u15514544731551454473 Luiz Fabrício Mendes

Los Angeles, 1948. Desde que os deuses decidiram deixar de interferir com seu poder na existência dos mortais e viverem vidas normais, esta cidade tem sido sua principal casa. A detetive Pandora Olympus, da D.A.O., organização destinada a proteger as divindades, recebe uma chamada de emergência da residência de um deus de segunda classe tentando carreira como astro de Hollywood. É o início de uma corrida pela Cidade dos Anjos em busca da dona de um sapatinho de cristal negro. A fábula da Cinderela está prestes a ser reencenada, mas com deuses atuando.


Fantasy Not for children under 13.

#mito #paganismo #lendas #crime #deuses #criminal #de-época #anos-1940 #los-angeles #detetive #investigação #policial #noir #mitos #mitologia
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Capítulo Único

Mythos Noir


Caso #02: Sapatinho de Cristal


I


Los Angeles, 1948


- Tente se concentrar – a voz ao seu lado, mesmo séria, conseguia relaxá-la, talvez por ter se tornado bastante familiar naqueles últimos meses. – Deixe a energia divina fluir dentro de você.

Pandora seguia as instruções à risca. Respirando leve, tinha as mãos suspensas pouca acima dos joelhos, o tronco ereto, olhos fechados. Os sons da Wilshire Boulevard afetavam sua concentração, mas pouco a pouco conseguiu ignorá-los... até pairar num oceano de silêncio. Sentiu algo como a própria essência abandonando o corpo, o calor da manhã e a textura do assento do carro desaparecendo.

Até que, tomando lugar dentro de seu íntimo, notou o grande poder preenchê-la tal qual um jarro vazio. Não se intimidou: permitiu que o fizesse, ao ponto de transbordá-la. Os membros formigaram, seus dedos chegando a tremer. A respiração ficou pesada, levando-a a dar conta de que precisava dominar aquele furor antes que ele a subjugasse.

Inclinando-se de leve para o painel do carro, abriu os olhos.

Encarou-se no retrovisor. Antes de analisar o próprio semblante, percebeu a luz do dia ser amplificada por sua percepção, as sombras no interior do veículo – como a área sob o painel ou os bancos de trás – tornando-se tão claras e nítidas que um holofote aparentava iluminá-las. Sentiu-se ofuscada, o mesmo incômodo de olhar diretamente o sol, como se não fosse digna... mas assim que habituou-se à luz, percebeu, pelo espelho, que seus olhos tinham se tornado discos brilhantes, entrecortados por pupilas escuras em formato de fenda.

Não se contendo, sorriu. Mesmo sem olhar Vahls no assento do motorista, pôde deduzir, por seu tom de voz, que o superior estava igualmente satisfeito:

- Esplêndido, senhorita Olympus. Deve continuar praticando. Será um grande benefício conseguir materializar certas habilidades felinas em seu corpo sem ter de se transformar completamente numa gata. Em termos de estratégia, é estar um passo à frente.

Ele tinha razão. Poder utilizar a aura da deusa Bastet para somente converter seus olhos no de um gato, como naquele caso, quando fosse necessário averiguar uma cena do crime; ou adquirir a habilidade e rapidez felinas mantendo seu organismo humano, o que a permitiria poder usar uma arma ou chamar reforços ao invés de depender unicamente de suas quatro patas. Era um recurso que tinha de dominar, se quisesse mesmo cumprir seu dever dentro da D.A.O.; deixar de ser tratada como uma novata.

Súbito, um estridente apito fez Pandora perder toda a concentração, e diante do retrovisor suas pupilas perderam o brilho e voltaram ao aspecto humano – as sombras no interior do carro tornando-se mais uma vez indistinguíveis. Suspirou irritada. Tinha de trabalhar mais o quesito "manter a aura ativada", ou acabaria em maus lençóis durante uma situação de risco.

Esperou a reprimenda de Vahls, mas o superior mostrou-se mais preocupado em apanhar o receptor do rádio embutido no painel, que emitira o som, piscando nele uma lâmpada vermelha de maneira insistente. Assim que manteve a peça firme em seu punho, Pandora achando que ele poderia esmagá-la pela ansiedade que escondia sentir, pressionou nela um botão e falou junto ao fone:

- Central, aqui é o carro 07. Informe a situação.

Uma breve onda de chiado propagou-se do rádio antes de uma voz feminina responder, com uma frieza que superava a das telefonistas da cidade, remetendo mais a uma robô saída de algum folhetim de ficção científica:

- Carro 07, Central falando. Temos um Código 14 em andamento. Repito, temos um código 14 em andamento. 5640 Selnada Road, West Hollywood Hills.

O corpo de Pandora formigou mais uma vez, agora de nervosismo. Vahls trocou um rápido olhar com a detetive, carregado de receio, antes de falar novamente ao receptor:

- Entendido, Central. Estamos a caminho.

O rádio soltou apenas mais um chiado em resposta, o que não serviu para deixar Pandora lá muito tranquila. O automóvel Nash 600 azul escuro manobrou de imediato para dentro da movimentada avenida. A dupla permaneceu em silêncio por vários quarteirões, Pandora não sabendo bem o que falar. Ela tinha, sim, ideia do que era um código 14, fora algo repassado diversas vezes no treinamento, mas nunca tinha atendido a um. Aguardou que Vahls fizesse as honras, como era seu costume.

O superior contornou a esquina da Highland Avenue. Eles estavam indo para o norte, as colinas de Hollywood já se anunciando ao fundo do cenário.

Foi quando ele resolveu falar:

- Código 14: divindade requisitando ajuda imediata. Esse protocolo é acionado quando um deus ou deusa sob nossa proteção aciona a linha direta de emergência com a Central, como quando nós mortais chamamos os bombeiros ou discamos para a polícia. Não se preocupe: toda viatura da D.A.O. em Los Angeles deve ter sido notificada, nós não estaremos sozinhos lá.

A D.A.O., Divine Aura Organization – força que existia há uns duzentos anos para proteger as divindades antigas que viviam disfarçadas de mortais na Terra, desde que haviam resolvido não mais interferir com seus poderes na história humana. Na virada do século, a indústria de cinema em Los Angeles havia atraído a maior parte dos deuses para a cidade, tendo a esperança de restaurarem seu culto entre os mortais se passando por estrelas badaladas ou divulgando a mitologia por meio de filmes épicos. Muitas divindades num só lugar era fonte de problemas, e eles estavam ali para resolvê-los, utilizando a própria aura divina a eles concedida para isso...

...embora Pandora vivesse se perguntando a respeito do poder da deusa egípcia Bastet, a ela concedido, ser suficiente para lidar com as ameaças que encontravam.

Enquanto acelerava pela Highland, Vahls estendeu um indicador na direção do porta-luvas.

- Pegue a pasta de endereços. Vamos ver quem está precisando de ajuda.

Olympus obedeceu, abrindo o compartimento. As mãos logo tatearam a superfície áspera do arquivo, puxando-o para fora com o cuidado de não deixar cair as inúmeras folhas soltas dentro dele. Eram fichas contendo o perfil de cada um dos mais de cento e cinquenta deuses residentes na área de Los Angeles, em ordem alfabética; havendo uma lista de endereços e telefones no topo da pilha. Pandora consultou-a primeiro, um dos dedos descendo pelas colunas enquanto os olhos buscavam atentos a letra "S".

Logo achou: Seldana Road, 5640. A propriedade pertencia a um certo Barry London. Por motivo de segurança, o índice de endereços não continha os nomes das divindades por trás dos nomes mortais usados como disfarce. Ela teria de consultar a ficha do sujeito para descobrir.

Folheou os papéis com rapidez. Letra "A", letra "B"... e pronto, lá estava: Barry London, ator de cinema. Tinha sua carreira em ascensão, muitos por isso ainda não tendo ouvido falar dele – Pandora inclusa. Fizera alguns filmes de sucesso recentemente, e um mês atrás assinara um contrato com um grande estúdio. Uma fachada para esconder o deus egípcio "Bes". Não era lá dos mais famosos: a ficha informava ser uma divindade da Núbia cujo culto os egípcios haviam adotado, e seus domínios incluíam música, dança, prazer sexual, fertilidade e proteção ao lar. A própria detetive, até então, também só conhecia aquele deus pelo nome. Talvez projetar-se como estrela de Hollywood fosse realmente um impulso de autoafirmação, visto que nem nos tempos antigos ele parecia ter sido muito adorado.

- É o deus Bes, ator de cinema – Pandora resumiu a Vahls. – Não aparenta ser alguém de muita projeção na comunidade dos deuses.

- Talvez por isso quem quer que esteja mexendo com ele achou que sairia impune – o superior opinou. – Bem típico. Esteja preparada, senhorita Olympus. Podemos ter de lidar com forças hostis.


II


O Nash 600 chegou derrapando pelas curvas da Seldana Road, repleta de casas suntuosas com muros altos e pouca receptividade a visitantes. O centro de Los Angeles agora parecia uma maquete metros abaixo das colinas, Pandora imaginando que muitos deuses deviam viver naquela altitude para saborearem a sensação de poder.

O carro logo parou diante do endereço informado pela Central: uma mansão que parecia grande demais para o precipício junto ao qual estava localizada, dando a impressão de que algum dia a colina atiraria abaixo aquela construção presunçosa. Um muro de três metros separava o jardim da rua, no centro havendo um portão metálico adornado com diversas esculturas douradas de leões. Do interior da propriedade provinha a mais completa quietude, contrastando com a urgência com que eles haviam sido enviados ali. Como Vahls previra, não estavam sozinhos: outras duas viaturas da D.A.O. faziam vigília diante do portão, atravessadas em meio à via para impedir o trânsito de mais carros enquanto a chamada não fosse solucionada.

Descendo do veículo junto com o superior, Pandora procurou identificar os colegas de organização: um deles era Jack Stiller, portador da aura de Ares – o que a fez concluir que as coisas ficariam feias aos possíveis agressores de London se a situação descambasse para um confronto. Os outros três ali presentes ela desconhecia, embora as descargas elétricas passando pelos dedos de um deles enquanto aguardava impaciente o identificava como tendo a aura de Zeus ou Thor.

Vahls avançou até o porta-malas do carro, que abriu numa pancada. Dentro havia arsenal suficiente para começar uma pequena guerra: metralhadoras Thompson, as famosas "Tommy Guns"; pistolas e revólveres diversos; até mesmo uma Panzerfaust alemã, bazuca herdada diretamente da Segunda Guerra.

O superior de Pandora muniu-se de uma das Tommys, acoplando nela o carregador redondo mais parecendo um rolo de filme, enquanto questionava àqueles que haviam chegado antes:

- Algum sinal lá de dentro?

- Nenhum, e já tentamos estabelecer contato – Stiller replicou, virando a cabeça para Vahls enquanto mantinha uma espingarda nas mãos, apontada para a casa sobre o teto de sua viatura. – O lugar parece morto.

- Vamos torcer para o deus em questão não estar. Acham que já podemos invadir, dadas as circunstâncias?

Todos assentiram com a cabeça, inclusive Olympus – que, mesmo não se sentindo muito segura a respeito, tinha apanhado uma pistola Colt de dentro do porta-malas. Ela tinha treinado bastante no stand de tiro nos últimos meses. Todos os pentes de munição daquelas armas possuíam balas com cápsulas de antiambrosia, a substância sintetizada pela D.A.O. capaz de afetar o organismo dos deuses. Uma precaução sempre necessária para quem lidava com criminosos imortais.

- Então vamos – Vahls já se dirigia ao portão.

Pandora acompanhou o superior de perto, enquanto os demais integrantes deixavam suas posições junto aos carros tendo as armas erguidas, cobrindo-os pela retaguarda. Vahls examinou a entrada: aberta, sem qualquer cadeado ou objeto que obstruísse a tranca. Abriu-a empurrando-a de leve para frente. O portão gemeu, mas baixo; e logo havia espaço suficiente para que ganhassem o jardim.

Por entre flores e plantas exóticas, além de um chafariz automático regando tudo a ponto de afogá-las, eles prosseguiram até a porta dupla da mansão. A superfície de madeira branca não apresentava sinais de arrombamento, e Vahls checou a tranca: liberada tal como a do portão. Ou London fora descuidado deixando as portas escancaradas daquele jeito e pego de surpresa, ou havia algo de muito estranho ali.

Vahls fez um sinal para que os demais abrissem espaço. Pandora posicionou-se à sua direita, arma em punho, de modo a cobrir um de seus flancos assim que a entrada fosse aberta. O superior aguardou alguns instantes, abaixou lentamente o braço...

...e chutou o centro da porta com violência, empurrando suas duas seções para dentro de modo a permitir completa visibilidade do hall. Vahls apontou a Thompson para frente feito um mafioso prestes a realizar uma chacina, os outros o acompanhando com não menos adrenalina.

O saguão da casa era todo revisto por piso xadrez, dando a Pandora a impressão de eles serem peças recém-inseridas no jogo cujo tamanho extrapolava o dos quadrados em que deveriam se inserir. Uma escadaria de corrimões dourados tinha início mais à frente, dividindo-se em duas após alguns degraus e conduzindo a cada lado da sacada circundando o hall no andar superior. Vasos, quadros e outras obras de arte decoravam o ambiente... e, bem diante deles, estava acomodado num sofá de estampa chinesa um rapaz de pele levemente morena, cabelos crespos e porte bem-apessoado. Usava terno e calças marrons, sapatos caros, e uma gravata borboleta de tamanho um tanto desproporcional, vermelha, adornava-lhe o pescoço.

- Bom que chegaram! – exclamou ao vê-los, fazendo questão de exibir os dentes impecáveis num sorriso. – Achei que não viessem mais!


III


- Deixe-me ver se entendi... – Vahls murmurou caminhando em círculos diante do sofá, dando a sincera impressão de que agora usaria a Tommy Gun para metralhar o próprio deus nele sentado. – Você iniciou um Código 14 só para trazer membros da D.A.O. à sua casa? Queria reportar um desaparecimento?

- Foi a maneira mais rápida que encontrei para trazer vocês aqui, e tenho pressa! – Barry London, na verdade o deus Bes, respondeu sem um pingo de arrependimento. – Se eu simplesmente requisitasse uma investigação, vocês demorariam, me atenderiam só quando lhes conviesse. Conheço os trâmites da D.A.O., os deuses mais antigos me deram algumas dicas...

A petulância do sujeito era mesmo irritante; Vahls e Stiller, os mais velhos ali, aparentando serem os mais afetados – já tendo presenciado caprichos de deuses demais para toda uma vida, a coisa piorando por terem de ouvir desaforos de uma divindade menor, fruto de sincretismo, ainda por cima. Foi o segundo deles quem rebateu, enquanto acendia um cigarro:

- Já ouviu aquela fábula do galo que vivia dando alarmes falsos no galinheiro sobre a chegada da raposa, e quando ela realmente veio ninguém acreditou nele?

- Não sou nenhum galo, e sim uma divindade egípcia atualmente trabalhando no ramo das artes cênicas – London demonstrou irritação. – Além do mais, não os convoquei aqui à toa. Eu preciso mesmo de ajuda. Quero que encontrem uma pessoa.

Vahls suspirou, mas ainda assim inquiriu:

- Que pessoa? Fale logo.

London pôs-se a explicar, abaixando a cabeça para consultar a memória; e a expressão em sua face demonstrou que ele se deliciava em recordar os acontecimentos:

- Ontem à noite promovi uma festa aqui na mansão para comemorar o lançamento de meu novo musical. A nata dos estúdios de cinema compareceu, assim como muitos admiradores do meu trabalho...

Pandora sentiu um gosto amargo na boca ao pensar naquilo. Conhecia as festas realizadas na casa de artistas hollywoodianos, inclusive o ponto de depravação em que podiam chegar. Geralmente eram pretexto para que os atores ou atrizes juntassem seus fãs num só lugar e conseguissem sexo fácil. Verdadeiras orgias, que faziam a detetive imaginar o que poderia haver na cabeça das garotas que se entregavam servilmente àquele homem, ou melhor, deus.

- Dentre os que vieram, uma mulher em particular logo me chamou atenção, e ela não constava na lista de convidados – London prosseguiu. – Era a jovem mais linda e formosa em que já tive o privilégio de deitar o olhar, uma verdadeira ninfa; isto é, se não fosse mesmo uma. Os cabelos negros formavam verdadeira coroa de esplendor, os olhos azuis penetraram fundo em minha alma e provocaram os desejos mais ardentes. Usava um vestido de cetim vermelho adornado com uma flor na altura do busto, mas que não conseguia se igualar à rosa que ela era...

- Poupe a poesia, vá direto ao ponto! – Stiller aparentava estar a ponto de mastigar e engolir seu cigarro, enquanto fazia anotações a lápis num bloquinho de anotações. – Ela fez algum mal a você? Tentou roubá-lo, agredi-lo?

- Se ela me roubou algo, foi apenas o coração, detetive. Criei coragem e pedi sua mão para uma dança, e flutuamos ao som dos músicos durante horas. Fiquei tão fascinado por sua beleza que nem sequer lhe perguntei o nome; tão hipnotizado por seu carisma que nem passou por minha cabeça saber se era uma atriz, cantora ou apenas uma admiradora... Até que ela olhou para o relógio uma ultima vez, depois de tê-lo feito insistentemente desde que chegara, e viu que faltavam poucos minutos para a meia-noite. Foi quando meu sonho se desfez: ela pareceu tomada por algum tipo de repulsa, ou medo, e me empurrou para longe de repente. Saiu correndo da mansão abrindo caminho por entre os convidados, como se um verdadeiro caso de vida ou morte a chamasse. Sua pressa foi tamanha que acabou tropeçando no jardim e deixou cair um dos sapatos, único indício que me restou daquela dama inigualável.

Em seguida, London levantou uma almofada do sofá, e de baixo dela retirou um bonito sapato de salto alto feito em material escuro e opaco, numa predominante cor negra. Levou algum tempo até que percebessem se tratar de um tipo de cristal, aparentando sugar a luz para si ao invés de refleti-la como era comum. Aqueles homens não entendiam nada de calçados femininos, mas Pandora percebeu que a numeração do salto era relativamente baixa, adequada a pés pequenos. Seja lá quem fosse a dona, não devia ser pessoa muito alta.

- Quer que a D.A.O. inicie uma investigação para descobrir quem foi a mulher que dançou com você ontem à noite e saiu correndo sem mais nem menos? – Stiller exclamou bastante incrédulo. – Só pode estar de brincadeira! A coitada deve ter fugido quando percebeu a fria em que entrava dando bola a você, amigo. Caso encerrado.

- Vou ignorar o insulto, e argumentar apenas que vocês da D.A.O. receberam poder divino para nos servir – o ator replicou indignado. – Eu preciso encontrar aquela mulher e vocês vão me ajudar!

- E o que faremos? – Vahls riu irônico. – Sairemos experimentando esse sapatinho de cristal nos pés de todas as moças da cidade? Sim, a D.A.O. existe para servir os deuses, mas somente se a segurança deles estiver ameaçada. Nossa função não é ficar caçando namoradas para vocês, não somos uma maldita agência de encontros nem "correio elegante" de rádio!

- Mas e se eu lhes disser que a segurança dos deuses estará ameaçada se não encontrarem a moça?

Vahls e Stiller perderam a fala, o segundo inclusive mantendo a boca aberta num semblante embasbacado. Os outros dois integrantes da D.A.O. ficaram pálidos, e Pandora sentiu-se satisfeita por ser a única ali que não aparentou surpresa. Ela já previa aquilo: o deus Bes era mais inteligente do que aparentava.

- Do que está falando? – Jack indagou ansioso.

- Eu contei a ela durante a festa, tudo – o ator revelou. – Os deuses escondidos na sociedade humana, minha verdadeira identidade. Não apresentei provas, claro; mas pelo olhar que ela assumiu, a expressão pensativa... A semente foi plantada, senhores. Imaginem se ela for uma roteirista e daqui a algum tempo ser lançada uma comédia musical sobre deuses antigos disfarçados entre os homens, ou uma alpinista social capaz de ceder ao primeiro tabloide que encontrar a manchete sobre ter dançado valsa com o deus egípcio do sexo. Ela pode expor incontáveis segredos se não for encontrada. E é por isso que irão atrás dela.

Vahls tremeu de indignação, fechando os punhos enquanto rebatia:

- Violou o acordo com os demais deuses ao fazer isso, colocou-os em risco. Será punido, pode ter certeza.

- Sim, concordo em ser punido por vocês ou quem quer que seja, detetive, mas antes... vocês encontrarão a dona deste sapato para mim. Nem que eu tenha de abrir mão da minha própria imortalidade, quero aquela mulher.


IV


Vahls fechou a porta do carro com tanta força que Pandora achou que ela fosse cair. Bufava pelo nariz de um jeito que o homem aparentava estar se transformando no Minotauro.

- Então, a missão é encontrar a dona do sapato... – suspirou Pandora ao entrar e se sentar do outro lado do veículo, segurando o calçado: bem mais leve do que pensara, considerando o material que o constituía; e sua cor preta se tornava cada vez mais fascinante à jovem. Ainda não sabiam quem o perdera, mas sem dúvida a mulher tinha estilo. – Parece-me uma encenação de "Cinderela", agora com deuses antigos envolvidos.

- Isso tudo é uma baita de uma palhaçada! – o superior disse passando uma das mãos pela testa. – E então, onde podemos começar a procurar? Você tem se mostrado cada vez mais perspicaz, Olympus, quero ouvi-la.

- Bem, não deve haver muita gente em Los Angeles que tenha salto altos feitos de cristal, ainda mais desta cor – sorriu a jovem. – Isso reduz bem nosso número de suspeitos. Deveríamos começar averiguando onde a tal mulher conseguiu esses sapatos. Pela estranheza do achado e pelo lugar em que ela foi vista, pode ser que ela tenha relação prévia com deuses. Pode até mesmo ser uma divindade, ou uma Mythos.

- Esse cristal preto... consegue identificá-lo?

Pandora torceu o rosto. Não, não conseguia. Mas eles eram a D.A.O. – sempre existia alguém no grupo com alguma habilidade que outros não possuíam. Sabendo o que precisava ser feito, a moça replicou ao superior:

- Requisite apoio à Central pelo rádio, pedindo alguém com a aura de Hefesto para identificar um cristal negro de razoável dureza, provável origem vulcânica. Enquanto isso, desça para fora da colina; algo me diz que logo teremos um novo local para averiguar.

Vahls não era do tipo que apreciava receber ordens de uma Investigadora Júnior, o que ficou claro por sua careta enquanto apanhava o receptor do rádio. Mas Olympus já se mostrara certa antes, o que deixava ela mesma mais segura quanto a opinar. Pelos deuses, os membros com a aura de Hefesto sabiam identificar elementos da tabela periódica na composição dos objetos de uma sala como quem lê letras num exame de vista, tinha certeza de que poderiam saber que pedra era aquela compondo o sapato.

Sua mãe, ex-investigadora da D.A.O., ficaria orgulhosa.

Eles desciam por uma das sinuosas ruas contornando Hollywood Hills quando o rádio chiou e uma das operadoras retornou a informação que tanto queriam:

- Carro 07, aqui é a Central. O cristal negro opaco que descreveram trata-se de obsidiana. Repito, é o cristal vulcânico conhecido como obsidiana.

Girando a direção para fazer uma curva, foi a vez de Vahls tomar as rédeas do caso:

- Por acaso, temos um deus da obsidiana em Los Angeles...


V


O quiosque de madeira e palha em Santa Monica Beach parecia uma armadilha para turistas das mais ordinárias; a placa "Pedra Esfumada – Artesanato em Cristal" sobre a entrada do bangalô dando indício vago, mas encorajador, de terem ido ao lugar certo. Vahls resmungou à beça por terem de estacionar o carro a bons quarteirões de distância da tenda e seguir até ela a pé pelo calçadão junto à praia. Além de algumas poucas pessoas tomando banho de mar, eles eram os únicos a se aventurar ali sob o ardente sol do meio-dia.

Adentraram o quiosque atravessando uma cortina feita de fios contendo conchas e pedrinhas amarradas, que provocou um tilintar prolongado ao passarem. O interior da cabana era pequeno, mas a boa organização ampliava o espaço: em estantes junto às paredes, via-se uma série de objetos talhados no mesmo cristal negro compondo o sapato encontrado pelos investigadores, desde estatuetas representando deuses incógnitos e jaguares, a caveiras humanas de razoável fidelidade, a maioria esculpida com a boca escancarada, os dentes projetados adiante num grito sem som. Toscas etiquetas de preço escritas a mão acompanhavam tudo, Pandora ficando surpresa por uma das caveiras custar mil e quinhentos dólares. Num canto estava pendurado um pôster revolucionário com a gravura do mexicano Pancho Villa; em outro, um autorretrato da pintora Frida Kahlo e sua marcante monocelha.

Tudo pertencia ao sujeito sentado numa cadeira de balanço no centro do quiosque: pele morena, cabelos compridos e traços indígenas, fumava um comprido cachimbo que enchia o ar de fumaça. O rosto estava riscado com uma linha de tinta amarela e outra de tinta preta na horizontal, o corpo vestindo camiseta sem manga e calças curtas de pano rasgadas e sujas. Não tinha um dos pés, este sendo substituído por uma escultura de cristal negro reproduzindo o membro com perfeição. Sobre o peito tinha pendurada uma placa de cristal mais brilhante que as demais peças, gerando parco reflexo – suficiente para distorcer as formas dos dois detetives como se fossem monstros. Uma maneira de afugentar visitantes indesejados, de certo.

- Vão ficar só olhando ou levarão alguma coisa? – o indivíduo indagou com carregado sotaque. – Tenho miniaturas da colina com o letreiro de "Hollywoodland" se quiserem. Elas têm vendido bem.

- Tezcatlipoca, deus mesoamericano da obsidiana – Vahls afirmou como se desse voz de prisão. – Acredito que isto seja obra sua.

E estendeu o sapato de salto alto encontrado na mansão de Bes ao indígena.

O dono do quiosque apanhou-o sem a menor cerimônia, examinando-o numa de suas mãos com expressão divertida. Em seguida colocou-o aos pés de sua cadeira, respondendo:

- Pode me chamar de Juan, vocês americanos têm essa dificuldade incompreensível de pronunciar nomes na língua nahuatl. Sim, ele é meu, esculpi um par deles. Obsidiana é minha especialidade; era o diamante da América Central antes de os espanhóis chegarem. Meu povo chamava-a de "espelho esfumaçado". Irônico, não acha? – retirou o cachimbo da boca e ergueu-o aos investigadores para ressaltar o que falava. – As caveiras, em particular, dão bastante dinheiro. Aqueles arqueólogos bestas acham que foram feitas pelos próprios astecas, quando na verdade...

- Quem foi a freguesa? – Pandora cruzou os braços.

- Vocês chegam ao meu quiosque fazendo perguntas, e nem sequer levam uma escultura? Depois a cultura europeia é a "única civilizada". Em respeito aos meus clientes, não tenho a obrigação de citar o nome de nenhum!

Vahls suspirou, como se lidasse com uma criança mimada:

- Outro deus asteca, Quetzalcoatl, vulgo "Serpente Emplumada", também está sob proteção da D.A.O., administrando uma reserva indígena no Arizona. É frequente papo de bar a rixa entre vocês, sobre como um destruiu sucessivamente o mundo criado pelo outro até surgir a América que conhecemos hoje. Seria uma pena se "Quetz" descobrisse seu paradeiro depois de tantos séculos e quisesse vingar a criação destruída dele descontando no seu quiosque...

- Tá bem, tá bem, eu falo! – "Tezca" ergueu as mãos. – Como devem saber, sou também um deus da beleza, e não suporto injustiças. Ver seu povo dizimado por armas de fogo e doenças trazidas por outro através do mar é o tipo de coisa que contribui para isso ao longo dos anos. Os sapatos de cristal foram parte de um plano para ajudar uma conhecida. Um feitiço para fazê-la ter ao menos uma noite feliz em meio à existência terrível que ela vive...

- Que conhecida?


VI


Rimpau Boulevard, 540.

Pandora olhou pela janela do automóvel, examinando a fachada tomada por trepadeiras do sobrado, situado numa vizinhança rica. De acordo com o que o deus asteca tinha lhes informado, quem nele residia causava intensa sensação de repúdio – porém sabia o que era conforto.

- Como eu tinha dito, é uma reencenação de Cinderela, mas com deuses – a detetive repetiu sua opinião, olhar perdido na casa. – E então, o que faremos?

Vahls deu a resposta já descendo do carro pelo lado oposto, segurando o sapato de obsidiana com cuidado digno de um príncipe de meia-idade procurando sua jovem amada:

- Nós seguimos o roteiro da fábula.

Olympus riu, deixando também o veículo e murmurando, ao bater a porta:

- Os Irmãos Grimm ficariam orgulhosos...

A dupla atravessou o gramado bem-aparado da residência, detendo-se diante da porta de madeira pintada num branco impecável – assim como o resto da fachada, sob a relva que a cobria. Pandora começava a achar as trepadeiras uma metáfora daquele lar: uma construção tão impecável abrigando moradores capazes de tirar todo seu esplendor, larvas apodrecendo um fruto.

O superior de Pandora pressionou a campainha ao lado da entrada. O repicar dos sinos no interior do sobrado ecoou para o lado de fora; e, cerca de três minutos mais tarde, a porta se abriu.

A bela mulher que os atendeu tinha o corpo de pele clara coberto por um robe azul de aspecto macio, um "E" em bela caligrafia bordado na altura do peito. Os pés encontravam-se cobertos por chinelos terminando em simpáticas cabeças de serpente feitas de pano. Tinha os cabelos castanhos enrolados numa infinidade de bobes, fazendo Pandora ter o breve pensamento de que seus cabelos deviam andar uma bagunça devido ao corre-corre do trabalho na D.A.O. – e que talvez depois daquele caso visitasse um salão.

- Sim? – a moradora indagou num semblante digno de atriz de comercial de cinema.

Erguendo o sapato até a altura de seu peito, Vahls respondeu:

- Olá, estamos aqui representando o senhor Barry London; o ator, deve conhecê-lo. Sou o advogado dele, Paul Simmons, e esta é minha assistente Clara – Pandora odiou o nome falso, mas ficou quieta. – Ontem à noite, Barry deu uma festa em sua mansão, e ficou particularmente encantado por uma jovem com quem dançou por horas, ela desaparecendo sem explicações à meia-noite e deixando este lindo sapatinho para trás. Através de meus contatos, descobri que a moça reside neste endereço. Saberia me informar quem é?

Os olhos da mulher de roupão de imediato se arregalaram, enquanto ela exclamava, numa vozinha aguda digna de adolescente histérica:

- Ai, sou eu, sou eu! Que bom que o senhor London enviou alguém para me encontrar! Infelizmente tive de deixar a festa às pressas, por ordem de meu pai. Ele é bastante severo com essas coisas, sabiam? Mas sou eu, sim! Meu nome é Euríale. Entrem, entrem!

Eles obedeceram, ganhando a ampla sala da casa. Vários móveis encontravam-se dispostos pelo cômodo, e tanto eles quanto o chão brilhavam de limpeza. A anfitriã acomodou-se num sofá, apontando outro para que eles fizessem o mesmo.

- Não nos leve a mal, senhorita, mas gostaria que experimentasse o sapato para termos certeza de ser mesmo a beldade que encantou Barry ontem à noite – sorriu Vahls. – Isso seria possível?

A euforia no rosto de Euríale mingou, mas ela procurou disfarçar, replicando com o máximo de animação que conseguiu:

- Sim, claro. Sem problemas!

Ainda com o sapato negro em mãos, Vahls ajoelhou-se diante da jovem de bobes como um vendedor de loja de departamentos – impressão intensificada por seu terno. Euríale tirou o chinelo de um dos pés e levantou-o ao detetive, que tentou nele encaixar o salto alto. Não entrou. O calcanhar era longo e grosso demais.

- Isso, hã... – a moça oscilou, olhando ao redor. – Eu não sei como explicar...

- Ora, temos visitantes?

A frase fora pronunciada por outra voz feminina, logo revelada pertencer a uma mulher mais velha, na casa dos quarenta anos, usando vestido preto com bolinhas brancas até os joelhos e calçando um par de saltos vermelhos elegantes. Tinha a pele mais morena, a cabeleira negra atada num coque bem discreto. Os olhos analisavam atentamente o que ocorria na sala, possuindo um ar aterrador. Algo como um aspecto réptil.

- Boa tarde, sou Paul Simmons, represento o ator Barry London – Vahls repetiu a ladainha. – Vim até aqui procurando a jovem misteriosa que encantou meu cliente noite passada e foi embora sem dizer seu nome, deixando apenas este sapato para trás.

Os olhos da segunda anfitriã brilharam de modo ameaçador, enquanto ela se jogava sentada sobre um dos sofás, agitando um pé para atirar seu sapato longe e esticando-o a Vahls para receber o novo calçado.

- Ah, sou eu! – riu orgulhosa, fazendo um gesto de desdém para Euríale. – Não ligue para a invejosa da minha irmã tentando se passar por mim. Chamo-me Esteno. O sapato é meu, fico muito feliz por tê-lo encontrado; e mais ainda pelo Barryzinho ter se lembrado de mim!

O investigador levou o salto alto ao pé da senhora – mas o calçado também não entrou, principalmente devido a um joanete acentuado que fazia o membro até parecer ter um dedo a mais.

Pandora vinha lutando para se conter, manter-se impassível diante daquelas mulheres nojentas, porém atingira seu limite. Sacou de súbito a Colt, fazendo as duas moradoras retraírem-se assustadas sobre os sofás. Por um momento deu a entender que apontaria a arma para uma delas, porém acabou exclamando, enquanto rumava a um corredor anexo à sala:

- Vamos acabar logo com esta palhaçada!

Vahls, que já sacara também um revólver, permaneceu no cômodo vigiando as duas suspeitas, enquanto Olympus se aventurava pelas entranhas do sobrado. Abriu uma primeira porta no extenso corredor, dando para o banheiro: vazio, mas igualmente límpido como a latrina de Zeus. Tentou a porta seguinte: um quarto com duas camas de solteiro e uma escrivaninha, também arrumadas como se jamais tocadas...

E por fim ganhou a cozinha.

Alguns anos antes, quando ainda era integrante da polícia comum, Pandora tivera acesso a filmes dos Aliados na guerra retratando a realidade dos campos de concentração nazistas, onde milhões de judeus tinham perecido em condições sub-humanas. Ficara horrorizada, recordando bem quanta indignação sentira por ver seres humanos tratando outros daquela maneira.

A sensação que teve naquele momento foi a mesma, transposta apenas para criaturas mitológicas.

Mesmo de costas para Pandora, o aspecto débil da figura ficou bastante claro. A jovem de pés descalços repletos de bolhas e feridas estava vestida em trapos, tão rasgados e imundos que a cor branca que um dia possuíram havia se convertido num marrom impossível de remover. Os braços fracos e frágeis manuseavam como podiam um esfregão sobre o piso da cozinha, mergulhando-o de quando em quando num balde d'água ao seu lado. Os cabelos agitavam-se sobre a nuca como se tivessem vida própria – e de fato tinham: eram compostos de incontáveis serpentes presas à sua cabeça, que exibiam as presas afiadas pingando veneno e sibilavam ferozes, mordendo umas às outras e algumas tentando se esticar para atacar a detetive, não conseguindo entretanto chegar até ela.

Gemendo de modo angustiante, a criatura começou a se virar à recém-chegada – a qual, mesmo sabendo do que ela era capaz através dos mitos, não temeu, tendo certeza de que as maléficas irmãs tinham feito algo para conter seu poder.

De fato, havia uma venda presa em torno da cabeça da moça, ocultando-lhe os olhos, incapazes assim de converter quem quer que fosse em pedra...

A Medusa, de volta à sua forma monstruosa depois de uma noite encantada na mansão de um deus hollywoodiano.


VII


- Euríale e Esteno, irmãs conhecidas como "Górgonas" – anunciou Vahls, enquanto algemava as megeras com o auxílio dos demais patrulheiros da D.A.O. que haviam requisitado. – Vocês estão presas por agressão e maus tratos a um Mythos, violando o acordo dos deuses. Têm o direito a permanecerem caladas e a uma Musa para defendê-las no tribunal.

As criminosas foram levadas, enquanto, num canto da sala de estar, alguns enfermeiros e assistentes sociais da organização cuidavam de Medusa, a "cobra borralheira" daquela história – usando, claro, proteção para evitar as picadas de seus cabelos.

- Dá para entender o que o Tezca fez, até eu estou chocada! – afirmou Pandora, caminhando para fora com Vahls. – Ele quis apenas dar uma noite normal à coitada, convertendo-a de novo em sua aparência original antes da deusa Atena amaldiçoá-la nos tempos antigos. É uma pena que, assim como no conto de fadas, o feitiço só tenha durado até a meia-noite.

- Já que a jovem era mesmo a Medusa, o segredo dos deuses não está comprometido – murmurou o superior. – No final, o caso serviu mesmo para descobrirmos a situação de escravidão doméstica mantida aqui. Acho melhor nem informarmos Bes sobre a identidade da jovem. A reação seria negativa para ambos.

Eles ganharam o gramado, Pandora silenciando-se – e falhando em ocultar o incômodo que sentia. Coube a Vahls dissecar seus pensamentos:

- O que há na sua mente, senhorita Olympus?

- A história toda da Medusa. Durante milênios ela foi enxergada como um monstro horrendo, uma criatura a ser odiada... sendo que foi apenas vítima da inveja de Atena, que não aceitava que ela fosse mais bela do que si. Não é uma injustiça? Mortais serem condenados a castigos eternos por causa de intrigas divinas?

O superior não replicou de imediato, apanhando um cigarro e o acendendo com seu isqueiro antes de encerrar a conversa:

- Nós da D.A.O. agimos como se os deuses estivessem no nosso colo... Mas nós ainda continuamos no colo deles, Pandora. E creio que estaremos eternamente...

June 18, 2020, 6:07 p.m. 0 Report Embed Follow story
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The End

Meet the author

Luiz Fabrício Mendes Goldfield, alcunha daquele em cuja lápide figura o nome "Luiz Fabrício de Oliveira Mendes", vaga desde 1988. Nasceu e reside em Casa Branca - SP, local que se diz ter sido alvo da maldição de um padre. Por esse motivo, talvez, goste tanto do que é sobrenatural. Atualmente é professor de História, mas nas horas vagas, além de zumbi, se transforma em agente de contra-espionagem, caçador de vampiros, guerreiro medieval, viajante do espaço ou o que quer que sua mente lhe permita escrever.

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