Notas iniciais: essa história pertence ao desafio FantasticoInk, com o subtema Intrigas da corte.
Créditos da fanart de capa pra @Luerstine, no twitter. Capa "censurada" não por causa de regras de site ou coisa assim, mas porque algo assim não acontece na fic. Apesar daquele detalhe duvidoso, a capa encaixava na fic e a Bárbara tapou a situação AOSKSKSJ
Espero que gostem, desculpem qualquer erro.
Rei se mantinha calma e indiferente em frente ao marido em sua despedida. Ao lado da mais nova amante, ele ordenou aos servos que deviam segui-la para todo e qualquer lugar. Não que fossem fazer isso por obediência a ele.
Na surra de ontem, por ter castanhas no bolo do jantar (coisa que de forma alguma era culpa dela, já que não tinha mais autoridade nem mesmo sobre a cozinha do próprio palácio), conseguira proteger a barriga. Ainda sentia a vida dentro de si, mesmo que suas costas tivessem tantos hematomas. Valeu a pena.
Rei Todoroki era a verdadeira rainha do reino Shimizu, obviamente, mas seus pais a sortearam para o nobre mais rico da redondezas para que ele pudesse ser rei. Por ser mulher, claramente não estava apta para governar.
Odiava seus pais. Odiava seu marido.
O processo para escolher aquele com quem obrigatoriamente dividiria a vida fora basicamente um sorteio entre os mais abastados do reino, além de certo requisito, e Endeavor ganhara. Nada do que dissesse iria impedir os pais, pois nenhum deles achava que uma mulher seria capaz de comandar o reino.
E ali estava ela, há quatro anos nas mãos de Endeavor.
Enji Todoroki, que desistiu de seu sobrenome de família para poder ser rei (exigência de sua família), era um completo imbecil. Se ela não era apta por ser mulher, segundo aquela lógica machista e deturpada, assim mesmo se aceitou um homem completamente incapaz de ordenar uma simples casa, quanto mais seu reino.
Além de incompetente, era um monstro. Rei, tola, no início chegou a se apaixonar por ele. Um homem forte, que se fingiu gentil para conquistá-la, achando que isso lhe traria pontos para ser escolhido. Como se a opinião dela importasse.
Depois do casamento, ele começou a mudar. Gradativamente tudo foi se deteriorando, até ele assumir publicamente suas amantes sem se importar com nada mais e ignorar quase completamente a esposa.
Quase. Eles tinham três filhos, frutos do amor de Rei por seu carrasco e a determinação de Endeavor de fazer herdeiros suficientes para sua linhagem permanecer no trono.
Mas Rei não era uma mulher que aguentaria de tudo e mesmo que ainda o amasse, as surras, as amantes e a fome que começava a assolar o seu povo eram a gota d'água. Era hora de agir.
O quarto filho em sua barriga era a chave de seu plano. Não o deixaria crescer no ambiente deturpado do Castelo, assimilando aquele ser como seu pai. Não.
Sabia o que faria, e precisaria da ajuda dele, o homem que era o completo oposto de seu marido.
O plano tinha que ser discreto.
Endeavor não sabia daquele filho. Para ele, estava mandando sua mulher para uma viagem fútil para comprar roupas e tecidos num reino distante.
Mas Rei não ia tão longe. Estaria bem perto, na verdade. Não era a única inimiga que seu marido desprezava e subestimava, seus servos e seus aliados a ajudariam em cada detalhe para mantê-la segura enquanto esperava sua criança nascer.
Quando Endeavor terminou de transmitir suas ordens, ela subiu na carruagem e eles partiram para o pedaço de terra sem dono onde o guerreiro livre All Might vivia.
...
— De novo, Shoto.
Shoto repetiu o golpe em Aizawa. A espada pesava em sua mão, mas não era hora de intervalo. Todos estavam assistindo, inclusive Midoriya, e, talvez, ele estivesse ainda mais determinado em derrotar seu Mestre por isso.
Avançou os passos cansados, vendo o oponente mal parar para pensar ao interceptar seus golpes. Estava errando demais.
Parou de avançar. Respirou fundo. Viu Aizawa se aprumar e segurar a espada melhor. Ele também percebera a mudança em sua postura. Todos perceberam.
De repente, jogou a espada contra seu Mestre com as duas mãos. Deu tudo de si. A mudança de atitude era notável e ele estava bem mais como ele mesmo agora.
Era uma demonstração. Na clareira perto da casa de seus Mestres eles batalhavam contra EraserHead, um a um, enquanto os outros observavam os possíveis erros cometidos pelos colegas de treinamento.
Shoto não conhecia uma realidade diferente daquela. Ele cresceu com All Might e EraserHead, criado desde sempre com os dois e Midoriya, que visitava frequentemente por morar no reino vizinho.
Seus mestres viviam numa terra oficialmente sem dono, mas que ninguém ousava tentar tomar por saber o que acontecia ali, ou no mínimo terem ouvido algumas lendas.
Os dois amantes treinavam guerreiros. Guerreiros livres que seguem apenas seus ideais, atuando em qualquer guerra ou desastre no qual inocentes precisassem de sua ajuda.
Ele não sabia por que sua mãe o colocara ali. Ele recebia cartas dela ao menos três vezes ao ano, sempre, sem falta, na data de seu aniversário, e outras variadas. Às vezes tinha dinheiro ou presentes pequenos, mas claramente caros.
Não entendia por que não podia viver com ela, parecia uma mulher gentil e dizia lhe amar, All Might sempre falava bem dela, então qual o motivo dele ter que viver ali?
Não que não gostasse, ou não fosse grato aos seus mestres, mas era sua mãe. Ele queria saber como ela era. Conviver com ela. Qual seria a cor dos cabelos dela? Como seria sua voz?
Qual seria a sensação de poder correr para seus braços ao chorar?
Desviou seus pensamentos desse rumo ao notar seu Mestre em cima de si, espada em seu pescoço. Se distraiu e perdeu. Era bom se preparar para escutar.
— Shoto, está distraído demais hoje. Por acaso achou que por ter me vencido semana passada não precisava mais se preocupar comigo como oponente?
— Não, senhor.
— Não foi o que pareceu. Sente-se antes que eu chute sua bunda daqui, moleque.
— Perdão, senhor.
Shoto se sentou ao lado de Midoriya, observando Kirishima se levantar, sendo o próximo no combate.
— Sabe que está tudo bem, não é? Todos ficamos distraídos às vezes, mas o Aizawa gosta de pegar no nosso pé pra gente não achar que ele é mole.
Midoriya era sempre assim, o cara que ajuda todos e sempre diz palavras doces de incentivo. Ele era especial, definitivamente.
— Seu merda, tava com a cabeça onde? No cu? Numa luta de verdade você não pode se distrair, porra.
— Kacchan, não precisa ser assim.
E, diferente do garoto doce de cabelos verdes, o loiro sentado de seu outro lado tinha uma forma diferente de apoiar as pessoas.
Shoto demorou a entender o jeito dele de demonstrar preocupação e afeto, mas eles se entenderam ocasionalmente.
Por trás dos palavrões e o tom rude, Bakugou acabara de dizer, na verdade, que não podia vacilar daquela forma numa luta real, pois custaria sua vida, portanto tinha que ser melhor nos treinamentos.
No fundo, em algum lugar, ele era um cara gentil. Em algum lugar.
Focou no treino de Kirishima. Ele era melhor no combate corpo a corpo, então, inteligentemente, desarmou Eraser de sua espada e o obrigou a lutar desta forma consigo.
Tornar os aspectos da luta favoráveis a si, transformar as desvantagens em vantagens.
Ele aprendera bem isso. Muitos pensavam que o colega era puro músculos, aqueles que não o conheciam, mas os que pertenciam ao grupo sabiam de sua inteligência, a capacidade estrategista dele.
No grupo de seus Mestres haviam poucos, mas apenas os melhores jovens. Homens e mulheres fortes, treinados com excelência para se usarem de seus talentos para o bem, para proteger inocentes.
Mesmo que quisesse conhecer sua mãe, era grato pela convivência com aquelas pessoas.
Ainda assim, queria saber seu sobrenome. Shoto era seu primeiro nome e achava íntimo demais que todos o chamassem assim, mas não conseguia descobrir seu sobrenome, aqueles que o criaram como seu filho não lhe contariam.
— Shoto.
Ele se virou para trás ao ouvir a voz conhecida lhe chamar. All Might, Toshinori Yagi, seu mestre, o amante de Shota Aizawa, lhe chamava, com o sorriso grande no rosto. Enquanto Aizawa era um homem magro, alto, facilmente se passando por alguém inofensivo, Yagi era considerado por muitos um brutamontes, muito alto e muito forte.
Mas se Shoto tivesse que dizer, afirmaria que EraserHead era muito mais perigoso que All Might, justamente por ser um inimigo subestimado.
— Vi seu treinamento. Se concentre mais da próxima vez, hum?
Shoto assentiu.
Ele não recebia cartas de seu pai. Nunca fora mencionado se ele tinha um. Talvez ele estivesse morto.
Seu pai seria como All Might? Ou como EraserHead?
Queria descobrir.
...
— Dance para mim. — sussurrou Endeavor, no ouvido da prostituta sorridente.
E Rei só ouvira pois estava ao lado dele, no trono, com a face indiferente. Não havia mais um pingo de amor depois daqueles 20 anos de casamento, principalmente depois do que ele fizera com quase todos os seus filhos. Seus filhos, exceto um.
Sentia falta do pequeno Shoto todo dia. Ficara com ele apenas o suficiente para amamenta-lo, mas tinha apenas um ano na viagem e teve que voltar logo, já que partira já quando a barriga começara a aparecer.
Mandava cartas para seu filho sempre que podia,mas não devia levantar suspeitas para Endeavor, o principal do plano era a surpresa, o fato dele subestimá-la daquela forma.
Era sofrido não estar com seu filho, mas estava em paz de saber que ele cresceu com All Might, criando os valores de um homem de verdade, forte e honrado, e não vendo o exemplo de seu progenitor e sendo influenciado por ele.
Enquanto Endeavor bebia e comia na presença de prostitutas caríssimas e dava festas desnecessárias para pessoas que não convinha, seu povo morria de fome, pequenas revoltas ocorriam em todo lugar e ele não mexia um dedo.
Mas estava na hora de agir.
Como bom idiota de ego frágil Endeavor cairia como um patinho em seu plano. Ela continuava sendo ignorada e subjugada, juntando aliados por debaixo dos panos, fazendo seus movimentos bem embaixo do nariz dele.
Endeavor parecia não saber que a peça mais forte no xadrez na verdade é a rainha.
...
Finalmente era a hora do desenrolar da história, a hora de agir. Rei estava na carruagem, numa viagem de um mês supostamente para comprar jóias num reino vizinho.
Na verdade, estava indo buscar seu filho, alguns reinos mais tarde, pois era a hora de seu plano ser posto em prática.
Como muitas revoltas menores incitaram também grandes nobres do país a desafiarem a “supremacia" de Endeavor, ela conseguiu plantar a ideia, fazendo parecer que tudo saira da cabeça dele, de que devia abrir um desafio para qualquer um que quisesse tentar roubar seu trono.
Sabia que aos olhos de seu marido aquela era uma ótima oportunidade de amaciar seu ego, se exibir e acabar com as revoltas tudo de uma vez, e ele não hesitou em espalhar a notícia. Em dois meses as lutas do desafio ocorreriam, sendo transformadas num grande show por parte do desafiado.
Ele não acreditava que podia ser derrotado por qualquer um naquele reino, sempre arrogante. Mas era com isso mesmo que Rei contava. Tanto para a ocorrência do plano, quanto porque seria seu filho a vencê-lo.
O plano da rainha era levar seu filho de volta para casa para o desafio, onde derrotaria seu pai e teria direito à Coroa legalmente, já que se apenas matasse Endeavor e reclamasse Shoto como Rei, poderia sofrer alegações de traição e seu filho poderia ser considerado um bastardo. Se outro vencesse, o plano iria por água abaixo.
Além disso, também tinha que dar conta dos, poucos, mas ainda sim existentes, aliados de Endeavor, para que não tentassem nada para proteger o Rei ou coisa do tipo.
Todos os preparativos eram mesmo importantes, sim, mas estava, principalmente, ansiosa para encontrar seu filho. Como estaria seu menino? Agora com 16 anos, um rapaz formado. Seria bonito? Forte? Teria se bronzeado vivendo naquele campo ensolarado, em contraste com sua pele pálida pelo frio ao que era acostumada?
Dúvidas mais cruéis também a perturbavam:
Ele a entenderia? Abraçaria o plano? Arriscaria a vida pela mãe que o abandonou? A odiaria?
Estava ansiosa, aflita, para dizer o mínimo. Era angustiante pensar que seu menino poderia lhe negar um abraço ou um beijo.
Depois de algumas semanas na estrada, Rei chegou à casa grande, porém simples, que abrigava os amantes All Might e EraserHead. Ela mesma já fora salva pelo homem loiro quando criança, e ouviu várias histórias de suas servas sobre as bondades daquele homem. Ah, se pudesse ter se casado com um homem como esse e conhecido a paz e o amor recíproco. Não estaria planejando fazer seu filho assassinar o próprio pai.
Seguiu com seus guardas aliados até a clareira que conheceu quando vivera ali enquanto grávida. Vários jovens, meninos e meninas, treinavam em duplas utilizando-se de espadas, machados, correntes, lanças e alguns até mesmo o próprio punho.
Seu olhar correu entre todos os meninos e, sem hesitar, reconheceu o fruto de seu ventre. Ele se parecia tanto com os irmãos. O cabelo a divisão exata entre seus platinados e o maldito ruivo de Endeavor. Ele era alto, forte e ágil em seus ataques com a espada, o menino de cabelos verdes que treinava com ele mal conseguia contra atacar.
Notou uma mancha, uma marca no rosto outrora imaculado de sua criança, uma cicatriz de queimadura no lado direito da face do menino. Se perguntou o que causara aquilo. Apesar disso, seu filho parecia saudável, bem em todos os sentidos.
A expressão séria e concentrada em seu rosto mostrava o respeito dele pelo oponente.
Estava ali, parada meio longe do local, embasbacada observando o próprio filho, até que All Might a notou, parando de observar os alunos. Ele a encarou com a face séria, invés do sorriso típico. Ele sabia de seus planos e sabia que, se ela estava ali, então chegara a hora.
Então, se recompondo, ele sorriu e começou a andar em direção a ela, fazendo Aizawa e todos os alunos pararem o treino para prestar atenção nela, gradativamente. O homem a abraçou apertado, soltando-a em seguida e ela cumprimentou o marido dele de longe. Os dois eram muito diferentes.
Notou que seu menino a olhava. Se ele crescera mesmo sendo doutrinado pela inteligência de EraserHead, já devia desconfiar de quem ela era. Ficou nervosa.
— Olá, Shoto. — murmurou, se aproximando.
— Você é quem, velha? — um menino loiro gritou consigo, em tom rude. Por algum motivo, não se ofendeu.
Ele não estava deliberadamente sendo grosseiro. Se posicionara, discretamente, à frente de Shoto. Queria protegê-lo.
— Bakugou, está tudo bem. Eu… eu acho que ela é minha mãe.
Rei sorriu. Sentiu o olhar de todos do grupo serem direcionados a ela, todos curiosos. Não sabia o que dizer. Queria pegar seu menino e beijá-lo e abraçá-lo milhares de vezes, mas o olhar dele a impedia. Era indecifrável.
— Sim, ela é. — Aizawa interviu ao perceber que ela ainda não conseguia falar. — Vocês precisam conversar.
Shoto largou a espada no chão e se despediu de Midoriya com um aceno breve, tocando o ombro de Bakugou ao passar por ele e trocar um olhar com Kirishima para que o ruivo cuidasse do loiro.
Entrou na casa em que morou durante toda sua vida sendo seguido por sua … mãe? E All Might.
Assim que se encontraram na sala do local, ele se virou e encarou a mulher. Ela era linda e parecia bem jovem, tinha cabelos brancos e olhos claros, era baixinha e tinha um sorriso doce direcionado para si.
Sem dizer nada, Shoto andou até ela e a abraçou. Queria saber a sensação de ser abraçado por sua mãe mais do que tudo no mundo.
Rei não esperava aquilo, mas estava feliz. Acolheu sua cria num abraço forte, alisando suas costas e beijando o topo de sua cabeça, como sempre imaginou fazer com sua criança quando ele corresse para si machucado.
Mais rápido do que queria, ele se afastou e a encarou, ainda com a face indiferente, mas o olhar profundo. Seu filho tinha heterocromia. Era um aspecto bem incomum em seu reino, mas não em outros lugares. Olhando bem fixo nos olhos dele, achava que aquela característica envolvia ainda mais quem o olhasse, parecia ainda mais profundo.
Seu menino era mais alto do que si, tão forte e...lindo. Seria um grande rei. Se assim o desejasse, o que a lembrava do porquê estava ali.
— Shoto, como vai, meu filho?
Ele a soltou e a encarou, engolindo em seco. Aquela era sua mãe? O abraço dela era tão quente, seu tom e sua postura para consigo tão doce e gentil. Tinha muitas perguntas, mas tinha ainda mais vontade de se agarrar a ela e não soltar mais. Não imaginava que estava tão carente dela.
— Estou… bem. — ele sussurrou.
— Owwn.
Eles tinham esquecido All Might bem ali no canto da sala, até então.
Isso fez a rainha se apressar em ir direto ao ponto.
— Bem, filho, sei que tens muitas perguntas a fazer, mas tenho muito a dizer também. Primeiro, acho que devo explicar por que estamos nos conhecendo agora, não é?
Shoto assentiu.
— Você é um Todoroki, filho. Shoto Todoroki,meu filho. Seu pai é um incompetente escolhido para governar o reino apenas por ser homem. Resumindo a história, desde que nos casamos e seus irmãos nasceram ele foi ficando gradativamente mais indiferente para o reino e a família, exceto quando lhe convinha. Seus irmãos sofreram tanto. Não queria que crescesse tendo ele como figura paterna, e eu tinha um plano para tirá-lo do poder, precisava que fosses forte e bondoso, e que ele não soubesse sobre ti para que o plano funcionasse. All Might foi minha melhor opção.
— Sua mãe veio até mim escondida, Shoto, com a barriga ainda discreta, e você nasceu aqui, no quarto onde dorme até hoje. Ela me pediu para cuidar de você até que fosse a hora de reclamar seu lugar de direito no palácio, e chegasse a hora de executar o plano.
— Então eu sou só um plano, deixado de molho até que servisse?
— Não é só isso, meu filho. Você sabe dos seus poderes, não sabe? — Shoto assentiu — Eles são normais aqui, com All Might e EraserHead, Mas nossa raça peculiar, com esses poderes, está em extinção há muito tempo. Há coisas que muitos não sabem. Os guerreiros que All Might junta não são apenas pessoas de bem dispostas a ajudar inocentes, todos têm esses poderes. Mas isso não é assim tão bem aceito na maioria das sociedades, filho. Estamos quase extintos pelo medo que os normais têm de nós. Humanos temem o que não conhecem, e o que eles temem eles matam. Muitos de nós foram queimados nas fogueiras, perseguidos. Em meu reino, nós viramos lendas antigas contadas para as crianças antes de dormir e nada mais. Seu pai também é um de nós. Ele domina e cria fogo, mas nem ele mesmo sabe. Seus pais sabiam, e convenceram os meus de que unir nossos sangues daria origem a seres poderosíssimos que possuiriam ambos os poderes, além de todas as outras vantagens. E assim foi. Assim como você, seus irmãos também podiam dominar gelo e fogo. Mas nossos pais não contavam com a burrice de Endeavor. Ele descobriu de uma única vez que as crianças podiam dominar esses elementos, eu não estava por perto, elas estavam brincando no quarto. Shoto, esse homem é um fanático religioso, como tantos que existem por aí ainda. Quando eu vi, já era tarde. Assisti meus filhos queimarem até a morte, mortos pelo próprio pai. Os gritos dos seus irmãos me assombram até hoje.
Shoto pasmou. Era muita coisa para digerir de uma vez, mas o primeiro sentimento em seu coração foi o de ódio. Ele acabara de descobrir sua mãe, tivera irmãos, porém agora sequer os conheceria pois o pai que nem sabia que tinha os matara.
Que tipo de homem era aquele? Ele não conhecia uma maldade como aquela.
Até então, suas figuras paternas eram os homens que o criaram naquela casa afastada, o doce, gentil e sorridente All Might e o sério, mas sempre responsável EraserHead. E eles nem eram seus pais de verdade, então como alguém que o era poderia fazer isso com os filhos?
Em sua mente rápida, logo um novo medo começou a nascer: se ele era capaz de fazer aquilo com os próprios filhos, o que não faria com sua mãe?
— Ele já machucou você? — perguntou hesitante.
— Sim, mas isso não importa muito. Preciso conversar com você sobre nosso plano, filho. Está disposta a se vingar de seu pai?
— Sim.
— Tudo bem. Seu pai está promovendo um desafio, filho. Eu fiz ele pensar que era uma ideia dele, apesar de ser minha. Qualquer um que conseguir matá-lo em um confronto com espadas pode tomar o trono. Obviamente, ele acha que ninguém no reino é páreo para ele, e apesar da incompetência como rei, não posso negar que ele é forte e um grande guerreiro. O povo pacífico de Shimizu, que não vê guerras com outros povos há décadas e apenas iniciam pequenas revoltas contra o rei não está apto para vencê-lo. Preciso de você, filho, e preciso que esteja pronto.
— Eu preciso matar meu pai? Só isso?
Shoto não fazia questão disso, era contra os princípios que aprendeu machucar inocentes, mas o homem que matou seus irmãos e machucava sua mãe não era um inocente. Iria massacrá-lo.
— Claro que meu plano não se resume a isso. Seu pai tem aliados, poucos, mas tem, é preciso lidar com eles para que tudo não vá por água abaixo mesmo que consiga matar Endeavor. All Might? Posso contar com você?
Mesmo que não imaginasse que seria fácil convencer o filho, para Rei a parte mais difícil era convencer All Might a lhe ajudar. Ele não comprava brigas de outrem apenas por favores, muito menos por dinheiro, não para machucar os outros sem um motivo plausível, em guerras que envolviam ego de reis e sangue desnecessário sendo derramado.
— O que eu precisaria fazer?
— Eu preciso apenas prender aqueles que se rebelarem em nome de Endeavor, para que jurem lealdade a Shoto. Não preciso de mortes desnecessárias no meu ombro.
— Ajudarei você. Não abandonarei uma amiga numa hora como essas. Vai precisar de toda ajuda possível e por isso falarei com meus outros alunos. Espero que esteja certa do que quer fazer, Rei, ele ainda é o rei, aquele que governa, e a nobreza do seu reino tem sido conservadora por muito tempo. Se algo falhar, todos sabemos que ele não hesitaria em matá-la.
— Não vou voltar atrás agora, All Might. Vingarei meus filhos, e me certificarei de que se algo falhar eu seja a única a morrer e meu último filho possa viver em paz.
Aquela mulher pequena, com o olhar doce e o abraço gentil e quente que lhe derreteu, falava tal coisa exalando determinação. Não entendeu como ela poderia ser tão corajosa e determinada, mas não ousou duvidar da força que viu em seu olhar.
Aquele ser complexo, que num momento lhe dirigia tanto amor, e no outro falava sobre o assassinato do próprio marido, era sua mãe?
Tinha muito sobre ela que tinha e queria conhecer.
— Se está tão determinada, tudo bem. Estarei sob suas ordens Rei, eu e meus alunos que se juntarem.
— Pensei que esse fosse o tipo de decisão que tomávamos juntos, Toshinori.
Shota Aizawa entrava pela sala, provavelmente depois de ter escutado toda a conversa. O professor tinha esse dom de aparecer pelos lugares de surpresa, sem fazer barulho ou ser visto por ninguém.
— Não que você seja contra, não é, amor?
Shoto riu. O Mestre só fazia uma demonstração de afeto publicamente com o outro homem quando sabia que estava encrencado por algum motivo.
— Não. Não me oponho, pode contar comigo também, Rei. O que não necessariamente diminui sua culpa, Toshinori.
O homem mais forte sorriu amarelo para o mais velho. Vivendo naquela casa, o garoto presenciara mais demonstrações de carinho entre os dois do que os outros alunos, e achava interessante e engraçada a dinâmica entre eles.
Será que algum dia ele teria aquilo também? Alguém que reclamasse com ele por queimar o pão, que lhe preparasse uma sopa quente quando estivesse resfriado, alguém que… que o beijasse quando tivesse que viajar para longe e sentisse sua falta enquanto esperava.
Corou ao se imaginar naquelas situações com uma pessoa específica. Ficava cada vez mais difícil ignorar aqueles sentimentos.
Nas semanas seguintes, Shoto teve a companhia de sua mãe. Enquanto todos os alunos que desejaram ajudar o colega aumentavam a intensidade de treinamento, se preparando para o combate, inclusive ele mesmo, o garoto, à noite, dormia com sua mãe.
Dormir na verdade é um jeito de falar, já que eles mais conversavam do que dormiam. Suas cores, comidas, estações do ano e histórias preferidas já eram de conhecimento um do outro, e o laço mãe e filho se estreitava cada vez mais.
Aos 16 anos, pela primeira vez na vida Shoto dormia abraçado em sua mãe, sentindo o conforto e o carinho dela e Rei chorava enquanto seu filho descansava em seus braços, finalmente podendo passar um tempo com o único filho que lhe restara.
Se o plano desse certo, eles teriam toda uma vida para continuar naqueles momentos.
Quando chegou o tempo de ir, Shoto estava triste. Passara apenas duas semanas com sua mãe e ela já tinha que ir embora, enquanto ele esperava o dia do desafio para ir para o reino de Shimizu, ao qual, agora sabia, pertencia.
Se despediu de sua mãe segurando as lágrimas, e eles prometeram que se veriam de novo.
Sua mãe foi embora e Shoto Todoroki ficou para trás, para aproveitar o pouco tempo que lhe restava para se preparar para matar seu pai.
...
Então, foi chegada a hora. Todoroki se preparava para a luta contra seu pai e seu colegas se preparavam para impedir que os aliados de Endeavor fizessem qualquer coisa que impedisse o garoto de subir ao trono.
Rei Shoto, o garoto que crescera naquela casa simples numa terra de ninguém sendo treinado como um guerreiro, seria Rei de Shimizu, um lugar que ele desconhecia completamente.
Não seria fácil. Era tolice pensar que o mais difícil seria vencer seu pai, porque suas provações não acabariam por aí.
O que o confortava era saber que seus amigos estariam consigo.
Não que fosse comum para ele se referir aos colegas de treinamento como amigos, mas foi o que percebeu que eles eram naquelas últimas semanas.
Mina Ashido, Tsuyu Asui, Tenya Iida, Ochako Uraraka, Denki Kaminari, Eijiro Kirishima, Fumikage Tokoyami, Katsuki Bakugou, Izuku Midoriya e Momo Yaoyorozu, todos aqueles que cresceram treinando com ele o ajudariam para que se tornasse rei, arriscariam sua vida por ele.
Todoroki nem sabia o que pensar.
Todos eles partiram para o castelo, que em breve lhe pertenceria, para mudar o destino de um reino.
A bagunça era tremenda e o barulho ao redor era ensurdecedor. Depois de conseguir se infiltrar no Castelo, já com a armadura, Shoto se voluntariou para o desafio e viu com seus próprios olhos o quanto o rei subestimava seus inimigos; sequer teve que dizer seu nome ou mostrar seu rosto, apenas o colocaram no corredor de entrada da arena onde enfrentaria o soberano.
Ele realmente transformara aquilo num grande show, milhares de pessoas eram servidas de bebidas e comidas enquanto gritavam ao assistir a primeira batalha. Um homem forte, mas com uma armadura frágil batalhava contra o rei, e Shoto podia ouvir dali que os gritos não eram a favor do governante, não em sua maioria.
De fato, o reino estava fragilizado. Era a melhor hora para tomar seu trono.
Deuses, como era estranho pensar isso. Seu trono, ser rei. A ideia ainda era abstrata em sua mente, mas ele viu o oponente atual de seu pai cair por terra e percebeu que teria que se acostumar com a ideia logo, pois seria realidade muito em breve.
Bakugou ouvia com raiva a conversa dos homens atrás de si.
Eles se dividiram em grupos menores para cercarem aqueles que a rainha argumentou serem mais perigosos, para dar cabo deles antes que atrapalhassem o plano.
Sim, talvez ela não tivesse falado “dar cabo", talvez tivesse sido mais como “imobilizar" mas para ele não fazia muita diferença. Principalmente com os dois idiotas atrás de si falando tanta merda. Ele não sabia tudo que o tal Endeavor fizera, sabia que Shoto estava escondendo a maior parte, mesmo dele, do cabelo de merda e do inútil, que eram os mais próximos do meio a meio imbecil, mas só por aquilo que ouvira, já odiava o cara.
Ele viu Shoto sair pelas grades pequenas para a arena, enquanto o corpo do oponente anterior era arrastado para fora.
Não estava aflito. Assistira com atenção o rei de merda lutar e, mesmo sem usar os poderes, Shoto era forte, reconhecia isso. O Endeavor não tinha a menor chance.
A batalha começou. Shoto usava a espada forjada por ele mesmo. Aos 14 anos, todos os alunos de All Might e EraserHead forjavam sua própria arma, depois de trabalharem para o velho ferreiro do reino ao lado como ajudantes.
O merdinha estava claramente tentando cansar o rei, notou após alguns minutos. Havia notado que se fosse um embate de força, ele jamais ganharia, então fazia com que ele tivesse que correr, atacar com força, se movimentar, para que ele cansasse ou se distraísse e conseguisse uma brecha para atacar.
Odiava o merdinha e o inútil por esse tipo de estratégia. Sempre funcionava com ele mesmo, até que aprendeu a fingir que caía no plano deles para usar o feitiço contra o feiticeiro. Mas demorou anos para montar a estratégia que de fato derrubou Shoto, se o rei era tão burro quanto ouvira, ele jamais se daria conta do que precisava fazer para vencer antes que caísse morto.
Estava funcionando. Sua mãe lhe falara os pontos fracos do rei, o que seria melhor fazer e o que era melhor evitar, e só esperava a brecha perfeita para vencer. Como planejara, seu pai estava cansando-se, ofegante, mais lento em seus ataques, embora a força fosse a mesma.
A ele só restava desviar dos ataques mais perigosos, e sabia que se sua armadura não fosse de boa qualidade, já estaria ferido gravemente.
Sua espada não era tão elegante quanto a de Endeavor, mas ele trabalhara duro para fazê-la resistente e cuidava da manutenção dela com atenção e minuciosamente. Assim, dava conta, junto com suas habilidades, de se defender dos ataques violentos de seu pai.
Sabia que ele não conhecia o próprio poder, nem os outros que assistiam, mas ele via as fagulhas que saíam de suas mãos e as partes da armadura que ficavam vermelhas ou começavam a derreter. Ele, claro, não tinha uma vestimenta adequada para seus poderes, mas Shoto possuía, e agradecia muito a Yaoyorozu por isso, a menina que tinha o poder de criar objetos com seu corpo era extremamente querida no grupo e já havia construído algo útil para todos.
Então, mesmo sabendo que não era o ataque mais glorioso, aproveitou a brecha de seu pai, que já perdera o escudo desde a primeira luta,para lhe encravar a espada na axila, arrastado o objeto pela carne, cortando o braço esquerdo de Endeavor.
O rei berrou pela dor e Shoto notou pelo canto do olho a agitação na platéia, mas ainda não havia ganhado, não podia se distrair.
Lembrou-se de tudo que sua mãe contara, sobre ela, sobre seus irmãos. Os estupros quando ele surgia no quarto à noite, bêbado, sem ter achado nenhuma de suas amantes pelo castelo, dizendo que ela ia ter que servir, viu à sua frente as lágrimas no rosto de sua mãe, seguidas do sorriso pedindo para mudar de assunto para não assustá-lo. Lembrou de quando ela contou sobre a morte dos irmãos mais detalhadamente, queimados lado a lado quando o mais velho tinha apenas 12 anos. As marcas de surra que viu no corpo de sua mãe quando ela usou um vestido sem mangas.
Decepou a cabeça do seu pai com todo seu ódio e sua força. O prazer que sentiu ao ver o corpo cair no chão e o elmo rolar para fora da cabeça, os olhos arregalados, foi incomparável.
Vingara seus irmãos, cumprira o plano de sua mãe.
Ao redor de si, ouvia os gritos de comemoração dos que também odiavam seu pai e sorriu, levantando a espada manchada de sangue. Estava feito.
Foram poucos segundos entre o momento que Endeavor estava vivo e o momento que sua cabeça rolava pela areia da arena. Midoriya estava com a corda preparada escondida em suas vestes e, assim que os homens à sua frente foram imobilizados por Iida e Uraraka, ele os amarrou, os arrastando para longe da plateia o mais discretamente possível para prendê-los.
Logo, todos haviam se encontrado na masmorra do grande complexo do castelo que agora pertencia à seu amigo de infância, jogando atrás das grades da prisão todos os principais nomes que podiam oferecer risco ao reinado de Shoto Todoroki.
Estava feito.
…
Alguns dias depois da Vitória, Shoto Todoroki estava desconfortável em roupas elegantes e apertadas. Era o dia de sua coroação.
As pessoas ainda não sabiam seu nome, ele era apenas aquele que derrotou Endeavor. Sua mãe havia preparado os guardas e aliados para qualquer problemática que surgisse sobre sua existência, seu nome e seus direitos, mesmo assim estava ansioso.
Ele mal havia descoberto sua mãe e poucos meses depois se tornaria rei de um lugar tão grande quanto Shimizu. Estaria preparado? Mesmo que sua mãe fosse guiar seus passos no começo, havia muito que deviam fazer e, para todos os efeitos, era sua voz que todos iriam ouvir. Naquele lugar, ele era a lei.
Atrelado a isso, também tinha algo muito importante a fazer hoje.
Havia conversado com sua mãe sobre os sentimentos em seu coração e ela havia lhe encorajado. Estava com medo das consequências ao seu futuro posto que aquilo traria, mas ela lhe tranquilizara, então decidira tomar uma atitude. Não era um medroso ou covarde, era um guerreiro. E guerreiros não deixavam de demonstrar sentimentos bons por vergonha, era o que All Might sempre dizia.
Então, encontrou Midoriya no salão de refeições. Estava tomando o café da manhã. Chamou-o.
— Olá, rei Todoroki.
Ele estava fazendo aquela brincadeira desde que venceu o desafio. Não adiantava o quanto dissesse que não precisava chamá-lo assim.
— Pare, Midoriya. Tenho um pedido para te fazer. Sério
O jovem sorridente se tornou sério, ouvindo o futuro rei com atenção.
— Você pretende voltar para casa, não é? Continuar vivendo com All Might e EraserHead na terra de ninguém. Eu quero te… fazer uma proposta. Fique aqui. Comigo.
Midoriya arregalou os olhos, o coração acelerou. Não estava entendendo.
— Mas você sabe que eu sempre quis ser um herói, não é? Ajudar pessoas e salvar inocentes com um sorriso no rosto, como All Might. Como eu poderia ser um herói… aqui?
— Acho que você não entendeu o que eu quero dizer…
— Como assim?
— Você quer ser um herói, não quer? Seja meu herói. Me proteja, Izuku.
Midoriya arregalou ainda mais os olhos e corou. Shoto nunca o chamava pelo primeiro nome, além disso, ele estava muito perto. Nem mesmo ele era tão bobo para não entender o que estava acontecendo.
E, mesmo que não entendesse antes, Shoto se aproximou e selou seus lábios de leve, para que não restasse dúvidas.
Midoriya estava mais vermelho que os cabelos de Kirishima quando Shoto se afastou.
— Seja meu herói, Izuku. — o futuro rei de Shimizu pediu, sussurrando.
Midoriya assentiu nervosamente várias vezes. Não conseguiria falar por mais que tentasse.
Mais tarde naquele mesmo dia, Shoto Todoroki sentava em seu trono, coroado, ouvindo os votos de lealdade e em seguida, nomeando Izuku Midoriya como guarda-real.
E essa é a história de como Rei Todoroki mudou o destino do reino de Shimizu por debaixo dos panos, guiando os passos de seu filho para que seu povo fosse próspero.
Ela não seria citada nos livros de história. Ninguém lhe daria os créditos por salvar o destino daquela nação. Mas está tudo bem, porque eu e você sabemos.
Notas finais: Podia ser melhor? Podia sim. Mas foi o que saiu. Comentem qualquer erro e o que podia ser melhorado pf, é minha primeira fic do gênero. Espero que tenham gostado, beijos.
Merci pour la lecture!
Nous pouvons garder Inkspired gratuitement en affichant des annonces à nos visiteurs. S’il vous plaît, soutenez-nous en ajoutant ou en désactivant AdBlocker.
Après l’avoir fait, veuillez recharger le site Web pour continuer à utiliser Inkspired normalement.