Ainda estava sob os efeitos de remédios, meio sonolento, inseguro, abriu os olhos, mas nada aconteceu, continuava na escuridão, nada tinha sido um sonho, tudo era real, a súbita vontade de chorar como uma criança lhe assolou, apertou a coberta que estava em si, e virou sua cabeça para o travesseiro, como se isso fosse impedir seus gemidos, era uma tentativa falha, logo estava se engasgando com suas próprias lágrimas.
Fechou os olhos, e riu de si mesmo, percebendo que não faria muita diferença, ele detestava ficar sozinho, detestava o escuro, era quando as lembranças vinham para lhe atormentar... Como um bichinho amedrontado ele se encolheu praticamente escondido sobre as cobertas.
O remédio voltara a fazer efeito, a contragosto ele começava a dormir, seus olhos se fecharam com o reflexo, sonhou com a tão temida noite e como se por milagre voltasse a enxergar ele viu tudo de novo.
''_Mano, vai devagar o recital é só as dez ainda são oito e meia – o rapaz ruivo falava entrando entre o banco do motorista e do carona no qual estava a irmã mais velha, logo sentiu-se ser colocado para traz pelos braços protetores e implicantes da irmã.
_Ai... Tema Oneechan, eu sou a estrela da noite não posso me machucar – ele ria dando língua para ela, era sua noite de estreia com o novo recital, era o filho mais novo o único que herdou o talento de sua mãe para arte, não tinha nenhum talento para os negócios deixava isso aos cuidados dos seus irmãos.
_Porque você não foi no carro do Shikamaru, Temari? – Kankuro falava com a irmã em um tom divertido fazendo-a tirar os olhos do celular.
_É obvio que eu queria estar junto com vocês, e curtir esse momento especial – ela apertava a cabeça de Gaara.
_Crianças dá para pararem de implicar uns com os outros como se tivessem cinco anos – o mais velho falava segurando o riso, quando ia passar a marcha um caminhão desgovernado veio na contramão, viu o clarão, ouviu os gritos, as mãos no volante se soltavam, sua irmã dizendo que o amava, era tudo que se lembrava daquele dia que era para ser de felicidades, acordou na escuridão gritando, esperneando, querendo levantar daquele pesadelo, teve seus pulsos amarrados, ouvia a correria em volta de si, mas não os via, um choro acometeu sua garganta causando enormes soluços, ele pediu pela mãe e até pelo pai, pela irmã e pelo irmão, ninguém respondeu estavam todos no silêncio parecia que todos o olhavam, repentinamente sentiu as mãos em seus cabelos e logo uma pontada em seu braço, tinham lhe dado um calmante, dormiu... Quando acordou a dor permaneceu ali no mesmo lugar, estava sozinho para sempre abandonado na escuridão. ''
_Gaara... - ele sentiu a mão forte em seus ombros, o aperto o fez despertar ainda trêmulo e febril ele se ergueu um pouco na cama, se perguntando onde estava. Não tinha sido um sonho o percebeu, as mãos rapidamente o deitaram de novo, ele reconhecia aquela voz era Shikamaru, colega de trabalho e noivo de sua irmã.
_Esta na minha casa Gaara. - a vontade de chorar tinha voltado não se lembrava de como tinha se tornado assim tão vulnerável, a casa era de sua irmã também, eles iriam construir uma família, Temari iria se casar com Shikamaru, ele ainda sentia o cheiro dela nos lençóis.
_Porque eu estou na sua casa? - ele perguntava com a voz rouca pelo sono, a vontade de chorar transparecia em sua frase, era a primeira vez que acordava sem os efeitos dos remédios depois de tudo que aconteceu, ainda lembrava-se da correria em volta de si no hospital, as vozes gritando para tentar salva-lo.
_Porque você não tem mais ninguém e está cego - na verdade ele tinha o pai, mas esse não simpatizava muito com o filho mais jovem, parecia aos olhos do pai que tudo o que aconteceu de ruim em sua vida tinha relação com Gaara, desde a morte de sua esposa no parto dele, até a morte de Kankuro, e o estado em coma de Temari, mas enfim a frase o fez se encolher, mais uma vez o pai havia se negado a ficar com ele, lembrou-se vagamente de quando descobriu que a irmã estava em coma e o irmão morto, as vozes continuavam em sua cabeça...
_POR QUÊ??? TUDO, TUDO, sempre tem relação com você, eles morreram por sua culpa como sua mãe... – o homem descontrolado falava aos berros em meio ao pranto, com o garoto igualmente abalado em seu leito, era o pai, era o pai deles...
As vozes em sua mente eram picotes, não se lembrava de tudo...
_Alguém precisa falar com ele – ele se virou para o lado, não queria falar com ninguém queria que alguém desse logo aquela injeção e não ser obrigado a encarar um mundo sem os que amava. _Ele não fala nada – ele falava na direção dos passos que se aproximava de seu leito. _Os psicólogos falaram que é por causa do trauma. – as primeiras horas eram horríveis, ele gritava enquanto aplicavam-lhe sedativos...
_Gaara – ele reconhecia a voz, os soluços logo voltaram. _Tá tudo bem Gaara, você vai ficar na minha casa, já ficou tempo demais aqui. – Shikamaru falava encarando o outro.
Shikamaru também o estava odiando, se não fosse por Temari teria deixado o mais novo apodrecer no hospital, mas a mulher nunca o iria perdoar, e se ele bem sabia ela assombraria seus sonhos das maneiras mais perversas possíveis, queria um banho frio e pensar que tudo era um sonho que sua doce noiva não estava em cima de uma cama em coma, mas tudo era realidade, e por mais que odiasse essa realidade ele se deu conta de que ele não poderia abandonar o irmão dela no hospital.
_Só foi um sonho ruim Gaara, volte a dormir – a voz impassível de Shikamaru demonstrava que não estava feliz, por mais que tentasse entender que o outro não teve culpa de nada, ele não conseguia.
_Não... consigo... – ele olhava o outro, era claro que ele estava sob efeito da febre, não era que ele não conseguisse, ele simplesmente não podia dormir se não os pesadelos o atacariam... Seu subconsciente falava para ele ficar ali junto dele, afinal era só um rapaz de 17 anos recém-completados que estava desesperado por ter perdido a família e ao mesmo tempo a visão.
_Eu posso te dar uma dose de calmante – sentiu o corpo do menor se encolher na cama, e leves lágrimas caíram de seus olhos, os soluços logo embargaram o local...
_O que foi agora Gaara? – Shikamaru falava com certa impaciência coçando as têmporas e agarrando os ombros do outro, estava-o machucando, só percebeu que fazia quando ouviu o soluço e a voz baixa.
_Não... Por-favor... – ele falava engolindo o choro e impondo suas dificuldades.
_Ok. Nesse caso vou me deitar – suas mãos tremulas foram seguras por um Gaara choroso, muito diferente da figura que Temari sempre fazia dele. As roupas, suas roupas, grandes demais para o garoto franzino o faziam ainda mais parecer uma criança, o encarando no escuro com os olhos banhados em lágrimas.
_Gaara... – ele respirou fundo antes de dar início à frase _ amanhã eu tenho trabalho, tenho que ir dormir... – as mãos o soltaram instantaneamente, virou-se de lado para chorar. _Posso te dopar? O médico falou que você vai dormir melhor – mas ele teria pesadelos e Gaara não queria ter sua mente perturbada pelas lembranças novamente.
_Não – a cabeça balançava em negativa. _Pode ir eu vou ficar bem... – Shikamaru passou as mãos pelos cabelos avermelhados e foi se deitar, o choro o incomodava, ele continuava chorando, tossindo, abafando os gritos e se engasgando com eles... Levantou-se e foi em direção ao quarto do outro decidido a apaga-lo de vez, pegou o pote de remédios e um copo d'agua se fosse possível daria mais de uma dose a ele, só que isso não foi feito. O garoto estava fora da cama encolhido na parede no canto do quarto de modo a abafar seus gritos. ''Merda'', proferiu Shikamaru mentalmente, ele pegou o colchão da cama e levou para o seu quarto.
_Vem Gaara! – a voz dura do outro, assustou de novo. Estava na sua frente, ele podia sentir o calor que emanava do outro, as mãos quentes tocavam seus braços.
_Desculpa ter te acordado – ele falava soluçando, pegando as mãos do outro e sendo levado para outro quarto.
_Esquece! – ele falou duro e grosso
_A onde eu tô? Você vai me colocar pra fora de casa? - o rosto baixo e vermelho pela febre evidenciava não só isso, como também o medo de ficar sozinho.
_Não, não que isso Gaara – Shikamaru chegou a dar uma leve risada. _Estamos no meu quarto. – ele viu as bochechas do outro corarem. _Você não queria dormir sozinho, traze-lo pra cá foi à única solução... – o rapaz mordia os lábios, tinha se tornado um ser que incomodava.
_Eu... Não quero incomodar. – Shikamaru bufava ele queria dormir então resolveu dar por encerrada a discussão.
_Então durma. – ele o levou até o colchão e o deitou, ainda ouviu uns leves soluços o rapaz, mas logo dormiu.
Shikamaru acordou com o último despertador, o quê significava que já estava atrasado, se arrumou correndo, colocou um copo de leite para Gaara, e foi-se para a empresa hoje ele teria que dar plantão, odiava ser o braço direito de Sakura, ela era uma fera, uma fera sem sentimentos...
_Temari... Como eu queria que estivesse aqui. – ele falava ao sair do elevador vazio e caminhar até sua sala, recebendo vários pesares ao longo do caminho. _eles falam como se ela já estivesse morta – ele sorria de lado abrindo a porta e encontrando Sakura sentada em sua cadeira.
_Shika! – ela o olhava com os verdes tão intensos que ele juraria que eram esmeraldas e não olhos.
_Saki! – Ela o abraçou apertado, selando sua bochecha.
_Porque não ficou em casa?
_Porque eu tinha trabalho – ele ria.
_Claro, claro, mas eu poderia te enviar por e-mail, faz só cinco dias que tudo aconteceu... o ruivinho deve tá mal né? – ele viu o rosto de Shikamaru se contorcer. _Shikamaru você deixou aquele garoto sozinho em casa?
_Eu tinha que vir trabalhar Sakura! – ele ia se sentar na cadeira, mas teve-se impedido pelas mãos dela.
_Temari é minha amiga, irmã, colega de trabalho, sócia, era sua noiva, seu coração, mas ela é irmã de Gaara, a dor que ele está sentindo é gigantesca ele perdeu tudo e acha que tudo é culpa dele.
_Eu sei, mas eu não posso olhar pra ele e pensar que... – ele foi calado pelo tapa em seu rosto, a expressão de Sakura estava dura como ele nunca a viu.
_Não ouse falar isso, eu o conheço desde pequeno, esse garoto tá sofrendo horrores, você não tem ideia do que ele já passou.
_Vou trabalhar – apesar de abalado, ele pegou os papeis em cima da mesa e quando ia sair pela porta Sakura se pronunciou novamente.
_Você vai voltar pra casa agora, ele precisa de você e você sabe disso.
_E se eu não voltar?
_Você vai voltar porque quando a Temari levantar daquela cama e perceber o que esta fazendo ao irmão dela ela não vai te perdoar.
_Eu não posso, eu tenho que me concentrar em algo, ela estava grávida.
_Eu sabia... mas mesmo assim você tem que entender que ele não teve culpa. – ela caminhou até ele e lhe entregou um papel. _Suas férias.
_O quê?
_Vai pra casa e descanse.
_Arg, Saky...
_Sem argumentos – ela retirava a papelada da mão dele.
Ele realmente queria dormir, quando chegou em casa à situação não poderia ser pior, a porta vagorosamente abriu, seus olhos correram pelo local o corpo do ruivo estava encolhido no canto da sala ao lado do piano, um vaso estava em cacos no chão, suas mãos foram à cabeça ao perceber os cortes nos pés e mãos do mais novo, alguns papeis também estavam no chão, sua sala estava uma bagunça no geral.
_Gaara... – ele falava praticamente cuspindo as palavras, sentiu o corpo do outro se encolher, encostando-se na parede. _O que aconteceu? – ele caminhava devagar até o ruivo e se escorava no piano para ficar da altura dele, realmente estava precisando praticar esportes, respirou fundo antes de retornar a conversa _Eu te fiz uma pergunta.
Demorou um pouco para que ele enfim obtivesse uma resposta, as pernas se abaixaram, mas o rosto continuava baixo, seus cabelos pendiam sobre os olhos. _Eu... levantei pra ir no banheiro, ai tropecei quebrei o vaso e me cortei – Shikamaru olhava o rastro de sangue e sorria de lado, ironicamente ele agradeceu pela cegueira do outro, ele não percebeu o piano...
_Só isso... – ele falava ao mais novo percebendo um leve fechar de mãos. _continua...
_Ai quando eu me escorei na parede encostei minha mão em um apoio, era um piano – Shikamaru contraiu-se diante a constatação.
_Compramos quando soubemos que tinha passado na faculdade, íamos te chamar pra morar conosco... – não tinha como impedir-se de chorar, o mesmo acontecia com o rapaz a sua frente o pranto parecia que não teria fim, Sakura tinha razão quando enfim Temari acordasse ela iria culpa-lo por machucar o irmão, então em um súbito ato ele o trouxe até si, o abraçou ternamente, deixando que as lágrimas do ruivinho ensopassem sua camisa, deu-se conta tardiamente sobre o que estava ocorrendo, mas era realmente tarde ele se desvinculou deixando um ser confuso em seu chão.
_Tenho que cuidar de você se não sua irmã me mata quando despertar – ele falava se levantando e caminhando até um armário do banheiro onde guardava os remédios. Abaixou-se devagar e afastou a franja em sua testa, estava febril, o pegou no colo surpreendendo-o e o colocando sentado no sofá.
_Isso vai doer um pouquinho... – ele falava enquanto segurava um dos pés retirando os cacos com um pinça, arrancou pequenos gemidos e muitas lágrimas, limpou com alguma coisa que ardeu bastante. _Calma...
_Unhum...
_Vou colocar uma faixa aqui, espere rapidinho... – ele se retirava da sala, acabando por encontrá-lo, ainda mais encolhido no sofá. _Eu sei que deve tá doendo, mas vou ser rápido, só falta enfaixar pra não infeccionar.
_Tá – a cabeça continuava baixa, e as mãos tremendas sobre o colo. Logo ambos os pés já estavam com bandagem.
O ajeitou no sofá, colocando as pernas para cima e limpou toda a bagunça, rumou para a cozinha para preparar algo, avistou a cartela de calmantes e pensou se deveria ou não fazer o que estava pensando, pegou o comprimido e despejou no copo de suco, que Temari o perdoasse, mas ambos necessitavam dormir. Pegou o sanduiche e depositou na mão do rapaz.
_Coma deve estar com fome. – ele apenas deu um leve murmúrio agradecido e comeu. _...
_ Vamos visitar sua irmã amanhã – ele falava parecendo meio óbvio
_Eu não tenho roupa e meu pé tá machucado – ele falava baixinho.
_Usa uma das minhas e quanto aos seus pés, vamos aproveitar e pedir para alguém dar uma olhada neles– ele olhava o outro confuso esperando uma resposta que não veio.
Não levou muito tempo para o remédio fazer efeito, Gaara praticamente desmaiou após a comida, só foi acordado no dia seguinte, o que não significa que ele não teve pesadelos, seu corpo estava inteiro dolorido devido aos machucados do acidente e a movimentação na cama.
_Levanta o braço – Shikamaru não tinha a mínima paciência, acabou fazendo uma força desnecessária enquanto o vestia arrancando gemidos, decorrente dos machucados no acidente.
_Me dê o pé Gaara – ele esperava o rapaz mostrar os dois, retirou as bandagens para verificar como estavam.
Gaara tinha sido praticamente carregado nas costas de Shikamaru durante o percurso de casa até o carro, do carro até o hospital, Shikamaru pediu uma cadeira de rodas emprestada para que o constrangimento entre ambos diminuísse, o médico que o atendeu, falou que estava tudo bem só recomendou passar outra pomada para acelerar a cicatrização, saindo dali eles seguiram para o quarto onde Temari estava.
As mãos de Shikamaru colocaram as de Gaara por cima das de Temari, ambos choravam, só que Gaara choraria bem mais, já que seu pai apareceu também para visita-la.
_O que ele faz aqui? – O homem ruivo afastava as mãos de Gaara de Temari, praticamente o jogando no chão, Shikamaru ficou sem reação, só percebeu de fato o que acontecia quando, ouviu os soluços e os palavrões. Rasa xingava-o de todos os nomes possíveis junto com chutes e socos, enquanto o outro só chorava. As mãos de Shikamaru instintivamente se meteram entre o menino e o pai.
_Rasa preciso falar com você!
Eles se retiraram do local ficando do lado de fora do quarto, Gaara tinha ficado ali, jogado e perdido, ouvindo os gritos de seu pai, ele concordava queria ter morrido no lugar de todos, tudo sempre era sua culpa.
_Rasa o que foi aquilo, ele é seu filho? – Shikamaru tentava entender o homem
_Aquela coisa não é o meu filho, eu me pergunto por que aquilo não morreu, ele sempre tira o que é importante para mim – ele falava se alterando.
_Calma Temari é irmã dele... – aquelas palavras eram como se ele gritasse aquilo a todo instante.
_Eu não o quero aqui- o outro gritava apontando para o quarto.
_Você não pode o impedir – Shikamaru mantinha o mesmo tom se recostando na parede da porta.
_Claro que posso, alias você não precisa aguenta-lo em sua casa, interne-o em alguma clínica.
_Sim! Digo Não, claro que não – aquela conversa duraria horas até que finalmente Shikamaru resolveu para-la. _Olha eu só preciso de umas roupas dele, só isso... – ele falava encarando o homem.
_Tudo bem, mas o retire de lá. Entrego tudo amanhã em sua casa.
Shikamaru colocou Gaara na cadeira de rodas, ele estava imóvel, chorando silenciosamente, febril e com muitos machucados.
_Vou devolver a cadeira – ele comunicava enquanto colocava o cinto no mais novo, o caminho até em casa foi silencioso. Gaara permaneceu na mesma posição durante horas, se levantou cambaleante para ir ao banheiro e depois voltou, Shikamaru pode ouvir quando ele murmurou quase que em segredo consigo mesmo.
Vielen Dank für das Lesen!
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