas não se olham desta forma. Amantes se olham desta forma. E era extremamente recíproco, o que descartava a ideia de amor platônico. – Só ao concluir que Sherlock virou o olhar para o amigo, desviando-se da televisão.

— Então você pressupôs que elas eram um casal por uma foto?

— Olhares dizem muito, mas o fato da foto estar escondida entre as demais e não ter mais nenhuma lembrança de Sarah na casa, ajudaram também. Além de que, a senhorita Cushing parecia bastante abalada com o casamento da amiga, qual ela sequer compareceu. Se fosse mero platonismo, um amor jamais realizado, ela teria ido ao casamento, pois não haveria o sentimento de traição somado a dor de perda.

— Um olhar definiu o amor de anos de duas mulheres?

— É John! – Acabou suspirando.

— E como você saberia isso?

Sherlock não respondeu, apenas arqueou as sobrancelhas. John não sabia se ele estava confuso ou sendo arrogante, porém tinha certeza que sua pergunta, da forma que fora feita, soara extremamente ofensiva.

— Como você sabe, por uma troca de olhares, que elas estavam apaixonadas e não era apenas amizade? – Reformulou-se, tentando soar menos contundente.

— A química do amor é absurdamente simples e as pessoas costumam ter reações parecidas quando estão apaixonadas. Não precisa de muito para descobrir quando duas pessoas se amam ou não.

— Por isso acha que Mary me amava?

O silêncio de Sherlock fez John se perguntar se deveria ter feito tal pergunta. Ainda que alegasse estar se esquecendo da ex-esposa, sentia falta dela. Seis meses não eram o suficiente para curá-lo da pior traição que já sofrera na vida. Aguentaria perdê-la para morte com menos pesar do que descobrir que o casamento era uma farsa. E ter o amigo alegando que Mary o amava acima de todas as mentiras contadas não ajudava em nada a superá-la. Não sabia, sequer, se queria realmente desfazer-se dela, esquecê-la e seguir sua vida como se tudo estivesse bem. Enquanto guardasse aquela mistura no peito de amor e rancor, não precisaria encarar os outros pensamentos cortantes que lhe passavam na cabeça. Sofrendo apenas por Mary, não precisaria pensar em Sherlock.

— Sim. – Finalmente Sherlock respondeu e John não escondeu o alívio, suspirando. Fora salvo dos próprios pensamentos pela resposta seca.

— Pelos olhares que ela me dava? – Tentou soar presunçoso, mas a mágoa na voz se sobrepôs.

— Mary é uma mulher ardilosa e incrivelmente criativa. Poderia ter destruído você de tantas maneiras que não sobraria restos seus para mim. Porém, ela preferiu contar-nos a verdade, deixar o bebê e ir embora se refazer. Ela abandonou a filha por você. Se te conforta de alguma forma, ela realmente te amava.

Desta vez, quem preferiu o silêncio fora John. As palavras de Sherlock cortaram tanto quanto seus próprios pensamentos. Chegou a se odiar, por segundos, por ter feito uma pergunta tão estúpida. Seu amigo era orgulhoso o suficiente para se achar certo, ainda que estivesse errado. Mary não o amava. Não acreditava nem por um segundo nestas palavras. Amor, como conhecia, era muito mais puro que aquilo. Por amor ela teria contado tudo antes de tentar assassinar seu melhor amigo, antes de ser entregue por Molly. Definitivamente ela não o amava. Apenas disse a verdade por medo, para ter tempo e ajuda para a fuga. Sabia que, assim que Molly contasse os segredos que descobriu, Mycroft estaria atrás dela com todo o MI5. A única ajuda possível era Sherlock. E isto, definitivamente, não era nada perto de amor.

Contudo, ao menos em um ponto, Sherlock tinha razão. Ela não fora até o final com o plano. Não deixará a bebê morrer de forma traumática como deveria ter feito e nem o colocara contra Sherlock, culpando-o por assassinos estarem atrás deles. Ela disse a verdade no momento certo, impedindo-o de odiar o amigo, evitando que não sobrasse mais nada de si para ele.

Por que teria algo seu para Sherlock?

Apegou-se a dúvida para massacrar as dores que carregava de Mary. Um sentimento muito menos doloroso para carregar naqueles minutos. Ergueu o olhar para um Holmes entretido com a televisão e sorriu. Ele ficava terrivelmente assustador tentando ser normal. Duvidava que ele realmente prestasse atenção naquele programa estúpido.

— Restos meus para você? – Perguntou em tom brincalhão, como se estas tivessem sido as únicas palavras de Sherlock.

— Você é meu melhor amigo, John. – Frio, sequer desviara os olhos da televisão.

— Claro. – Sorriu. O coração um pouco mais aquietado com as palavras carinhosas de Sherlock. Talvez fosse o máximo que tirasse dele, mas já lhe bastava.

— Não é óbvio que David traiu ela? – Ele bufou repentinamente — Ele sequer olha para Karina quando está perto dela. Sequer fala com a Karina e antes vivia a abraçando. Além de que, ele realmente saiu do quarto dela com o zíper aberto e os cabelos penteados para o outro lado. Que provas mais ela precisa?

— Vê-lo na cama com a Karina! – Riu baixo, divertido, esquecendo-se dos problemas.

— Qual o ponto nesse programa, mesmo? – Bufou exagerado e John soube, neste momento, que toda aquela cena era para diverti-lo. Outro carinho que recebia de Sherlock.

— Entretenimento. Diversão. Distração. – Respondeu sorrindo.

— As pessoas realmente gostam de assistir a vida alheia! – Suspirou.

— Gostam.

— Entendo porque têm vidas tão entediantes. – Negou com cabeça e John tornou a sorrir.

Definitivamente, aquilo era amor. Sherlock, com tudo o que fazia e com todos os defeitos, sabia amar. Dizia verdades necessárias e depois tentava, à sua maneira, curá-lo. Sempre que estava entrando em algum momento de tristeza, ele soltava piadas ou brincadeiras que, de tão estúpidas, o aliviavam de qualquer sensação ruim. Caso falhasse, criava na cabeça algum mistério mirabolante e o arrastava por Londres para distraí-lo dos problemas. Nos dias mais terríveis, ele apenas sentava-se com Wendy no chão da sala e brincava, fazendo a si lembrar-se do que era ter uma família que o amava. Se não fossem os pequenos detalhes, disfarçados de excentricidades, jamais aguentaria a traição de Mary, o abandono dela enquanto tinha uma criança para criar.

Sherlock era a personificação do amor e eram esses os outros pensamentos cortantes dos quais queria fugir. Pois acreditar que ele amava não era certeza alguma. Sabia que o amigo queria se distanciar dos sentimentosdivorciar-se do amor encontrado apenas no lado perdedor. Não se entregar. Não se importar. Ainda que não fosse possível para um humano, Sherlock era muito mais que um mero ser humano. E isso era uma pequena facada que abria um corte grande dentro de seu estômago. Sherlock amava, certamente, mas não como os outros.

— Acha que David ama Karina? – Perguntou tentando distrair a si mesmo, já que não veio nenhuma brincadeira do amigo para lhe acalmar os pensamentos.

— Não. Ele não ama nem Jessica, quem dirá amar Karina! – Riu baixo.

— Você realmente entende de amor, hein! – Brincou, ajeitando-se no sofá — Experiência própria? – A brincadeira lhe enjoou mais do que esperava.

Sherlock não respondeu. Apenas virou a cabeça para John. A expressão leitora no rosto, quase confusa, mas Watson duvidava que o amigo pudesse realmente ficar confuso com algo. Não por mais de cinco minutos. Se ele não pudesse deduzir, ele adivinharia e, como em um milagre, iria acertar.

— Como eu disse, a química do amor é absurdamente simples e as pessoas costumam a agir de maneiras parecidas quando estão apaixonadas.

Aquilo ainda não era uma resposta definitiva, mas se continuasse com perguntas vagas seria difícil tirar algo concreto de Sherlock. Sorriu travesso com a ideia de incomodá-lo com isso, ignorando, como se fosse insignificante, o suco gástrico que lhe queimou o estômago.

— Então você reage igual aos outros quando está apaixonado?

— Provavelmente.

— E já se apaixonou? – Riu baixo.

Sherlock arqueou as sobrancelhas.

— Certamente.

A resposta não era a esperada. Ajeitou-se na poltrona novamente, ficando mais centrado no assunto. Então seu amigo já tivera sentimentos mais humanos? Ignorou o que aquilo poderia significar. Não queria pensar muito além das respostas metódicas dele. Encontrar subtextos em Sherlock era um trabalho para deixar qualquer um insano.

— E passou?

— Sim.

John negou com a cabeça. A resposta era tão óbvia que quase riu de si mesmo. Todos se apaixonam alguma vez na vida, porque esperou que Holmes fosse diferente? Talvez Mycroft, mas com certeza não Sherlock.

— E já amou? – Continuou, aproveitando o momento para saciar as próprias curiosidades.

— Creio que já disse que lhe amo. – Ele parecia confuso.

— Não assim! – Sorriu — Amor romântico, como o da senhorita Cushing e Sarah.

— Oh! – Ele concordou, voltando a olhar para a televisão, mas não respondera.

— E então? – A curiosidade o deixou impaciente — Já amou?

— Sim... – A resposta viera diferente das outras, menos confiante. Sherlock sequer o fitara. Estranhou.

— Faz muito tempo?

— Não...

Novamente Sherlock soava incerto, como quem teme o que fala. O primeiro nome que viera a cabeça de John, então, fora Irene. Era a única mulher que conheceu recentemente que poderia ter dado borboletas no estômago do detetive. Remexeu-se na poltrona incomodado. Então ela teria realmente causado sentimentos nele naquele curto período de tempo? Não era uma ideia agradável, pois sabia o quanto aquela mulher magoara seu amigo. De todos que havia no mundo, ela era a única que não queria ver ao lado de Sherlock.

— Eu conheci? – Tentou, desejando que seu breve silêncio não houvesse cortado o clima.

— Onde quer chegar, John? – A voz era acusadora.

— Em lugar algum. Apenas responda.

— Não tem que ir ver Rosie no quarto? Nossa conversa pode tê-la acordado.

— Ela está no meu quarto, Sherlock. E tem um sono de pedra. Se ela aguenta você tocando violino a maldita madrugada inteira, aguenta uma conversa calma entre nós dois. – Rolou os olhos. A desculpa fora tão absurda que sequer conseguiu se irritar, apenas ficou ainda mais impaciente.

Sherlock bufou, como quem desiste de argumentar. John não conseguiu conter o sorriso orgulhoso. Ter a última palavra sobre Sherlock Holmes não era para muitos e causava certa sensação boa. Ainda assim, não houve uma resposta para sua pergunta. E, tendo chegado tão longe, não desistiria agora.

— Eu conheço ou não? – Provocou.

— Céus, John! – Ele se esquivava, o que deixava John ainda mais perto da resposta.

— Só responda.

— Se eu responder, vai me deixar em paz? – Sherlock parecia extremamente nervoso, ou impaciente. John não tinha certeza.

— Vou. – Sorriu, sabendo que poderia estar mentindo.

— Sim, você conhece!

John segurou-se para não gritar o quanto já tinha conhecimento do fato. Estava tão óbvio! E agora tinha quase certeza de que era Irene, um pequeno detalhe que desgostava muito. Antes fosse Molly, que jamais o magoaria ou machucaria. Estaria em paz se fosse ela ou até mesmo Janine, ainda que as chances fossem pequenas para ambas.

Deixou aquele silêncio acalmar os nervos de Sherlock, como se realmente fosse desistir de entendê-lo. Com tudo o que andava pensando, crescia a necessidade de saber mais sobre o amigo. Sobre como ele sentia e por quem. O que fazia ele sentir. O que o tornava tão único e adorável. O que o tornava a verdade mais real que já teve desde a guerra. Precisava se envolver mais com ele para sufocar tudo aquilo que o preenchia, pois, alimentar-se com a dor da Mary nem sempre bastava. Ao menos era no que queria acreditar, fingindo que não estava ansioso para adentrar naquela parte cortante que era ter Sherlock.

— Irene Adler? – Perguntou, vendo-o rolar os olhos sob a luz da televisão.

— Achei que deixaria isso. – Ele suspirou.

— Só responda, Sherlock. – Foi firme, sabendo que se cedesse as birras dele, perderia.

— Não.

— Molly Hooper? – Tentou.

— Não! – Ele quase riu e John sorriu. Não custava a tentativa.

— Janine?

— Com certeza não! – Apesar da resposta dura, um pequeno sorriso brilhou nos lábios de Sherlock, sumindo com a mesma rapidez com a qual surgiu.

Eram as únicas mulheres que lembrava terem se envolvido com Sherlock. Molly era dolorosamente óbvio que ele não amava desta maneira, pois ambos poderiam estar juntos agora, casando talvez. Já Irene não ser correspondida lhe causou certo alívio. A ideia de ver o amigo sofrer finalmente era descartada. Contudo, Janine chegou a lhe causar uma certa dúvida, afinal, ele sorrira tão bonito. Não! Duvidava que Sherlock fosse mentir. Qualquer que fosse o motivo para aquele brilho no rosto do amigo não tinha em nada a ver com amor romântico. Então sobrava apenas...

— Mary? – Indignou-se, sem conseguir conter o nome apenas em pensamento.

— Céus, não! – A resposta de Sherlock lhe confirmara tudo, ele parecia mais indignado que a si próprio — Deixo os sociopatas para você.

John riu baixo da resposta. Tão rude. Tão Sherlock. Tão espontânea.

Sendo assim, não havia mais nomes aos quais apelar. Não se lembrava de mais nenhuma mulher que conhecia qual já houvesse encantado seu amigo, ou convivido com ele por tempo o suficiente para se conhecerem melhor. Donovan sequer poderia ser uma alternativa, visto o ódio mútuo qual um nutria pelo outro. Sem alternativas femininas, lhe sobrou apenas mais uma resposta.

— Você é gay? – Tentou não soar ofensivo, mas pela expressão de Sherlock, havia falhado terrivelmente — Sabe que eu não ligaria, não é?

— Precisamos mesmo ter essa conversa? – Ele estava mais sério do que o esperado e John temeu o que aquilo significava. Ajeitou-se na cadeira, sentindo-se queimar com o olhar acusador de Sherlock.

— Eu só quero saber. Só isso. Não me importo se você for gay. Mesmo. Não ache que isso mudaria...

— Pelo amor de...! – Ele bufou, impedindo John de continuar — Realmente não deveria subir e cuidar de sua filha? Ela pode ter urinado! Que péssimo pai é você se ela estiver chorando nesse exato momento? Sozinha!

— Ela está na minha cama e já tem quase três anos, sabe descer dela. Além do mais, deixei a luz acesa. – Suspirou.

— Ela pode cair das escadas se tentar descer.

— Você a deixou escorregar no corrimão, não finja que acha que ela realmente vai cair! – Bufou, irritando-se com as acusações.

Sherlock, novamente, calou-se e John teria ficado feliz se não estivesse tão perplexo. De tudo o que poderia ouvir, ser acusado de ser um pai ruim era o pior. Deixava o trabalho e se afundava nos pesadelos para cuidar dela. Perdia noites de sono e brigava até com Sherlock pela filha. Nunca se entregou tanto alguém, cedeu tanto a alguém, deixava Sherlock de lado por ela e ainda precisava ouvir tamanha blasfêmia? Conteve-se para não se levantar e quebrar todos os dentes tortos de Sherlock.

— Por que quer tanto saber minha sexualidade? – A voz do amigo o impediu de continuar o xingando mentalmente.

— Não quero saber sua sexualidade, merda! Quero conhecer você. Saber sobre você. Sei tanto sobre sua vida, mas quase nada sobre seus sentimentos. – Bufou.

— É porque não é algo impo...

— Para mim é, ok? – Interrompeu-o — Eu acho importante saber essas coisas. Acho importante entender você. Eu preciso disso agora. Quero esquecer... tudo... e só tenho você para me ajudar! – Apesar das palavras que soltou, manteve-se sério o tempo todo. Não gostava da ideia de cair na frente de alguém, ainda que este alguém fosse seu melhor amigo.

Sherlock, pela terceira vez na noite, ficou em silêncio. John quase estava desistindo, prestes a se levantar e ir se deitar com a filha, até ver o amigo mudar de posição, erguendo as pernas na poltrona e as abraçando. A cena meiga quase acalmou o coração, mas ainda se sentia amargurado, apenas não sabia se era pelas acusações de outrora ou pela pouca confiança que recebia do amigo.

— Não acho que devo me rotular dentro de uma sexualidade, visto que foram quase nulas as vezes que senti interesse sexual por alguém. – Ele respondeu sério, encarando a televisão. Foi quando John percebeu que estava adentrando em um território íntimo para Sherlock.

— E nessas quase nulas vezes, as pessoas eram homens ou mulheres? – Perguntou delicadamente.

— John, – suspirou – eu não me interesso por gêneros nas pessoas, mas pelo intelecto que elas possuem.

— Tudo bem. – Deu-se por vencido, não conseguiria uma resposta concreta ali — Mas a pessoa que você amou é um homem?

— Sim.

— E eu conheço? – Mordeu o lábio inferior, o estômago girou algumas vezes dentro de seu corpo, ignorou-o.

— Sim. – Suspirou cansado.

— Lestrade? – O sentimento de desconforto aumentou quando tornou o pensamento em palavra.

— Não.

— Mycroft é seu irmão... – Disse para si mesmo — Então...

— Não, John! Não é Stamford!

— E...

— Se você falar Moriarty eu juro que saio da sala e te deixo falando sozinho!

John sorriu com a interrupção, adorando a mania de Holmes de ler sua mente, porém a felicidade durou segundos. Já não conseguia pensar em outro nome, no momento, que refletisse o amor de Sherlock. Outro homem na vida dele que conhecesse e fosse significativo. Com certeza Anderson não era, então lhe restava apenas um nome. E este nome não teria coragem de perguntar. Não queria ter a resposta, pois ela seria apenas mais uma facada para se preocupar. De repente, queria voltar a sentir amargura pela partida de Mary e não aquele peso no peito com a mera possibilidade do amor de Sherlock estar tão próximo.

— Você ainda ama essa pessoa? – Perguntou mais baixo do que o usual, acreditando que, talvez, a televisão abafasse sua voz e não precisassem falar sobre.

— Você realmente quer uma resposta? – Sherlock falava no mesmo tom o que aumentava a pressão no peito de John.

— Depende da resposta.

— John, eu posso mentir.

— Para mim? – Engoliu seco, fazendo descer pelo esôfago a queimação que lhe subiu.

— Já menti antes, posso fazer novamente.

— Você é um maldito idiota!

Bufou com certo ódio, mas a pressão nos pulmões não diminuía. Sentia que precisava de ar, mas não sabia se era uma boa ideia sair e deixar a bebê dormindo no andar de cima. Levantou-se, ainda pensando no que fazer. Talvez simplesmente socar Sherlock o fizesse se sentir menos pressionado, menos enganado.

— Vai sair?

O desdém de Sherlock fez John fechar as mãos com certa força, apertando os dedos na palma. Virou-se para o amigo puxando o ar com força pelas narinas. Os pensamentos dos quais fugia, com medo do que sentiria, tentavam romper as trancas de onde estavam, fazendo sua cabeça pesar mais do que o normal. Tentou pensar em Mary e focalizar o ódio nela, mas apenas a voz cortante da mulher se fez presente: anos casada com um homem que ama o melhor amigo. Foi o que bastou para que todas facadas se abrissem dentro de si, quase o derrubando no sofá. Conteve-se por orgulho, ainda que se rompesse mais uma vez naquele maldito ano. Estava tão cansado de tudo ser tão complicado e confuso.

— Você está bem?

Bufou em ódio com a pergunta. O grande dedutor com uma curiosidade tão estúpida! Ás vezes duvidava da inteligência de Sherlock, da veracidade de suas deduções. Não era possível que por todos aqueles anos ele houvesse entendido menos que a si sobre tudo aquilo. Sobre estar ou não bem. Sobre quem amar ou não.

Merda!

E sequer conseguia abrira boca para xingá-lo. Ou mover as pernas para que pudesse derrubá-lo daquele sofá e fazê-lo sangrar. Se pudesse descontar aquela raiva quebrando cada mínimo ossos frágil de Sherlock... sentir-se-ia culpado pelo resto da própria vida, pois nada valeria machucar de verdade o homem que mais amava em toda a Terra. E tudo era tão malditamente confuso!

— John, – ele se levantou do sofá num pulo — eu sinto muito.

Dois passos e John podia sentir o calor de Sherlock próximo o suficiente. Podia se inebriar com aquele cheiro de casa que ele carregava. Sherlock era mais que amor, era lar e estar com ele trazia certo conforto dentro de todo aquele caos que se instalava em sua mente.

John nunca fora um homem de palavras e, agora, começava a sentir falta de ter alguma ação dentro daquele relacionamento conturbado. Daquela amizade complexa demais. Talvez fosse a solução.

— Eu realmente sinto muito.

Com toda coragem que sempre teve, ergueu o rosto, encontrando aqueles olhos de cores distintas sob a luz da televisão. Brilhavam mais do que o normal e John não tinha certeza se eram lágrimas. Puxou o máximo de ar que podia com os lábios entreabertos, tentando dilatar o máximo possível o aparente diafragma contraído. Precisava agir se quisesse que sua mente não entrasse em combustão instantânea com tantas palavras ecoando ali, tantos gestos de carinho que recebera de Sherlock e apenas soaram como amizade, tantos olhares mais intensos que aqueles e ainda assim mais distantes.

— Você disse que a química é extremamente simples... – Murmurou baixo, recebendo um aceno de cabeça como resposta — É o que te fez desvendar o mistério da senhora Cushing, certo? – Outro concordar de cabeça — Você acha que eu amava a Mary? – Não saberia dizer ao certo o que estava fazendo, pois, os pensamentos embaralhados não ajudavam muito. Buscava alguma certeza e aquela fora a única forma que encontrou de verbalizar os sentimentos.

— Acho. – Ele parecia convicto com seu olhar acusador. Ou talvez apenas buscasse por algo, John não sabia dizer naquele momento.

— E você... me ama? – Precisou umedecer os lábios para conter o nervosismo que fazia seu coração palpitar.

— Já disse que sim, creio eu.

— Romanticamente falando, Sherlock. – Não conseguiu conter a acusação na voz.

Segundos passaram pelos olhos brilhantes de Sherlock, correndo como as expressões faciais que ele fazia. John pode reconhecer poucas, como ansiedade e concentração, e já não tinha mais tanta certeza se queria aquela resposta depois de vê-las. O arrependimento nascia do sufoco no peito, tentando devastar todos os outros sentimentos que bagunçavam seu estômago. E sentir tanto nunca o fez tão mal. Sherlock tinha esse poder também.

— Sim. – Ele respondeu tão simples e singelo, com o tom mais calmo que pode contemplar naquela conversa. John chegou a acreditar que estavam falando sobre alguma morte, e não sobre amor, mas a crença se desfez assim que a palavra ecoou em sua mente com todo o contexto do qual nasceu.

— Sim... – Murmurou para si mesmo e já não conseguia mais encarar Sherlock. A acusação estava ali na frente e agora era apontada para si. Um peso a mais para carregar pelos próximos dias.

Ou um alívio.

— John...

Fixou o próprio olhar nos olhos dele mais uma vez, esperando que ele concluísse o que fosse dizer. Porém, Sherlock silenciou-se, desfocando-se da sala como se entrasse no próprio palácio mental. Tudo o que John não precisava no momento!

Num ímpeto de raiva, que sequer John soube explicar, aproveitou-se do pulso fechado e socou o rosto de Sherlock, longe do nariz e dos dentes para não o machucar tanto. O real problema, entretanto, fora a força que empregou para acertá-lo, ao ponto do rosto do Sherlock pender para o outro lado e ele se afastar alguns passos. O que bastou para a raiva ser substituída por remorso.

— Puta merda! – Indignou-se, levando uma mão para apoiar a cabeça de Sherlock e a outra, a direita qual usou para socá-lo, para tocar o local que o acertou.

— Eu realmente sinto muito. – A voz bastou para quebrar os resquícios que mantinham John inteiro.

Com a ponta dos dedos trêmulas, John acariciou o lugar avermelhado na pele de Sherlock, temendo que pudesse sentir alguma umidade ali. A mão esquerda deslizou do rosto para os cabelos desgrenhados pelo recente banho, sentindo a maciez que sempre imaginou carregarem.

Em cacos, sentiu-se encontrar o chão. Jamais quis machucá-lo. De todas as coisas que poderia fazer, deixá-lo sangrar era a única delas que não deveria ter cogitado. Quebrou-se ali, no entanto, não pelas palavras, mas por Sherlock, ainda que de olhos fechados, deixar escorrer gotículas minúsculas pelo canto de ambos os olhos. John não se lembrava de já tê-lo visto chorar antes. Quebrou-se. Quebrado, já não precisava mais se segurar. Quebrado, já não havia mais motivos para não cair.

— Eu só...

John não o permitiu terminar a frase, pois o puxou com delicadeza para mais perto, o que fez Sherlock abrir os olhos lentamente. Na fraca iluminação descobriu o formato daquelas irises coloridas e o tamanho daquelas pupilas dilatadas, ainda que ofuscadas pela umidade; o contorno singular dos lábios e a cor avermelhada que os pintava. Descobriu-se, também, ansiando saber até que ponto Sherlock teria gosto de lar também.

Fora das próprias convicções, deixou-se cortar o pequeno distanciamento, inclinando-se o mínimo para sentir o gosto daquela boca. Sherlock não relutou, não se afastou. Ali sentiu a breve entrega dele, quando ele relaxou até ambos os corpos se tocarem. Era a permissão para John beijá-lo e desfrutar de tudo aquilo que esteve preso dentro de si nos últimos anos. E Sherlock não parecia se sentir diferente, deixando que os próprios dedos frios tocassem a mão de John pousada no próprio rosto, entreabrindo os lábios para recebê-lo, dedicando-se ao beijo com mais carinho do que Watson poderia acreditar.

Ele sabia beijar!

Precisou se afastar para não rir durante o beijo. Uma felicidade inexplicável explodiu dentro de si o suficiente para querer gargalhar sem motivo algum. A constatação de que Sherlock sabia beijar também ajudou no processo de alegria plena. Nunca pensou que descobriria esse detalhe sobre ele de uma maneira tão própria.

— O que foi? – Sherlock perguntou ainda de olhos fechados e com os lábios entreabertos. John podia sentir o ar que lhe fugia da boca.

Não respondeu, inclinou-se e voltou a deliciar-se com o gosto de plenitude que sentia quando sua língua encontrava a de Sherlock. Sentia-se até pecaminoso por descobri-lo com tamanha intensidade, o suficiente para as partes íntimas queimarem. Normalmente não se excitaria com um mero beijo, mas a situação era o extremo oposto da normalidade. Provar daquele amor clandestino lhe era novo o suficiente para estar se redescobrindo na boca de Sherlock, no cheiro dele, no momento que nascia ao redor dos dois.

Chegou em um momento que John precisava mais do que simplesmente tê-lo colado ao próprio corpo. Precisava descobrir o quão quente ele poderia ser, que sons fazia quando perdia o controle do próprio corpo e qual a expressão predominante quando não houvesse mais um palácio mental para se esconder. Uma necessidade nova a qual adorou imaginar-se cedendo. Não quis esperar mais, finalizou o beijo sugando o lábio inferior do maior, deleitando-se com um breve murmúrio que lhe escapou dos lábios. Sorriu.

— Vem. – Segurou-o pela mão e se afastou.

— Onde? – Sherlock sequer se moveu, ofegando baixo. Atordoado de uma maneira tão única que John encantou-se.

— Quarto! – Riu baixo, puxando-o para que pudessem seguir até a cozinha.

— Fazer o quê? – Ele cedeu com as pernas bambeando a cada passo que dava.

— Céus, Sherlock!

Sequer deu-se ao trabalho de responder, atravessando o pequeno corredor abriu a porta do quarto de Sherlock e o empurrou para a cama com certa brutalidade. O amigo caiu sentado e John fechou a porta rapidamente. Encarou-o na cama e respirou fundo.

Se fosse até o final não teria mais volta. Entregar-se para Sherlock seria aceitar tudo o que escondeu até de si mesmo por anos. Seria perder Mary para sempre. Seria aceitar-se com todos os problemas que viriam a seguir. Deitar-se com Sherlock não seria como deitar-se com uma mulher e entrar em um relacionamento com ele, definitivamente, não seria como se relacionar com um humano. Nunca foi. Eram seus últimos segundos para desistir e voltar ao próprio quarto, apagando aquele momento singular no qual se sentiu leve o suficiente para não haver culpa.

E talvez fosse o certo a se fazer.

— Ninguém pode nos ver. – Sherlock lhe chamou com uma voz doce que John quase não reconheceu — Ninguém precisa saber. Ninguém nunca precisou saber. – Mas John percebeu o entoar temoroso que veio a seguir, relutante, como se Sherlock jamais tivesse deixado de chorar.

— É delicado... – Suspirou, dando-se por vencido. Precisou encarar o chão para não se entregar as verdades de Sherlock tão rapidamente. Para não correr até a cama e aninhá-lo, ignorando os próprios medos para salvá-lo dos dele.

— Eu sei. – Ele levantou-se da cama e John sentiu-o envolver todo o quarto. Ergueu a cabeça, buscando nele mais convicção. Sherlock se aproximou — Você também é. Nós somos.

John mordeu o lábio inferior com tamanha proximidade. Sua vontade de pensar se dissipava aos poucos com Sherlock colando o próprio corpo ao seu.

Talvez, se ninguém ficasse sabendo, pudesse se perdoar por ser quem era, como era. Se cada sentimento ficasse apenas preso dentro daquele quarto, então não estaria exposto, desnudo e tão entregue a tudo o que não conseguia suportar.

Talvez até pudesse manter Mary em algum lugar dentro de sua mente sem se sentir culpado.

Talvez amar Sherlock, naquele escuro, naquele esconderijo, naquela solidão, fosse menos errado e menos doentio.

Talvez sua família o aceitasse, enquanto Sherlock fosse apenas um lindo segredo.

Pela terceira vez naquela noite, John se viu se inclinando para encontrar os lábios do melhor amigo. A mão esquerda o puxou para si pela nuca, sentindo os pequenos pelos dali se arrepiarem. A mão direita o trouxe mais para si pelo quadril, adentrando, então, as vestes complicadas para descobrir o quão quente aquela pele era. E estava tudo bem afinal. Tudo bem em descobri-lo naquele segredo tão clandestino.

15 Décembre 2018 15:29 0 Rapport Incorporer Suivre l’histoire
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La fin

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A. G. Mars We'll be a fine line... we'll be alright

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