zephirat Andre Tornado

No Natal, Mr. Satan, o grande campeão da Terra, reflete sobre a época, evocando memórias e sonhos, próprias desta festa tão especial.


Fanfiction Anime/Manga For over 18 only. © Dragon Ball não me pertence. História escrita de fã para fã.

#dragon-ball #Satan #natal #desejos #família #Campeão
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Capítulo Único


Chegava mais um Natal.


Era uma altura do ano que me punha sempre demasiado introspetivo, em que me recolhia dentro da minha concha, pensando em mim mesmo. Poderiam chamar-me egoísta numa época em que é suposto ser generoso para os outros, mas eu sempre fui egoísta. É um dos meus defeitos. Bem, não será o único, admito-o, mas não queria começar a dissecar a minha personalidade no Natal. Mas também me dava para isso, a minha introspeção.


Que relação tinha eu com a celebração do Natal? Era uma pergunta interessante que eu repetia todos os anos, nesta época em que as ruas se enchiam de luzes, de grinaldas vermelhas, brancas e verdes, de sinos a tilintar e de gente atarefada num carrossel de consumismo.


Neste exercício psicológico sentava-me num cadeirão, na grande sala da minha mansão, perna traçada, charuto fumegante entre os dedos, cismando com o meu cinto de campeão devidamente guardado numa vitrina com caixilhos dourados. Até conseguia ouvir os gritos do povo aclamando-me, naquele silêncio de veludo:


- Sa-tan! Sa-tan! Sa-tan!


Pois era, rodeava-me o silêncio. Era assim em todos os natais. Uma total ausência de som, nem mesmo os sinos a tilintar que chegavam a irritar-me de tão perfeitamente cristalinos e inocentes. E eu não gostava de viver no silêncio.


Precisava absolutamente de ruído em meu redor, de aclamações épicas, de palmas ininterruptas, de vozes entusiasmadas a gritar o meu nome numa idolatria que alcançava as nuvens. Eu era o grande campeão da Terra, o homem mais forte do mundo!


Neste ponto de reflexão, pigarreava, engolia a saliva a custo, disfarçava a imodéstia arredando a verdade para sítio escuro dentro da minha cabeça que se enchia de pensamentos e voltava a focar-me no Natal.


Ora, mais um Natal…


E abanava a cabeça para trás e para a frente, afirmativamente, como que a confirmar que sim, que o Natal estava mesmo ao virar da esquina, que o dia feriado iria acontecer e estava na altura de mais um exame a mim próprio.


No Natal, fazia o que me competia, o que os meus assessores de imagem do departamento de relações públicas que trabalhavam para mim diziam que era para ser feito, pois um grande campeão tinha certas obrigações, explicavam subservientes e maravilhados. Visitava orfanatos carregado de presentes para todas as crianças, fazia apresentações em centros comerciais promovendo produtos e lojas, participava em campanhas de angariação de fundos para causas sociais, ajudava nas cozinhas das associações de proteção a pessoas carenciadas distribuindo sopa e outras refeições quentes. Havia sempre uma legião de fotógrafos, jornalistas aos magotes, publicidade a rodos, eu no centro das atenções, sorrindo, brilhando como uma estrela, o que aparecia comigo passava a secundário mas ninguém se importava, pois bastava a minha presença para que todos se sentissem importantes e amados, os sonhos de Natal satisfeitos, pois tinham estado na companhia do grande campeão Mr. Satan!


E eu? Eu não teria direito aos meus sonhos de Natal?


Puxava uma passa ao meu charuto caro.


Houve um tempo em que não era famoso, nem sequer introspetivo ou cínico. Houve um tempo em que eu tinha um Natal normal, como um vulgar anónimo e posso arriscar que era bastante feliz. E volto a abanar a cabeça, afirmativamente.


Estava com a minha mulher e a minha filha Videl, dois aninhos inocentes. Para a pequenina era tudo magia, cores e luzes, cheiros doces e sabores deliciosos. Apontava para a boneca preferida na montra da loja dos brinquedos e dizia que era linda e eu sabia que era o que ela desejava para aquele Natal. Aconchegávamo-nos no sofá velho, todos abraçados, cantando cantigas próprias daquela festa e comíamos bombons de chocolate de uma caixa que eu tinha comprado naquela tarde, um pequeno luxo. Depois trocávamos beijos e segredos, dizendo o que cada um desejava para o Natal e lá vinha Videl a pedir a boneca linda da tal loja! Eu gostava de pedir amor e saúde, sussurrando à minha mulher o quanto ela era especial, muito mais linda que a boneca. Ela sorria-me e eu sentia-me feliz.


Agora tenho um monte de dinheiro, estou num salão enorme de uma mansão que é como um palácio, sou admirado pelo mundo inteiro por causa dos meus dotes nas artes marciais, o meu Natal é um corrupio pois não paro entre orfanatos, cozinhas comunitárias, centros comerciais e bancas de angariação de fundos, mas trocaria tudo isso pelo sofá velho.


Esse é o meu sonho de Natal. Regressar ao passado.


Sei que a minha amiga cientista Bulma, um dia, construiu uma máquina do tempo. Talvez… Talvez se eu pedisse uma máquina do tempo pelo Natal!... Mas essa invenção só trouxe problemas… Aceno com a cabeça, mais uma vez, considerando com um laivo de orgulho e muito egoísmo que os problemas acabaram por me beneficiar, pois se não fosse o monstro Cell, transportado por essa mesma máquina do tempo, eu não seria o que sou hoje – campeão, rico, famoso, uma lenda.


Mas será melhor deixar o passado intocado.


Deixo o charuto consumir-se, como eu me consumo na minha memória distante daqueles natais simples, com a minha família. Sinto a face húmida, acho que é a lágrima tradicional, o vestígio de tristeza que se me acomete depois do exercício de meditação sobre os meus sonhos frustrados.


Depois, respiro fundo, forço um sorriso.


O grande Mr. Satan não se deixa abalar por nada!


Recoloco a máscara, o peito inchado de ar, solto uma gargalhada trovejante. Levanto-me de um pulo do cadeirão, abandono a contemplação do meu cinto de campeão.


Sou feliz, penso. Tenho outras dádivas.


O salão resplandece de decorações de Natal. Esferas, grinaldas, sinos – mudos que eu não suporto aquele tilintar alegre – renas, luzes, estrelas, pingentes. Tudo em dourado, vermelho, azul. Estou preparado para mais um Natal, afastando o sonho melancólico da simplicidade dos primeiros natais. Da magia inicial, da boneca singela, do beijo cândido, do sofá velho.


A porta dupla do salão escancara-se, passa o mordomo.


Eu abro os braços iluminando os olhos baços, recuperando a alegria.


- Pan-chan!!


A minha neta corre para mim, gritando:


- Ojiisan!


A solidão vai-se embora. A minha filha Videl, adulta, aparece na porta dupla acompanhada do marido, Son Gohan. Apesar de ter os meus traços, faz-me lembrar a mãe dela e sinto saudades. Mas só por um momento.


Com a minha neta Pan nos braços aqueço o coração. Acredito no Natal – não nas correrias loucas, nas ações de caridade publicitadas, nos compromissos de uma agenda impessoal e demasiado cheia. Acredito, simplesmente, no Natal, aquele dos abraços e dos segredos, dos sonhos perfeitos.


Acho que Videl comprou uma boneca para Pan.


Uma daquelas bonecas lindas de uma loja de brinquedos especial…

Dec. 20, 2018, 12:02 a.m. 2 Report Embed Follow story
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The End

Meet the author

Andre Tornado Gosto de escrever, gosto de ler e com uma boa história viajo por mil mundos.

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Lyse Darcy Lyse Darcy
Todos seus contos de natal estão adoráveis ... e esse não poderia ser diferente beijos!
December 21, 2018, 13:21

  • Andre Tornado Andre Tornado
    Oi Lyse! Muito obrigado pelo teu comentário. O Natal é época de reflexão e de amor, de saudade e de celebração. Beijo! December 22, 2018, 11:05
~