zephirat Andre Tornado

Clara Oswald é confrontada com um regresso e um convite. Ela deverá decidir-se… e preparar-se para o último brinde, antes de voltar a página e seguir adiante com a sua vida. Como ela quis.


Fanfiction Series/Doramas/Novelas Sólo para mayores de 18. © Doctor Who não me pertence. História escrita de fã para fã.

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Cuento corto
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Capítulo único


Clara Oswald apagou as luzes da sala de professores e fechou a porta. Naquele dia tinha ficado até tarde na escola de Coal Hill para corrigir testes de alunos e preparar as avaliações intercalares do semestre. Normalmente, ela conseguia resolver as tarefas inerentes à docência dentro do horário de expediente. Considerava-se bastante organizada e metódica, sendo que a característica mais importante era gostar efetivamente de fazer o que fazia. Ser uma professora. Contactar com os alunos, moldar-lhes o conhecimento como quem molda uma peça em barro, desenhar caminhos e proporcionar escolhas, aprender enquanto ensinava.


Mas durante semanas estivera mais cansada do que o habitual, sem vontade de fazer nada e foi desleixando as suas obrigações, ao ponto de ter acumulado o serviço. Quando se decidiu a sacudir a indolência e a tristeza, o peso que carregava sobre os ombros e a mágoa que a fazia cismar com a distância sem realmente ver o horizonte, descobriu que estivera somente a perder tempo. Arrependeu-se por ter sido tão leviana, sobretudo por se ter importado com uma questão que ela devia ter ignorado, logo desde o início. Ao mostrar que se importava, enviava o sinal de que sentia e ela queria mostrar-se indiferente. A indiferença, convenceu-se, seria a maneira ideal para curar a sua melancolia e o seu coração partido. Não, afastou essa ideia. Não estava de coração partido!


Resolveu que o trabalho era a melhor solução para se distrair e para… para afastar o que a tivesse cansado. Criou um projeto inovador que apresentou à direção da escola, uma semana temática dedicada à língua inglesa, com diversas atividades para os alunos. O projeto foi aprovado e ela ocupara os últimos dias a preparar o evento. Assim, só lhe tinha restado a noite para resolver os assuntos corriqueiros de uma professora, como correções, classificações e avaliações. Mas graças ao seu esforço suplementar, os seus alunos iriam receber as notas dos testes na aula do dia seguinte. Sorriu, satisfeita com a sua eficiência.


Avançou pelo corredor sombrio. A pouca iluminação da passagem provinha das enormes janelas que coavam a luz fria da lua plena, ela não quisera acender as luzes, não valia a pena, o trajeto era curto, a luz vinha também do pequeno ecrã do seu telemóvel, que ela conferia, na mão esquerda. No braço direito carregava uma pasta recheada de papéis e documentos diversos, no ombro do mesmo lado ainda usava a mala onde tinha a carteira com o dinheiro, as chaves do carro e de casa, toda a parafernália útil e indispensável que recheava o interior da mala de uma mulher.


No telemóvel tinha algumas notificações relacionadas com o correio eletrónico, nomeadamente promoções de lojas, duas mensagens do namorado, uma delas perguntando se estava bem, a outra se queria ir jantar fora naquele dia. Ela parou para responder. Naquela noite não podia ser, estava exausta e só queria chegar a casa, descalçar-se, tomar um banho quente, beber um chá, enfiar-se na cama e adormecer com a ajuda de um programa chato de televisão.


Era um excelente serão e soltou um suspiro de felicidade simples a antecipar as horas de preguiça que a aguardavam, depois de uma semana tão preenchida como tinha sido aquela. No dia seguinte seria sexta-feira e depois teria o fim-de-semana inteiro para fazer o que mais gostava. Respondeu ao namorado que gostaria de ir jantar fora no sábado e Danny devolveu-lhe a mensagem com um emoji sorridente.


Vida profissional e vida pessoal resolvida. Tudo arrumado, portanto.


Clara guardou o telemóvel bloqueado no bolso do casaco. Ajeitou a pasta volumosa no braço e retomou a caminhada, visando a porta de batente duplo que lhe daria acesso ao patamar das escadas que a levariam ao exterior, ao parque de estacionamento onde tinha o seu carro.


Apressou o passo, subitamente inquieta. Cingiu a pasta ao peito, apertando-a com os dois braços.


Escutou o chiar da madeira, atrás de si. O rangido das dobradiças.


Girou sobre si mesma, encarou a porta da sala de professores. Viu um vulto a sair dali e sobressaltou-se. Ela estivera sozinha a trabalhar e o facto de existir mais alguém que pudesse ter estado no mesmo compartimento, acoitado, a vigiá-la, numa espécie de emboscada, causou-lhe uma certa confusão.


Perguntou num tom grave, mas estava assustada:


- Quem está aí?


Surgiu uma voz masculina conhecida.


- A escola não tem dinheiro para pagar a conta da eletricidade? Por que motivo estamos às escuras? Ah!


Os arrancadores zumbiram e o corredor encheu-se de uma claridade branca que fez com que Clara pestanejasse fortemente. Sacudiu a cabeça para se habituar à diferença de luz. E, quando voltou a olhar em frente, murmurou:


- Doutor…


Depois de ter pressionado o interruptor que iluminou o lugar, o senhor do tempo apoiou as mãos na cintura, os cotovelos a empurrar o casaco para trás. Olhava-a com a costumeira expressão de superioridade ofensiva, condescendência intransigente e bonomia natural. Havia fogo e gelo nos seus olhos azuis que brilhavam, cuja cintilação Clara conseguia distinguir. Não estavam muito longe um do outro, afinal o trajeto até à saída do corredor era curto, mas havia certas caraterísticas daquele homem que ela era capaz de reconhecer sem esforço, não importando as dificuldades, os intervalos, as aparências, os tons ou as impressões.


Se num primeiro impulso quis saltitar até ele, como nos velhos tempos, por outro lado recordou-se que se tinham despedido e que não havia mais nada a ser dito. Ou melhor, ela tinha resolvido terminar com o que tinham – as viagens, as aventuras, a cumplicidade, a competição, o sentimento, a paixão, a descoberta e a maravilha. Não o queria ver mais, mas eis que o Doutor tinha regressado. Contra todas as expetativas, contra tudo o que ela queria.


Clara fechou a boca numa linha implacável e deixou de respirar. Colocaria o bater do seu coração em suspenso também se o pudesse fazer. O seu olhar era duro e todo o seu rosto mostrava o seu desagrado. Um azedume contraiu-lhe o estômago, apertou mais a pasta contra si, o papel estalou.


O Doutor percebeu que ela não iria avançar, mas ele era teimoso o suficiente para também não o fazer e ficou aquele espaço imenso entre eles, a extensão do pequeno corredor que se transformou num abismo profundo de suspeições.


- Clara…


- O que fazes aqui? Disse-te que nunca mais te queria ver! – disse ela, zangada.


O Doutor não se melindrou com o seu arroubo de fúria. Não hesitou, nem vacilou, nem se espantou. Limitou-se a repetir, naquela sua voz que ressoava como um trovão nas montanhas.


- Clara.


O nome na boca dele era bom de se escutar, uma nota musical que convocava uma sinfonia inteira, e ela percebeu que tinha sentido falta dessa pequena massagem na alma.


Manteve-se obstinada na sua fúria, contudo, porque ela gostava de guardar rancores e não permitia que se brincasse com os seus medos, os seus segredos e as suas inseguranças. Com o que ela era nas profundezas da sua intimidade. Esperava amor e compreensão, não desafio e troça. Havia limites que nunca se deviam cruzar.


Depois recordou-se, num lampejo de pânico, que continuava demasiado zangada para que conseguisse ser isenta. Danny, o namorado, tinha-lhe pedido que se acalmasse em relação ao que tinha acontecido, porque a sua fúria só demonstrava que ela continuava ligada emocionalmente, quando o que pretendia era desligar-se em definitivo. Ou seja, ela precisava de encerrar aquele capítulo da sua vida – e estava a falhar, miseravelmente.


E depois era o ódio, que, em vez de ser frio e nebuloso, era quente e pesado, metal derretido a preencher os buracos do seu espírito desfeito, solidificando e magoando quando acontecia o contacto com a parte concreta da sua consciência tenaz. E o ódio era uma emoção demasiado forte para ser desperdiçado em quem não gostamos, lembrou-se. O ódio não podia ser quente. Tinha sempre de ser gelado, como a indiferença…


O Doutor insistiu:


- Clara.


Agressiva, ela indagou:


- O que queres?


- Quero despedir-me.


A resposta aturdiu-a. Talvez esperasse um longo discurso, uma justificação, uma daquelas dissertações infindáveis que a haveriam de conquistar, nos seus dias bons. Nos dias maus, afastavam-na e ela fazia a sua escolha, voltava costas e ficava tudo sanado. Em vez disso, contudo, apareceu aquela sentença definitiva. Quero despedir-me.


Ela engoliu a saliva que tinha na boca e preparou-se para, com raiva ou sem ela, com ódio ou sem ele, resolver aquela pendência de uma vez por todas. Como num dia mau.


O Doutor acrescentou, sem sair do seu lugar, junto à porta entreaberta da sala de professores:


- Merecemos uma despedida apropriada, Clara.


E ela, também sem sair do seu lugar, junto à porta de saída de batente duplo, devolveu, com um laivo de ironia:


- Merecemos?


Ele não captou a entoação diferente.


- Sim, merecemos. Uma última viagem. Gosto de despedidas com festas e barulho. O universo é demasiado silencioso, vasto e solitário. Precisamos de encher as nossas existências com ruído, aconchego e companhia.


- Pensava que gostavas de silêncio, vastidão e solidão.


Pareceu que considerava aquela declaração dela. Continuava a ser tudo um elaborado fingimento, a mente de um senhor do tempo era demasiado arguta para se deter em considerações. O Doutor replicou:


- Nunca dei a entender isso… Posso precisar dessas variáveis, mas não quer dizer que aprecie esse estado no seu pleno conceito. Muitas vezes me apontaram a necessidade de viajar acompanhado. Eu tento percebê-la, mas não tenho realmente… necessidades. São estados, níveis, ideias. Não penso ou reajo como vocês, humanos. Existo num plano diferente e sinto, precisamente, de uma forma diferente. É apenas… o que sou.


Ela sacudiu a cabeça, humedeceu os lábios.


- És demasiado egoísta, Doutor. Acabas sempre sozinho, nalgum ponto da tua… longa vida.


Ele uniu as fartas sobrancelhas, numa espécie de hesitação controlada. Resmungou, passando os olhos brevemente pelo teto. Agitou uma mão.


- Um convite, Clara. Só estou aqui para te fazer um convite.


- E se eu disser que não?


- Não vais recusar.


- Ah! – Ela sentiu-se ofendida. Arrebitou o nariz, petulante. – Tens tanta certeza de me conhecer… de saberes o que quero, o que admiro, o que ambiciono.


- Talvez.


- Deste o primeiro passo. Queres mais do que eu. Estás aqui. Vieste procurar-me.


- O contrário seria impossível. Ninguém que procura o Doutor, encontra-o.


- E porque achas que não irei recusar o teu convite?


- A tua curiosidade, Clara Oswald. E porque não te foste embora assim que viste que era eu. Queres saber o que tenho para te oferecer.


- Se fosses um intruso também te teria enfrentado.


- Isto não é um confronto. Estamos a falar como bons e velhos amigos que somos.


Ela estava a perder o debate e irritava-se. Ele, de algum modo, percebeu isso – a derrota e a irritação.


- Continuas zangada e não quero que nos separemos dessa maneira – explicou, tentando ser paciente. – Não há necessidade de nos tornarmos inimigos, quando já partilhámos tanta coisa juntos. A minha memória guarda-te em tantos momentos, Clara Oswald. Não queria que o último fosse um vazio e um equívoco. Vem comigo.


- Quando?


- Agora. – Estendeu-lhe a mão. A outra continuava na cintura, cotovelo espetado.


- Estou cansada.


- Descansas na TARDIS. Daremos uma volta maior para teres esses minutos de descanso.


- O que propões?


- Um copo de champanhe e uma surpresa. Uma viagem… como tantas outras. E, no entanto, diferente. Nunca repito os lugares que ofereço aos que aceitam viajar comigo. Essa é a maior maravilha!


- Demasiado vago.


- Quero que seja uma surpresa – reforçou.


- Talvez não queira ser surpreendida… desta vez.


Uma minúscula cedência e o Doutor animou-se.


- Ambiente requintado, boa comida, excelente bebida, passageiros nobres, destino excêntrico. Roupas bonitas. Elegância e discrição.


- Tudo para que me esqueça…


Ela baixou ligeiramente o olhar, recordando-se da razão daquele amuo. O Doutor a abandoná-la durante uma crise na Lua, o seu pavor, a sua inaptidão – a exposição miserável das suas pequenas incompetências, vidas em perigo. A responsabilidade monstruosa que viria com o falhanço. Só que ela não falhou, acontecera o final feliz e depois ela odiara a lição que eventualmente ali existira. Não precisava de ser educada ou guiada. Precisava que confiassem nela. E tudo lhe pareceu monstruoso por se ter reduzido, contra a sua vontade, a um mero apontamento de pé de página.


Compreendeu que era ninguém na vida do senhor do tempo e odiou-se a si mesma por isso. Depois passou a odiá-lo e terminou. Ela impôs esse fim. Só que faltou, efetivamente, a despedida.


Ele contrapôs:


- Tudo para que te lembres para sempre.


A mão do Doutor continuava estendida.


Clara fechou as pálpebras. Não podia esquecer-se. Podia perdoar, claro. Mas esquecer… nunca.


Assentiu, engolindo em seco.


A tentação era demasiado grande e ela concordava que faltava um adeus apropriado. Assim, filtraria a sua raiva e podia terminar aquele episódio da sua vida da melhor maneira. Precisava de uma vitória qualquer, de saber que tinha razão e que não era somente um capricho, uma mania, uma futilidade.


Danny acusava-a de estar dependente e de ser infantil naquele desejo de viajar, de tempos a tempos, na companhia do Doutor para longe, entre as estrelas e as dobras do tempo. Danny não sabia que havia aquela ligação extraordinária com o Doutor e que ela fazia parte das estrelas que seguiam, incansáveis, o senhor do tempo.


Ela era também o espaço infinito e o tempo incomensurável.


Havia uma recordação escamoteada em milhares de pedaços eternos…


Ali, naquele corredor, era um fragmento dessa imortalidade.


Não precisava de provar nada, a ninguém. Nem ao Danny, muito menos ao Doutor. Nem sequer a si própria. A sua independência provinha, exatamente, dos sacrifícios que fora capaz de fazer para salvar o universo onde ela se estendia, perpétua, entre a existência e a não-existência. Treva e luz, ao mesmo tempo.


O coração bateu no seu peito, ansioso e febril.


Ela pertencia àquele mundo onde não havia regras.


Olhava para a mão estendida do Doutor e lembrou-se do calor especial que emanava, de como era bom tocá-lo, do carinho implícito que existia na proximidade dele.


O ódio desfez-se, a fúria diluiu-se.


- Vou ter um vestido apropriado?


- Eh… Sim, claro que sim – respondeu ele, baralhado.


- Se me vais levar para um lugar requintado onde iremos beber champanhe, não quero fazer má figura. Também disseste que será elegante, excêntrico…


- Nunca deixaria que fizesses má figura, Clara Oswald.


- Irei lembrar-me disso.


- Na TARDIS terás tudo o que precisas. Até uma cama para descansares. Ou um sofá. Ou um simples colchão. Agora… preciso de uma resposta. Sim ou não?


Clara estalou a língua, fez uma curta inspiração, pestanejou de forma sedutora e declarou:


- Muito bem, Doutor. Creio que irei aceitar o teu convite.

23 de Noviembre de 2019 a las 18:15 2 Reporte Insertar Seguir historia
4
Fin

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Andre Tornado Gosto de escrever, gosto de ler e com uma boa história viajo por mil mundos.

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