coldcherry Cold Cherry

Os dias de Baekhyun em Vernonia eram calmos e rotineiros. Nada de muito interessante acontecia por ali. E as coisas permaneceram daquela forma até o novo estudante, transferido para aquela cidade, chamar a atenção dele em uma das aulas da faculdade. Após dias de observação e uma noite conturbada na aula, o comportamento silencioso e gosto por florestas do outro não lhe pareceram tão estranhos. Havia algo muito pior por trás de tudo.


Fanfiction Bandas/Cantantes No para niños menores de 13.

#exo #baeksoo #baekhyun #kyungsoo #slash #universo-alternativo #sobrenatural
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Você corre sob os fios do sol e eu espero por você


I

KOMOREBI

Sete horas, vinte e cinco minutos


A janela estava aberta.


Essa foi a primeira coisa que os olhos sonolentos de Baekhyun registraram segundos após despertar. As cortinas brancas balançavam com o vento fresco da manhã. O tecido fino se estendia no ar, ondulando, numa visão quase fantasmagórica.


Por mais que o corpo magro debaixo dos cobertores estivesse quase febril, a pele do rosto estava gelada pela exposição. Aquela transição entre verão e outono era difícil para o jovem Baekhyun. Ainda que a luz amarelada do sol estivesse brilhando lá fora, já detestava a sensação do inverno que se aproximava.


O frio sempre trazia as memórias do antigo lar. E ele não gostava de lembrar tanto disso. Era mais fácil jogar tudo para debaixo do tapete, e só absorver o quão limpo as coisas estavam agora. A tranquilidade que tinha encontrado naquela cidade era algo que, anos atrás, seria apenas uma utopia. Ele estava feliz.


Após um longo suspiro, Baekhyun se revirou nas cobertas, gemendo e balançando as pernas no ar, como uma criança birrenta insistindo por um brinquedo novo. O dia anterior fora o fim das férias, e aquela manhã trazia consigo o início das aulas. A diferença de empolgação dos primeiros semestres e do atual era ridícula. Ela desaparecia com o passar dos dias, mas o mantra sobre escolhas próprias e controle trazia a motivação suficiente e jogava aquele tipo de pensamento num canto escuro da própria mente.


Os olhos inchados, menores ainda pelos resquícios da noite de sono pesado, fitaram o teto branco por alguns minutos. Aquele era o momento pós-despertar que ele gostava de usar para notar que a pequena mancha de mofo, que anos atrás estava bem tímida ao lado da lâmpada, já tinha andado mais alguns centímetros. Não sabia se estava se tornando uma flor negra ou uma estrela. Aquele pequeno teste de Rorschach matinal fazia o cérebro “funcionar”.


Os pés pousaram sobre a madeira do assoalho, sem fazer muito barulho. As paredes verde oceano tornando a visão do ambiente iluminado menos dolorosa. Baekhyun atravessou o pequeno quarto, até a cadeira da escrivaninha, e puxou a toalha de banho do encosto. O tecido felpudo fez cócegas na palma da mão pálida.


Eram oito horas da manhã.


E não tinha como adiar o inevitável.




Ele gostava de como as coisas pareciam meio etéreas pela manhã.


Mesmo que o lado preguiçoso pesasse sobre os ombros magros.


Todas as ações rotineiras aconteciam em cadência, e ele só se dava conta que estava pronto para sair, quando se sentava no banco da bicicleta e apoiava as duas mãos no guidão, a mochila nas costas.


Baekhyun não repetia o caminho.


Era um para cada dia da semana.


A floricultura ficava a apenas vinte quarteirões de distância da casa. E por mais que o trajeto fosse mais rápido se seguisse pela avenida principal, ele evitava. Às quintas, ou seja, aquele mesmo dia, sempre passava pelo bosque que tinha do outro lado da rua.


O cheiro de grama molhada e a sensação úmida no ar, que a sombra das grandes copas das árvores traziam, tornava o ambiente mais refrescante e agradável. As pequenas brechas de luz do sol, que atravessava com dificuldade as folhas verdes, iluminavam o trajeto coberto de cascalhos.


Aquele leve momento bucólico trazia um estranho reconforto no jovem coração de Byun. E mesmo que adorasse pedalar com alguma música tocando nos headphones, o pequeno passeio até o trabalho era muito melhor acompanhado do estalar dos dois pneus estreitos sobre a trilha arenosa.




Estranho, no mínimo.


Naqueles dois anos em que esteve ali, nunca teve um cliente tão precoce na porta do estabelecimento.


A rotina que Baekhyun seguia, quando chegava ao seu local de trabalho, se mantinha desde a segunda semana inicial, na qual tinha sido oficialmente contratado. Selena Foster, dona da floricultura Bloom, havia o treinado o suficiente para as atividades que exerceria.


Baekhyun tinha um copo de latte, na mão esquerda, e uma caneta hidrocor verde, na direita. O jornal The Independent aberto no chão do apartamento ainda vazio. A cidade era tão pequena que a parte dos classificados não cobria mais do que meia página de papel. Por isso, foi na primeira coluna, no quinto quadradinho de palavras, que a vaga estava disposta.


Um círculo verde e torto selou o destino do garoto de dezenove anos.


Como de costume, o estudante apoiou a bicicleta na parede, do lado da porta dupla de vidro, a entrada da Bloom, e tirou o molho de chaves do bolso lateral da mochila lilás. Os ombros um pouco rígidos, pela forma como o homem parado a alguns metros de distância o encarava. Após girar a chave negra na fechadura, e o click indicar que estava aberta, ele empurrou as portas e adentrou o local.


Estava tudo como ele havia deixado no dia anterior.


A ideia inicial que Baekhyun teve ao ver o anúncio no jornal, sobre trabalhar entre as flores, foi um pouco clichê. De alguma forma, aquela imagem de mangá shoujo rodopiou pela mente um pouco infantil do garoto.


O avental estava lá, junto das flores, papéis e laços de fita para buquês e dezenas de vasos coloridos para arranjos. Mas ele não contava que junto disso viesse as entregas com carrinhos de mão, lotado de sacos gigantes de terra fertilizada, adubo, sementes e pesados enfeites de cerâmica para jardim.


Meses depois, ele começou a detestar duendes e fontes.


E, principalmente, o fato de não ter tirado a carteira de habilitação quando fez 18 anos.


Mesmo que Byun soubesse conduzir, a dona do local era sensata demais pra deixar a velha picape nas mãos do garoto. Então, nos primeiros dias de treinamento, ele andou por toda a cidade, empurrando um carrinho de mão carregado de terra fertilizada. A horta municipal estava iniciando o processo de preparo do solo para a nova plantação de legumes.


Vernonia nunca pareceu tão gigante aos olhos de alguém.


Mas a recompensa para todo aquele mês de dor nas costas e pernas veio com o primeiro pagamento. Aquele dinheiro estava visível na estante, cheia de livros, que decorava a sala de estar.


“São 15 dólares”, Baekhyun proferiu quando o homem estranho pousou o vaso de violetas no balcão do caixa.


O sujeito caminhou por todas as prateleiras, onde ficavam os vasinhos prontos para levar. Os olhos corriam por entre as flores, que formavam um arco-íris de pétalas, e o jovem que estava pensativo, com os cotovelos no balcão e o queixo sobre a palma das mãos. Os passos lentos desde as gérberas vermelhas até as violetas, próximas de Byun.


Um nota de 20 dólares foi depositada sobre a madeira lustrada, e uma de 5, retornou para o mesmo lugar. Mas o homem de cabelos grisalhos não a pegou, apenas balançou a cabeça negativamente.


“Gorjeta”, a voz era grave e polida.


Baekhyun assentiu e agradeceu, colocando a nota dobrada dentro do vidro de conserva, com uma etiqueta chamativa de ‘FÉRIAS’, do lado da registradora. Quando puxou uma caixa de plástico, transparente e com alça, para colocar o vaso marrom dentro, sem danificar as flores, sentiu a mão quente do homem sobre o pulso.


“Não precisa”, proferiu, soltando do toque repentino e segurou o vaso com as duas mãos. “Vou levar assim mesmo”, concluiu.


“Certo…”, o tom do jovem atendente saiu meio incerto. “Obrigado pela preferência. Volte sempre”, sorriu meio amarelo, a mão levantada no ar, num aceno.


Quando o tal cliente passou pela porta, quase esbarrou em Jongin, que vinha apressado. O ajudante estava um pouco atrasado para o expediente, como sempre. Ele tinha de estar ali meia hora mais cedo que o estudante de literatura. Antes que o colega de trabalho pudesse expressar o ‘Bom dia, B’ rotineiro, com um semblante risonho, o homem grisalho soltou uma frase que deixou Baekhyun perdido, sem saber como responder.


“Ele se foi há alguns anos”.




“Nossa”, Jongin mastigou o pedaço de omelete e engoliu com uma careta. “Você esqueceu do sal”, concluiu, se esticando até o ketchup, na ponta da mesa, e o jogando por cima da comida.


Baekhyun apenas balançou a cabeça, observando o colega comer outra parte do almoço que tinha preparado, contradizendo a reclamação anterior. Jongin sabia ser folgado.


O moreno chegou à Bloom como um salvador.


Mesmo depois de seis meses de trabalho, Byun não tinha se acostumado com a rotina. Na verdade, mal conseguia dormir direito por causa das dores no corpo. Ele não estava acostumado com aquele tipo de coisa, porque aquele era o primeiro emprego que tinha conseguido na vida. E a jornada dupla, entre a floricultura e a faculdade, estava lhe destruindo a sanidade. Eram duas novas experiências.


Jongin apareceu, repentinamente, numa manhã chuvosa.


A maioria das pessoas apareciam do nada em Vernonia.


Por isso, com a população não passando de três mil habitantes, toda mão de obra que aparecia era bem-vinda. Selena soube aproveitar muito bem a oportunidade. Ela sabia que o garoto novo não conseguiria aguentar por muito tempo.


O novo morador da cidade sabia dirigir, era mais velho e, fisicamente, mais forte. Dessa forma, Baekhyun assumiu a posição de caixa e ajudante, e a Sra. Foster, que se ocupava dessas tarefas, teria mais tempo livre em casa, junto do marido e netos. Ela parecia vez ou outra, quando sentia falta daquele ambiente colorido e cheiroso que tanto gostava. E também, ensinar um pouco mais sobre o cultivo das flores para Byun.


“É hoje que você volta para as aulas?”, Jongin questionou, o garfo parado a meio caminho da boca, esperando por uma resposta do colega de trabalho.


“Sim”, concordou. “Você pode fechar o expediente por mim?”, Baekhyun sorveu um gole do suco de laranja e aguardou que o moreno mastigasse o último pedaço do omelete ensopado de molho de tomate artificial.


“Claro”, Jongin assentiu, afastando o prato. “Nem acredito que vou ver a minha chave depois de todo esse tempo”, riu, com toda a cara de pau que aquele momento exigia. O estudante apenas revirou os olhos, mal acreditando em como Jongin podia ser tão irresponsável naquela idade.


Entretanto, aquela frase sobre a chave era verdade.


Era função do Jongin chegar mais cedo, abrir a loja e colocar todas as ferramentas, enfeites, vasos e flores na frente da Bloom. Mas ele não tinha chegado uma única vez no horário certo. Na verdade, ele tinha cumprido o horário apenas durante o treinamento. Os dias que se seguiram após isso, ele sempre deixava Baekhyun esperando na frente da floricultura.


Depois de uma longa semana, de muito mau humor e uma série de palavrões e ameaças do garoto, e afim de evitar uma discussão e, possível, demissão, ambos os colegas combinaram de que a chave ficaria com Byun.


“Preciso ir ao mercado, antes de ir a faculdade”, o estudante comentou, desenroscando a chave preta do chaveiro dele. “O estoque de comida acabou durante as férias”, Jongin riu da cara desanimada do outro.


Porém, a feição de Baekhyun mudou em questão de segundos. Com o braço direito estendido, os lábios finos apertados e os olhos brilhantes fixos no mais velho, ofereceu a chave da porta principal.


“Se você chegar atrasado amanhã, nunca mais faço aqueles bolinhos de carne para o almoço”, o tom ameaçador, fez com que o moreno concordasse sem pensar muito.


Droga! O macarrão com molho branco e os bolinhos de carne fritos eram o melhor prato que ele fazia.




O supermercado principal era grande o suficiente para prover alimentos e produtos para cada morador. Mas com a pressa que corria pelo corpo magro de Baekhyun, aquele lugar parecia ter triplicado de tamanho.


Ele tinha apenas vinte minutos para comprar tudo o que precisava e chegar até a faculdade.


Por mais que soubesse que alguns minutos de atraso eram permitidos, e que aquilo não era tão grave, como quando estava no ensino médio, a educação que tinha recebido dos pais, não permitia que quebrasse aquele tipo de regra. Era uma das poucas coisas que não tinha aprendido a se livrar.


Costumes e trejeitos intrínsecos demais para se desapegar.


O estudante de literatura andou pelas várias seções do supermercado, puxando tudo o que precisava para dentro da cesta amarela de compras. Estava tão alheio que não notou que estava sendo atentamente observado, desde o momento que havia saído da floricultura até quando havia cadeado a velha bicicleta na vaga livre. E que agora, aquela pessoa, analisava a movimentação ágil do jovem pelos corredores.


Aquilo só parou, quando Byun passou pelo caixa do supermercado, pagou pelas compras e saiu de lá com duas sacolas plásticas azuis a tiracolo, e outra espremida na mochila.


Ele não tinha pressa alguma.


Se equilibrando sobre as duas rodas, o jovem de cabelos caramelo pedalou como podia, os joelhos batendo de vez em quando nas sacolas postas em ambos os lados do guidão. Ele não sabia se ria da situação ou se chorava de desespero.


A faculdade ficava a dez minutos dali, mas agora, ele tinha de fazer o trajeto todo pela metade. Ele sabia que cronometrar as coisas nunca dava muito certo. Os dez minutos de compra se tornaram quinze. A fila estava grande porque era o início da noite e todos saiam de seus locais de trabalho e passavam para fazer comprar de última hora, como ele mesmo.


Depois do caos que foi aquele trajeto, e com o lembrete mental de que não deixaria para fazer a compra quando não tivesse nem um tomate velho na geladeira, ele parou em frente e construção de madeira.


Não era um monumento de concreto, como a maioria das universidades da capital ou das metrópoles que a cercava. A Faculdade de Vernonia era simples. Não tinha mais que seis cursos para graduação. E a quantidade de estudantes era ridícula de tão pequena, porque a maioria dos adolescentes da cidade ainda estavam no ensino fundamental e médio. Mas ainda assim, era um bom lugar pra se estar, porque todos levavam a educação bem a sério.


Depois de encaixar a bicicleta na vaga dos alunos e cumprimentar a secretária, que estava ao telefone, na recepção, como que desembestado, Baekhyun correu pelo longo corredor.


O chão, também de madeira, fez com que os passos dele ecoassem pelas paredes. Com o cabelo bagunçado pelo vento, as duas sacolas pesadas em cada uma das mãos e a mochila batendo pesada nas costas, o jovem estudante chutou a porta, muito levemente, e subiu os degraus depressa, chamando a atenção de alguns alunos e do professor, um pedido de desculpas pelo atraso sendo proferido quase sem ar.


Assim, em meio a algumas risadinhas, ele caminhou até na quinta fileira, para o lugar que sempre sentava, a cada novo semestre.


*


IKTSUARPOK

Seis horas, três minutos


A princípio, a figura sentada a algumas cadeiras de distância não chamou a atenção de Baekhyun.


O jovem de cabelos cor de caramelo estava ocupado demais, fazendo anotações sobre a cultura francesa nas folhas amarelas do bloco de notas, espalhadas na extensa mesa de estudos. Apesar de ser o primeiro dia de aula, após as férias, o professor daquela disciplina não queria desperdiçar mais tempo.


Então, duas semanas se passaram.


Depois de quatorze dias, enquanto pensava sobre aquele homem velho de aparência estranha, que estava sempre parado nas redondezas da floricultura, e comprava um vaso de flor diferente nos últimos dias, deixou que os olhos pousassem sobre a nuca do estudante desconhecido a duas fileiras de distância dele.


Baekhyun se questionou, num sussurro, sobre como não tinha notado aquela pessoa. A cabeça com cabelos tão curtos, que quase pareciam não estar ali, se destacava entre os demais. E o fato de ele estar usando uma blusa grossa de moletom, no meio do outono, contrastava com a escolha do corte.


O sinal soou por alguns segundos, e despertou a linha de pensamentos curiosos que se instalou na mente de Byun. Silenciosamente, ele se levantou da cadeira onde estava sentado e recolheu as folhas onde tinha escrito as ideias do novo seminário, para entregar dentro de algumas semanas. Os olhos vagaram entre o que fazia e as ações do outro, que seguia a mesma coreografia de arrumar os materiais, porém dentro de uma pasta preta com zíper.


Os demais estudantes pareciam não notar aquela figura de estatura pequena e ombros estreitos, que descia os degraus até alcançar a porta de saída da sala, abraçado aos livros, cadernos e canetas.


Estavam ocupados demais em conversas aleatórias, em meio a vozes e risadas altas.




No dia anterior, e nos demais que se seguiram, com exceção do final de semana, o estudante de cabelos curtos não apareceu. Não era porque Baekhyun estava atento sobre isso, era apenas curiosidade. Nada de muito interessante acontecia naquela cidade.


Vernonia era um pequeno pedaço de terra habitada no meio do verde.


Ainda que muito raro, alguns estudantes de outras localidades, apareciam durante o início ou meio do semestre. Entretanto, eles frequentavam todas as aulas. E Byun não se lembrava de algum outro curso que tinha aquela disciplina, a nível de introdução, em comum. Com um sorriso nos lábios e um balançar de cabeça, ele percebeu que estava cada dia mais parecido com os habitantes mais velhos daquele lugar.


Levemente interessado na vida de desconhecidos.


Esse pensamento ficou suspenso na mente até a quinta-feira de Cultura Francesa.


Baekhyun chegou muito mais cedo que o normal naquele dia.


A sala de aula estaria quase vazia, se não fosse pelo único aluno presente. Em silêncio, sentado no mesmo lugar da primeira vez em que fora avistado, rabiscando alguma coisa no caderno que tinha à frente dele. A cabeça estava abaixada, deixando visível apenas as sobrancelhas grossas e o ponta do nariz arredondado.


Os pés do jovem estudante de literatura travaram, durante alguns segundos, pela surpresa do momento. Com a mochila pendurada no ombro esquerdo e a caneta apertada entre os dedos longos e magros, ele deu alguns passos, meio vacilantes até a mesa do professor, sem tirar os olhos daquele meio semblante.


Era o costume do Sr. Lewis, desde as disciplinas anteriores que ele havia lecionado naquele curso. A lista de presença era um folha A4 amarelada, da qual os estudantes tinham a liberdade de assinar, sempre abaixo da data de cada nova aula. O professor repetia a cada semestre que aquela simples tarefa ajudava a criar um senso de responsabilidade e compromisso.


Por isso, quando Baekhyun desviou o olhar para escrever o próprio nome na folha, e notou que ela estava em branco, franziu o cenho e levantou a cabeça na direção do estudante, que permanecia na mesma posição.


Olá!”, sem pensar muito, proferiu, numa tentativa de chamar a atenção para si. A voz não saiu muito clara, mas foi o suficiente para despertar o “desconhecido”.


Os olhos negros se fixaram aos de Baekhyun, atentos. Eram tão grandes e brilhantes que pareciam duas luas cheias num céu escuro. Byun perdeu o raciocínio e permaneceu mudo, encarando o rosto bronzeado. Os lábios rosados e fartos do outro se moveram, mas o estudante não conseguiu compreender. A mente estava nublada num transe muito estranho.


“Oi”, foi como se tivessem tirado a cabeça dele debaixo da água. A voz baixa e grave, junto de um simples piscar de olhos rápidos, trouxe Baekhyun à tona.


“Você…”, tentou, mas parecia que o pensamento tinha se escondido. As sobrancelhas finas de Byun se juntaram, uma expressão de confusão estampada no rosto. “Você…”, repetiu, baixando o olhar e encarando a caneta vermelha que tinha na mão. “Não assinou a folha”, as palavras saltaram da boca, sem controle, como se uma alavanca tivesse sido acionada.


Qual era o problema?


Os dois se encararam outra vez, silenciosos. Dessa vez, as orbes do estudante desconhecido não tinham aquele brilho tão penetrante quanto antes. E o tempo parecia ter voltado ao normal. O modo como levantou a cabeça rápido demais talvez tenha lhe tirado o equilíbrio. Era o que Baekhyun deu como veredito.


A resposta do outro não veio de imediato.


“Ah”, e nem foi esclarecedora.


Foi apenas isso. O sujeito de cabelos curtos abaixou a cabeça e tornou a rabiscar o caderno, como se nada tivesse acontecido. Byun piscou algumas vezes, perdido por alguns segundos, antes de subir os degraus até o lugar onde sempre se sentava. Não insistiu no assunto.


E naquela noite, enquanto retornava para casa, pedalando devagar sobre as calçadas desertas do centro da cidade, Baekhyun se lembrou de que ele também não tinha assinado a lista de presença.




Minseok se sentou ao lado de Baekhyun na aula de Morfologia I.


Apenas porque Joonmyeon tinha faltado.


“E aí, tudo certo?”, a voz sempre soava mansa, doce. “Como vai o seminário?”, emendou outra pergunta, enquanto deslizava o zíper da bolsa carteiro marrom. Os olhos felinos atentos à resposta do colega de curso.


Ao ouvir aquilo, Byun inclinou a cabeça para o lado, franzindo o nariz pequeno e piscando um dos olhos, um sorriso travesso nos lábios finos. Era a típica careta brincalhona que usava para se esquivar das coisas. Porque ele sequer tinha mexido nos próprios rascunhos. Os papéis estavam perdidos entre os livros da escrivaninha. Ainda estava indeciso entre a arte e o folclore francês, que eram os temas restantes dados pelo professor.


Entretanto, aquele comentário de Minseok, fez com que a dúvida, que estava rondando a cabeça do jovem estudante desde o dia anterior, retornasse à superfície. Não sabia se perguntava despreocupado ou se tentava chegar ao assunto sem parecer muito ansioso.


Decidiu pela primeira opção.


“De qual curso veio aquele aluno novo?”, indagou, enquanto deslizava a ponta da caneta sobre o papel, numa letra inclinada e rápida.


“Qual deles?”, havia mais de um? Em que planeta ele estava vivendo, ultimamente, que não tinha notado?


“Aquele bem quieto, de cabelo raspado”, a resposta foi rápida.


Minseok colocou o dedo indicador sobre o queixo e pensou por um tempo, o cenho franzido. As bochechas fartas ficaram mais evidentes, com a forma como ele pressionou os lábios pequenos. E com aquele mesmo semblante, ele olhou para Baekhyun.


“Sabe que... Eu não tenho ideia”, concluiu, depois de alguns segundos. Por pouco Byun quase revirou os olhos, tamanho o suspense inútil que o Kim tinha criado. “Por que?”, rebateu.


Baekhyun não sabia, exatamente, o por quê. Apenas se sentia curioso. Então, com um balançar de cabeça, ele se desvencilhou da pergunta. E como Minseok não estava tão interessado naquele assunto, começou a dissertar sobre as dificuldades para finalizar o fatídico seminário, e como a internet não estava o ajudando a encontrar as imagens necessárias para a apresentação.




Aconteceu em uma noite bem rara.


Baekhyun estava sem sono.


O pequeno ritual de encher uma caneca com chá de camomila, mergulhar uma colherzinha prateada cheia de mel, rodopiá-la no líquido quente por dez vezes, só para observar o mini-redemoinho amarelado, enquanto caminhava da cozinha até o quarto, estava completo.


A janela do quarto estava aberta, deixando a luz da rua e o vento fresco entrar, as cortinas balançavam inquietas. Os olhos murchos de sono fitaram a pequena jardineira. O cacto estava se espalhando de uma forma incontrolável, quase tomando a parte das margaridas e das gérberas alaranjadas.


Com a mão esquerda apoiada na beirada de madeira, em meio ao terceiro gole de chá, ele notou uma silhueta que vinha do lado direito da rua. As mãos no bolso frontal do moletom e um capuz na cabeça, andava a passos lentos, despreocupado. O bairro estava tão silencioso naquela hora, que era possível ouvir o som dos sapatos contra o concreto da calçada.


Baekhyun permaneceu na mesma posição, a caneca a meio caminho dos lábios. Observou aquela pessoa sem pretensão alguma, com nenhum pensamento na cabeça. Ele só reconheceu o semblante daquele ser, quando a luz do poste incidiu sobre a pele queimada pelo sol. Aquela descoberta quase o fez se engasgar com o líquido quente que tomava.


Era, sem sombra de dúvidas, o colega de turma.


O rosto possuía uma feição tranquila, relaxada. E permaneceu daquela forma, até que o campo de visão de Byun não pudesse ter acesso. Mas foi por apenas alguns segundos. Os passos dele estacaram no chão, e cuidadoso, olhou por sobre os ombros, buscando por alguma testemunha ou curioso. Os olhos maiores que o normal.


Não viu ninguém.


Nem mesmo Baekhyun que, agora, tinha o corpo todo escondido na lateral da janela, apenas uma parte do rosto evidente para não ser flagrado.


Com um movimento rápido, ele baixou o zíper do moletom, revelando a lateral do corpo. Mesmo que a estatura fosse pequena, ele tinha o corpo muito forte. A barriga era magra, mas ondulada pelo abdômen marcado, e o peito firme, um pouco avantajado. E Baekhyun invejou o que viu, mesmo que por questão de segundos. Porque nem com todo aquele exercício físico, praticado na floricultura nos primeiros meses, ele não tinha chegado perto de ter um físico daqueles.


Cego pelos próprios pensamentos, a atitude do outro não pareceu tão estranha de imediato.


Apenas quando o colega de turma escorregou o moletom dos ombros, e deu as costas, bem trabalhadas, para o estudante de literatura, que o mesmo se deu conta de que entrar num bosque, à noite, e parcialmente despido, não era algo comum para se fazer.


A xícara de chá de camomila ficou esquecida na beira da janela, à mercê das formigas e abelhas.


Não era uma quinta-feira.




Em 1604, Jean Grenier, um garoto francês de 13 anos de idade, foi acusado de ser um lobisomem. Ele alegou que um homem misterioso, o Senhor da Floresta, tinha dado a ele uma pele de lobo mágica e uma pomada que o transformava em um lobo. Por três anos, ele correu pela floresta como um lobisomem comedor de homens.

Baekhyun tinha optado pelo folclore francês.


Não era um tema fácil de encontrar, mas era diferente. E ele gostava das coisas não corriqueiras.


Depois de digitar as duas palavras no buscador da internet, a primeira opção de pesquisa que surgiu foi sobre Dame Blanches. Segundo o site, elas eram uma espécie de bruxa que ficavam próximas de pontes e pediam para os homens dançarem com elas. E como toda história, havia uma consequência se fossem ignoradas.


E era apenas isso.


Não tinha encontrado nada mais sobre o assunto, além de dezenas de blogs, e outras fontes não confiáveis, reproduzindo a mesma coisa. O desespero começou a falar mais alto. Já não sabia raciocinar direito. Ele tinha apenas mais dois dias para finalizar a apresentação.


As aparições nas catacumbas de Paris faziam parte? Será que as histórias da capela de Châtelard podiam ser incluídas? A lenda de Melusine era boa, também. Será que tinha mais alguma coisa significativa na biblioteca? Nada daquilo parecia ser chamativo o suficiente, ou muito memorável.


Em meio ao pequeno surto de pesquisas, os dedos longos de Byun digitaram algumas palavras, uma tecla aleatória acionada e a pesquisa foi feita, sem querer. E foi assim que as três palavras surgiram na tela, em meio a muitas fotos.


Bête du Gévaudan.


Era um monstro em forma de lobo que assombrou as pessoas que viviam na França, em torno de 1764 e 1767. Muitos animais foram mortos, confundidos com a tal Besta. E quando um novo período de paz se instalava nas aldeias, um novo lobo retornava, junto de muitas vítimas. No fim, a tal Besta nunca foi encontrada.


Era interessante como a cultura francesa tinha muitas histórias com lobos. Aquele parágrafo sobre Jean era resultado disso.


O jovem estudante não se impressionou muito. Era engraçado notar como as pessoas, que viveram séculos atrás, se surpreendiam com animais e situações tão normais, atualmente. Não que é como se todos vissem um lobo enorme, que arranca cabeça de crianças ou qualquer humano, andando pelas ruas. Poderia ser um espécie maior que as outras, ou mesmo um pessoa, que não era tão sã. Ou mesmo um serial killer.


Ainda que, nos dias atuais, muitas pessoas avistem lobos com forma humana, andando sobre duas patas, em estradas, florestas e acampamentos, um ser humano se transformar, literalmente, em animal era meio estranho de se pensar.


Como e por que eles seriam assim? O que os tornavam tão especiais?


“Se é que existem”, Baekhyun sussurrou, colando uma imagem sob o título da apresentação.


Agora sim, o seminário seria concluído.


Ele tinha mais uma hora até a hora do chá em frente a janela.




Depois daquela noite estranha, Baekhyun iniciou uma nova rotina.


Não era por mal.


Era ócio puro, por mais que a pilha de rascunhos para pesquisas e trabalhos tivesse aumentando sobre a escrivaninha dele.


O colega sem nome vinha sempre da mesma direção, no mesmo horário. As roupas variavam de estilo, assim como os calçados, mas tinham o mesmo tom. Preto. Parecia que ele queria se camuflar, mesmo que sempre seguisse o mesmo ritual de tirar a parte de cima, antes de entrar no bosque.


O estudante de literatura não negaria, caso perguntassem, se ele assistia ou procurava na internet por notícias sobre assassinatos, corpos desmembrados ou coisa do tipo pela região, todas as manhãs, antes de sair para o trabalho. Ele estava sendo drástico, mas não fazia sentido algum alguém se embrenhar num mar de coníferas por puro entretenimento. Aquele bosque tinha caminhos traçados para os habitantes se exercitarem, passearem de bicicleta num domingo ou ter um maior contato com a natureza.


Mas às duas da madrugada?


Por mais segura que a cidade fosse, era loucura se aventurar a noite por lá. Os trajetos eram marcados, mas se alguém avançasse mais de cinco metros além do limite, era fácil de se perder e topar com um bicho. Baekhyun cogitou acrescentar um ‘restos de um homem devorado por animais selvagens’ na lista de busca.


Com o corpo coçando de curiosidade, em uma breve conversa com Jongin durante o almoço, ele questionou se o moreno sabia em que direção aquele bosque dava. Porque ele só sabia da imensidão de árvores até alcançar Keasey, a cidade vizinha. O colega de trabalho confirmou o que ele já sabia, e desconversou sobre o assunto, mostrando um desinteresse palpável.




Quinta-feira, dia do seminário.


Todos estavam ansiosos, e andavam de um lado para o outro, com laptops nas mesas, fichas nas mãos e pendrives rolando de uma lado para o outro. O professor não tinha chegado, provavelmente estava atrás do único retroprojetor que a faculdade tinha domínio.


“Eu esqueci a merda do pendrive em casa”, Jongdae gritou, revirando a mochila, jogando os livros e os caderno sobre a mesa. “Não é possível!”, balançava o objeto, com os bolsos todos abertos, como se magicamente o pendrive fosse cair no chão.


Baekhyun, que estava relendo as pautas, riscou o tópico em que tinha parado, e se aproximou.


“Chen, não está nos bolsos da sua calça?”, comentou, chamando a atenção do colega.


“Não está!”, a tom de voz estridente. “Você acha que eu não procurei nos meus bolsos”, retrucou, como se Byun fosse o culpado daquela situação, mas apalpou os jeans do mesmo jeito. Os olhos se arregalaram e ele desviou o olhar com uma típica cara de pastel. Estava no bolso lateral esquerdo.


“Você acha que eu não procurei, blá, blá, blá”, Baekhyun imitou o outro.


“Desculpa”, Jongdae começou, enquanto se sentava na cadeira e plugava o objeto no laptop. “Eu não quero ficar com a corda no pescoço com o Lewis como no semestre passado”, batucou as pontas dos dedos na mesa de madeira. “Esse velho é um saco. Nada do que eu faço é bom para ele”.


Jongdae e Joonmyeon eram os alunos que o professor mais implicava, desde o começo do curso. E para sorte dos dois, com muita ironia, Lewis sempre lecionava uma disciplina por semestre. Essa era a parte ruim da faculdade ser tão pequena.


“Relaxa, se ficar nervoso desse jeito, aí é que as coisas desandam”, era engraçado como Chen era o aluno mais falante da turma, mas era um seminário brotar em algum momento do semestre, que ele ficava descontrolado. Se para ele já era difícil, imagina para quem era tímido.


Aquela linha de pensamento fez com que os olhos de Baekhyun pousassem sobre a nuca do ‘garoto do bosque’. Ele era extremamente silencioso. As únicas palavras que Byun tinha ouvido da boca dele foram monossilábicas. Como é que apresentaria o seminário?


“Más notícias”, Sr. Lewis passou pela porta, segurando o projetor debaixo do braço. “Temos apenas as duas aulas iniciais para a apresentação. A Sra, Smith vai utilizar com a turma dela depois do intervalo”.


As palavras do professor causaram suspiros de alívio e grunhidos de irritação. Suspiros de alívio, para quem tinha as iniciais a partir da letra N, e grunhidos, para os que se estendiam até o M. A ordem de apresentação era orientado pela lista de chamada oficial.


“Byun, você já pode começar”, o homem calvo chamou, e o estudante de cabelos caramelo suspirou pesado. Desde que Anne tinha ido para Portland, ele era sempre o primeiro. Não sabia se era uma benção ou uma maldição.


E ainda tinha que montar o equipamento todo.




“Caralho, eu nem acredito que apresentei aquela porcaria”, Chen comentou, andando lado a lado com Baekhyun, no hall da faculdade. “Me sinto um homem livre e desimpedido”, abriu os braços, bem exagerado. “Pra fechar com chave de ouro, não temos aula amanhã”.


Era a reunião de professores. Byun tinha esquecido completamente daquele detalhe. Ainda bem que o colega tinha lembrado, porque ele teria perdido tempo e viagem.


Alguns passos, e ambos pararam em frente as vagas de bicicleta. Baekhyun tirou a chave do bolso da calça e se agachou para abrir a trava.


“Hmm”, Jongdae hesitou por um momento, observando o colega. “Até semana que vem, cara”, sorriu e acenou, antes de dar as costas e caminhar em direção ao estacionamento.


“Até”, Byun respondeu, os olhos atentos ao que fazia. Quando terminou de enroscar a trava por todo o cano da bicicleta, e trancar outra vez, ele se levantou e guardou o molho de chaves no bolso.


Ele não pedalou até a rua Bridge, como sempre fazia.


Dessa vez, ele empurraria a bicicleta por toda a Avenida Califórnia, até alcançar a extensa rua que o levaria pra casa. Estava, estranhamente, muito afim de caminhar.


Com esse pensamento rodopiando pela cabeça, ele não percebeu que o colega silencioso estava alguns passos à frente dele, disperso entre alguns alunos que compartilhavam a mesma ideia de Baekhyun.


O clima nublado, propício para as chuvas repentinas de outono, contribuiu para tal.


Quando uma forte lufada de ar frio atravessou pela avenida, balançando árvores, vestidos, e arrancando bonés, quase perto da esquina com a Bridge, Byun se deu conta da presença do outro. Aquela cabeça de cabelos raspados surgiu, quando o capuz que ele vestia, como de praxe, escorregou com a força do vento.


Instantaneamente, a silhueta do outro parecia estar enrolada em fitas de neon. Era impossível, para o estudante, perder o outro de vista.


Os dois viraram à esquerda da Bridge, caminhando com passos calmos e ritmados, sem pressa de chegar ao destino. A ideia de ir pedalando até a casa foi esquecida, momentaneamente. O estudante de literatura seguiria o ‘garoto do bosque’ até onde o caminho de ambos divergissem.


A loja de auto-peças, o grande campo de futebol, o posto de gasolina, a oficina mecânica e as poucas casas, que se estendiam por aquele trecho reto da rua, ficaram pra trás. Apenas o motor dos carros, quando passavam por eles, e o ‘tec tec’ da correia da bicicleta, girando pesada, pela falta de dois pés sobre os pedais, eram os barulhos daquela noite.


A Bloom surgiu a alguns metros de distância, quando as cercas brancas de balaústre, nas laterais da Rock Creek, se aproximaram.


Quando estavam quase em frente a floricultura, o estudante de capuz, estacou sobre a calçada. E Baekhyun parou, num sobressalto, achando que tinha sido descoberto. Ou que o outro desconfiou de alguma coisa. Mas não era isso.


Ele apenas observou a floricultura por um tempo, suspirando tão forte, que Byun conseguiu ouvir o modo como o ar entrava pelo nariz arredondado. A cabeça, levemente, para o alto, e os olhos fechados. Depois disso, ele atravessou até o outro lado da rua, caminhando até a esquina, com as mãos nos bolsos da calça, e subiu para a Avenida Jefferson. Como se aquela pausa repentina não tivesse acontecido.


Não olhou uma única vez para trás.


Baekhyun continuou na mesma posição, até ele desaparecer. Somente depois disso, que sentou no banco da bicicleta e pedalou apressado para a casa.




A semana seguiu conforme a rotina de Baekhyun.


Não aconteceu nada de muito diferente.


Exceto pelo homem de cabelos grisalhos, que estava na frente da Bloom diariamente, esperando para que o atendente destrancasse a porta e ele pudesse entrar. Após andar entre as prateleiras, ele tornou a comprar outro vaso com violetas.


A movimentação de pessoas na floricultura era moderada. Entretanto, era difícil não lembrar da compra de cada cliente. E Baekhyun sabia com facilidade, que ele já tinha comprado uma flor de cada cor, durante todas os dias da semana que passou por ali. Os vinte dólares pelos quinze da flor, e os cinco de gorjeta. Mas todas as vezes, sem aquela frase sem sentido do primeiro dia.


E correndo as folhas do calendário, era quinta-feira novamente.


Dessa vez, enquanto passava pelo trajeto de cascalhos do bosque, os olhos sonolentos de Byun, que estavam sempre fixos no pneu dianteiro da bicicleta, observaram melhor o entorno. Eram tantos troncos de árvores, que corriam junto com ele, na velocidade das pedaladas, que a cabeça quase girou. Os arbustos estavam mais espessos e altos, e as folhas alaranjadas caídas estavam tornando o ambiente um pouco mais claro. Os raios de sol penetravam ainda mais por entre os vãos dos galhos.


“Alguma pergunta para o colega de vocês?”, a voz grave do Sr. Lewis fez Baekhyun pular na cadeira. Não tinha prestado atenção a nenhuma das outras apresentações. Todos os alunos negaram. Sabiam que se perguntasse alguma coisa, teria um vingança na próxima apresentação. “Quem é próximo? Todos já apresentaram?”


O silêncio tomou conta da sala toda.


O professor percorreu o olhar por todos os lugares, até cair sobre o estudante de cabelos raspados. As sobrancelhas cinzentas se juntaram, a feição de dúvida bem estampada no rosto do mais velho.


“Você não apresentou”, proferiu. O homem calvo abaixou a cabeça, e folheou os papéis que tinha em mãos, buscando por alguma coisa e, visivelmente, não encontrando. “Não tenho seu nome na chamada. Você é transferido?”


“S-sim”, a voz soou mais grave do que Baekhyun se lembrava.


“Menino, você sequer assinou a lista”, o professor parecia indignado de não ter notado a presença do garoto em todo aquele tempo. “Qual é o seu nome? Trouxe o papel carimbado para eu assinar?”


Todos os estudantes estava vidrados naquela interação, a curiosidade palpável no rosto de cada um.


“Meu nome é Kyungsoo. Do, Kyungsoo”, depois de todas aquelas semanas, Byun finalmente soube o nome do outro. Ele estava, quase, chamando o outro de Grenier, por causa do hábito de desaparecer floresta adentro. “Não trouxe o papel, senhor”.


“Kyungsoo, você ficou com algum tema?”, o professor estava perdido. Não sabia se repreendia o outro, pelo esquecimento do papel de transferência, ou se pedia desculpas, por ser desatento. Preferiu mudar de assunto, depois resolveria aquilo.


“Arte”. respondeu de imediato. “Arte francesa”.


Por mais que o outro tivesse aquele semblante neutro, enquanto respondia ao questionamento do Sr. Lewis, as mãos estavam inquietas. Os dedos curtos espremiam um bolo de fichas, formando um canudo. Ora apertava, ora libertava. O diâmetro mudando a cada movimento.


“Certo… Pode se apresentar”, o mais velho balançou a mão, num gesto para que o outro descesse até o centro da sala.


Kyungsoo desceu as escadas de madeira, os pés mal pareciam tocar o chão. Ele conseguia sentir os olhares curiosos sobre as costas. Então, instintivamente, encolheu os ombros. A vontade de grunhir para todos, como uma forma de defesa, ficou presa na garganta.


“Não tenho pendrive, o tom de voz era calmo e baixo. “Desculpa”, fixou os olhos fartos no professor, por alguns segundos.


“Não tem problema. Pode começar”, Sr Lewis estava compreensivo demais. Era esquisito ver o modo como ele estava falando com o aluno transferido.


Kyungsoo respirou profundamente, antes de ler a primeira linha das fichas amassadas.


“A arte francesa…”, e travou. “Os pintores…”, tentou outra vez. O suor que surgiu na testa do estudante brilhava, conforme ele virava a cabeça de um lado para o outro, tentando ler as linhas que tinha escrito. “Monet, Renoir e… Courbet… Eles…”.


E as fichas caíram das mãos dele.


Os dedos, com unhas tão curtas como os cabelos, deslizaram pelo pescoço e orelhas. Ele parecia transtornado, mas estava tentando se acalmar, em meio a inspirações ritmadas. Antes que Baekhyun pudesse pronunciar alguma coisa, Kyungsoo saiu correndo pela porta.


Um monte de palavras sem sentido escapando dos lábios do outro, antes de desaparecer corredor afora.


Os demais estudantes começaram a falar todos ao mesmo tempo, um segundo depois do acontecido. E no meio daquele caos, onde o professor começou a gritar para todos calarem a boca, Byun apanhou o material do outro, a própria mochila e saiu despercebido da sala.


As pernas curtas não conseguiram alcançar uma boa distância, parou no meio do estacionamento, com falta de ar. Porém, Baekhyun pode ver, a algumas dezenas de metros, Kyungsoo atravessar os arbustos, que delimitavam o chão de concreto, da pequena mata que cercava a faculdade.


Qual era a do outro com árvores e derivados?


E qual era a dele, em seguir Do, mesmo que não soubesse onde tudo aquilo ia terminar?


Sem enxergar nada além de um palmo à frente dos olhos, com a pouca luz vinda dos postes e da entrada da faculdade, Baekhyun se deixou ser engolido pela floresta.


Mesmo que novos, os tênis que calçava não ajudavam muito a amortecer o impacto das pedras, galhos quebrados e raízes, espalhados entre os troncos das árvores.


O estudante de literatura pensou em gritar pelo nome do outro, e informar que era perigoso demais estar num lugar como aquele. Mas uma voz gutural, vinda de algum lugar próximo, fez com que os pelos do corpo todo se arrepiasse, e ele travasse onde estava.


A frase era repetida incessantemente, como um mantra. E mesmo que mantras fossem proferidos para encontrar um estado de relaxamento, o dono dela parecia cada vez mais furioso. O tom pesado demais, deu lugar a um rosnado congelante. E as palavras morreram num eco.


Omiyage mittsu tako mittsu.


O silêncio durou alguns segundos.


Os olhos de Baekhyun tinham dobrado de tamanho, e procuravam por algum sinal de vida por entre as sombras das árvores. A cabeça estava cheia de questionamentos. Será que alguma coisa tinha acontecido com o colega? Algum animal selvagem tinha o atacado? O que estava acontecendo?


Com passos vacilantes, a pasta de Kyungsoo entre os braços e a mochila pesando nas costas, ele avançou alguns metros. Não sabia bem o que procurar, ou o que encontrar. Estava sendo inconsequente, sabia muito bem.


O barulho de galho seco se partindo, junto de um suspiro ruidoso, fez com que Byun levantasse o olhar do chão. E pela primeira vez, ele não quis ser tão curioso sobre as coisas.


Os braços amoleceram e o coração acelerou ainda mais.


Ele estava entre os tronco e, passaria despercebido se não fosse os olhos amarelos brilhantes.


Aquele ser passava de dois metros de altura, por isso foi difícil notar que ele estava a menos de dez passos de distância, camuflado entre as árvores. Com um grito preso na garganta, a única coisa que Baekhyun registrou, antes de disparar pelo caminho do qual tinha vindo, foi os pedaços de tecido enroscado naquele corpo delgado, mas igualmente forte.


Um lobo gigante de pêlos negros e dentes pontiagudos.


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Komorebi [japonês]: uma palavra poética que os japoneses têm para descrever quando a luz do sol é filtrada pelas folhas das árvores antes de chegar ao chão, criando sombras e buracos de luminosidade.

Iktsuarpok [esquimó]: aquela sensação de que alguém está chegando e faz com que você vá verificar constantemente se há pessoas do lado de fora (também indicando um pouco de impaciência).

8 de Junio de 2018 a las 03:39 0 Reporte Insertar Seguir historia
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