Era um daqueles dias que você não quer sair da cama. O som da chuva lá fora, batendo na janela. O frio. Tudo convidativo demais para se enrolar melhor e virar para o lado nos cobertores.
O alarme toca pela terceira vez.
Você se levanta.
Olha para a casa desabitada. Na mesa vazia, você toma um café coado e fraco.
Ouve os risos na memória, lembrando de uma mesa repleta de pessoas e do cheiro do café no ar.
Por alguma razão, você se sente vazia ao pensar nisso.
......
As pessoas passam. Todos se olham, ninguém se vê.
Pressa. Passo. Cabeça baixa.
Um oceano de guarda-chuvas pretos. Você desvia. O seu vermelho parecendo um desafio.
Por alguma razão, você ri ao pensar nisso.
..........
A conversa nos corredores. Você se senta na mesma cadeira de sempre. Coloca a bolsa no mesmo lugar. O guarda-chuva vermelho pendurado perto, para não esquecer.
A chuva lá fora a convida para dançar.
Sua mente tenta se manter concentrada, mas você divaga.
Pensa se todos podem ouvir a batida do seu pé no chão, ou dos seus dedos na cadeira. Analisa os rostos pela sala. Depois de tanto tempo, ainda assim percebe que não sabe o nome da metade deles. Não sabe sobre a vida de nenhum deles.
A sala tem por volta de 40 alunos.
Você se sente em uma ilha, sozinha.
Você pensa se todos se sentem assim.
Por alguma razão, você fica triste ao pensar nisso.
.............
Fim de tarde. Os guardas chuvas pretos ainda estão lá. Você pega o ônibus. E divaga mais.
A mulher sentada no banco da sua frente parece ter chorado mais cedo. Ou pode ser gripe. Os dois adolescentes atrás de você namoram escondido.
Você já leu o livro que o rapaz à sua direita está lendo. Seu personagem favorito morreu no final. A senhora na sua frente não deveria estar sozinha.
Você divaga. E quando olha, passou da sua parada.
Por alguma razão, você não está surpresa com isso.
.............
Andar na chuva por um tempo, ou esperar o outro ônibus em vinte minutos. Não é uma escolha tão difícil. Não é tão tarde, mas já está escurecendo. Você tem uma vontade repentina de cantar nos momentos mais estranhos. Aperta seu guarda-chuva vermelho e suspira.
Você amaldiçoa paradas de ônibus que não são cobertas e com bancos molhados. Só quando alguém ri, percebe que falou em voz alta.
Tem um sujeito ali. Com uma bolsa na cabeça, tentando disfarçar a risada com uma tossida.
Você conhece risadas. Pensa em ignorá-lo. Fica difícil com o corte de cabelo estranho.
Ele ri de novo e você percebe que falou em voz alta. De novo.
Olha o sujeito de canto de olho. Óculos tortos no rosto, ensopados pela chuva, tentando segurar o riso. Os livros dele se molhando.
Um ultraje.
Você pensa. E suspira.
“Quer abrigo?”
Ele olha, confuso. Pessoas são confusas. Mostra o guarda-chuva e ele assente, sorrindo.
“Essa chuva está terrível hoje! Meu nome é-”
“Não é um convite para conversar.” Você comenta.
Por alguma razão, ele ri.
...............
O estranho ignora seu silêncio. E fala. Fala sobre sua cidade do interior. Sobre o curso. Sobre seu vizinho. Sobre livros. Depois de dez minutos, você começa a responder. Um pouco.
Como todas as pessoas que conhece, ele é confuso. Ri mesmo que você não esteja brincando e as piadas dele não fazem sentido algum. Ainda assim, você não o corta. Apenas ouve.
Ele fala sobre como se sente sozinho no meio de uma multidão.
E por alguma razão, você o entende.
...............
Seu ônibus chega primeiro. Você se sente estranha por deixar o sujeito sozinho na chuva, mas ele diz que está tudo bem, logo o ônibus dele passa. Você não entende a expressão dele.
Talvez a sua seja igual.
Quando entra no ônibus, percebe que nunca disse seu nome, não deixou ele dizer o dele.
Por alguma razão, você se sente sozinha.
.................
O alarme toca. Você se levanta.
Mais uma vez só toma um café.
Você não olha para a mesa.
Por alguma razão, você quer muito conversar com alguém.
....................
Um mar de guarda-chuvas pretos. O seu vermelho se destaca. Como um ponto que não se encaixa.
Por alguma razão, você quer sair correndo.
.............
Na volta, o vento é forte. Você devaneia. O guarda-chuva voa e você corre na chuva. As pessoas olham, você não liga. Seu ônibus vem vindo. Você dá uma última olhada no guarda-chuva voando ao longe e então você entra no ônibus.
As pessoas olham torto para você encharcada.
Por alguma razão, você não dá a mínima.
...........
Você desce na parada errada de novo. Continua chovendo na sua cabeça.
E então ela repentinamente para.
Você olha para cima e vê um guarda-chuva vermelho e óculos tortos, molhados pela chuva.
O sujeito sorri e fala em tom de brincadeira.
“Isso não é um convite para conversar.”
Você passa a mão nos cabelos ensopados. Seus sapatos chiam quando você troca um pé pelo outro.
Ele fica vermelho e desvia os olhos. Como você sempre diz, pessoas são confusas. Muito confusas.
Você espera.
“Mas pode ser um convite para um café.”
Por alguma razão, você sorri.
E aceita.
Vielen Dank für das Lesen!
Wir können Inkspired kostenlos behalten, indem wir unseren Besuchern Werbung anzeigen. Bitte unterstützen Sie uns, indem Sie den AdBlocker auf die Whitelist setzen oder deaktivieren.
Laden Sie danach die Website neu, um Inkspired weiterhin normal zu verwenden.