Não fazia ideia de como havia ido parar ali, naquele campo vasto que parecia infinito. As flores lhe faziam cócegas nas pernas onde o kimono não alcançava e o vento lhe bagunçava os cabelos, misturando suas cores, acariciando suas bochechas e arrancando um sorriso simples de Mitsuri. Naquele lugar, independente de onde fosse, sentia-se em paz e isso não se comparava a nada que ela já experimentou até aquele momento da vida.
"Kanroji."
Alguém a chamou, a voz lhe sendo familiar e causando uma ansiedade em seu ser sem que ela conseguisse entender exatamente o porquê.
Bastou apenas um piscar de olhos e de repente Obanai estava à sua frente, com uma das mãos estendidas em sua direção, os olhos calmos e um sorriso que Mitsuri identificou em meio à grande cicatriz da boca até as bochechas dele.
Ela aceitou aquele convite não dito em palavras segurando a mão de Iguro e deixando que o hashira a guiasse para algum lugar que ainda não sabia qual seria. Tinha seus olhos fixados nele, sua mente e seus extintos calmos. Não havia perigo ali e muito menos onis. De alguma forma, Mitsuri possuía essa certeza e se era assim, apenas aproveitaria a tranquilidade da imensidão e o calor da mão de Obanai, que segurava firme a sua.
Naquele momento, para Kanroji, não parecia errado ou minimamente estranho o fato de Obanai estar ali, assim como não parecia quando, parando embaixo de uma cerejeira, ela pôde reencontrar mais uma vez todos os seus companheiros hashiras.
Todos estavam ali, a olhando com carinho e com uma emoção que não soube identificar.
O primeiro a se aproximar foi Rengoku, que a abraçou bem forte, até a levantando do chão, e então, desapareceu. Mas Mitsuri não teve tempo para entender isso, pois logo Kocho a abraçou também. Pôde sentir as mãos dela acariciarem suas costas e como o outro hashira, ela também desapareceu, tendo acontecido a mesma coisa com os próximos: Uzui, Sanemi, Tokito, Himejima e Giyuu.
E por último, Iguro se aproximou. Seus rostos ficaram pertos um do outro e as mãos estendidas esbarrando uma na outra. Ela queria segurá-lo para que não desaparecesse como os outros, porém seu corpo não a obedecia, paralisado naquela posição e naquele momento crucial. Todos haviam desaparecido bem diante de seus olhos e não foi capaz de fazer nada. Com Obanai, seria a mesma coisa, ela sabia. A vida nunca lhe foi um mar de rosas no fim, mas queria ao menos dizer o que sentia por ele e o que guardava consigo há tanto tempo, apenas isso.
Porém, não houve tempo e assim como os outros, Obanai começou a desaparecer, mas lentamente, parte por parte, e seu último ato foi lhe dar um singelo beijo na testa antes de ir por completo. Restou apenas Kanroji e um enorme vazio, este que rapidamente se tornou tão doloroso quanto a escuridão que a tomou para todos os lados. Ela não resistiu. Deixou que a tomasse parte por parte até que, assim como seus amigos e seu amado, não restou mais do que um nada de si própria.
_______
Mitsuri recobrou a consciência aos poucos. Por vários minutos, tudo esteve mergulhado em escuridão, até que se esforçou para abrir os olhos, sentindo as pontas dos dedos das mãos e o seu tórax subindo e descendo em um ritmo acelerado. Não soube de exato se havia conseguido abrir seus olhos, pois tudo ainda era apenas um imenso borrão preto, mas uma luz surgiu e então trouxe vários pontos coloridos à visão de Kanroji, que, devagar, se acostumou com a claridade, mais especificamente com a luz do sol lhe trocando a face diretamente.
Quis sorrir ao olhar ao redor e ver vários funcionários correndo de um lado para o outro, arrastando pessoas para serem tratadas, passando por ela que estava escorada contra a parede de uma casa qualquer. Os ferimentos em seu corpo estavam devidamente cobertos e o fato de não conseguir se sentir completamente se devia com certeza à algum remédio que lhe foi aplicado.
Se estava viva juntamente àquelas pessoas, significava que Muzan estava morto de alguma forma e que o mundo havia se livrado do seu maior mal. Foi impossível para Mitsuri conter as lágrimas de felicidade e um alívio a deixou com a existência mais leve. Porém, ela sabia que muitos morreram para isso acontecer, para essa amanhã ter chegado para ela e muitos outros, para estarem respirando…
E então, nessa linha de pensamento, lembrou-se dos seus companheiros hashiras. Não esteve ao lado deles até o fim da batalha, fracassou em ajudá-los. Alguns haviam morrido até onde se lembrava, mas e os outros? O sonho que tivera lhe rompeu a mente e a sensação de perda deixou aquele momento menos vivo, com tons cinzas de morte.
Mas logo suas angústias foram confirmadas assim que viu o filho de Ubuyashiki vindo em sua direção. A face cansada dele sustentava um mínimo sorriso nos lábios que Mitsuri soube ser forçado. Afinal, uma pessoa que sempre usou máscaras conseguia identificar outro alguém que o fazia. Ubuyashiki Kiriya se agachou em sua frente, lhe segurou a mão e a olhou bem nos olhos. Apenas uma criança, Kanroji não pode evitar de pensar, com o coração apertado e as lágrimas descendo por suas bochechas.
— Nós ganhamos. Muzan foi derrotado pela luz graças à força e persistência de todos — Kiriya disse. — Agora vamos cuidar melhor de você e assim que estiver recuperada, te daremos mais detalhes sobre tudo o que aconteceu enquanto esteve desmaiada.
Ele iria se levantar e ir embora sem dizer mais nada, Mitsuri sabia disso após aquela fala, mas não poderia permitir que fosse assim. No momento só havia uma única coisa que ela precisava saber, somente uma, que a assombraria para o resto de sua vida e que era inevitável. Então, se esforçou em tentar segurá-lo a mão, falhando graças ao seu estado atual. Mas como o ato não passou despercebido pelo outro, se aproveitou da oportunidade e se esforçou para dizer algo, mesmo que saísse em sussurros baixos e intercalados.
— Eles… meus amigos… Obanai, todos… eles estão…
A sua fala não precisou ser concluída para que o garoto entendesse o que ela queria saber. Imutável à verdade naquela manhã — da qual ele gostaria de tê-la poupado da dor —, não achava justo ignorar a súplica por respostas nos olhos de Kanroji, nem dizer doces mentiras que cedo ou tarde viriam a se desmanchar.
— Todos estão mortos, sinto muito. Os únicos sobreviventes da luta foram alguns funcionários, você e a Nezuko — O jovem Ubuyashiki queria tê-la abraçado ao ver como ela ficou com a confirmação do que já sabia ser bem possível, mas achou que não seria muito proveniente, já que mal se conheciam. Então, mesmo parecendo cruel, a deixou ali, sozinha em seu choro.
A hashira precisava de um tempo a sós e avisou sobre isso aos outros, para que assim que se passasse esse tempo, a levassem para o tenda improvisada onde estavam cuidando dos feridos.
Mitsuri viu e sentiu seu pequeno mundinho criado junto de todos os colegas desabar, restando apenas ela e um vazio sem fim. Aquelas pessoas que a acolheram, a ajudaram a treinar e fizeram tanto para que se tornasse alguém que se orgulhava de si própria não existiam mais, haviam ido, assim como no sonho. Transformaram-se em pó e escorreram por seus dedos sem que pudesse impedir, sem que nem ao menos tivesse feito seu máximo para impedir que isso acontecesse.
Obanai a protegeu, a impediu que morresse e ela não pôde fazer o mesmo por ele, não pôde ajudá-lo no momento que provavelmente ele mais precisou. Ela queria ter se despedido direito, tê-lo beijado ao menos uma vez e dito que o amava, assim como ele a amava, assim como Shinobu havia dito a ela várias vezes para que fizesse, pois Iguro não o faria por fortes motivos pessoais e cabia a ela mostrá-lo que aquele amor entre os dois era certo e puro.
Mas não havia mais tempo para se declarar, despedir-se e nada mais. A morte era o ponto final sem vias de retorno. Todos que ela conheceu um dia, amou de alguma forma e considerou como parte de sua família estavam mortos. Agora, restava apenas Mitsuri, a sombra do luto às suas costas, a dor das perdas em seus olhos claros e a culpa marcada em sua alma por não ter se esforçado um pouco mais para ter salvado mais vidas ou talvez morrido junto daquelas que amava, sem precisar presenciar tantos outros dias sem eles ao seu lado.
N/A:
Revisada por Muzzx do blog MyeonDesign ;)
Vielen Dank für das Lesen!
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