Tsume estava imensamente irritada. Não aguentava mais, o tanto que Kiba ficava trancado no quarto! Se tivesse a idade de Hana, mas ele era só uma criança. Uma criança trancada no quarto.
Mas ela sempre soube que ele era diferente. Lembrava muito bem, quando teve Hana em seus braços, e anos mais tarde foi a vez dele. Ela... sentiu, simplesmente. Mais tarde ele mostrou que a mulher estava certa.
Com Hana era fácil. A menina estava decidida a assumir o papel de pai, pro irmãozinho. Tinha orgulho ao falar da mãe, e quando Tsume a ouviu, falando com alguns amiguinhos, que "minha mãe é ainda mais forte que o seu pai, cuidado com o que diz! Porque... ela faz os dois papéis e nunca pensou em desistir.", e Tsume sabia que estava chorando, pela primeira vez não tinha vergonha de admitir.
Kiba era... Diferente. Enquanto crescia, ele só reclamava. Se isolava nos cantos da casa, e por mais que Tsume gritasse, e que Hana tentasse mimá-lo, nada adiantava.
Foi assim na creche. A cada semana uma reclamação: às vezes ele atrapalhava, brincava em excesso, e às vezes estava trancado dentro de si mesmo. Ninguém entendia o motivo das mudanças, e quando Kiba chorou pela primeira vez, tanto Hana quando Tsume, cansaram.
Tiraram-no da creche, e Kiba foi educado em casa. Infelizmente, às vezes esse tipo de bobagem acontecia.
Enquanto a irmã dizia que Kiba precisava de um psicólogo, Tsume cuidava do seu pequeno milagre. As poucos ela enxergou seu diagnóstico.
Via na maneira em como Kiba agia, quando se deparava com outras crianças.
Quando conheceu Naruto, Kushina, Minato e Jiraya no Festival do Equinócio de Outono, ele agiu como o pestinha que a mãe não admitia, mas amava ter. Mais tarde, esbarrando com Orochimaru e Kabuto, ele voltou a se isolar. E ali estava a resposta.
Além de ser hiperativo e ter déficit de atenção, coisa facilmente percebida ao tentar dar aulas ao filho, Tsume viu que ele não sentia o cheiro das pessoas, sentia a alma.
Infelizmente, o pai dele resolveu visitá-los.
— Querido, saia. Já deu, ele já foi. Abra a porta.
A obstinação de Kiba não era proporcional a idade dele. Uma pestinha de sete anos não podia ser tão decidido. E ele conseguia se manter calado, quando queria, sentado no canto do próprio quarto, abraçando as próprias pernas e tampando o nariz.
— Por favor, Kiba. Posso chamar Naruto, o que acha?
Demorou. Foram quase quatro minutos, mas a porta abriu.
— Ele tem cheiro de álcool.
Tsume abraçou o filho e deu um beijo na bochechinha dele.
— Por isso que eu não o quero mais. Nunca mais. Por isso ele não estava aqui quando você nasceu, e sou só eu e Hana. Está bem, por você?
— Gosto do cheirinho de vocês.
***
Hana pesquisou sobre aquilo. Era um tipo de transtorno olfativo. Kiba sentia todos os componentes de um odor, e aquilo o assustava. Mas ela também desconfiava que ia além dos cheiros, pois vira seu irmãozinho identificar uma ameaça, mesmo que seu odor não fosse ruim.
Naquela noite nem ela sabia que o "pai" tinha bebido, ele não tinha cheiro algum. Certamente estava se mantendo limpo, por um dia, pra reconquistar a ex-esposa, e Hana quase viu Tsume fraquejar, quando ele apareceu com rosas e um "feliz dia das mães, amor". Mas Tsume não demorou a se recompor. De acordo com a lei, um pai tinha o direito de ver os filhos, e como nenhum dos dois se interessou, ele foi embora. Hana sabia que nem todas as frases bonitas apagariam as marcas de hematomas que a mãe escondia.
A surpresa foi ver Kiba correr escada acima. Ele sentia o cheiro ruim no ar, o cheiro de uma alma podre.
***
— Pra você, mãe.
Tsume pegou o frasco que seu filho estendia, sem entender o que ele queria dizer.
— Obrigada por ser minha mãe, ok? Sei que sou difícil.
Ela respirou fundo algumas vezes, e Kiba continuou.
— Esse é o cheiro que me lembra você.
Tsume cheirou a tampa do frasco, que exalava um aroma cítrico e amadeirado.
— Desde quando você faz perfumes? Você só tem sete anos.
— Precisava aprender um jeito de guardar os melhores cheiros só pra mim. Quer saber como foi?
Ela só assentiu, e Hana veio se sentar ao lado da mãe pra ouvir o pequeno pestinha gênio.
— Eu percebi que existem três notas. A primeira é a de cabeça. É a primeira impressão que deixa. Dura alguns segundos. Sua primeira impressão é... A essência do limão. Depois vem a de coração. É a personalidade do perfume. Pra você, o sândalo, que perfuma o machado que o corta. Dura horas. E aí vem a nota de fundo, ou de fumaça, que é o rastro que o perfume deixa. Essa dura anos. E a sua é a dama-da-meia-noite. Ela é doce. Igual a senhora não admite que é.
Onde aquele pirralho aprendera tudo aquilo, Tsume não fazia a mínima ideia. Mas nunca esqueceria, e parecia a primeira vez que choraria na frente do filho, até Hana intervir.
— Eu também quero um perfume!
As duas riram, e Kiba não teve opção senão rir também. Ele adorava o cheiro que as duas exalavam ao rir.
Até a porta ser praticamente derrubada, não houve problema.
Os Inuzuka olharam para a fonte do barulho, mas Kiba não estava trancado dentro de si mesmo, não era uma ameaça.
— Eu soube que ele apareceu aqui! Tem algo errado?!
A risada voltou a preencher o lugar.
— Shibi?
— Eu...
A arma foi rapidamente escondida no sobretudo do policial, que olhava pra parceira com dúvida e surpresa.
— Anko me disse que o viu vindo na direção de sua casa, achei que fosse fazer algo com vocês.
— E esse é seu filho?
— Também tenho folga no dia das mães.
O sorriso ladino de Tsume fez Shino sair das sombras do pai. Era a primeira vez que via o filho do parceiro, e achou ele estranho, assim como achava o adulto estranho. E mesmo sendo estranho, ela adorava o policial, assim como ele adorava ela, mesmo que nenhum dos dois fosse admitir.
Assim como era com Hinata e Naruto, Kiba não se agitou. Ele já conhecia o parceiro da mãe e sabia que ele era incrível, pelas histórias de dormir que Tsume contava pro filho, mas eram raras as vezes em que ele não se fechava por causa de uma criança.
Hana viu o jeito que Shino encarava seu irmãozinho, como eles se analisavam. Ela quase suspirou alto ao ver que Kiba não estava com o olhar desfocado que assumia quando não gostava de alguém, muito pelo contrário. As duas mulheres sorriram quando ele levantou.
— Quer brincar comigo?
Mesmo que as duas soubessem que ele ia aprontar alguma travessura, sequer fizeram menção de atrapalhá-los a saída da sala, de onde Shibi via tudo com a boca entreaberta.
— Shino... Nunca... Ele nunca brinca, ele...
— Sim. Eu sei. Meu irmão é realmente incrível.
Hana saiu da sala, deixando os dois adultos sozinhos.
E naquele dia, Kiba conheceu seu terceiro melhor amigo. Shino era incrível, ele ouvia o tagarela sem reclamar, e adorava Akamaru.
Seu grupo continuou crescendo de acordo com a idade, até ele conseguir se formar de verdade numa escola - a mesma que os amigos, diga-se de passagem.
***
Mais uma vez, Tsume batia na porta do quarto de Kiba.
— Querido, saia. Já deu, ele já foi. Abra a porta.
Mas ninguém ouvia nada de lá de dentro.
— Kiba! É a noite de sua formatura, por favor, não deixe que um fantasma do passado estrague tudo!
Dessa vez, era Hana quem gritava.
Nenhuma conseguiu fazer o filho abrir a porta. A surpresa começou nesse ponto.
— Kiba, nós vamos nos atrasar.
Shino subia, lentamente, as escadas.
A porta foi aberta.
— Não vou, Shino, eu nem tenho par.
— Mas tem que ir com a família! Como sua irmã mais velha, eu...
— Vou ser seu par, Kiba. É óbvio. Vamos?
A boca de Tsume quase alcançava o chão. Shino conseguiu o que as duas tentavam a duas horas! E... Além de tudo...
Mas o olhar de Kiba era de desconfiança.
— Meu pai me contou que seu pai veio, mas juro que não estou aqui só por isso. Eu quero ir com você.
— Por não ter outra opção?
— É claro que não, você sabe que fui convidado pela Ino como eu sei que foi convidado pela Sakura. Agora, pronto?
Tsume e Hana assistiam tudo como uma partida de ping-pong, de um lado pro outro. Por fim Kiba sorriu. Ele estendeu o braço pro melhor amigo, e Tsume como toda mãe babona estava amando vê-lo de terno.
— Você está cheiroso. Que bom.
E os dois saíram da casa, enquanto Hana e Tsume ainda superavam a surpresa.
— Mãe! Hana! Vamos nos atrasar! Venham logo!
Elas se apressaram pelas escadas, e antes de alcançar a porta, olharam de uma para outra.
— Eles...
— Ainda não perceberam, mas eles vão...
Tsume não poderia estar mais feliz. Shino era parte do grupo seleto de Kiba, aqueles de alma encantadora, os únicos que não o deixavam mal, e ela confiava na intuição do filho. Hana ainda mantinha a promessa mental de surrar o Aburame, caso seu irmãozinho se machucasse, mas quando saíram pela porta, viu que sequer era preciso.
Kiba explicava as notas do perfume, que ele mesmo fez pro outro, enquanto mostrava o porquê daquela fragrância ser perfeita pra ele.
Era a segunda vez que aquilo acontecia na casa Inuzuka, e as duas mulheres entendiam o que significava.
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