Rosa era loira, alta e magra. Olhos agudos de quem guarda segredo das coisas. « Olhos de quem ‘sabe'" o marido dizia às vezes, olhando-a com uma ternura que a asfixiava .-O que foi , Armando ?- perguntava sem saber que ele não entendia. »O que ? » - É que…o seu amor me sufoca .- respondia triste lembrando que , quando criança, gostava de se deitar sobre a relva ( um verde tao absoluto , até ofensivo de quando em vez , ela que não ousava além do ciano de maresia das suas íris) e ser.Apenas ser , sem a necessidade de um entendimento .De noite , murmurava para sim depois do marido haver adormecido – eu sou feliz…-.
Olha o relógio : nove da manhã , o susto repentino – Meu Deus ! Já é tarde e estou na cama…- o óbvio dito ecoou pelas paredes como um grito numa masmorra , alguém diria.Armando já saira a essa hora e estava sozinha , só ela com seus vinte e cinco anos.- Ah, não é possível.-disse mais alto , pensando que , ao verbalizar aquilo poderia fingir que havia mais alguém com quem falaria.Sozinha era obrigada a barbarie de ser ela mesma.
-Eu ! Essa mesma ?- Olha-se no espelho e leva um susto : não tem rugas .Olhos azuis .-Tanto azul que poderia me matar.-.E a conclusão : devia até ser bonita. Ouve um leve ruído do que lhe lembrava um violino desafinado , era um gritinho de criança do lado de fora da casa.Lembra agora que a vizinha tem um filho .- Ela deve ser plena .E eu aqui …mas…até devo ser inteligente e isso basta , não ?Ninguém responde.Quer banhar-se , o calor do sol começara já a aquecer a manhã fria.Ouve o som da água caindo com tal deleite só sentido ao ouvir Tchaikovsky , « a maior das alegrias. » e sorri sem entender que essa poderia ser sua salvação. -Mas …de que ?- foge da própria pergunta e entra embaixo do chuveiro.A água é gelada e a faz sentir , por isso, viva, havia calor nela , por isso sentia o frio ainda .
A janela da cozinha estava aberta quando ela chegou para o café , a mesa estava arrumada com um bule , alguns pães e uma xícara sobre a toalha xadrez.Sente um calorzinho invadir-lhe o ventre seguido de um calafrio intenso e , ao mesmo tempo, tímido.Não quer pensar , e crê que se empenhar-se , pode conseguir.Come uma fatia de pão com os olhos fixos na janela : o ceu estava limpo apesar da sensação de abafamento que tudo aquilo lhe produzia.O café fazia espirais sinuosas antes dela o beber em um gole objetivo .Ainda podia ouvir com certo incômodo a gritaria na casa vizinha.
Amava o homem , sim , diria se lhe perguntassem.Ele , a sua paz mais profunda com suas mãos enfadadas de assinar os processos dia após dia e seu olhar de constante agradecimento, como se ela lhe tivesse feito um grande bem .Mas não esse homem lhe fazia sonhar , não esse que lhe acendia , por vezes, aquela ânsia febril , aquele desespero de fêmea no cio. -Eduar…- ouve o estalo da xícara caindo no chão e se desfazendo violentamente em cacos.Suspira – Se ,ao menos, eu pudesse me entender …-.
Então, a ousadia.Se levanta às súbitas, como se ali mesmo visse uma cobra. -Eu estou viva !- grita sentindo um arranhão forte na garganta.Uma especie de quase raiva lhe invade o peito furtando um gemido confuso entre gozo e agonia.-Quero rosas !Quero as minhas rosas agora !-disse enquanto as lagrimas lhe vinham embaçar a voz .Quer , então, chorar .Chorar de desespero , que fosse .-Eu estou sozinha !...-conclui se assustando consigo mesma.
Abre a porta rapidamente , forçando-a para longe de si . Sai para o jardim : o mesmo verde de sempre.Mesmo ali , sente-se sufocada .-Eu vou morrer !- soluça entrecortando sua fala .As rosas crescem logo à frente numa moita volumosa .Apenas a cerca a separa do mundo exterior .Todos podiam ver , portanto , seu pranto nu como estava.Se ajoelha em plena grama .-Me mate , se tem piedade !- bramiu para a mulher de vestido cor de vinho que passavapela calçada, essa sorriu uma risadinha de desdém e continuou a caminhar.
Levanta a fronte descomposta .Vê as flores , lhe assusta a fatalidade naquela beleza e , concomitantemente, são-lhe um eterno encanto.Senta-se agora , entorpecida naquela tristeza.Quer colher a rosa maior cujas petalas sao de um vermelho sanguíneo , não para contemplar-lhe , para destruí-la , tiraria-a do seu ramo lançando-a no chão úmido e a pisotearia com todo seu ódio até que fosse apenas uma memória apagada da própria beleza.Colheu-a , no entanto , se recompondo e a põe na água.Ainda era Rosa e Armando chegaria ao fim do dia para lhe perguntar como passou o tempo .-Fui eu por um instante , agora chega.-respira fundo sentindo preencher-lhe um estranho contentamento .Era ela ,só isso… .
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