Brom era um homem que vivia na caverna.
A floresta era vasta e conhecida. Sombria e previsível. Ainda que não tivesse bordas, Brom estava cansado de conhecê-la.
Brom estava sozinho. Sozinho, sozinho e sozinho. Não sabia mais o som de sua própria voz. Não conhecia seu próprio rosto. Sua origem era desconhecida. Só sabia que estava ali, naquela floresta - só a floresta e ele.
Em seus dias, dedicava-se à sua sobrevivência. À noite, não sabia o que fazia. Nos momentos de tédio, deitava-se. Queria satisfazer-se com o próprio prazer, mas ouvia vozes. Em sua bruta percepção, acreditava que fossem espíritos. Não muito bons, pelo o que pôde perceber. Pareciam querer sugar-lhe a energia vital, grotesca, sexual. A sensação ao tocar-se era de fogo - e o fogo lhe consumia.
Pintava o fogo nas paredes da caverna. Pintava o fogo em seu próprio corpo. Fazia o fogo acender-se em si próprio para que tivesse companhia.
Brom era terrivelmente solitário. Choraria, se soubesse como. Sua existência era oca. O fogo era a única luz no meio do nada.
Certo dia, ao nadar - a água o oprimia - enxergou uma figura humanoide aproximar-se da queda d'água. Surpreendido, emocionado, desesperado, Brom escondeu-se atrás da rocha. A rocha o escondia.
Era uma mulher. Não sabia o que era uma mulher, só sabia que era diferente dele. Tinha seios largos. Largos quadris, também. Seu cabelo era muito longo, muito longo, muito longo. Não tinha cabelo no rosto. Usava adereços, ainda que não soubesse o porquê. Tinha colares de conchas, pulseiras de conchas, tiara de conchas, despida estava. Tinha um olhar determinado, uma visão de mundo ampla.
Sentiu o cheiro de água salgada. Odiava água, quanto mais salgada.
Brom permaneceu quieto. Maravilhado e assustado pela companhia - além das vozes de sua cabeça - não sabia como reagir. Se é que reagiria. Aquela figura anciã o nada encarava, e ali parada estava.
Sentiu o fogo despertar em seu peito. Em seu estômago. Em suas partes baixas. Sabia o que aquilo significava - só não sabia de mais nada.
A mulher das conchas pisou na pedra molhada, na pedra molhada, na pedra molhada. De uma em uma, foi parando no meio d'água. Ali sentou-se, abaixo da cascata.
A mulher cantava. Tremeu de susto, o bruto Brom, ao ouvir uma voz que não vinha de sua cabeça. Esta era distante. E era linda.
Encantado, hipnotizado, enfeitiçado pela sereia, Brom saiu de trás de sua rocha. Sentado e à mostra, observou-a. Ela ainda não o havia visto.
Brom arriscou-se a aproximar em um passo. Ela ainda não o havia visto.
Mais um. Mais outro.
De sobressalto e arregalados olhos, a mulher saltou para o outro lado da margem. A ninfa estava estarrecida na presença do ogro.
Apreensivos, do outro lado do rio, observavam-se. Brom sentia os olhos da mulher cravados em si. Não conseguia lê-los.
Após um longo momento - Brom não conseguia calcular tempo - a mulher levantou-se. Sacudiu a terra de sua pele e molhada, aproximou-se.
Recuado e neurado, Brom correu para a sua caverna. Escondeu-se entre suas maiores rochas - suas únicas companhias naquele mundo de agonia.
Conseguia ouvir seu andar. Se aproximava cada vez mais. Enterrou a cabeça em suas próprias mãos. 'Me deixe em paz! Me deixe em paz! Me deixe em paz!'
Brom não sabia o que era paz.
A mulher cercou-o, barrando a saída. Ajoelhou-se em sua frente, em uma expressão compadecida. Sua voz doce ecoava pela caverna.
Brom não sabia o que ela dizia. Seu olhar o perseguia…
De súbito, a mulher veio a ter seu toque. Sobressaltou-se ao ter pego seu punho, pelo calor do toque, do toque da mulher fria.
Posto foi de costas contra a rocha. Em cima de si sentou-se a mulher - a mulher água, que em fogo o afogava.
Os movimentos vinham e voltavam como as ondas - ondas pesadas em cima de si. Não sabia o que sentir.
O fogo vinha, e aumentava, e aumentava, e aumentava. O tamanho da brasa incendeia - queimado estava.
Aquela presença o devorava. Seus olhos cor de terra pareciam enterrá-lo debaixo d'água.
Embriagado foi, estimulado foi, mitigado foi. Ao momento, viu o eterno. Feliz ficou por não ter das vozes a companhia.
Acordou, lentamente, tonto - o Sol entrava pela fresta.
Olhou ao redor. Procurou entre as rochas, a beleza.
Onde estavam as conchas?
O mar não chegava até caverna. O mar Brom nem conhecia. Seria aquela uma imagem produzida, em seu desespero por vida?
Recolheu-se o homem Brom, abraçado com as pernas. Entre ele e as rochas, confessou, era mais provável que estivesse sozinho com a besta.
E as vozes, e as vozes do homem Brom, que não lhe saíam, não lhe saíam, não lhe saíam da cabeça.
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