Era mais um dia normal na loja de artigos de rock, onde Pehleq atendia o décimo cliente da tarde já pensando na hora que poderia fechar a loja e Soul lia uma revista qualquer no canto, atrás do balcão, sem se incomodar com o som da gaita tocando na música de fundo.
— Tá tranquilo – o loiro falou assentindo, vendo o jovem rapaz acenar para ele caminhando em direção a porta, — pode passar aqui amanhã até meio dia que a gente vê isso pra você.
— Valeu! Prometo que venho.
— Beleza, se cuida.
Com um singelo aceno de cabeça, se despediu do cliente, o assistindo seguir em direção aos corredores do shopping e desaparecer por entre outras pessoas. Com as mãos na cintura, se virou em direção ao balcão, mostrando olhos irritados e um sorriso congelado. Soul apenas levantou o olhar, já esperando o que estava por vir.
— Dá pra acreditar naquilo? – Dando um riso frustrado, perguntou jogando os braços para cima, caminhando para debruçar na frente do jovem. — Ele nem sabia qual era a banda!
Revirando os olhos, o mais novo suspirou, voltando a ler as páginas coloridas, sem dar trela para a frustração do marido. Era sempre assim. Toda vez que algum jovem entrava na loja, era essa mesma conversa sobre “não entender nada sobre bandas”.
— Esse negócio tá falido mesmo.
Interrompendo os gritos frustrados de Pehleq, uma voz alta adentrou a loja em um tom risonho, chamando a atenção dos dois. Automaticamente se viraram, vendo parado na entrada, com as mãos na cintura, um homem alto de longo cabelo castanho e marcas de idade embaixo dos olhos, sorrindo, observando os artigos nas paredes.
— Toda vez que venho aqui você tão nesse balcão conversando.
— Você que entra na hora errada! – Indignado com a acusação do amigo, Pehleq gritou se explicando, vendo o outro erguer os braços, balançando as mãos, o ignorando. — Pra sua informação, acabei de atender um cliente.
— Ah é?
— É!
— Mas ele não comprou nada – Soul sussurrou no canto, atraindo os olhares.
Daichi riu alto enquanto Pehleq movia o corpo de uma lado a outro, frustrado por não saber como responder aquilo.
— Mas veio fazer o que aqui? – Mudando o assunto com seu tom irônico de sempre, Pehleq questionou vendo o outro se aproximar deles.
— Comprar suas porcarias que não é.
— Você sabe que eu tenho todo o direito de te expulsar da loja, né?
— Sei – falou erguendo as sobrancelhas, vendo o loiro o encarar como se dissesse para não testar sua paciência. — Noite de jogos hoje na minha casa, pode ser?
A pergunta foi o suficiente para mudar as expressões desconfiadas para olhares surpresos. Depois de tantos problemas durante a semana, o casal tinha até se esquecido que era sexta-feira.
Pehleq olhou para o lado vendo Soul fitando o mais velho. Os olhos azuis do marido perguntava o que queria fazer e os ombros relaxados do jovem dizia que estava tudo bem. Pehleq apenas balançou a cabeça em concordância, entendendo aquilo como um “por mim, ok”.
— Horas? – Perguntou fazendo o mais velho suspirar olhando para o teto pensativo.
— Eu vou arrumar as coisas com o Hayato em casa e pegar comida ainda... O que vocês querem?
— Pizza! – O loiro gritou automaticamente, tirando um resmungo cansado de Soul.
— A gente não comeu isso na sua casa da outra vez?
— E daí?
— Olha, – interrompendo as perguntas que se desafiavam, Soul começou a falar — por mim, qualquer coisa não muito exagerada tá ótimo.
— Então salgadinhos.
— E a pizza?
— Eu vejo isso pra você – balançando a cabeça descrente de sua teimosia, Daichi respondeu. — Podem chegar depois das 7.
— Ok.
— Eu vou levar bebida, pode?
— Pehleq... – Conhecendo o marido, Soul resmungou seriamente o repreendendo.
— Refrigerante...
— Ah...
— Pode – sorrindo do jeito como o maior se acanhava sempre que Soul chamava sua atenção, o moreno concordou, dando alguns passos para trás em direção a porta. — Então até daqui a pouco.
— Até.
—
O homem caminhava de um lado a outro pelos azulejos brancos da cozinha. Sobre a mesa de madeira, uma toalha de patinhos decorava os vários pacotes de salgadinhos espalhados no centro. Queria garantir que tudo ficasse em ordem dentro do possível.
— A gente vai jogar cartas?
Inclinando a cabeça na entrada do cômodo, o jovem de cabelos castanhos, Hayato, perguntou correndo os dedos pelo baralho na mão.
— Pode ser qualquer um dos três jogos que tá no armário.
— Então... cartas?
A pergunta fez o mais velho parar no meio do caminho. Seus olhos encontraram o rosto de olhos curiosos e lábios indecisos. Um leve sorriso surgiu no canto de seu rosto.
— É.
— Tá.
Assentindo para si mesmo, o jovem saiu deixando o mais velho balançando a cabeça. Hayato sempre foi assim, não gostava de tomar decisões e mesmo que quisesse alguma coisa sempre esperava o outro dizer algo antes.
Com um curto suspiro, retomou o trabalho indo até o armário pegar as tigelas, mas antes que pudesse abrir qualquer pacote e separar os conteúdos, ouviu o barulho de batidas na porta.
Seus olhos miram no relógio vendo 19:05 piscando.
— Hayato, termina aqui pra mim.
— Termino.
Limpando as mãos em um dos guardanapo na mesa, Daichi caminhou pelo corredor. Em poucos passos, alcançou a porta e com um puxão abriu espaço, revelando os rosto conhecidos o esperando.
— Na hora – falou, dando lugar para entrarem.
— O Soul não me deixa atrasar.
O comentário do loiro fez Daichi rir e Soul o encarar com um ar satisfeito.
— O Hayato tá arrumando as coisas na cozinha, fica à vontade.
— Beleza.
Soul caminhou em direção a sala enquanto Pehleq, com as sacolas, acompanhou Daichi até a cozinha. Assim que adentrou o local cumprimentou Hayato com um aceno e colocou as compras na mesa.
— Não precisava ter comprado – Daichi apontou ligeiramente incomodado.
— Tá tranquilo.
Debruçando sobre uma das cadeiras, Pehleq observou Hayato retirando as latas de cada sacola. Seus olhos curiosos o encarava esperando pela reação que não demorou acontecer. No meio da organização, o jovem pegou a lata roxa do refrigerante favorito.
Seus olhos brilharam contente e instintivamente se virou procurando Pehleq. Suas bochechas ficaram vermelhas quando viu que o homem o encarava.
Sorrindo, o loiro acenou como se dissesse um sutil “de nada”.
— Nem vai caber tudo aqui.
— Para de reclamar, Daichi! – Voltando a atenção para o mais velho, Pehleq resmunou e logo seus olhos viram os pacotes sobre a mesa. — Comprou minha pizza?
— Ah... – a pergunta fez o homem estalar o dedo. Caminhando até a mesa, bagunçou os pacotes e pegando um deles entregou ao loiro. — Tá aqui.
Na embalagem as formas coloridas acompanhavam a frase "sabor pizza". Pehleq se virou para ele com um olhar capaz de esfaqueá-lo.
— Você tem que maneirar nessas coisas – falou sorrindo.
— Nem começa! Eu vou pra academia toda semana.
— E come igual uma criança!
— Ah, tá, porque você é muito saudável, né?
— O assunto aqui é você!
— Vocês já vão brigar? – Fechando a porta da geladeira, Hayato questionou revirando os olhos. — O jogo nem começou ainda.
— Não... Eu vou esperar pra acabar com ele no- Que que a gente vai jogar?
— Cartas.
— Ah... Vou acabar com você.
— Tá bom – sem dar atenção, Daichi concordou pegando as tigelas. — Vamo pra sala. Ajuda a levar as coisas, criança.
— Cala boca!
Os três adentraram o cômodo, carregando o máximo que podiam, encontrando Soul sentado no sofá, arrumando as cartas.
Colocando as coisas sobre a mesa, ajeitaram o lugar, sentando cada um em uma almofada no chão.
— O que vamo jogar, Soul? – Pegando um petisco, Daichi perguntou.
— Poker.
O relógio já marcava nove horas quando todas as tigelas se esvaziaram e as latas começavam a se acumular pelos cantos. A noite alcançava o pico do cansaço, mas os rapazes mantinham a energia entre seus gritos e risos altos a cada nova jogada.
— O Daichi tá roubando ali! – O loiro gritou, batendo a mão contra a coxa.
— Lá vai começar! Já faz um ano que você vem aqui e ainda não aprendeu a perder.
— Eu tô vendo! Você fica toda hora olhando pro Hayato.
— Ah, Pehleq... Você não muda, né? – Rindo, deixando suas cartas na mesa, Daichi comentou.
— Já faz um ano mesmo? – Também colocando as cartas, Hayato perguntou antes de tomar um gole do refrigerante.
— Ou quase... Não parece que foi tudo isso desde que você apareceu na loja e começou a apontar seu dedo pra todo lado – repetindo os movimentos no ar, Daichi explicou fazendo Soul sorrir de canto. — Moto quebrada e tava querendo me ensinar a fazer meu trabalho.
— Eu só estava explicando a situação.
— Daichi te xingou tanto quando foi embora – Hayato confessou assistindo o mais velho assentindo frustrado.
— Sério?
— Igual você faz com seus clientes pelas costas – o moreno apontou tirando o olhar convencido de seu rosto.
— Ah... Aí eu entendo.
Rindo e finalmente deixando o jogo de lado, os quatro se jogaram pelos cantos, esticando os corpos e bocejando contentes. O silêncio tomou o local por alguns instantes enquanto refletiam sobre a situação.
Toda semana era assim. Trabalhavam todos os dias atendendo pessoas que não tinham consideração por seus esforços e ganhavam salários que nem um deles tinha sonhado em querer, mas eram felizes. Toda vez que a sexta-feira chegava, eles se lembravam disso.
— Quando foi que tudo isso aconteceu? – Daichi perguntou chamando os olhares. — A gente sair junto assim...
— Você consertou minha moto, eu achei que você era legal por isso e comecei a vir aqui mais vezes.
— O motivo foi esse? Eu achei que você não tinha o que fazer.
— Se fuder – rindo, reclamou fazendo o mais velho gargalhar.
— Mas eu não achava ruim – coçando a nuca, confessou antes de se virar e olhar para o mais novo do seu lado. — Sempre foi só eu e o Hayato e pra mim tava ótimo assim, mas não foi ruim vocês aparecerem – sorriu, se virando para Soul. — Lembro quando conheci o Soul.
— Eu também... – Concordou, dando um risinho contente.
— Você disse que tinha marido e eu automaticamente achei que fosse um cara do seu tamanho ou maior, mas aí eu vi o Soul – Daichi explicou olhando para Pehleq que com as sobrancelhas levantadas prestava atenção. — Nada a ver com você.
— A gente fala isso o tempo todo também.
— Você também não era tudo o que eu esperava quando o Pehleq falava de você – Soul apontou fazendo o mais velho inclinar a cabeça surpreso.
— Sério?
— Achava que era um homem irritante que só o Pehleq ia aguentar, mas, na verdade, é você quem aguenta ele.
— Soul!
— Como todo mundo.
— O Hayato não me aguenta! – Falou tentando se defender.
— Aguento sim – retrucou quase indignado.
— É pra ficar do meu lado!
Rindo alto Daichi os observou, discutindo como amigos sempre fazem e não conseguiu conter o sorriso.
— Eu queria o Hayato na minha vida. Quis que ele morasse comigo pra gente tentar uma vida melhor – falou em um tom carinhoso que fez o mais jovem sorrir contente. — Eu adotei ele e ganhei vocês dois no meio do caminho.
As palavras os fizeram se calar. Não eram de falar muito sobre sentimentos, mas compartilhavam dessa gratidão. Nunca tinham dito, mas pensavam a mesma coisa.
— Vocês vão começar a chorar agora? – Quebrando o silêncio, Soul falou em tom incomodado. — Porque se for, eu vou sair.
— Pra ninguém ver você chorando? – Hayato provocou fazendo o menor o encarar com olhos cerrados.
— Ninguém vai chorar! – Daichi afirmou rindo e antes que pudesse dizer algo, batidas na porta ecoaram pela sala. — Ah, até que fim.
Sem se explicar, levantou deixando os três para trás.
— Tinha mais alguém vindo? – Olhando para a entrada da cozinha, Pehleq perguntou para Hayato.
— Tem…
A resposta vaga fez o casal se entre olhar, confusos. Porém logo suas perguntas foram respondidas quando Daichi entrou na sala, sorrindo, com duas caixas nas mãos.
— Tinha alguém aqui que queria pizza?
Ele nem tinha terminado de falar e Pehleq já estava de pé, gritando contente. A reação boba do rapaz fez Hayato rir e Soul revirar os olhos inconformado.
— Daichi tem que parar de mimar ele – Soul levantou, vendo Pehleq correndo atrás do Daichi na cozinha, acompanhando Hayato em direção ao local. — Ele fica insuportável assim.
— Tenta falar isso pra ele.
Os dois se entre olharam por alguns instantes, imaginando o que aconteceria se fizessem isso e, rindo, decidiram deixar como estava e só aproveitar o momento.
Vielen Dank für das Lesen!
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