ca_vini Caio Vinícius

Amanda poderia jurar que seu amante apareceu na sua cama para uma despedida covarde, mas essa não é a única possibilidade.


Short Story For over 18 only.

#romance #conto #lenda #mitologia #psicolologia
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O amante e a pisadeira

Ele chegava por trás e deitava com cuidado pra não me acordar imediatamente. Ele procurava os sinais para saber se chegava mais perto ou dormia no canto dele. A minha cama era o maior sinal. A cama de casal que eu usava só um cantinho pra dormir toda encolhida.

Antes de deitar, eu avaliava meu humor em frente ao espelho do banheiro depois de tomar banho. Eu avaliava meu corpo e a reação do sabonete na química da minha pele. Perto demais do espelho, a minha pele precisava estar reluzente e os olhos precisavam clarear conforme o rosto chegava bem perto do meu reflexo. Eu precisava enxergar minha alma e ficar interessada por ela.

Antes de passar os sinais pra ele, eu buscava os meus próprios. Não adiantava só meus pensamentos pedindo ele na minha cama. O meu corpo também tinha que querer. ME querer! Primeiro.

O papel dele, como homem e amante, era perceber os sinais e fazer o que ele queria, baseado no que EU estava afim de fazer. E sem reclamar. Eu era a vagabunda para os outros. Por mais que só entre a gente, eu fosse igual a ruiva da novela que só se preocupa com a companhia dele e a música de fundo que toca durante o beijo.

Eu ainda era a vagabunda, se pudesse ler os pensamentos de qualquer pessoa no mundo; se eu pudesse entrar na cabeça da moça que rega as plantas do meu condomínio ou do senhor que pede para eu abaixar os faróis na hora de passar pelo portão.

Isso nem sempre me incomodava. O que me tirava do sério, era quando ele ignorava os sinais. Do jeito que ele fez da última vez. Ele devia estar achando que merecia atropelar meus sinais depois de um dia cansativo; depois de quase acabar com o casamento dele só pra inventar uma desculpa. Ele até aumentava pra mim, os riscos que corria ao inventar suas desculpas. E eu fingia que não sabia que, nas noites que ele deitava na minha cama, a mulher dele fazia plantão em um hospital. Eu já escrevi que nada disso me incomodava, senão, estou escrevendo agora. O que me tirava do sério, eram os sinais ignorados. Um homem que atropela esses sinais está pedindo para escutar o que se passa na cabeça de uma mulher; não é pra qualquer um.

Na última noite que ele apareceu no meu quarto, a cama só estava arrumada do meu lado. Eu puxei a colcha só até a metade e dobrei por cima do outro lado. Cuidadosamente. Por mais que a cama fosse de casal, eu só tinha deixado lugar pra mim. E, se eu estava usando minha melhor camisola... Era só pra mostrar que ele não poderia arrancá-la naquela noite.

Outro sinal era a falta incenso. Eu sempre acendia o "incenso da harmonia" no meu quarto quando esperava por ele. Me ajudava a ficar paciente ao invés de ficar ligando a cada meia hora pra saber do trânsito. Na última noite que ele apareceu meu quarto, só tinha o cheiro do risoto que eu comi enquanto assistia a reprise do último episódio de "Friends". O ar condicionado pregou o cheiro de gordura nas paredes. Eu apaguei, mesmo sabendo que era cedo pra desistir de esperar. Só acordei quando ele começou a invadir os sinais.

O peso dele deitando calmamente sobre a parte da cama com as duas camadas de colcha me acordou em etapas.

"Bárbara?"

Eu nunca soube se foi ele cochichando meu nome ou era um fragmento de uma conversa no meu sonho que eu nem lembrava mais.

Ele atropelou outro sinal.

A mão dele passou pela minha nuca e passeou pelas costas até chegar na perna.

Eu decidi que iria ficar imóvel. Eu só ia me mexer se ele continuasse avançando até tentar tirar minha camisola. Eu me senti desejada e perfeita naquele momento. Estava deitada de lado pra desenhar um morro com minha cintura e continuava com a respiração lenta e concentrada, como em um sono profundo. Eu dormia o sono mais profundo, mesmo sabendo que ele viria naquela noite e, mesmo sabendo, destruí os sinais que ele levou meses para aprender. Não tinha um motivo especial para eu estar fazendo aquilo. Parte de mim queria só que ele me tratasse como a vagabunda que eu tinha certeza que era na cabeça dele. Aí sim. Eu teria motivos reais para repetir aquela destruição de sinais por mais um bom tempo. Até que eu cairia no mesmo dilema clichê das outras amantes que são vagabundas na cabeça de todo mundo. E esse seria meu melhor argumento.

Ele continuou passeando os dedos até a minha panturrilha. Devia estar esperando um sinal que não veio. Ele deve ter percebido o cheiro de risoto, a cama arrumada só de um lado e o meu sono precoce e profundo. Eu demorei a perceber que o meu sono profundo não estava mais sob o meu controle. A respiração paciente era insuportável para uma mente consciente. Eu já não sabia qual parte de mim estava acordada para me mostrar a parte que continuava dormindo. Contra a minha vontade. Eu cheguei a me concentrar no sono outra vez para fazer o caminho de volta para o descanso, já que acordar parecia impossível.

Eu estava presa em um caminho entre a entrega do sono e a realidade. O meu corpo não acompanhava o medo. Eu sentia uma agonia que me proibia de expressar com um pulo da cama ou uma esticada de pernas. Nada parecido tinha acontecido comigo. Não era a mesma coisa que acordar depois de despencar com o elevador nos pesadelos surpresas. Eu tinha plena consciência de tudo ao meu redor, na minha vida real e podia sentir esta vida mantendo meu corpo. Ao mesmo tempo, eu não conseguia abrir os olhos ou a boca. O ar condicionado já estava entupindo meu nariz e não podia abrir a boca para respirar melhor.

Fiz um teste.

Eu tentei gritar, esticar as pernas, abrir os olhos e a boca... Eu tentei gritar por ele e torci para que ele me sacudisse na cama. Nada aconteceu. Meu coração batia devagar e minha respiração estava em desacordo com o meu desespero. Me lembrei de quando era criança e tinha medo dormir porque achava que dormir era o mesmo que morrer por algumas horas. Acabei descobrindo que morrer por algumas horas não era pior do que ficar no meio do caminho por alguns segundos.

Acordei fazendo mais força que um afogado.

Ele não estava do meu lado. A parte dele na cama estava fria do jeito que estaria se ninguém tivesse deitado ali. Fiquei com tanta raiva que me esqueci de sentir medo. Enquanto tomava banho, eu fiquei reprisando a noite agonizante. Resolvi que nunca iria contar sobre aquela noite pra ele. Todas as minhas dicas de que não estava nem aí seriam inúteis se ele achasse que eu sonhei com ele...Chegando por trás de mim e passando a mão no meu corpo.

Se eu tivesse conseguido me mover, teria virado na cama para comentar: "Nossa, eu ia ignorar você, mas depois de ser acordada com esse carinho. Você nunca me acordou desse jeito." Nunca. Torci pra esquecer aquela noite no decorrer do dia. E deu certo até eu me deitar.

Voltei pra cama depois da faculdade e dos estágios de fisioterapia. Meu orgulho me impediu de entrar em contato com ele. Era minha maior dica de que eu não iria engolir o bolo. Mais do que nunca, eu tentei enxergar nos professores e pacientes alguma característica interessante. Qualquer coisa que pudesse me colocar em outro clima e me livrar dele. Minhas amigas falam que mulher que namora, sempre tem um homem na reserva. As amantes vagabundas são as que se entregam completamente no objetivo de ter aquele homem que não é dela. Da segunda parte eu entendia. E sonhava em passar para fase onde meu objetivo seria arrumar um "homem emergência." Voltei pra cama sem esperanças. Naquela faculdade, no máximo eu ia servir pra algum projeto de play boy tirar onda com os amigos.

Voltei pra cama.

Dentro do meu sonho, existia um lugar escuro que brincava de labirinto comigo. E quando eu fazia força pra olhar pra cima, minha cabeça dava uma volta completa pra trás. E se eu tentasse olhar para o lado, meu corpo girava até me enjoar. Eu estava presa e completamente sem equilíbrio, mas ao mesmo tempo, podia sentir cada parte do meu corpo na cama. Foi difícil negar. Já não dava pra voltar pro sonho e nem dava pra acordar de verdade. Estava acontecendo outra vez.

Minha audição foi atraída para os sons no meu quarto. Havia alguém andando de um lado para o outro. Me sobrou lucidez para recordar dos sites de notícia e aquelas tragédias cruéis que começam quando um estranho invade uma casa. Aí vinha o silêncio e eu achava que os sons vinham do sonho que me prendia. Os passos voltaram e me deixaram desesperada. Tinha alguém varrendo o quarto. Se eu tivesse conseguido abrir os olhos pra ter certeza que era apenas minha memória preenchendo uma lacuna na minha cabeça... Mostrando eu mesma varrendo meu quarto. De qualquer jeito, não era o ritmo das minhas varridas. A pessoa que varria, estava com muita calma. Passava pra lá e pra cá na frente da minha cama. A vassoura chegou a esbarrar na mesa da escrivaninha que ficava perto da janela.

Outra vez o afogamento. O despertar. Abrir a boca. O nariz entupido.

Fui correndo pro computador depois de verificar as trancas do apartamento. Eu digitei no Google: "Acordo e não consigo me mover. Pessoa pelo quarto."

Apareceram links do tipo: "Paralisia do sono" "Assombração, demônio ou ciência?"

Ainda eram quatro horas da manhã. Me arrependi de ter feito aquela pesquisa logo depois de acordar. Era melhor ter visto um filme. Fiz pior. Cliquei em "Imagens". Surgiram fotos horrendas na minha tela. O quadro de um demônio grotesco sentado na barriga de uma mulher. Aquela expressão sádica que saiu da cabeça de alguém perturbado. Um demônio calando a boca de outra mulher. Extraterrestres torturando um ser humano em uma mesa de cirurgia. Para afastar o medo, fui ler as matérias científicas. Li matérias sobre o REM, que é um estado profundo de sono e que a paralisia era um oposto do sonambulismo. Milhões de pessoas passavam por isso. "Distúrbio moderadamente grave do sono." O mesmo mecanismo que me impedia de levantar durante a noite, estava anulando meus movimentos e me torturando.

Nem lembro o que estava passando na TV quando meu corpo desligou outra vez. Sonhei com ele. Sonhei com a noite que nos conhecemos, oito meses atrás. Ele me pagou um coco na praia e tinha uma expressão diferente; era um cachorro que não tinha atenção em casa e saiu pra pegar um ar.

"Encontrei o que faltava na minha vida" – Ele falou isso na nossa primeira noite juntos. E repetiu no meu sonho. Acordei com um sorriso de apaixonada que não durou muito. Não tinha nenhuma chamada dele no meu celular. Além de me dar um bolo, ele não pensou em nenhuma explicação, não veio me procurar com a cara de cachorro. Muito tempo não via aquela cara.

No Facebook, nada. Ele não existia em lugar nenhum. Nem no perfil da mulher dele. Ou da filha. Já no meu perfil, eu postei muitas músicas eletrônicas e confirmei presença em várias festas. Além de frases enigmáticas que sugeriam que eu estava me colocando na mão do cupido; mostrando meus peitos pra flecha dele.

A semana passou. Uma semana de silêncio que pra mim foi o mesmo que terminar tudo. Meu ódio era tão grande que eu já tinha uma lista de novos apartamentos pra alugar. Eu decidi sumir. Se um dia ele fosse me ver, não ia ter sinal do que faltava na vida dele. O porteiro ia falar "Dona Bárbara não mora mais aqui, senhor." Mas, eu aposto que ele iria subir pra verificar se eu tinha deixado uma carta ou algum sinal. Cheguei a pensar se deixaria. Claro que não.

Outra semana acabou passando, ainda que eu não quisesse. Eu comecei a correr na orla para aliviar meu ódio e ajudar no meu sono. Por mais que eu tivesse entendido as explicações científicas para a paralisia do sono, a forma como o folclore evoluiu ao redor do caso me fez dormir todas as noites com a luz do banheiro acesa. Mulheres já foram exorcizadas e queimadas por causa desse problema; jovens se afastaram dos estudos por não conseguirem dormir; todos tinham medo de passar por louco. No Brasil, eu li uma matéria sobre a "bruxa pisadeira" que esmaga o peito da pessoa depois de imobilizá-la com um feitiço. A única solução era não dormir de barriga pra cima. A pisadeira gostava de pisar na barriga. Uma mulher que sentia seu corpo violado várias vezes por mês, descobriu que conseguia fugir do "atentado" estalando os dedos do pé ou tentando mover o dedão do pé com força. Tentar gritar também ajudava, segundo alguns depoimentos.

Tomei coragem pra comentar essa tortura com uma senhora que eu atendia no estágio. Ela sempre carregava imagens de santas e parecia uma daquelas senhoras bem supersticias e que nunca ficava sem um conselho pra dar.

"Mude o colchão, minha filha. Isso é encosto! Você precisa mudar a sua rotina." A senhora tinha muitos conselhos. "Já tomou chá de amora? Você dorme sozinha? Bota alguém na sua cama que resolve. Eu já tive isso uma vez... Quando era solteira. E naquela época eu não dormia com a minha santa debaixo do travesseiro ainda."

Metade das coisas que ela disse, foram as mesmas que minha vó teria dito se eu tivesse ligado pra ela. Geralmente eram bons conselhos. Mudei o colchão enquanto o novo apartamento não saía. E fiquei surpresa por nem ter mais aquela pressa de sumir. Antes eu tinha a sensação que ele ia entrar no apartamento com mil desculpas que justificassem tanto tempo fora. Depois, eu passei a me acostumar com minha nova rotina. Eu corria de manhã, ia pra faculdade, ia pro estágio, passava no trabalho do meu pai pra deixar algumas contas e respondia minhas amigas no What's app; até ria das fotos virais com "kkkkkk"; curtia alguns elogios na minha nova foto de perfil. À noite, deixava a luz do banheiro acesa e tentava não pensar na "bruxa pisadeira".


Mas, a bruxa não parava de pensar em mim.


Ela voltou na última noite que eu passei no antigo apartamento. Eu estava outra vez no fundo escuro dos meus pensamentos e tinha dificuldade para saber o que era sonho o que não era. Eu não sabia meu nome, onde estava. Eu só sabia que não conseguia mover um único músculo e minha respiração estava tão lenta e profunda que cada inspiração era uma despedida. Cada suspiro parecia o último, minha vida dependia da força que eu fazia pra não perder a consciência. Meu corpo não sabia que eu estava acordada. A "pisadeira" sabia. Ela andou pelas caixas da mudança que estavam empilhadas no canto do computador.

Eu consegui mover o dedão? Não tinha certeza. E, por mais que eu sentisse minha garganta arranhando de tanto gritar, eu sabia que não estava produzindo som nenhum na vida real. O único barulho que eu escutava, eram as varridas da "pisadeira" ao redor da minha cama. Fiquei em pânico. Esqueci de todas as explicações científicas. Percebi que estava dormindo de barriga pra cima. E o nariz entupido já me afogava.

Alguém falou "Barbrinha?" Só ele me chamava assim. Ele tirou o cabelo do meu rosto e fez um carinho no meu nariz. Se eu não estivesse paralisada, teria ficado imóvel do mesmo jeito. Como um dos meus sinais, não por causa da bruxa.

"Barbrinha, acorda, a gente precisa conversar."

Conversar? Eu queria MATAR ele! Desgraçado! Ele pensa que meu apartamento é um puteiro que ele pode aparecer quando quer variar? Eu sentia a vibração das minhas cordas vocais enquanto desabafava todo o meu ódio. Aquela crise de paralisia foi a mais forte e inesquecível.

"Eu odeio você! Eu quero você fora da minha vida! Eu odeio você."

Não saiu nada. Só algumas lágrimas escaparam dos meus olhos lacrados. E eu me sentia uma miniatura do valor que tinha a minha vida, no fundo de um poço escuro.

"Barbrinha... Eu não posso mais ficar no caminho da sua vida. Você tem muita coisa pra viver. Muita coisa que eu já vivi, entende? Eu te amo e eu te acho a menina mais especial que eu já conheci... Eu só to fazendo isso por você. Um dia você vai me agradecer."

Foi isso. Ele limpou as lágrimas do meu rosto e foi embora. Deve ter achado que eu estava acordada e fiqueiimóvel pra mostrar um dos sinais que ele bem conhecia.

Ele falou aquilo e foi embora. Eu despertei com um grito de raiva. Ao invés de uma afogada, parecia que eu estava me recuperando de uma crise epiléptica.

Na manhã seguinte, o porteiro disse que não viu ninguém passando pro meu apartamento. Mas, o porteiro não via nada no turno da madrugada. Ele trabalhava na cadeira mais confortável que eu já vi na vida.

No Facebook, a notícia veio em letras gigantes e centenas de "likes".

"Aloísio Ribeiro mudou-se para Vitória."

Logo abaixo.

"Aloísio Ribeiro está se sentindo completo com sua família."

Cento e setenta e três "likes"! 173! Passei longe dos mais de sessenta comentários. Pensei em dar uma curtida de raiva. Acabei jogando o celular dentro da última mala aberta. Muito caro pra se espatifar na parede.

Ele disse que um dia, eu iria agradecer; e estava certo. O nosso relacionamento teria terminado de um jeito melhor, se fosse com uma briga? Não. Eu só não queria que ele tivesse visto que eu chorava. Eu chorava de ódio e não para parecer uma coitada. O meu consolo foram as caixas da mudança. Ele foi embora sabendo que eu já estava seguindo em frente, sem ao menos ouvir a explicação dele. Eu estava pronta. E segui.

A "bruxa pisadeira" voltou diversas vezes ao novo apartamento. O quarto novo era enorme. Meu pai percebeu que eu estava deprimida e alugou um lugar lindo e muito maior. A "pisadeira" vinha lá da varanda e já estava varrendo. Levou meses para ela subir na minha barriga. Eu não conseguia abrir os olhos pra ter certeza que era uma mulher. Só conseguia sentir o peso dela. Ela pisava e sentava na minha barriga pra se divertir com a tortura. Aí vinha o afogamento e a epilepsia.

Encontrei um fisioterapeuta. Ele fez milagres no meu corpo. Curou minha insônia, afastou a bruxa e ocupou o lugar vazio da minha cama. Ele sabia onde apertar no meu corpo. Ficamos juntos por quatro meses. Um mês para cada ano do seu casamento.

Ele também foi embora quando o conforto falou mais alto. Ao menos, a "pisadeira" nunca mais retornou. Quem voltou a chegar de mansinho durante as crises de paralisia foi o outro. O outro que vinha ignorar meus sinais.

O outro ainda chega na minha cama e encosta o corpo dele contra o meu, sempre que eu me deito de conchinha. Nas noites que e choro de raiva e saudade, o outro passa o dedo nas minhas lágrimas. Se eu não estivesse me afogando na cama, deixaria ele ali, pertinho de mim e nem faria força para me mover. Ao invés de dormir com a santa debaixo do travesseiro, passei a deixar um descongestionante nasal. Pra ajudar a aguentar mais tempo, espiar como é minha vida quando meu corpo acha que eu estou dormindo. O outro vem e eu não posso evitar, não posso abrir os olhos ou a boca.

São os primeiros sinais de que o outro veio me visitar.

Oct. 18, 2022, 7:39 p.m. 2 Report Embed 3
The End

Meet the author

Caio Vinícius Sigo buscando um espaço para dividir meus mundos. Seja bem vindo ✍️

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Leticia Diniz Leticia Diniz
De todos os medos a paralisia do sono é o que mais me assusta, lembro que na infância eu sempre sentia a mente mergulhar na escuridão, mas eu sentia tanto medo que acordava antes de mergulhar mais fundo, nunca tive coragem de ver do outro lado, não parecia ser bom, já acordei depois de muito tempo gritando sem voz, já conversei com minha mãe no quarto falando sobre que algo que só eu via, depois ela perguntou e eu não soube explicar. Mas parabéns pelo seu conto, a princípio me chamou atenção a sensibilidade de escrever sobre sentimentos mais profundos da mente feminina.
November 06, 2022, 20:36

  • Caio Vinícius Caio Vinícius
    ❤️ Eu sofro muito com paralisia do sono desde criança, quando escrevi esse conto estava numa fase intensa hehehe valeu pelo comentário. Escrever como mulher é um exercício legal de observação e empatia, gosto muito. November 06, 2022, 21:26
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