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Para quando e depois de antes


Remorsos são crianças nos bancos do fundo de um ônibus escolar, pela primeira vez. Assustadas por todas as certezas tardias que vão ficando fora do alcance. Ansiando voltar sem achar o caminho. Sabendo-se abortadas do velho e seguro tudo que era...


Aghata deixara de regar seu jardim.

Não se dera conta! Notar-se ultimamente era estar em todo lugar ao mesmo tempo e nunca fora muito boa em fazer companhia para si mesmo sem se ausentar para mais longe do que deveria. Sóis esfriam-se rápido demais e todos vão embora sem que percebamos que não se despediram até estarmos em nossa própria presença.

Relógios não têm a fineza suficiente de se fazerem de rogados em relação à quase nada que valha um pequenino momento à mais. Os ponteiros arrotavam as últimas cores do sol de um inverno que se impunha com a força e a naturalidade de tudo que não há alternativas.


Aghata deixara de regar tantas coisas! Apenas não se dera conta. Pois é assim, com as pontas dos pés sobre o asfaltado e frágil chão do dia-a-dia que se evita ruir o pouco da perseverança que insiste em nos desnortear.


A secura da terra marrom esquecida do canteiro combinava com seu estado de espírito ultimamente. O silêncio das canções que ouvia repetidamente eram de alguma forma agradáveis. Talvez por lembrarem de quando seus passos teimavam em levá-la sem permissões.


Permissões, por vezes, têm problemas imaginários com simplicidades. Simplicidades, admiravelmente não se dão sequer ao trabalho de pintar suas cercas ao seu redor.


E ursos cinzas não entendem portões. Pintados ou não!


Quanto à seus pés, Aghata jamais deveria ter calçado sapatos apertados. Eles têm cadarços pelo mesmo motivo de que os ventos tentam, em vão, rebanhar todas as nuvens do céu. Ventos são narcisistas. Não alcançam a simplicidade de que o azul não flerta com seus redemoinhos. Declara-se o tempo todo à serenidade das nuvens.

Aghata pensou ter tido uma familiar sensação de que talvez, todo o caminho à sua frente seja ainda estar sentada. Ainda na calçada de casa. Esperando o momento de entrar.


O ônibus e suas vozes ficaram distantes. O bastante. Só um pouquinho...

7 Octobre 2022 15:26 6 Rapport Incorporer Suivre l’histoire
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Joalison Silva Joalison Silva
Fantástico! Que grata surpresa a narrativa me proporcionou, me lembrou bastante o estilo narrativo conhecido como fluxo de consciência, muito famoso por escritores como Virgínia Wolff, William Falkner e até nossa querida Clarice Lispector. Não sei se vc utilizou ou até conhece o estilo, isso porém não tira o brilho da poesia contida no seu texto. Parabéns.
February 13, 2023, 12:42

  • Marcelo Farnési Marcelo Farnési
    Gratidão por suas palavras e referências, Joalison! Mesmo sabendo o quanto ainda estou distante delas, mas caminhando com o sincero desejo de aproximação! Pessoas generosas como você tornam essa caminhada muito mais gratificante. Desejo tudo de próspero a você e sua narrativa também. Espero ter a honra de sua presença mais vezes. February 13, 2023, 16:31
Aarvyk Aarvyk
Olá, Marcelo! Sou da Embaixada Brasileira do Inkspired e gostaria de te parabenizar pela sua história, ainda mais pela conquista de estar entre os Destaques da Semana do Inkspired! Fiquei muito feliz ao ler suas palavras tão cuidadosas e sinestésicas sobre Aghata, me senti como ela, no ônibus, ao vento e pensando sobre as flores em minha janela e se as reguei. Além disso, gostei muito do modo como as palavras fluíram pela narrativa, dando a ideia de uma pequena crônica reflexiva e profunda, perfeita para se ler em uma manhã enquanto toma café rsrsrs (ou no meu caso, uma leitura agradável antes de ir dormir). Enfim, gostei muito de conhecer um pouquinho de sua escrita! Que leveza mais gostosa! Um abraço
December 29, 2022, 01:54

  • Marcelo Farnési Marcelo Farnési
    Nossa, fiquei sem palavras aqui! Gratidão pelo incentivo. Escrever, às vezes, é bem solitário e receber um feedback ilumina todo o percurso. Há dias em que o calor abrasador das dúvidas pelo camiho está acima do que as nuvens possam abrandar. Então, você vê a resistência, a persistência da flor a brotar no concreto! E tudo faz sentido... Na imensidão do asfalto de céu no chão acinzentado, insiste a natureza da vida. Gratidão por regar o meu jardim! December 29, 2022, 12:56
Amanda Kraft Amanda Kraft
Eu amo Ágata.
October 07, 2022, 16:24

  • Marcelo Farnési Marcelo Farnési
    É uma honra! Aghata se sente lisonjeada com sua atenção e carinho, Amanda! October 07, 2022, 16:31
~

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